sexta-feira, 7 de maio de 2010

Vietnã defende sistema de partido único



Décimo e último artigo da excelente série de reportagens de Breno Altman sobre o Vietnã. A série, com uma recheada galeria de fotos e vídeos, está disponível no sítio Opera Mundi:

A Academia Nacional de Política e Administração Pública Ho Chi Minh ocupa amplo espaço no distrito Cau Giay, zona noroeste de Hanói, capital do Vietnã. O conjunto de prédios cor de tomate se distribui ao redor de uma praça vigiada pela estátua do líder comunista. Mas não é um estabelecimento de ensino qualquer. Nenhum vietnamita pode ocupar cargo de direção no Partido Comunista ou no Estado sem passar pelos bancos dessa escola.

Fundada em 1949, a instituição pertence à organização partidária que dirige o Vietnã desde a independência. Mas também presta serviços à gestão governamental. Sua missão primordial é garantir a formação político-ideológica de quem comanda o país. Até mesmo daqueles que tenham cursado o ensino superior, não importa qual estágio.

Um mecanismo dessa natureza seria impensável em democracias ocidentais. A verdade, de todo modo, é que o sistema político vietnamita não bebe na fonte das idéias liberais de Monstesquieu, o pai da teoria de separação dos poderes. A começar porque a Constituição nacional consagra o Partido Comunista do Vietnã (PCV) como único e dirigente.

“O Vietnã não é uma ditadura”, afirma o professor Le Huu Nghia, presidente da academia e membro do comitê central do PCV. “Nosso sistema político possui regras de funcionamento democrático e participativo que são produtos de nossa história e tradição. O que não aceitamos é a imposição de outros modelos, baseados na vinculação entre poder político e poder econômico.”

O alvo aparente das críticas do dirigente comunista é o multipartidarismo existente nas democracias representativas, no qual os recursos financeiros e o acesso à mídia são instrumentos decisivos. No caso vietnamita, após a implantação da economia de mercado, esse tema é mais do que uma discussão filosófica.

Afinal, o que aconteceria com a revolução liderada por Ho Chi Minh se os novos ricos e o capital estrangeiro, engordados durante o período de renovação, pudessem ter seus próprios partidos e veículos de comunicação? Essa talvez seja uma das grandes preocupações entre os comunistas.

“Os grupos empresariais podem ganhar dinheiro, mas não lhes é permitido almejar o poder de Estado”, explica o professor Vo Daí Luoc, presidente do Centro Econômico Vietnã, Ásia e Pacífico. “O multipartidarismo tradicional é uma fórmula pela qual os destinos de um país são submetidos à ditadura de quem tem dinheiro e mídia para apoiar as campanhas eleitorais.”

Fusões partidárias

Mas nem sempre essa rejeição à liberdade partidária foi tão explícita. A independência vietnamita, por exemplo, foi conquistada por uma coalizão de partidos, denominada Vietminh, na qual os comunistas eram a corrente majoritária. As outras duas agremiações mais importantes, democratas e socialistas, foram incorporadas pelos comunistas apenas em 1988.

O próprio PCV surgiu de uma fusão, ocorrida em 1976, entre o Partido dos Trabalhadores, que dirigia o norte do país até o final da guerra, e o Partido Revolucionário do Povo, que combatia no sul o regime apoiado pelos norte-americanos.

O conflito militar é importante para entender o que ocorreu depois da expulsão dos franceses. Os grupos direitistas, fortes abaixo do paralelo 17 e vinculados às forças colonialistas, desrespeitaram os acordos de Genebra, que previam eleições gerais para 1956 com o objetivo de reunificar o país. Esses setores constituíram ilegalmente a República do Vietnã, ao sul, e se subordinaram a sucessivos governos norte-americanos.

A disputa entre os diversos partidos deixava, assim, de ser uma questão institucional. As correntes conservadoras tinham se aliado à agressão externa e rompido com o pacto de 1954, recorrendo à repressão contra os simpatizantes do Vietminh. Os comunistas passaram a ver na sua liquidação política e militar uma questão de sobrevivência nacional.

