Por Edson Aparecido da Silva e Arlindo Rodrigues
Em março de 2018, ocorreu o Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA) em Brasília, esse fórum foi um encontro de diversas experiências coletivas de vivência com a Água. Foi espaço de trocas de sucessos e adversidades na luta em defesa da água como direito e não como mercadoria. Seu objetivo foi enriquecer as práticas de seus participantes, estreitar as relações entre os diversos movimentos e, ao mesmo tempo, ser contraponto ao Fórum Mundial da Água (FMA).
Foi, sem dúvida, um dos maiores encontros alternativos acontecidos na história dos fóruns mundiais da água. Conseguiu reunir cerca de 7.000 participantes, 450 organizações, representantes de 35 países dos 5 continentes. Ocorreram mais de 180 atividades autogestionadas na Universidade de Brasília. Vários grupos de interesse, que lidam com o tema da Água nas mais variadas interfaces, puderam se conhecer e traçar estratégias de organização e luta. Foram seis dias de muito debate, muita mística, muita música, e, principalmente, muita troca de saberes, vivências, afeto e solidariedade regido pelo espírito da busca do Bem Viver.
O FAMA foi construído por diversos movimentos sociais e representantes do meio acadêmico. Esse encontro foi fruto de um processo de construção coletiva iniciada no primeiro semestre de 2017, organizado por diversos comitês locais em mais de vinte estados brasileiros. Um marco importante em sua organização foi o lançamento internacional ocorrido em setembro de 2017, pois além dos brasileiros, estiveram presentes representantes de movimentos sociais da Argentina, Bolívia, Canadá, Chile, Costa Rica, Espanha, Estados Unidos, Holanda, Itália, Palestina, Paraguai, Peru e Uruguai.
A diversidade de pessoas envolvidas na construção do FAMA enriqueceu seu propósito e seus resultados. Participaram representantes de várias religiosidades, movimentos de mulheres, povos originários, quilombolas, pescadores, atingidos por grandes obras hídricas, comunidades originárias e tradicionais e diversos segmentos socioambientais.
O FAMA nasceu para se contrapor ao FMA, o qual, na percepção dos movimentos socioambientais, está comprometido com a visão mercantilizadora da água, através das privatizações, pelas Parcerias Públicas Privadas (PPPs), e outras formas de privatização. Em sua declaração final, o FAMA deixa clara a intencionalidade de ser contraponto ao FMA, chamando-o de Fórum das Corporações, afirmando que seu espaço tem como objetivo capturar e roubar as nossas Águas e que atende apenas aos interesses corporativos em detrimento dos povos e da natureza.
Critica o lema do FMA “compartilhando a Água”, ao que questionou: compartilhando a Água de quem, para quem e para quê? A denúncia presente no documento final do FAMA é que as privatizações dos serviços de água e saneamento causaram diversos danos à sociedade onde foi implementada, como o aprofundamento das desigualdades, a violência contra as mulheres, a contaminação e envenenamento das Águas, redução na qualidade dos serviços prestados à população, precarização do trabalho e aumentos abusivos nas tarifas.
O FAMA reafirmou a orientação ética de que a Água não é mercadoria, é do povo. No documento, assinado por 168 instituições de diversos países e diversas missões, o caminho indicado é a valorização do conhecimento dos povos tradicionais, pois sua relação com as Águas (nas suas diversas formas, como rios, lagos, aquíferos, lagoas entre outras) é de uma profunda unidade, resgatando o seu sagrado por ser essencial à reprodução da vida de todos os seres do nosso planeta.
A principal mensagem desse fórum é que a “água não é e nem pode ser mercadoria. Não é recurso a ser apropriado, explorado e destruído para bom rendimento dos negócios. Água é um Bem Comum e deve ser preservada e gerida pelos povos para as necessidades da vida, garantindo sua reprodução e perpetuação”. Uma contribuição do processo de construção e realização desse fórum foi a inclusão da questão ambiental pelo debate hídrico nas pautas de reivindicações e ações dos movimentos sociais.
A principal mensagem desse fórum é que a “água não é e nem pode ser mercadoria. Não é recurso a ser apropriado, explorado e destruído para bom rendimento dos negócios. Água é um Bem Comum e deve ser preservada e gerida pelos povos para as necessidades da vida, garantindo sua reprodução e perpetuação”. Uma contribuição do processo de construção e realização desse fórum foi a inclusão da questão ambiental pelo debate hídrico nas pautas de reivindicações e ações dos movimentos sociais.
Assim, esses movimentos deram um grande passo para se tornarem movimentos socioambientais, assumindo que se não houver Água, em quantidade e qualidade para todos, os solos férteis para produzir alimentos e ar puro, as conquistas salariais e moradias entre outras perdem seu sentido de bem viver social. A ambição do FAMA é se consolidar como uma grande rede nacional e internacional das pautas debatidas no Fórum em 2018. Nesse sentido, temos o diálogo do FAMA com a organização do Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento (ONDAS). Espaço importante para reunir movimentos socioambientais comprometidos com o combate a privatização e, ao mesmo tempo, com a democratização do acesso à Água e ao Saneamento.
Como diz a declaração final do FAMA “Nossa resistência e luta é legítima. Somos os guardiões e guardiãs das águas e defensores da vida. Somos um povo que resiste e nossa luta vencerá todas as estruturas que dominam, oprimem e exploram nossos povos, corpos e territórios. Somos como água, alegres, transparentes e em movimento. Somos povos da água e a água dos povos”.
* Edson Aparecido da Silva é Sociólogo e Mestre em Planejamento e Gestão do Território. Integrou a Coordenação Nacional do FAMA; Arlindo Rodrigues é Doutor em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Pesquisador do Núcleo do Estudo do Futuro na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
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