Por Eleonora de Lucena e Rodolfo Lucena, no site Tutaméia:
Grande responsável pela descoberta do Pré-Sal, o geólogo Guilherme Estrella está indignado com os rumos que o governo golpista vem dando à Petrobras: “É um negócio completamente contrário ao interesse nacional, que vai explodir lá embaixo, no preço no diesel, na gasolina, no gás de cozinha, que passou a R$ 80 o botijão!”.
E prossegue: “Por causa dessa explosão de preço do gás, tivemos uma milhão e duzentos mil lares brasileiros voltando para a lenha! Isso é uma coisa primitiva! O país volta ao paleolítico, nós estamos voltando ao paleolítico! O ser humano, há dez mil anos, utilizava lenha.”
Essa é apenas uma das consequências perversas do “descalabro que se instalou na Petrobras”, como disse o especialista em entrevista ao Tutaméia. Estrella não poupa palavras para definir a situação: “Esse é o quadro tétrico, completamente desorganizado, caótico, de uma incompetência gigantesca na gestão desse sistema.”
País sobre pneus
Trata-se de um sistema complexo, em que participam muitas variáveis e que exigem muitas e diversificadas competências, como ele explica:
“A Petrobras trabalha com um produto que é absolutamente central para o país continental como o nosso, estratégico para manter a economia funcionando. Nós somos um país sobre pneus, essa é que a verdade. A cabotagem é praticamente inexistente, o complexo ferroviário é de pouca monta, ainda que crescendo, mas o Brasil é um país sobre pneus. A economia brasileira se desenvolve e se fundamenta nos caminhões.
“Esse sistema começa na exploração de petróleo, começa nos riscos enfrentados na atividade exploratória –mundialmente, em média se perfuram dez poços para ter uma descoberta, então são grandes os riscos. É uma atividade intensiva em capital, em investimentos: é preciso investir muito, correndo um risco elevado.
“Por isso, a capacitação geocientífica e tecnológica na área de equipamentos e produção é fundamental. Há ainda toda uma atividade de logística e de apoio operacional, passando para o transporte e o refino, até a colocação lá no consumidor final –boa parte deles sãos caminhoneiros, que transportam a economia brasileira.
“Essa gestão precisa ser integrada. É extremamente complexa e de sintonia fina. Quando se desagrega esses atores, essas partes que compõem o sistema, você transforma isso numa balbúrdia.”
Desagregação da Petrobras
No caso brasileiro, diz Estrella, essa balbúrdia é provocada pelas decisões da própria empresa: “A desagregação da Petrobras, com as refinarias 30% ociosas, com a liberdade de importação de combustíveis, mais a exportação de petróleo bruto, isso desestrutura a gestão de metade da matriz energética brasileira. E isso explode lá no final, como resultado da política adotada por esse governo golpista, ilegítimo e rejeitado pela população brasileira”.
Para piorar as coisas, sublinha ele, essa desagregação da empresa foi associado à política de referenciar os preços internos nos preços internacionais do petróleo –“voláteis como sempre, num mundo completamente conturbado em relação a petróleo e gás natural”—e na variação cambial.
Trata-se de um absurdo sem qualquer lógica, diz ele, associar à variação cambial os preços de um produto em que o Brasil é praticamente autossuficiente –“Não somos totalmente autossuficientes, mas, volumetricamente, sim–, no Brasil, com custos brasileiros e gastos no país.
O resultado é a disparada de preços, com consequências perversas para a população: “Por causa dessa explosão de preço do gás, tivemos uma milhão e duzentos mil lares brasileiros voltando para a lenha! Isso é uma coisa primitiva! O país volta ao paleolítico, nós estamos voltando ao paleolítico! O ser humano, há dez mil anos, utilizava lenha”.
“É inacreditável”, diz Estrella, destacando que essa política maléfica acontece num país, o Brasil, que não é mais dependente –pelo menos, volumentricamente, destaca—de petróleo importado nem de gás importado. “Isso é um total absurdo, camarada, é inacreditável o que nós estamos passando!”
Soberania e desenvolvimento
A revolta e a indignação de Estrella talvez sejam ainda maiores porque ele mesmo participou da descoberta dos recursos que podem tornar o Brasil independente. Batizado de “Pai do Pré-Sal” pelo presidente Lula, o geólogo aponta o tamanho da riqueza guardada na provincía petrolífera apelidada de Picanha Azul, nas profundezas da costa brasileira:
“O Pré-sal tem um imenso volume de petróleo –há estudos que calculam as reservas totais em 150 bilhões de barris. O valor disso é uma coisa inimaginável, o petróleo agora está a 75 dólares o barril, multiplicando dá trilhões e trilhões e trilhões de dólares.”