Esses grupos, derrotados em 1975, praticamente deixaram de atuar no Vietnã. Suas principais lideranças fugiram para o exterior, particularmente para os Estados Unidos. Lá fundaram diversos partidos e organizações dissidentes, financiados por empresários que apoiavam o regime de Saigon. Seu objetivo é reingressar na vida política do país.

Algumas entidades defensoras dos direitos humanos reclamam que há presos de consciência no país. O governo rechaça a denúncia, alegando que os eventuais prisioneiros participaram de conspiração financiada por potências estrangeiras e foram julgados como terroristas.

Há fatos que parecem dar sentido à posição oficial. Na véspera do desfile pelos 35 anos do final da guerra, uma mulher foi presa em Ho Chi Minh com bombas, armas e um plano de sabotagem contra a manifestação. Morava na Califórnia e ingressara clandestinamente pela fronteira do Camboja. Declarou pertencer a uma célula oposicionista criada em São Francisco.

Financiamento público

Esses acontecimentos eventualmente reforçam a opção pelo partido único. Mas o que se ouve dos dirigentes comunistas é a convicção das benesses democráticas de seu sistema se comparado com os paradigmas ocidentais.

“Qualquer cidadão, filiado ou não ao partido, pode se apresentar como candidato às eleições”, explica o professor Le Huu. “Não terá que se preocupar com recursos, marketing ou imprensa. Todos os candidatos têm as mesmas oportunidades de propaganda. O que os diferencia são suas biografias e suas ligações com a comunidade que querem representar.”

A Assembléia Nacional é o topo da pirâmide. Seus deputados elegem o primeiro-ministro, os membros do governo e o presidente da República, além dos integrantes do poder judiciário. Cada parlamentar representa uma das 493 zonas eleitorais. As 63 províncias possuem instituições equivalentes: o Conselho Popular, que faz às vezes de parlamento regional, e o Comitê Popular, que funciona como governo local. Também os distritos e as aldeias se organizam desse modo.

Nas últimas eleições quinquenais, realizadas em maio de 2007, 492 dos deputados nacionais eleitos pertenciam à Frente da Pátria, que inclui o PCV, diversas organizações sociais não partidárias e até grupos religiosos. Desses, 43 não eram filiados comunistas. Um dos parlamentares foi eleito avulsamente.

A Constituição de 1992, que fixou o sistema institucional atual, também elencou mecanismos automáticos de renovação. O presidente e o primeiro-ministro só podem permanecer nas respectivas funções por dois mandatos de cinco anos. O PCV adotou a mesma regra em relação a seu secretário-geral.

Várias reformas e programas foram implementados para oxigenar a vida política. Uma dessas iniciativas é a transmissão dos debates da Assembléia Nacional por televisão, rádio e internet. Atualmente é comum que distintas comissões do parlamento chamem os ministros, discutam propostas e cobrem resultados sob a luz das câmeras.

Imprensa

Há alguns anos também foi aprovada uma nova legislação sobre imprensa. A propriedade individual dos meios de comunicação continua proibida, mas as organizações sociais passaram a receber licença e financiamento público para desenvolver seus próprios veículos. O Vietnã tem hoje mais de quatrocentos jornais periódicos, além de uma centena de estações de rádio, setenta de televisão e 170 mil sítios de internet.

Algumas das publicações e páginas eletrônicas apresentam versão em língua estrangeira. Não é incomum matérias de denúncia sobre problemas nacionais e erros cometidos pelas autoridades. A abordagem direta e informativa não fica nada a dever aos melhores manuais ocidentais de mídia. Ao menos para inglês ver. Ou brasileiro.

Tampouco parece haver controle sobre o acesso à rede mundial. Existem centenas de lan houses nas ruas de Hanói e Ho Chi Minh. Ao contrário do que se diz sobre a China, por exemplo, não há evidências de proibição a algum sitio no Vietnã. As biroscas de internet estão sempre lotadas de jovens loucos por um mouse. A reportagem testou dez diferentes páginas eletrônicas, incluindo endereços de grupos dissidentes, em três lans aleatórias

“Nosso esforço é desenvolver nosso sistema, não abandoná-lo”, afirma Le Huu. “Queremos aumentar a participação política, especialmente dos não comunistas.” Essa lógica, de fato, tem atropelado dogmas. Disposto a influir sobre diferentes setores sociais, o PCV permite, desde 2006, a filiação de empresários. Muita gente deve ter ficado de cabelo em pé.

