Por Paulo Kliass, no site Carta Maior:
O quadro dramático de nossa profunda tragédia social e econômica corre o risco de ser “naturalizado” por parte das forças políticas que fazem oposição ao governo Bolsonaro. Percebe-se uma insistência inexplicável em priorizar suas energias e atenções para o complexo processo de composição das chapas para o pleito municipal do final do ano, em detrimento de travar a luta ampla e cotidiana contra os efeitos da pandemia e a criminosa conduta da equipe do capitão também nesse quesito.
Passam-se os dias, as semanas, os meses e parece que todos ficamos anestesiados frente ao terremoto, na expectativa de qual será o número de mortos a ser oficialmente anunciado a cada instante. A permanência de um general na condição de ministro substituto da saúde se combina à insistência do presidente em fazer propaganda enganosa da cloroquina. Enquanto isso a marca dos 100 mil óbitos foi superada em agosto, período que é considerado pelos fatalistas como sendo o mês de cachorro louco.
Ocorre que não basta apenas denunciar as mazelas proporcionadas pelas ações e inações do governo do capitão. Para além de todos os problemas associados à pandemia, o fato concreto é que o desemprego atinge níveis alarmantes, em espiral de alta há muito tempo. A generalização da miséria da população avança a ritmo galopante A recessão das atividades econômicas (herdada ainda da intenção austericida de Guedes e de seus antecessores) se vê potencializada pelas necessidades impostas pelo próprio confinamento e pelas medidas de isolamento essenciais para combater a covid 19.
Romper com a austeridade e elevar as despesas públicas
A esse conjunto de dificuldades vem se somar negativamente a obsessão do superministro com a austeridade fiscal e sua sandice monotônica em apenas cortar, cortar e cortar as despesas governamentais. Assim, as necessárias políticas públicas de atenuação dos efeitos desastrosos do pandemônio não conseguem nunca se viabilizar. A mentira repetida ad nauseam do “não temos recursos” tampouco resiste à liberação instantânea de mais de um trilhão de reais quando se tratava de facilitar a vida dos bancos e demais instituições financeiras. Já a concessão de valores para o mais-do-que-urgente auxílio emergencial de R$ 600 termina sempre por ser adiada a cada novo prazo mais uma vez não cumprido.
Para além da denúncia, cabe às forças de oposição e progressistas apresentar um Programa de Salvação Nacional, ou seja, uma alternativa a essa loucura que vem sendo implementada por Guedes em nome do governo. É preciso deixar claro para a maioria da população que dá para ser diferente. É fundamental que o povo brasileiro seja informado de que é possível conduzir o País de maneira diversa. A difusão de um conjunto de soluções na esfera do econômico e do social pode operar como elemento catalisador desse evidente descontentamento amplo e generalizado, mas ainda bastante difuso na base da sociedade.
Aqui e ali começam a pipocar alternativas nesse sentido. O PT lançou há quase um ano seu Plano Emergencial de Emprego e Renda., mas o debate pouco avançou. O PSOL lançou em abril deste ano seu Plano de Manutenção de Emprego e Renda. Essa semana foi a vez do governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), que propôs a formação de um Pacto Nacional pelo Emprego. Guardadas algumas diferenças pontuais entre eles, o que se tem é uma compreensão comum a respeito das medidas emergenciais a serem adotados no âmbito do Estado brasileiro.
Programa de Salvação Nacional e revogação do teto de gastos
Talvez a forma mais apropriada de qualificar esse conjunto seja um Plano de Salvação Nacional. Isso porque o Brasil está sendo destruído a olhos vistos a cada dia que passa e precisa urgentemente ser salvado dessa verdadeira rota da maldição. No entanto, é necessário sublinhar que há um elemento que atua como pré-requisito para qualquer tipo de proposta. Trata-se da revogação da EC 95, a famigerada emenda do teto de gastos. Alguns assessores da própria oposição parecem querer incorporar mais uma vez o natimorto espírito do bom mocismo e começam a flertar perigosamente apenas com uma suposta “flexibilização” desse engessamento. Não basta! A situação é muito grave e o que o Brasil precisa é se livrar de uma vez por todas dessa amarra. O caminho é apenas um: revogar o teto de gastos.
Uma vez eliminada essa obstrução ao aumento de despesas públicas, o programa de salvação deve atuar em várias linhas. Em primeiro lugar, na direção da manutenção da renda para os mais necessitados. Isso pode se viabilizar por meio da extensão do auxílio emergencial e de sua manutenção mesmo para o período pós pandemia sob a forma de uma renda universal básica. Em segundo lugar, o programa deve ter um capítulo dedicado à questão do emprego, com medidas de estímulo às empresas que se caracterizem como geradoras de novos postos de trabalho. É compreensível que tal postura das mesmas só virá na medida em que sintam uma melhoria na demanda por seus produtos e serviços. Por isso, o foco na retomada da atividade econômica de maneira generalizada se faz essencial.
