Por Altamiro Borges
Num momento político sombrio, em que os militares retornam ao poder central – são oito generais vassalos no ministério do capitão Jair Bolsonaro – e uma ditadura híbrida avança no país, a publicação do livro sobre a história do jornal cearense Mutirão (1977-1982) é bastante oportuna. O amigo Benedito Bizerril, advogado e militante das causas populares, acertou em cheio ao se dedicar à pesquisa e à redação da obra. Protagonista dessa empreitada heroica, ele mostra a importância da mídia alternativa em tempos de resistência.
Há muitas diferenças, mas também algumas similaridades entre esses distintos períodos. Assim como hoje, a mídia monopolista ajudou a criar o clima para o golpe militar de 1964. Na época, a TV ainda era incipiente e quem cumpriu esse papel nocivo foram os jornais e as rádios. O livro traz acalentada pesquisa sobre a linha editorial dos principais veículos do Ceará. Os editoriais da época, alguns reproduzidos no livro, até lembram a satanização da política patrocinada pela mídia para justificar o golpe contra Dilma Rousseff e a prisão política de Lula – e que foi decisiva para chocar o ovo da serpente fascista que permitiu a eleição de Jair Bolsonaro.
Como relembra Benedito Bizerril, “nos anos sessenta, assim como nos dias atuais, os principais veículos de comunicação no Ceará pertenciam a restritos grupos de empresários e de famílias das classes dominantes. Os Diários Associados, de Assis Chateaubriand, destacavam-se na condição de proprietários dos jornais Unitário, matutino, e Correio do Ceará, vespertino, bem como da Ceará Rádio Clube, de prefixo PRE-9, e da TV Ceará, Canal 2, à época o único canal televisivo do Estado. A família do senador Paulo Sarasate, ex-governador do Ceará e liderança de projeção nacional da UDN, era proprietária do jornal O Povo, concorrente direto dos jornais dos Diários Associados na disputa pela preferência do público leitor cearense”.
O livro destaca que apenas um veículo se contrapôs ao golpe e à ditadura. “Somente a Rádio Dragão do Mar, do empresário e deputado federal pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) Moysés Pimentel, manteve-se em sintonia com os anseios democráticos e progressistas”. Exatamente por isso, a emissora foi alvo da fúria dos generais. Um dos primeiros atos do regime ditatorial foi a retirada do ar da rádio. “A emissora só retornará a funcionar algum tempo depois, mas sob nova administração de um oficial da reserva, general Almir Macedo de Mesquita”. Já o deputado trabalhista teve seu mandato cassado e foi preso.
É diante desse cenário de censura e violência da ditadura militar e de cumplicidade da mídia patronal que um grupo de lutadores, políticos e jornalistas decide organizar um jornal contra-hegemônico. Ele será fruto de um mutirão generoso e trabalhoso – e esta é a origem do nome do novo veículo –, que se esforça para construir a unidade respeitando as divergências existentes. Ele reunirá trabalhistas, comunistas, trotskistas, lideranças da igreja progressista e ativistas sociais. Como afirma já na chamada de capa da sua primeira edição, Mutirão “é um jornal que tem a petulância de colocar-se ao lado do povo”.
Como um dos criadores do jornal, Benedito Bizerril relata com paixão o ato de fundação que lotou a sede da Associação Cearense de Imprensa (ACI), as prolongadas e acaloradas reuniões de pauta, as vendas em pontos de concentração de trabalhadores. Também descreve as inúmeras dificuldades. A pressão dos fascistas sobre os donos das bancas de jornais e os anunciantes, as ameaças dos órgãos de repressão, o medo dos donos das gráficas – o que fez com que o impresso fosse rodado em vários Estados. É tudo muito cativante e heroico, em tempos bem mais difíceis – o que até reduz alguns chororôs dos dias atuais.
Vale a leitura. É um livro indispensável para entender a importância da mídia alternativa, ontem e hoje!