Os dirigentes do país costumam associar a natureza de suas instituições à estratégia militar que adotaram nos embates contra franceses e norte-americanos. "Nosso conceito era o de guerra de todo o povo", diz o major-general Bui Thanh Son, da direção do Instituto de Defesa Nacional. "Não eram apenas as forças armadas que combatiam. Todos os cidadãos estavam engajados, em cada aldeia ou povoado. Nossa política de defesa continua baseada nas mesmas idéias. Nosso sistema político também."

Sua declaração não deve ser lida como bravata. Todo vietnamita que ocupa cargo de chefia, dos menores municípios até o poder central, deve fazer um treinamento militar especial, do qual sai como oficial de milícia. Essas pequenas unidades de autodefesa organizam milhões de vietnamitas. Nenhum cidadão está autorizado a possuir armas. Mesmo os policiais trabalham apenas com um bastonete, o que faz do país uma das nações menos violentas do planeta.

Mas a história ensina a seus adversários que deveriam pensar duas vezes antes de querer impor seu próprio modo de vida ao povo de Ho Chi Minh.

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A queda da pobreza absoluta no Vietnã



Nono artigo de Breno Altman, publicado no sítio Opera Mundi:

Hoa Binh é uma província montanhosa no nordeste do Vietnã. A capital, de mesmo nome, fica a 63 quilômetros de Hanói. Ali foi travada uma das batalhas mais importantes da guerra de independência contra os franceses. As tropas do general Vo Nguyen Giap expulsaram os colonizadores em fevereiro de 1952.

Mas os feitos militares não contam toda a história local. A província é uma das mais pobres do Vietnã. A renda per capita não ultrapassa os 300 dólares anuais. As terras de Hoa Binh são pouco férteis e irregulares. Os moradores, na maioria de etnia muong, sobrevivem com dificuldades.

A camponesa Dinh Thi Sy, 51 anos, vive na comuna de Xom Mo, composta por duas aldeias pequenas e habitada por 700 agricultores. Viúva, abriga em casa o filho e sua esposa, além de dois netos. Quando começou o período de renovação, a família recebeu mil metros quadrados descontínuos para plantar arroz. A duras penas, produzem para subsistência.

Para complementar renda, desenvolvem uma modesta lavoura de bambu em terra pública cedida pela comuna. Vendem o miolo da planta como alimento e da casca extraem varetas para as indústrias que fabricam palitos de dente. Mesmo assim, o dinheiro não é suficiente. O filho de Sy trabalha em uma pedreira. A nora dela está cumprindo um contrato de três anos em Taipé, capital de Taiwan.
O filho de Sy está empregado em uma pedreira. A nora está cumprindo um contrato de trabalho em Taiwan, de três anos. Aliás, como outros centenas de milhares, que são escolhidos pelo governo entre os mais pobres, contratados para suprir demanda por mão de obra em outros países.

Mas a camponesa acha que a vida está melhor. “Depois da guerra, passamos fome”, lembra Sy. “Durante anos trabalhamos em uma cooperativa sem receber nem para a comida. Agora tenho casa e televisão. E posso pagar pelos estudos de meus netos, para que eles possam ter melhores chances de progredir”.

As peripécias dessa sorridente muong fazem parte da trajetória de muitos vietnamitas nas últimas décadas. As dificuldades são imensas. Mas o prolongado ciclo de crescimento econômico, depois das reformas realizadas no final dos anos 1980, criou um clima de prosperidade.

Números

Os números ajudam a entender essa situação. Enquanto a miséria extrema (menos de 1 dólar por dia) despencou de 53% para 12,3% nos primeiros 20 anos de dao moi (renovação, em vietnamita), a pobreza absoluta (menos de 2 dólares por dia) caiu de 58% para 22% entre 1993 e 2007. O Vietnã apresenta, portanto, proporção de pobreza máxima semelhante ao Brasil (com 20%). Os dados são do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.