Um terceiro bloco de medidas opera como uma síntese entre a matriz geradora de empregos e a ampliação necessária dos serviços públicos. Trata-se da formulação e implementação de frentes de trabalho, capitaneadas pelo setor público e em articulação com o setor privado, para criar novas postos de trabalho em atividades como infraestrutura, educação, saúde, assistência, esportes, cultura e outras. Nesse conjunto cabem opções a mais variadas para dar conta do recado: consórcios interestaduais e intermunicipais, parcerias público privadas, obras encomendadas diretamente pelo poder público, entre tantas outras.
Um quarto arrazoado de medidas relaciona-se ao apoio às micro, pequenas e médias empresas. Tendo em vista sua dificuldade crônica em trabalhar com recursos de folga para travessar períodos como o atual, as soluções passam por facilidades de natureza creditícia e tributária. Acesso a empréstimos com juros subsidiados e a redução dos encargos de impostos podem oferecer fôlego e sobrevida a setores cujo maior contribuição talvez resida no campo da elevada oferta de emprego.
A tradicional desculpa de falta de recursos, tão bem propagandeada por Guedes e reverberada pela grande imprensa, não mais se sustenta. A Conta Única mantida pelo Tesouro Nacional junto ao Banco Central mantém seu saldo credor em mais de R$ 1 trilhão. Por outro lado, a cada dia caem por terra os receios de que o governo possa vir a se utilizar das conhecidas alternativas como a emissão monetária ou o aumento do endividamento público. As abordagens da corrente conhecida como Teoria Monetária Moderna ganham cada vez mais adeptos, inclusive no interior do próprio establishment do sistema financeiro. Assim, passa ser cada vez mais reconhecida a possibilidade de se lançar mão desse tipo de ferramenta para que o Estado disponha de mais recursos para levar a cabo as suas políticas públicas.
Os caminhos estão abertos. Agora basta a vontade política de se construir as bases desse Programa de Salvação Nacional. O relógio da política começa a correr contra a oposição. Bolsonaro percebeu que precisa flexibilizar o teto de gastos se quiser ter alguma chance de reeleição em 2022. Além disso, está preparando um conjunto de medidas na área de assistência social para se apresentar junto ao eleitorado mais pobre. Finalmente, opera uma narrativa que tem por objetivo jogar no colo dos prefeitos e governadores os efeitos dramáticos da crise, que é de sua inteira e total responsabilidade.
Esse é o programa para municiar politicamente as oposições e operar com um tema que toca profundamente cada cidadão e cada cidadã. Trata-se de assegurar renda, gerar emprego e salvar o país da catástrofe em que estamos metidos. Mãos à obra!
O quadro dramático de nossa profunda tragédia social e econômica corre o risco de ser “naturalizado” por parte das forças políticas que fazem oposição ao governo Bolsonaro. Percebe-se uma insistência inexplicável em priorizar suas energias e atenções para o complexo processo de composição das chapas para o pleito municipal do final do ano, em detrimento de travar a luta ampla e cotidiana contra os efeitos da pandemia e a criminosa conduta da equipe do capitão também nesse quesito.
Passam-se os dias, as semanas, os meses e parece que todos ficamos anestesiados frente ao terremoto, na expectativa de qual será o número de mortos a ser oficialmente anunciado a cada instante. A permanência de um general na condição de ministro substituto da saúde se combina à insistência do presidente em fazer propaganda enganosa da cloroquina. Enquanto isso a marca dos 100 mil óbitos foi superada em agosto, período que é considerado pelos fatalistas como sendo o mês de cachorro louco.
Ocorre que não basta apenas denunciar as mazelas proporcionadas pelas ações e inações do governo do capitão. Para além de todos os problemas associados à pandemia, o fato concreto é que o desemprego atinge níveis alarmantes, em espiral de alta há muito tempo. A generalização da miséria da população avança a ritmo galopante A recessão das atividades econômicas (herdada ainda da intenção austericida de Guedes e de seus antecessores) se vê potencializada pelas necessidades impostas pelo próprio confinamento e pelas medidas de isolamento essenciais para combater a covid 19.
Romper com a austeridade e elevar as despesas públicas
A esse conjunto de dificuldades vem se somar negativamente a obsessão do superministro com a austeridade fiscal e sua sandice monotônica em apenas cortar, cortar e cortar as despesas governamentais. Assim, as necessárias políticas públicas de atenuação dos efeitos desastrosos do pandemônio não conseguem nunca se viabilizar. A mentira repetida ad nauseam do “não temos recursos” tampouco resiste à liberação instantânea de mais de um trilhão de reais quando se tratava de facilitar a vida dos bancos e demais instituições financeiras. Já a concessão de valores para o mais-do-que-urgente auxílio emergencial de R$ 600 termina sempre por ser adiada a cada novo prazo mais uma vez não cumprido.
Para além da denúncia, cabe às forças de oposição e progressistas apresentar um Programa de Salvação Nacional, ou seja, uma alternativa a essa loucura que vem sendo implementada por Guedes em nome do governo. É preciso deixar claro para a maioria da população que dá para ser diferente. É fundamental que o povo brasileiro seja informado de que é possível conduzir o País de maneira diversa. A difusão de um conjunto de soluções na esfera do econômico e do social pode operar como elemento catalisador desse evidente descontentamento amplo e generalizado, mas ainda bastante difuso na base da sociedade.