Num momento político sombrio, em que os militares retornam ao poder central – são oito generais vassalos no ministério do capitão Jair Bolsonaro – e uma ditadura híbrida avança no país, a publicação do livro sobre a história do jornal cearense Mutirão (1977-1982) é bastante oportuna. O amigo Benedito Bizerril, advogado e militante das causas populares, acertou em cheio ao se dedicar à pesquisa e à redação da obra. Protagonista dessa empreitada heroica, ele mostra a importância da mídia alternativa em tempos de resistência.
Há muitas diferenças, mas também algumas similaridades entre esses distintos períodos. Assim como hoje, a mídia monopolista ajudou a criar o clima para o golpe militar de 1964. Na época, a TV ainda era incipiente e quem cumpriu esse papel nocivo foram os jornais e as rádios. O livro traz acalentada pesquisa sobre a linha editorial dos principais veículos do Ceará. Os editoriais da época, alguns reproduzidos no livro, até lembram a satanização da política patrocinada pela mídia para justificar o golpe contra Dilma Rousseff e a prisão política de Lula – e que foi decisiva para chocar o ovo da serpente fascista que permitiu a eleição de Jair Bolsonaro.
Como relembra Benedito Bizerril, “nos anos sessenta, assim como nos dias atuais, os principais veículos de comunicação no Ceará pertenciam a restritos grupos de empresários e de famílias das classes dominantes. Os Diários Associados, de Assis Chateaubriand, destacavam-se na condição de proprietários dos jornais Unitário, matutino, e Correio do Ceará, vespertino, bem como da Ceará Rádio Clube, de prefixo PRE-9, e da TV Ceará, Canal 2, à época o único canal televisivo do Estado. A família do senador Paulo Sarasate, ex-governador do Ceará e liderança de projeção nacional da UDN, era proprietária do jornal O Povo, concorrente direto dos jornais dos Diários Associados na disputa pela preferência do público leitor cearense”.
O livro destaca que apenas um veículo se contrapôs ao golpe e à ditadura. “Somente a Rádio Dragão do Mar, do empresário e deputado federal pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) Moysés Pimentel, manteve-se em sintonia com os anseios democráticos e progressistas”. Exatamente por isso, a emissora foi alvo da fúria dos generais. Um dos primeiros atos do regime ditatorial foi a retirada do ar da rádio. “A emissora só retornará a funcionar algum tempo depois, mas sob nova administração de um oficial da reserva, general Almir Macedo de Mesquita”. Já o deputado trabalhista teve seu mandato cassado e foi preso.
É diante desse cenário de censura e violência da ditadura militar e de cumplicidade da mídia patronal que um grupo de lutadores, políticos e jornalistas decide organizar um jornal contra-hegemônico. Ele será fruto de um mutirão generoso e trabalhoso – e esta é a origem do nome do novo veículo –, que se esforça para construir a unidade respeitando as divergências existentes. Ele reunirá trabalhistas, comunistas, trotskistas, lideranças da igreja progressista e ativistas sociais. Como afirma já na chamada de capa da sua primeira edição, Mutirão “é um jornal que tem a petulância de colocar-se ao lado do povo”.
Como um dos criadores do jornal, Benedito Bizerril relata com paixão o ato de fundação que lotou a sede da Associação Cearense de Imprensa (ACI), as prolongadas e acaloradas reuniões de pauta, as vendas em pontos de concentração de trabalhadores. Também descreve as inúmeras dificuldades. A pressão dos fascistas sobre os donos das bancas de jornais e os anunciantes, as ameaças dos órgãos de repressão, o medo dos donos das gráficas – o que fez com que o impresso fosse rodado em vários Estados. É tudo muito cativante e heroico, em tempos bem mais difíceis – o que até reduz alguns chororôs dos dias atuais.
Vale a leitura. É um livro indispensável para entender a importância da mídia alternativa, ontem e hoje!
0 comentários:
Postar um comentário