Mais de 90% da população adulta é alfabetizada. O índice de mortalidade infantil situa-se em 22,26 natimortos por mil. Novamente dados muito parecidos com os brasileiros. Mas a expectativa de vida ao nascer, de 74 anos, é quase 3% superior. São indicadores, enfim, de um país que já se encontra entre as nações com grau médio de desenvolvimento. Com a diferença que nenhum outro sócio desse clube teve trinta anos de guerra nos últimos sessenta.

Apesar da abertura à economia de mercado, o nível de concentração da renda – medido pelo índice Gini, que registra a distribuição da renda familiar – o situa na 78ª posição no ranking da desigualdade. Está melhor que Brasil (10º lugar), Rússia (53º) e China (54º), os três grandes do quarteto BRIC. E apenas um posto pior que a Índia.

O programa mais importante para esses resultados talvez tenha sido a reforma agrária, que aumentou a produtividade e a renda no campo. Também contra a tradição, da maioria das famílias, inclusive nas cidades, de plantar parte do que come. O ritmo de industrialização foi igualmente decisivo: gerou empregos e salários para milhões de camponeses sem perspectiva na atividade rural.
O processo de urbanização atualmente atinge a taxa de 3% ao ano sobre o total da população. Vinte e oito por cento dos vietnamitas já vivem nas cidades. Alguns fatos curiosos decoram essa transição. O Vietnã é o 11º país em número de telefones fixos, o 13º em celulares e o 18º em acesso à internet. Não é pouca coisa.

Saúde e educação

Mas as reformas também trouxeram malefícios sociais. Os serviços de educação e saúde, antes públicos e gratuitos, passaram a cobrar parcialmente dos usuários, além de portas terem sido abertas à iniciativa privada.

“O orçamento do Estado não suporta manter integralmente a gratuidade desses direitos e os programas de desenvolvimento”, explica Dinh Duang Thi, assessor teórico da direção do Partido Comunista. “Adotamos um sistema misto, que protege os mais pobres e cobra dos mais ricos.”

O mecanismo é de anuidade progressiva. Quem estuda em escolas estatais não paga nada até o fim do ensino primário. Mas é obrigado a arcar com 10% das despesas escolares depois disso, até completar o ensino secundário. A mensalidade sobe na universidade. O governo oferece créditos educacionais que os alunos deverão honrar depois de ingressados no mercado de trabalho.
A estrutura de saúde segue modelo semelhante. As redes básicas de atendimento médico-hospitalar são gratuitas, mas tratamentos mais sofisticados requerem que o paciente coloque a mão no bolso.

Nem sempre isso é possível. O marido da camponesa Sy, por exemplo, que morreu de câncer no fígado, teve de vender os animais de criação para pagar a conta de médicos e remédios.

Universidades e hospitais privados foram autorizados a funcionar. O governo alega que essa medida desafoga o Estado, pois empresas que operam no Vietnã estariam obrigadas a garantir para os empregados, nessas instituições particulares, tanto educação quanto cuidados médicos. Outra coisa, no entanto, é assegurar que essas companhias cumpram regras e acordos.

Subsídios

O governo tem aumentado consistentemente o orçamento para educação e saúde em relação ao produto interno, declarando o compromisso em sustentar a universalização paulatina dos serviços estatais. Resultados importantes têm sido alcançados. Por exemplo: 93% dos jovens com 15 anos ou mais estão na escola, contra uma média mundial de 84%. Mas, por ora, os esforços estão focados no campesinato.

O Estado subsidia cerca de 90% os planos de aposentadoria e saúde dos agricultores, que correspondem a 72% da população nacional. A diferença é paga pelos próprios camponeses. Geralmente com sacrifício, que muitas vezes é insuficiente para mantê-los em dia com o sistema de seguridade social.

Outro problema social grave são os mutilados de guerra e descendentes. Quase cinco milhões de vietnamitas, nessas condições, estão parcial ou totalmente impedidos de trabalhar. Centros humanitários disseminam-se por todo o território, apoiados por campanhas permanentes de solidariedade. Trabalham nesses locais as famílias vitimadas pela guerra, que produzem artesanato e roupas cujas vendas complementam a pensão paga pelo Estado.

