Por Tereza Cruvinel, no Jornal do Brasil:
O presidente eleito Jair Bolsonaro já definiu os ocupantes de pastas estratégicas como Casa Civil, Economia e Justiça, mas não o de Relações Exteriores, geralmente um dos primeiros anunciados, até para que os governos estrangeiros tenham logo um interlocutor.
Ele segue fixando, pessoalmente, as linhas de uma política externa que pode ter custos elevados para o Brasil e comprometer décadas de esforços diplomáticos. O convidado terá que aceitar o prato feito.
O alinhamento com os Estados Unidos deve alcançar o nível das “relações carnais”, definição do ex-presidente argentino Carlos Menem para a submissão de seu governo.
Ao bater continência para a bandeira americana, Bolsonaro disse gestualmente a mesma coisa.
Na quinta-feira, ele anunciou a transferência da embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, seguindo os passos de Donald Trump e contrariando a posição historicamente assumida pelo Brasil, de respeito às aspirações do povo palestino ao seu próprio Estado, tendo a cidade sagrada como capital.
Haverá alinhamento também nos órgãos multilaterais, disse Bolsonaro, na entrevista ao jornal “Israel Hayom”: “Podem contar com o nosso voto”. O premiê Benjamin Netanyahu louvou o “passo histórico” e prometeu vir à posse.
O custo da hostilidade aos palestinos pode ser uma drástica redução das exportações brasileiras para os países árabes, que são o quarto maior destino de produtos nacionais, atrás da China, EUA e Argentina.
Elas somaram US$ 1,01 bilhão em 2017.
Má notícia para os exportadores de frango e açúcar, que representam quase a metade das vendas para os árabes.
Bolsonaro quer comprar briga também com a China, maior parceiro econômico do Brasil, com quem Trump está em guerra comercial.
Durante a campanha chegou a dizer que não privatizaria a Eletrobras para que nossa energia não ficasse “nas mãos dos chineses”, grandes investidores no setor.
Foi à Ásia em fevereiro, pulou Pequim, mas foi a Taiwan, irritando os chineses, que consideram a ilha parte de seu território. O Brasil reconheceu isso no reatamento das relações diplomáticas por Geisel, em 1974.
Se a relação desandar, pior para o Brasil, que exporta US$ 50 bilhões anuais para a China, com saldo comercial de US$ 32 bilhões.
Passemos às relações com a Argentina, que estão na base do surgimento do Mercosul.
Devemos aos presidentes Sarney e Alfonsín, os primeiros civis após o fim das respectivas ditaduras, a negociação de um acordo estratégico que pusesse fim às antigas rivalidades entre Brasil e Argentina.
Foi a Declaração de Iguaçú, que cobri como repórter. Seguiram-se vários acordos.
Um deles pôs fim à disputa armamentista e nuclear entre os dois países, outro lançou as bases para a criação de uma área de livre comércio, à qual aderiram depois Uruguai e Paraguai, dando origem ao Mercosul.
Mas para que o bloco chegasse a ser o que é hoje, perto de firmar acordo com a União Europeia, foram anos de trabalho, negociação e superação de dificuldades e conflitos.
Esta semana o futuro ministro Paulo Guedes respondeu com estupidez à repórter argentina que perguntou sobre o bloco.
“Não é prioridade. É isso que você queria ouvir? Não é prioridade”.
Há problemas que devem ser corrigidos, mas o que se pretende, como disse o ex-chanceler Celso Amorim, é esfacelar o Mercosul, lembrando que o bloco compra 25% dos manufaturados brasileiros.
Na relação bilateral com a Argentina não haverá mais a “aliança estratégica”, tão importante para o progresso e a paz na região. A primeira viagem de Bolsonaro não será a Buenos Aires, mas a Santiago do Chile, numa deferência ao também direitista Sebastião Piñera, cuja política econômica ultraliberal é semelhante à que Guedes implantará.
Mas o Itamaraty, dirigido por uma carreira de Estado específica e altiva, é menos aberto ao aparelhamento.
Talvez consiga retardar os movimentos mais arriscados, até que o bolsonarismo passe.