O Brasil consome 1 bilhão de barris de petróleo por ano, informa boletim produzido pela Associação Beneficente e Cultural dos Petroleiros. Ou seja, em tese, o país tem petróleo para 150 anos ou mais. Em dólares, o valor do Pré-sal equivale hoje a sete vezes o PIB do Brasil –o total das riquezas produzidas no país ao longo de um ano.
O valor do Pré-Sal, porém, vai além das quantificações volumétricas e monetárias, afirma Estrella: “Está numa fronteira de exploração que exige conhecimento e tecnologia, isso é o filé mignon. Para empresas que trabalham em setores de risco financeiro e de imprevisibilidade, isso é um filé mignon, porque trabalhar ali, nessa fronteira, que capacita essas empresas para saltos mais adiante”.
Ou seja, os desafios envolvidos com a exploração do Pré-sal são motor para construção de conhecimento e tecnologia que, por sua vez, dão base para o país enfrentar o que vier pela frente. “Isso é um processo contínuo. Não é uma coisa, um professor Pardal, que inventou algo… É um processo de enfrentar dificuldades, pesquisar, desenvolver tecnologia, vencer a dificuldade, enfrenta outra dificuldade e assim por diante, é um processo contínuo.”
Governos Lula e Dilma
Estrella, que tem muitas décadas de seus 77 anos de vida dedicadas ao mundo do petróleo, afirma que a descoberta do Pré-sal e a reconstrução da pujança da Petrobrás como sustentáculo e motor do desenvolvimento brasileiro só foram possíveis por causa das políticas adotadas pelos governos Lula e Dilma.
Ele conta que viu, no governo Fernando Henrique, a empresa definhar. E faz até uma ilação: “Se o Pré-sal tivesse sido descoberto no governo FHC, a empresa teria sido privatizada”.
Novos ventos sopraram no governo Lula. Na diretoria da Petrobrás em 2003, Estrella lembra que a empresa perdeu a concorrência para explorar o primeiro dos blocos da província petrolífera brasileira que foram a leilão naquele ano.
Instantes depois de o resultado da derrota ter sido, ele recebeu um telefonema de Dilma Rousseff, então ministra das Minas e Energia:
- Estrella, fiquei sabendo que perdemos o primeiro bloco – disse ela.
A explicação que o geólogo começou a dar foi cortada na lata por Dilma: “Perdemos o primeiro. Não vamos perder mais nenhum. Estamos compreendidos? Não vamos perder mais nenhum”.
Estava dado o recado: o governo Lula queria investir na expansão da importância da Petrobrás, na expansão da pesquisa, da exploração.
E prossegue: “Por causa dessa explosão de preço do gás, tivemos uma milhão e duzentos mil lares brasileiros voltando para a lenha! Isso é uma coisa primitiva! O país volta ao paleolítico, nós estamos voltando ao paleolítico! O ser humano, há dez mil anos, utilizava lenha.”
Essa é apenas uma das consequências perversas do “descalabro que se instalou na Petrobras”, como disse o especialista em entrevista ao Tutaméia. Estrella não poupa palavras para definir a situação: “Esse é o quadro tétrico, completamente desorganizado, caótico, de uma incompetência gigantesca na gestão desse sistema.”
País sobre pneus
Trata-se de um sistema complexo, em que participam muitas variáveis e que exigem muitas e diversificadas competências, como ele explica:
“A Petrobras trabalha com um produto que é absolutamente central para o país continental como o nosso, estratégico para manter a economia funcionando. Nós somos um país sobre pneus, essa é que a verdade. A cabotagem é praticamente inexistente, o complexo ferroviário é de pouca monta, ainda que crescendo, mas o Brasil é um país sobre pneus. A economia brasileira se desenvolve e se fundamenta nos caminhões.
“Esse sistema começa na exploração de petróleo, começa nos riscos enfrentados na atividade exploratória –mundialmente, em média se perfuram dez poços para ter uma descoberta, então são grandes os riscos. É uma atividade intensiva em capital, em investimentos: é preciso investir muito, correndo um risco elevado.
“Por isso, a capacitação geocientífica e tecnológica na área de equipamentos e produção é fundamental. Há ainda toda uma atividade de logística e de apoio operacional, passando para o transporte e o refino, até a colocação lá no consumidor final –boa parte deles sãos caminhoneiros, que transportam a economia brasileira.
