Por Cynara Menezes, no blog Socialista Morena:
“Não é a missão da arte chafurdar na sujeira pela sujeira, pintar o ser humano apenas em estado de putrefação… Ou apresentar idiotas deformados como representantes da força masculina” disse Hitler em um discurso em 1935. Para demonstrar seu ponto de vista, o führer foi convencido por seu ministro da Propaganda, Joseph Goebbels, que também controlava a cultura com mão de ferro, a realizar duas exposições de arte: uma com a “Grande Arte Alemã” e a outra apenas com a “arte degenerada”.
Ambas as exposições foram inauguradas em Munique em julho de 1937: primeiro a oficial, no dia 18, e, no dia seguinte, a “degenerada” (veja o catálogo aqui).
Panfletos convidando para a exposição diziam: “Óleos atormentados, decadência psicológica, fantasias doentias, picaretas mentalmente enfermos: visite a exposição Arte Degenerada“. Nas paredes, ao lado das obras, foram colocados dizeres como: “Zombaria insolente da divindade”; “Insulto à mulher alemã”; “Natureza vista por mentes doentias”. Nada muito diferente do que os “especialistas em arte” de extrema-direita do Brasil falam quando veem uma obra particularmente provocadora em algum museu…
Mas a antipropaganda surtiu um efeito inverso: estima-se que mais de 2 milhões de alemães tenham visitado a exposição de arte “degenerada”, e menos de um quarto delas, a de arte “boa”. Pelo visto, o público alemão não se deixou enganar pelos discursos hitleristas e percebeu qual das duas mostras de fato continha trabalhos que passariam à história.
Além de confiscarem os quadros de artistas modernistas dos museus, os nazistas roubaram obras de comerciantes judeus cujas famílias até hoje lutam por reparação. Cerca de um terço dos cerca de 800 comerciantes de arte e leiloeiros em Berlim naqueles anos eram de origem judaica e, em 1938, todos eles foram obrigados a deixar seus negócios para trás. Um documentário italiano que estreou com grande sucesso em abril do ano passado, Hitler contra Picasso e os Outros, conta a história das famílias que tiveram suas obras de arte surrupiadas pelos nazistas.
Em 2011, a polícia alemã descobriu um apartamento repleto de obras de arte confiscadas pelos nazis em posse do filho idoso de um receptador que adquirira os quadros a preços módicos de seus contatos hitleristas. Entre as obras apreendidas estavam trabalhos de Matisse, Picasso, Chagall e Renoir que ficaram longe dos olhos do público durante 70 anos. Na última década, museus renomados de todo o mundo fizeram mostras relembrando a “arte degenerada”. Nenhum recriou a exposição de “grande arte alemã”.
Quanto valerá, no futuro, a arte “aprovada” pelo bolsonarismo? Provavelmente tanto quanto o apreço deles pela cultura.
O governador do Rio de Janeiro, o bolsonarista Wilson Witzel, acaba de concretizar o primeiro ato de censura da sua gestão. Alegando “nudismo” (sic) em uma performance que fazia referência à tortura durante a ditadura militar, Witzel mandou encerrar antes do tempo a exposição Literatura Exposta, em cartaz na Casa França-Brasil.
Dias antes, o diretor da instituição, Jesus Chediak, já havia vetado uma instalação onde milhares de baratas de plástico saíam de um bueiro ao som de falas de Jair Bolsonaro. Witzel defendeu inclusive a censura prévia, ao dizer que o governo do Rio precisa ser avisado com antecedência sobre o conteúdo de exposições em espaços públicos.
Mas a perseguição à arte pela extrema-direita não chega a ser uma novidade: assim como os bolsonaristas estão fazendo desde 2016 no Brasil, os nazistas também censuraram e instauraram uma caça à arte e aos artistas modernos sob a desculpa de “defender a pátria, a moral, a religião e os bons costumes”. Como todo mundo sabe, Adolf Hitler foi também um pintor medíocre. Ao chegar ao poder, freudianamente decidiu designar qual arte era “boa” e deveria ser glorificada e qual era “degenerada” e deveria ser banida.
Claro que a arte “boa” era aquela à sua imagem e semelhança como artista: bucólicas paisagens, cenas pastorais ou esculturas ao estilo greco-romano, que Hitler considerava “não contaminadas” por influência dos judeus ou dos comunistas. O nu era permitido, mas apenas se fosse “clássico”. Absolutamente toda a arte moderna foi considerada “degenerada” pelos nazistas, do surrealismo ao cubismo e ao fauvismo, e foi criada pelo governo a Câmara de Cultura do Reich com o objetivo de combater o “bolchevismo” e a “imoralidade” na arte.
“Modernismo é agora proibido”, titulava o New York Times em sua edição de 25 de julho de 1937. Não foram só livros que foram queimados pelos nazistas; obras de arte também. Em março de 1939, mais de 1000 pinturas e esculturas e quase 4 mil aquarelas, desenhos e gravuras foram queimados na sede do Corpo de Bombeiros de Berlim.
Nomes consagrados da arte universal como Pablo Picasso, Kandinsky, Otto Dix, Piet Mondrian, Marc Chagall, Giorgio de Chirico, Max Ernst, Max Beckmann, Edvard Munch e Paul Klee, entre outros, foram banidos. Mais de 20 mil obras de cerca de 1400 artistas foram retiradas de museus e galerias. Curadores e diretores foram demitidos e substituídos por nazistas alinhados à concepção de “arte alemã” de Hitler. Exposições foram fechadas com participação ostensiva da polícia e os artistas, atacados publicamente pelas autoridades. Alguma semelhança com o que fizeram com a exposição Queermuseu em Porto Alegre em 2017?