Próximas batalhas

As dificuldades de transpor certos obstáculos no combate à miséria têm levado os vietnamitas a estudar projetos para transferência de renda, como o Bolsa Família brasileiro. Alguns de seus especialistas acham que seria um caminho possível para atender as minorias étnicas, que vivem em zonas inóspitas ao desenvolvimento econômico e respondem por um terço da pobreza absoluta.

No final de abril, uma missão de estudos da Academia de Ciências Sociais do Vietnã visitou a cidade de Formosa, em Goiás, para conhecer uma experiência concreta de implantação do programa. Levaram para casa novas ideias, que talvez orientem as próximas batalhas sociais.

Aliás, batalhas que têm sido vitoriosas. Em 1990, a ONU fixou a meta de reduzir a miséria pela metade até 2015. A decisão foi ratificada, em 2000, pela Declaração do Milênio. O Vietnã terminou sua lição de casa em 2006.

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Música latina faz sucesso em Ho Chi Minh

O oitavo artigo de Breno Altman sobre o Vietnã, publicado no sítio Opera Mundi:

O Hotel Caravelle abriga lembranças fabulosas. Ali pousavam, durante a guerra, correspondentes de importantes jornais e militares de alta patente. Era também alvo de ataques. Um de seus andares foi explodido por um comando guerrilheiro em 1964, quando ganhava força a escalada de Washington contra o Vietnã. Dois soldados norte-americanos morreram e 78 ficaram feridos.

Atualmente, o Caravelle é a torre de babel mais badalada de Ho Chi Minh. Principalmente por causa de seu famoso bar, o Saigon, Saigon. Localizado no nono andar, atrai estrangeiros e nacionais. Seus frequentadores apreciam o elogiado cardápio de comes e bebes, além da oportunidade de ver as ruas e edifícios iluminados do centro da cidade.

Mais que tudo, porém, gostam mesmo é de ouvir música ao vivo e se esbaldar na aconchegante pista de dança. Ali a festa entra pela madrugada. A animação da noite, de terça a domingo, desde setembro de 2008, está aos cuidados do grupo cubano Warapo. Seus ritmos latinos – salsa, merengue, chá-chá-chá, cumbia – fazem ferver a casa.

O quinteto tem uma formação eclética. O bandleader Alexei González, 31 anos, toca teclado e canta. O percussionista e vocalista Elder González, 38 anos, é apenas parcialmente homônimo de Alexei. O guitarrista Armando Lopez, 28 anos, que está de mudança para a Indonésia e dará lugar a outro músico de percussão, Raul Lopez, que não é seu irmão nem parente. E duas cantoras-bailarinas, Madelin Corona e Lissette Garcia, 23 e 22 anos, que deixam muitos clientes sem ar.

Formado em 1998 na Universidade de Las Villas, em Santa Clara, interior de Cuba, o Warapo é uma invenção de González e González. Alexei estudou cibernética. Elder era aluno de filologia. Não demoraram a se aventurar em Havana. Arrebentaram. Gravaram dois CDs, participaram de festivais e realizaram apresentações concorridas. Sempre com músicas de autoria dos fundadores da banda.

Ida para o Vietnã

Mas um dia resolveram se arriscar pelo mundo. Mandaram músicas e histórias para vários países. A proposta mais concreta veio do distante Vietnã. Um convite para assumir a noite em um dos mais importantes hotéis de Ho Chi Minh. Alguns meses depois estavam com contrato assinado e malas prontas. O acerto inicial era de um ano. Prorrogaram por outro mais.

“Somos o único grupo latino por aqui”, conta Alexei, que acabou conhecendo, na antiga Saigón, a também cubana Janet Leyva, 22 anos, uma rara estrangeira fluente em vietnamita. Casaram-se e o primeiro filho nascerá nos próximos meses. “No início, quem vinha ao bar ouvir nosso grupo eram turistas e residentes de outras nacionalidades. Mas pouco a pouco os vietnamitas começaram a aparecer”, conta.