“Essa gestão precisa ser integrada. É extremamente complexa e de sintonia fina. Quando se desagrega esses atores, essas partes que compõem o sistema, você transforma isso numa balbúrdia.”
Desagregação da Petrobras
No caso brasileiro, diz Estrella, essa balbúrdia é provocada pelas decisões da própria empresa: “A desagregação da Petrobras, com as refinarias 30% ociosas, com a liberdade de importação de combustíveis, mais a exportação de petróleo bruto, isso desestrutura a gestão de metade da matriz energética brasileira. E isso explode lá no final, como resultado da política adotada por esse governo golpista, ilegítimo e rejeitado pela população brasileira”.
Para piorar as coisas, sublinha ele, essa desagregação da empresa foi associado à política de referenciar os preços internos nos preços internacionais do petróleo –“voláteis como sempre, num mundo completamente conturbado em relação a petróleo e gás natural”—e na variação cambial.
Trata-se de um absurdo sem qualquer lógica, diz ele, associar à variação cambial os preços de um produto em que o Brasil é praticamente autossuficiente –“Não somos totalmente autossuficientes, mas, volumetricamente, sim–, no Brasil, com custos brasileiros e gastos no país.
O resultado é a disparada de preços, com consequências perversas para a população: “Por causa dessa explosão de preço do gás, tivemos uma milhão e duzentos mil lares brasileiros voltando para a lenha! Isso é uma coisa primitiva! O país volta ao paleolítico, nós estamos voltando ao paleolítico! O ser humano, há dez mil anos, utilizava lenha”.
“É inacreditável”, diz Estrella, destacando que essa política maléfica acontece num país, o Brasil, que não é mais dependente –pelo menos, volumentricamente, destaca—de petróleo importado nem de gás importado. “Isso é um total absurdo, camarada, é inacreditável o que nós estamos passando!”
Soberania e desenvolvimento
A revolta e a indignação de Estrella talvez sejam ainda maiores porque ele mesmo participou da descoberta dos recursos que podem tornar o Brasil independente. Batizado de “Pai do Pré-Sal” pelo presidente Lula, o geólogo aponta o tamanho da riqueza guardada na provincía petrolífera apelidada de Picanha Azul, nas profundezas da costa brasileira:
“O Pré-sal tem um imenso volume de petróleo –há estudos que calculam as reservas totais em 150 bilhões de barris. O valor disso é uma coisa inimaginável, o petróleo agora está a 75 dólares o barril, multiplicando dá trilhões e trilhões e trilhões de dólares.”
O Brasil consome 1 bilhão de barris de petróleo por ano, informa boletim produzido pela Associação Beneficente e Cultural dos Petroleiros. Ou seja, em tese, o país tem petróleo para 150 anos ou mais. Em dólares, o valor do Pré-sal equivale hoje a sete vezes o PIB do Brasil –o total das riquezas produzidas no país ao longo de um ano.
O valor do Pré-Sal, porém, vai além das quantificações volumétricas e monetárias, afirma Estrella: “Está numa fronteira de exploração que exige conhecimento e tecnologia, isso é o filé mignon. Para empresas que trabalham em setores de risco financeiro e de imprevisibilidade, isso é um filé mignon, porque trabalhar ali, nessa fronteira, que capacita essas empresas para saltos mais adiante”.
Ou seja, os desafios envolvidos com a exploração do Pré-sal são motor para construção de conhecimento e tecnologia que, por sua vez, dão base para o país enfrentar o que vier pela frente. “Isso é um processo contínuo. Não é uma coisa, um professor Pardal, que inventou algo… É um processo de enfrentar dificuldades, pesquisar, desenvolver tecnologia, vencer a dificuldade, enfrenta outra dificuldade e assim por diante, é um processo contínuo.”
Governos Lula e Dilma
Estrella, que tem muitas décadas de seus 77 anos de vida dedicadas ao mundo do petróleo, afirma que a descoberta do Pré-sal e a reconstrução da pujança da Petrobrás como sustentáculo e motor do desenvolvimento brasileiro só foram possíveis por causa das políticas adotadas pelos governos Lula e Dilma.
Ele conta que viu, no governo Fernando Henrique, a empresa definhar. E faz até uma ilação: “Se o Pré-sal tivesse sido descoberto no governo FHC, a empresa teria sido privatizada”.
