Montagem: Gladson Targa |
Nos últimos dez dias, a sociedade brasileira mostrou incrível vitalidade cívica e política ao tomar iniciativas de autoproteção solidária, desobedecendo o governo fascista.
Estão sendo isolados paulatinamente não apenas os discursos genocidas do presidente e seu rosário de ofensas à população, como seus seguidores de Norte a Sul estão sendo execrados.
Carreatas da classe média alta incitando a criadagem a voltar ao batente – “O Brasil não pode parar” – são vaiadas em número crescente de cidades. Em João Pessoa, ovos foram arremessados aos bólidos da malta.
Panelaços se multiplicam.
Há uma mobilização cidadã que alcança agentes de saúde – médicos, enfermeiros e mesmo leigos -, parte dos policiais e servidores públicos em geral para evitar que a tragédia se alastre.
Essa energia alcança a Universidade pública – e algumas privadas – na pesquisa de antídotos que freiem a agressividade do vírus e na fabricação de ventiladores apropriados em larga escala.
Setores do capital produtivo começam – ainda muito modestamente – a engrossar esse caldo positivo.
Essa vibração desigual e combinada se estende a boa parte dos governos estaduais e prefeituras, que deixam o boçal e seus acólitos falando sozinho.
Tais setores vão à luta enfrentar todo tipo de dificuldades para que vidas não se percam.
O interesse pode ser qual for, mas o que vale é a ação concreta. E ela está acontecendo ao se traçarem metas e planos de quarentena sustentáveis.
Economistas até ontem ultraliberais – com destaque para André Lara Resende, Mônica de Bolle, Pérsio Arida e Armínio Fraga – jogam no lixo a ortodoxia e abraçam o keynesianismo e sua variante, a MMT (Teoria Monetária Moderna).
Convergem com vozes mais ousadas da oposição, para a qual vale agora a máxima de Milton Friedman, de que em tempos de depressão deve-se jogar dinheiro de helicóptero para a população.
Dane-se o equilíbrio fiscal, danem-se as cartilhas toscas do contracionismo para crescer, que contaminou anos atrás até parcelas da esquerda.
O keynesianismo se impôs ao mundo no meio de quatro hecatombes há quase cem anos, a I e a II Guerra Mundial, a Crise de 1929 e a Gripe Espanhola.
O keynesianismo, ou seja, a ação anticíclica do Estado para inverter o mergulho econômico, fez seu debut no mundo antes mesmo do lançamento da Teoria Geral (1936). Como lembra Celso Furtado – em ‘Formação Econômica do Brasil – isso aconteceu por aqui, a partir da Revolução de 1930.
Não é o debate acadêmico que empurra a maioria para reconhecer o papel do Estado, as iniciativas de Vargas, Roosevelt e Keynes.
É a realidade. Se faltasse alguma prova empírica do que Marx falava sobre a formação da consciência, agora não falta: é a vida que determina a consciência e não o contrário.
Ou seja, “Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas, ao contrário, é o seu ser social que determina a sua consciência”, na letra do “Para a Crítica da Economia Política” (1859). A vida real impõe que se mandem às favas todo o arsenal teórico mercadista e picareta brandido ao longo dos últimos cinquenta anos.
Os partidos de oposição, por sua vez, tendem a convergir num curto e contundente leque de propostas emergenciais: 1, Revogação do teto de gastos; 2. Dinheiro ilimitado para o SUS; 3. Garantia de renda mínima para todos os brasileiros; 4. Socorro às empresas; 5. Investimento em áreas produtivas de grande efeito multiplicador de empregos.
Os pontos variam em cada caso, mas a essência, semelhante em quase todos, é esta.
Até mesmo as milícias e o crime organizado (!!!) se mexem.
Impõem toque de recolher nas comunidades, alertam sobre perigos da má higienização e ameaçam comerciantes para não sonegarem ou venderem alcool gel e produtos sanitários a preços extorsivos.
Aqui vale uma ressalva: a base de sustentação última de Bolsonaro e seu bando são essas organizações que formam um embrião das famigeradas SA, as tropas paramilitares nazistas na Alemanha dos anos 1930.
Constituem-se em grupos armados, com capacidade de controle sobre vastos territórios nos quais o poder público tem influência cadente. Ao que tudo indica, a relação entre o imbecil planaltino e as milícias está trincando. Se for real, a solidão política do Mussolini de quermesse se torna fatal. São esses os exércitos com o qual a primeira-família conta em última instância para seguir em suas atividades ao arrepio da lei.
As milícias agora desobedecem frontalmente o discurso “liberou geral” da última terça (24), em rede nacional.
Cada iniciativa de Bolsonaro tem sido também torpedeada por setores da própria direita, como Rodrigo Maia, governadores (como já dito) e pela Justiça.
É muito, mas ainda é pouco.
O dinheiro ainda não chegou às mãos das pessoas, não há um plano integrado de ação nacional, que articule os Ministérios da Saúde, da Economia, da Defesa, da Educação, da Justiça, de Direitos Humanos e órgãos como IBGE, Ipea etc. As aberrações que os comandam, como Guedes, Weintraub, Moro e outros dejetos humanos sumiram, mostrando a pequenez de suas personalidades.
Mas o vigor da sociedade brasileira, demonstrado ao longo da História, com destaque na luta pela democratização a partir dos anos 1970 se mostra sempre surpreendente.
Não se trada de exalar um otimismo ingênuo, até porque a hecatombe está em curso e o contágio do coronavírus cresce no Brasil. Mas é indispensável atentar para a movimentação impressionante de nossa sociedade e de nosso povo. Às vezes entramos em grossas roubadas, como nos últimos anos. Mas a inquietação e a rebeldia são bons sinais em meio à peste.
Sinais, fortes sinais!
O Boçal atrapalha. Tem de sair.
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