“Eles sentavam nas mesas mais tranquilas e afastadas do palco”, lembra-se Elder. “Muitas vezes vinham famílias inteiras. Pareciam impressionados tanto com a batida das músicas quanto com o bailado de Madelin e Lissette. Não demorou muito para alguns deles darem suas primeiras requebradas latinas.”

Os cubanos também foram descobrindo que havia, em Ho Chi Minh, escolas de dança de salão. Os alunos, informados da nova atração no Saigon, Saigon, tinham encontrado um lugar para praticar os passos aprendidos. O boca-a-boca fez a fama do Warapo na cidade. Acabaram atraindo também a atenção da imprensa local.

O repertório do grupo inclui canções famosas de vários rincões, mescladas com algumas às quais eles próprios deram vida. Até sambas saem de suas vozes e instrumentos. O público vai ao delírio.

A adesão dos vietnamitas à música quente dos latinos não é a única surpresa cultural que reservam aos estrangeiros desavisados. Possivelmente dez em dez turistas apostariam que o ping-pong ou alguma luta marcial seria o esporte nacional. Perderiam feio. Eles gostam mesmo é de futebol, o bong dá, acompanhado com fanatismo por homens e mulheres. Vários brasileiros jogam e são ídolos no país.

Esse ambiente aberto a descobertas estimulou o Warapo a vôos mais altos. Quando acabar o contrato com o Caravelle, em julho, continuarão no Vietnã. A banda tem convites para tocar em várias cidades, o que ainda não foi possível por conta do compromisso de exclusividade que os prende ao Saigon, Saigon. Mas já se decidiram a pegar estrada.

“Nós ainda vamos encher as praças e os estádios daqui com o som do Caribe”, aposta Alexei. “Os vietnamitas não têm medo de experimentar o novo.”

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A mídia, as eleições e o Barão de Itararé



Qual será o comportamento da mídia hegemônica – ou do PIG (Partido da Imprensa Golpista), segundo o rótulo irônico do jornalista Paulo Henrique Amorim – na cobertura das eleições presidenciais de 2010? É possível incluir no acirrado debate sucessório uma plataforma para democratizar os meios de comunicação? O Estado, através de políticas públicas e regulamentações, pode ter um papel mais ativo para estimular a diversidade e pluralidade informativas como contraponto à ditadura midiática?

Estes são alguns dos temas em debate no seminário “A mídia e as eleições de 2010”, que ocorrerá nos dias 14 e 15 de maio, no auditório do Sindicato dos Engenheiros de São Paulo. O evento também será palco para o lançamento do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé. A nova entidade, que reúne jornalistas e lutadores sociais, tem como objetivos contribuir na luta pela democratização da comunicação, fortalecer a mídia alternativa e comunitária, promover estudos sobre a estratégica frente midiática e investir na formação dos comunicadores sociais.

Barão de Itararé inspira a luta contra o PIG

“Barão de Itararé” é o apelido irreverente com que ficou famoso o jornalista Aparício Torelli (1895-1971), considerado um dos criadores da imprensa alternativa no país e o “pai do humorismo brasileiro”. Itararé é uma referencia sarcástica à batalha que nunca houve entre a oligarquia cafeeira e as forças vitoriosas da Revolução de 1930. Criador dos jornais “A Manha” e “Almanhaque”, ele ironizou as elites, criticou a exploração e enfrentou os governos autoritários. Preso várias vezes, nunca perdeu o seu humor.

Mais atual do que nunca, o Barão de Itararé agora ajudará a inspirar a luta contra os barões da mídia, que estão em plena ação, utilizando seu duplo poder – econômico e ideológico – para interferir nos rumos políticos do país. A nova entidade conta no seu conselho com jornalistas progressistas, como Luis Nassif, Leandro Fortes, Luiz Carlos Azenha, Maria Inês Nassif, Rodrigo Vianna; renomados intelectuais, como Venício Lima, Marcos Dantas, Dênis de Moraes, Laurindo Lalo Leal Filho; responsáveis pelos principais veículos alternativos do país e várias lideranças dos movimentos sociais.