Novos ventos sopraram no governo Lula. Na diretoria da Petrobrás em 2003, Estrella lembra que a empresa perdeu a concorrência para explorar o primeiro dos blocos da província petrolífera brasileira que foram a leilão naquele ano.
Instantes depois de o resultado da derrota ter sido, ele recebeu um telefonema de Dilma Rousseff, então ministra das Minas e Energia:
- Estrella, fiquei sabendo que perdemos o primeiro bloco – disse ela.
A explicação que o geólogo começou a dar foi cortada na lata por Dilma: “Perdemos o primeiro. Não vamos perder mais nenhum. Estamos compreendidos? Não vamos perder mais nenhum”.
Estava dado o recado: o governo Lula queria investir na expansão da importância da Petrobrás, na expansão da pesquisa, da exploração.
“Com a aquisição desses blocos, revertemos a curva de exploração”, lembra o cientista. “A Petrobras, que estava prestes a devolver blocos da bacia, fez o contrário: expandiu sua área de exploração. Tanto que perdemos produção em 2004 porque estávamos investindo na exploração, tiramos sondas da produção para colocar na exploração.”
Razões do golpe
A empresa passava no longo prazo, “que é uma visão absolutamente crítica e decisiva para uma empresa de petróleo”, buscando recuperar sua importância para a economia brasileira e para a construção da soberania nacional.
Está aí, aponta Estrella, uma das razões para o golpe contra o governo da presidenta eleita Dilma Rousseff.
É uma opinião que o geólogo vem construindo já há algum tempo –falou sobre ela para o Tutaméia no ano passado, em entrevista que fizemos na sua casa, na região serrana do Rio de Janeiro (veja aqui).
Construir a autossuficiência na área energética, afirma Estrella, é decisivo para possibilitar políticas de Estado que reduzam as desigualdades sociais do país.
“Nós somos a nona economia mundial, mas ocupamos a 72ª posição no consumo de energia por habitante, que é parâmetro de qualidade de vida. Há uma enorme desigualdade social. Em um índice, somos o quinto último do mundo, só há quatro países africanos em situação pior que nós. Em contrapartida, temos 210 milhões de habitantes. Temos um mercado interno enorme, que é também uma riqueza. Em potencial de consumo de bens é gigantesco. Que pode nos dar sustentação por todo o século 21.”
Este deveria ser o compromisso da Petrobras: “Uma empresa integrada, que produz petróleo no Brasil, descobre a maior província petrolífera, com tecnologia brasileira, com engenharia brasileira, com competência brasileira, descobre a maior província petrolífera dos últimos tempos. E tem como compromisso o suprimento para o país em condições que promovam a maior igualdade social e desenvolvimento nacional, para ter, lá no final, combustíveis baratos.”
O golpe veio interromper essa trajetória, levando à balbúrdia o setor energético brasileiro.
Reconquista do Brasil
“Isso precisa ser revertido”, afirma Estrella. “Esse governo é um governo ilegítimo. Ele não tem o direito de tomar decisões de tal forma comprometedoras em relação ao futuro da Nação, em relação ao nosso patrimônio natural estratégico. O Brasil está vendido! O professor Bercovici vai além: esses caras [os compradores] são receptadores de roubo. Têm de ser processados. Não só os bens têm de ser readquiridos imediatamente como os compradores devem ser processados.”
Essa consciência, acredita ele, já está chegando a uma grande parte dos brasileiros. Cita estatísticas de rejeição às políticas de Temer e afirma: “Esse governo é antibrasileiro”.
Por isso, é preciso derrotá-lo nas urnas, garantindo ao presidente Lula o direito de se candidatar, garantindo aos brasileiros o direito de votarem em quem desejarem.
“A prisão do Lula é um absurdo mundialmente reconhecido. Uma ilegalidade! O mundo todo está se pronunciando sobre isso, juristas brasileiros mostrando que está sendo cometida uma barbaridade”, afirma o Pai do Pré-sal.
Como sair dessa situação: “Não tem jeito, temos de romper com o que está aí, com esse entulho fedorento. Tempos de ganhar a eleição para reverter tudo isso que foi feito”.
É possível, afirma Estrella: “Aos setenta e sete anos, eu sou um sobrevivente. Tenho de ser otimista. Não sou oniricamente otimista. Existem bases. O crescente apoio a Lula mostra que esse movimento é possível. Trazendo as pessoas para uma reflexão, uma análise crítica das nossas possibilidades, de sua vida própria, eles vão se incorporar a esse movimento para recuperar o Brasil. Precisamos afirmar: Esta terra é nossa!”.
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