Dias antes, o diretor da instituição, Jesus Chediak, já havia vetado uma instalação onde milhares de baratas de plástico saíam de um bueiro ao som de falas de Jair Bolsonaro. Witzel defendeu inclusive a censura prévia, ao dizer que o governo do Rio precisa ser avisado com antecedência sobre o conteúdo de exposições em espaços públicos.
Mas a perseguição à arte pela extrema-direita não chega a ser uma novidade: assim como os bolsonaristas estão fazendo desde 2016 no Brasil, os nazistas também censuraram e instauraram uma caça à arte e aos artistas modernos sob a desculpa de “defender a pátria, a moral, a religião e os bons costumes”. Como todo mundo sabe, Adolf Hitler foi também um pintor medíocre. Ao chegar ao poder, freudianamente decidiu designar qual arte era “boa” e deveria ser glorificada e qual era “degenerada” e deveria ser banida.
Claro que a arte “boa” era aquela à sua imagem e semelhança como artista: bucólicas paisagens, cenas pastorais ou esculturas ao estilo greco-romano, que Hitler considerava “não contaminadas” por influência dos judeus ou dos comunistas. O nu era permitido, mas apenas se fosse “clássico”. Absolutamente toda a arte moderna foi considerada “degenerada” pelos nazistas, do surrealismo ao cubismo e ao fauvismo, e foi criada pelo governo a Câmara de Cultura do Reich com o objetivo de combater o “bolchevismo” e a “imoralidade” na arte.
“Modernismo é agora proibido”, titulava o New York Times em sua edição de 25 de julho de 1937. Não foram só livros que foram queimados pelos nazistas; obras de arte também. Em março de 1939, mais de 1000 pinturas e esculturas e quase 4 mil aquarelas, desenhos e gravuras foram queimados na sede do Corpo de Bombeiros de Berlim.
Nomes consagrados da arte universal como Pablo Picasso, Kandinsky, Otto Dix, Piet Mondrian, Marc Chagall, Giorgio de Chirico, Max Ernst, Max Beckmann, Edvard Munch e Paul Klee, entre outros, foram banidos. Mais de 20 mil obras de cerca de 1400 artistas foram retiradas de museus e galerias. Curadores e diretores foram demitidos e substituídos por nazistas alinhados à concepção de “arte alemã” de Hitler. Exposições foram fechadas com participação ostensiva da polícia e os artistas, atacados publicamente pelas autoridades. Alguma semelhança com o que fizeram com a exposição Queermuseu em Porto Alegre em 2017?
“Não é a missão da arte chafurdar na sujeira pela sujeira, pintar o ser humano apenas em estado de putrefação… Ou apresentar idiotas deformados como representantes da força masculina” disse Hitler em um discurso em 1935. Para demonstrar seu ponto de vista, o führer foi convencido por seu ministro da Propaganda, Joseph Goebbels, que também controlava a cultura com mão de ferro, a realizar duas exposições de arte: uma com a “Grande Arte Alemã” e a outra apenas com a “arte degenerada”.
Ambas as exposições foram inauguradas em Munique em julho de 1937: primeiro a oficial, no dia 18, e, no dia seguinte, a “degenerada” (veja o catálogo aqui).
Panfletos convidando para a exposição diziam: “Óleos atormentados, decadência psicológica, fantasias doentias, picaretas mentalmente enfermos: visite a exposição Arte Degenerada“. Nas paredes, ao lado das obras, foram colocados dizeres como: “Zombaria insolente da divindade”; “Insulto à mulher alemã”; “Natureza vista por mentes doentias”. Nada muito diferente do que os “especialistas em arte” de extrema-direita do Brasil falam quando veem uma obra particularmente provocadora em algum museu…
Mas a antipropaganda surtiu um efeito inverso: estima-se que mais de 2 milhões de alemães tenham visitado a exposição de arte “degenerada”, e menos de um quarto delas, a de arte “boa”. Pelo visto, o público alemão não se deixou enganar pelos discursos hitleristas e percebeu qual das duas mostras de fato continha trabalhos que passariam à história.
Além de confiscarem os quadros de artistas modernistas dos museus, os nazistas roubaram obras de comerciantes judeus cujas famílias até hoje lutam por reparação. Cerca de um terço dos cerca de 800 comerciantes de arte e leiloeiros em Berlim naqueles anos eram de origem judaica e, em 1938, todos eles foram obrigados a deixar seus negócios para trás. Um documentário italiano que estreou com grande sucesso em abril do ano passado, Hitler contra Picasso e os Outros, conta a história das famílias que tiveram suas obras de arte surrupiadas pelos nazistas.
Em 2011, a polícia alemã descobriu um apartamento repleto de obras de arte confiscadas pelos nazis em posse do filho idoso de um receptador que adquirira os quadros a preços módicos de seus contatos hitleristas. Entre as obras apreendidas estavam trabalhos de Matisse, Picasso, Chagall e Renoir que ficaram longe dos olhos do público durante 70 anos. Na última década, museus renomados de todo o mundo fizeram mostras relembrando a “arte degenerada”. Nenhum recriou a exposição de “grande arte alemã”.
Quanto valerá, no futuro, a arte “aprovada” pelo bolsonarismo? Provavelmente tanto quanto o apreço deles pela cultura.
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