Aqui e ali começam a pipocar alternativas nesse sentido. O PT lançou há quase um ano seu Plano Emergencial de Emprego e Renda., mas o debate pouco avançou. O PSOL lançou em abril deste ano seu Plano de Manutenção de Emprego e Renda. Essa semana foi a vez do governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), que propôs a formação de um Pacto Nacional pelo Emprego. Guardadas algumas diferenças pontuais entre eles, o que se tem é uma compreensão comum a respeito das medidas emergenciais a serem adotados no âmbito do Estado brasileiro.
Programa de Salvação Nacional e revogação do teto de gastos
Talvez a forma mais apropriada de qualificar esse conjunto seja um Plano de Salvação Nacional. Isso porque o Brasil está sendo destruído a olhos vistos a cada dia que passa e precisa urgentemente ser salvado dessa verdadeira rota da maldição. No entanto, é necessário sublinhar que há um elemento que atua como pré-requisito para qualquer tipo de proposta. Trata-se da revogação da EC 95, a famigerada emenda do teto de gastos. Alguns assessores da própria oposição parecem querer incorporar mais uma vez o natimorto espírito do bom mocismo e começam a flertar perigosamente apenas com uma suposta “flexibilização” desse engessamento. Não basta! A situação é muito grave e o que o Brasil precisa é se livrar de uma vez por todas dessa amarra. O caminho é apenas um: revogar o teto de gastos.
Uma vez eliminada essa obstrução ao aumento de despesas públicas, o programa de salvação deve atuar em várias linhas. Em primeiro lugar, na direção da manutenção da renda para os mais necessitados. Isso pode se viabilizar por meio da extensão do auxílio emergencial e de sua manutenção mesmo para o período pós pandemia sob a forma de uma renda universal básica. Em segundo lugar, o programa deve ter um capítulo dedicado à questão do emprego, com medidas de estímulo às empresas que se caracterizem como geradoras de novos postos de trabalho. É compreensível que tal postura das mesmas só virá na medida em que sintam uma melhoria na demanda por seus produtos e serviços. Por isso, o foco na retomada da atividade econômica de maneira generalizada se faz essencial.
Um terceiro bloco de medidas opera como uma síntese entre a matriz geradora de empregos e a ampliação necessária dos serviços públicos. Trata-se da formulação e implementação de frentes de trabalho, capitaneadas pelo setor público e em articulação com o setor privado, para criar novas postos de trabalho em atividades como infraestrutura, educação, saúde, assistência, esportes, cultura e outras. Nesse conjunto cabem opções a mais variadas para dar conta do recado: consórcios interestaduais e intermunicipais, parcerias público privadas, obras encomendadas diretamente pelo poder público, entre tantas outras.
Um quarto arrazoado de medidas relaciona-se ao apoio às micro, pequenas e médias empresas. Tendo em vista sua dificuldade crônica em trabalhar com recursos de folga para travessar períodos como o atual, as soluções passam por facilidades de natureza creditícia e tributária. Acesso a empréstimos com juros subsidiados e a redução dos encargos de impostos podem oferecer fôlego e sobrevida a setores cujo maior contribuição talvez resida no campo da elevada oferta de emprego.
A tradicional desculpa de falta de recursos, tão bem propagandeada por Guedes e reverberada pela grande imprensa, não mais se sustenta. A Conta Única mantida pelo Tesouro Nacional junto ao Banco Central mantém seu saldo credor em mais de R$ 1 trilhão. Por outro lado, a cada dia caem por terra os receios de que o governo possa vir a se utilizar das conhecidas alternativas como a emissão monetária ou o aumento do endividamento público. As abordagens da corrente conhecida como Teoria Monetária Moderna ganham cada vez mais adeptos, inclusive no interior do próprio establishment do sistema financeiro. Assim, passa ser cada vez mais reconhecida a possibilidade de se lançar mão desse tipo de ferramenta para que o Estado disponha de mais recursos para levar a cabo as suas políticas públicas.
Os caminhos estão abertos. Agora basta a vontade política de se construir as bases desse Programa de Salvação Nacional. O relógio da política começa a correr contra a oposição. Bolsonaro percebeu que precisa flexibilizar o teto de gastos se quiser ter alguma chance de reeleição em 2022. Além disso, está preparando um conjunto de medidas na área de assistência social para se apresentar junto ao eleitorado mais pobre. Finalmente, opera uma narrativa que tem por objetivo jogar no colo dos prefeitos e governadores os efeitos dramáticos da crise, que é de sua inteira e total responsabilidade.
Esse é o programa para municiar politicamente as oposições e operar com um tema que toca profundamente cada cidadão e cada cidadã. Trata-se de assegurar renda, gerar emprego e salvar o país da catástrofe em que estamos metidos. Mãos à obra!
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