Programação do seminário

As inscrições para o seminário “A mídia e as eleições de 2010” se encerram em 12 de maio e custam R$ 20,00. As vagas são limitadas. Os interessados devem entrar em contato com Danielli Penha pelo telefone (11) 3054-1829 ou pelo endereço eletrônico britarare@gmail.com. Abaixo a programação:

Dia 14 de maio, sexta-feira, às 18h30

A cobertura jornalística da sucessão presidencial

- Maria Inês Nassif – Jornal Valor Econômico;
- Leandro Fortes – Revista CartaCapital;
- Paulo Henrique Amorim – Sítio Conserva Afiada;
- Altamiro Borges – Portal Vermelho;

Dia 14 de maio, sexta-feira, às 21 horas.

Coquetel de lançamento do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.

Local: Auditório do Sindicato dos Engenheiros de São Paulo (Rua Genebra, 25)

Dia 15 de maio, sábado, 9 horas:

Plataforma democrática para a comunicação.

- Marcos Dantas – professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro;
- Luiza Erundina – deputada federal do PSB-SP;
- Manuela D’Ávila – deputada federal do PCdoB-RS;
- Igor Felippe – assessoria de imprensa do MST;

Dia 15 de maio, 14 horas:

Políticas públicas para democratização da comunicação.

- Ottoni Fernandes – secretário executivo da Secom;
- Regina Lima (Abepec) – presidente da Abepec;
- Jandira Feghali – ex-secretária de Cultura do Rio de Janeiro;
- José Soter (Abraço) – coordenador nacional da Abraço.

Dia 15 de maio, 17 horas:

Lançamento do livro “Vozes em cena – Análise das estratégias discursivas da mídia sobre os escândalos políticos”, de Regina Lima.

- Local: Salão nobre da Câmara Municipal de São Paulo (Viaduto Maria Paula).

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quinta-feira, 6 de maio de 2010

As peripécias de um Barão vermelho



Reproduzo abaixo a bela biografia do Barão de Itararé escrita pelo historiador e amigo Augusto Buonicore:

Ele se chamava Apparício Fernando de Brinkerhoff Torelly. Um nome pomposo para alguém que havia nascido numa carroça, em Rio Grande, interior do Rio Grande do Sul, filho de uma índia charrua. O próprio Torelly contou, bem humorado: "Viajava com minha mãe numa diligência quando uma roda teve o aro quebrado. Com todo aquele barulho, nada mais natural que eu me apressasse a sair para ver o que se passava". Era 29 de janeiro do ano da graça de 1895.

A triste infância de Torelly, decerto, não anunciava o humorista talentoso que faria rir gerações de brasileiros. Logo cedo perdeu a mãe. O pai era um homem truculento e de poucas palavras. Aos nove anos foi internado num colégio dirigido por austeros jesuítas alemães. Apesar do ambiente repressivo, aos 14 anos elaborou seu primeiro jornalzinho manuscrito, o Capim Seco, no qual já começava a revelar sua veia humorística.

Terminado o colégio, à contra-gosto, foi cursar medicina em Porto Alegre, que acabou abandonando no 4ª ano. Contam que numa prova oral, um dos professores perguntou-lhe "Conhece esse osso?", ele disse ainda não e apertou-lhe dizendo: "Muito prazer em conhecê-lo".

Neste período publicou poemas e artigos em diversas revistas e passou a se dedicar exclusivamente ao jornalismo. Fundou inúmeros e efêmeros jornais entre elas O Chico, dedicado ao humor. Casou-se pela primeira vez com Alzira Alves com quem teve três filhos.

Por indicações médicas, em 1925, partiu para o Rio de Janeiro. Ali procurou a redação de O Globo. "O que o sr. veio fazer?", perguntou-lhe Irineu Marinho. Para o qual respondeu irônico: "Tudo, de varrer a redação a dirigir o jornal. Creio não haver muita diferença". Foi imediatamente contratado. Depois de alguns meses se transferiu para A manhã, no qual passou a publicar uma coluna humorística diária intitulada “A manhã tem mais ...”. Mas, o sonho de Apparício era ter o seu próprio jornal. Em menos de um ano deixou A Manhã para fundar outro periódico intitulado ironicamente A Manha – um órgão de ataque ... de risos. Este vem ao mundo no dia 13 de maio de 1926 – uma forma encontrada de homenagear a abolição da escravidão e a sua própria.