Pois tudo um dia passa.
O presidente eleito Jair Bolsonaro já definiu os ocupantes de pastas estratégicas como Casa Civil, Economia e Justiça, mas não o de Relações Exteriores, geralmente um dos primeiros anunciados, até para que os governos estrangeiros tenham logo um interlocutor.
Ele segue fixando, pessoalmente, as linhas de uma política externa que pode ter custos elevados para o Brasil e comprometer décadas de esforços diplomáticos. O convidado terá que aceitar o prato feito.
O alinhamento com os Estados Unidos deve alcançar o nível das “relações carnais”, definição do ex-presidente argentino Carlos Menem para a submissão de seu governo.
Ao bater continência para a bandeira americana, Bolsonaro disse gestualmente a mesma coisa.
Na quinta-feira, ele anunciou a transferência da embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, seguindo os passos de Donald Trump e contrariando a posição historicamente assumida pelo Brasil, de respeito às aspirações do povo palestino ao seu próprio Estado, tendo a cidade sagrada como capital.
Haverá alinhamento também nos órgãos multilaterais, disse Bolsonaro, na entrevista ao jornal “Israel Hayom”: “Podem contar com o nosso voto”. O premiê Benjamin Netanyahu louvou o “passo histórico” e prometeu vir à posse.
O custo da hostilidade aos palestinos pode ser uma drástica redução das exportações brasileiras para os países árabes, que são o quarto maior destino de produtos nacionais, atrás da China, EUA e Argentina.
Elas somaram US$ 1,01 bilhão em 2017.
Má notícia para os exportadores de frango e açúcar, que representam quase a metade das vendas para os árabes.
Bolsonaro quer comprar briga também com a China, maior parceiro econômico do Brasil, com quem Trump está em guerra comercial.
Durante a campanha chegou a dizer que não privatizaria a Eletrobras para que nossa energia não ficasse “nas mãos dos chineses”, grandes investidores no setor.
Foi à Ásia em fevereiro, pulou Pequim, mas foi a Taiwan, irritando os chineses, que consideram a ilha parte de seu território. O Brasil reconheceu isso no reatamento das relações diplomáticas por Geisel, em 1974.
Se a relação desandar, pior para o Brasil, que exporta US$ 50 bilhões anuais para a China, com saldo comercial de US$ 32 bilhões.
Passemos às relações com a Argentina, que estão na base do surgimento do Mercosul.
Devemos aos presidentes Sarney e Alfonsín, os primeiros civis após o fim das respectivas ditaduras, a negociação de um acordo estratégico que pusesse fim às antigas rivalidades entre Brasil e Argentina.
Foi a Declaração de Iguaçú, que cobri como repórter. Seguiram-se vários acordos.
Um deles pôs fim à disputa armamentista e nuclear entre os dois países, outro lançou as bases para a criação de uma área de livre comércio, à qual aderiram depois Uruguai e Paraguai, dando origem ao Mercosul.
Mas para que o bloco chegasse a ser o que é hoje, perto de firmar acordo com a União Europeia, foram anos de trabalho, negociação e superação de dificuldades e conflitos.
Esta semana o futuro ministro Paulo Guedes respondeu com estupidez à repórter argentina que perguntou sobre o bloco.
“Não é prioridade. É isso que você queria ouvir? Não é prioridade”.
Há problemas que devem ser corrigidos, mas o que se pretende, como disse o ex-chanceler Celso Amorim, é esfacelar o Mercosul, lembrando que o bloco compra 25% dos manufaturados brasileiros.
Na relação bilateral com a Argentina não haverá mais a “aliança estratégica”, tão importante para o progresso e a paz na região. A primeira viagem de Bolsonaro não será a Buenos Aires, mas a Santiago do Chile, numa deferência ao também direitista Sebastião Piñera, cuja política econômica ultraliberal é semelhante à que Guedes implantará.
Mas o Itamaraty, dirigido por uma carreira de Estado específica e altiva, é menos aberto ao aparelhamento.
Talvez consiga retardar os movimentos mais arriscados, até que o bolsonarismo passe.
Pois tudo um dia passa.
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