O jornal foi um sucesso e transformou-se numa referência do novo humorismo jornalístico. Ele utilizou, pela primeira vez, da fotomontagem para ridicularizar os governantes de plantão e as elites brasileiras. Apesar da boa repercussão inicial, a situação financeira se agravou rapidamente. Entre os anos de 1929 e 1930 teve que circular como encarte do jornal Diário da Noite, pertencente a Assis Chateaubriand. Naquela conjuntura de crise política, colocou-se então ao lado dos revoltosos da Aliança Liberal, encabeçada por Vargas.

Em homenagem àquela que deveria ter sido, e nunca foi, a maior batalha da “Revolução de 1930” se auto-intitulou Duque de Itararé. Mais tarde, dando prova de extrema modéstia, rebaixou seu título para Barão de Itararé. Nesta região de São Paulo havia se concentrado o grosso das tropas legalistas que deveria deter as forças revolucionárias que vinham do sul. Mas, os generais acabaram destituindo o presidente Washington Luís e não houve batalha alguma. As tropas comandadas Vargas simplesmente contornaram as de São Paulo e seguiram triunfante ao Rio de Janeiro, onde amarraram seus cavalos no Obelisco.

Porém, o namoro com o novo regime durou pouco. Logo Aporelly – agora Barão de Itararé – voltou a suas baterias contra o governo revolucionário de Vargas. Gostava, por exemplo, de chamar o poderoso general Góes Monteiro de general Gás Morteiro. Trocadilhos como estes lhe custou a primeira prisão, ainda em 1932.

No final de 1934 fundou o Jornal do Povo – publicação antifascista e com forte influência comunista. Durou apenas 10 dias e foi o centro de um escândalo político. Na suas páginas o Barão publicou uma série de artigos sobre a vida de João Cândido, o Almirante negro que comandou a revolta dos marinheiros em 1910. Isto foi encarado como uma afronta a Marinha de Guerra brasileira.

A sede do jornal foi invadida, o Barão seqüestrado, violentamente espancado e teve seus cabelos cortados por oficiais daquela arma. Isto acarretou protestos por todo o país, inclusive na Câmara dos Deputados. Os agressores jamais foram punidos. Sem perder o humor, o Barão achou aconselhável mudar a tabuleta na entrada de seu escritório. A nova inscrição dizia simplesmente: “entre sem bater!”.

A principal vítima do Barão era os integralistas de Plínio Salgado. Gostava de dizer que, acidentalmente, quase entrou para as hostes dos “camisas verdes”, quando ouviu um deles gritando “Deus, Pátria e Família”, pois havia entendido: “Adeus pátria e família”. Ele era um inimigo do militarismo e do belicismo tão em voga naqueles anos turbulentos, que já anunciavam uma segunda guerra mundial. Gostava de dizer: “Como se chama o assassinato de uma criancinha? Infanticídio. E o assassinato de uma porção de criancinhas? Infantaria”.

Ao lado do perigo de uma guerra iminente, crescia a ameaça do domínio planetário do nazi-fascismo. Por isso mesmo o Barão foi um ativo organizador e militante da Aliança Nacional Libertadora. Após o levante armado, comandado por Prestes, ocorrido em novembro de 1935, foi preso novamente e ficou encarcerado até o final de 1936. Primeiro no navio-presídio Dom Pedro I e depois na Casa de Detenção do Rio de Janeiro, ao lado de nomes como Graciliano Ramos. No Dom Pedro I deixou crescer uma barba a la Dom Pedro II. Esta passaria a ser uma das marcas registradas do Barão.

Dizem que quando o juiz federal lhe perguntou por qual motivo acreditava ter sido preso, ele afirmou que, possivelmente, teria sido graças ao cafezinho. Diante do juiz perplexo explicou: sua falecida mãezinha o havia avisado para tomar cuidado com o excesso de café. Justamente naquele dia ele havia parado num bar e tomado oito xícaras e, assim, a polícia conseguiu prendê-lo. O Barão era um daqueles que perdia um amigo (e a liberdade), mas não perdia uma boa piada.

No seu livro Memórias do Cárcere, o mestre alagoano descreveu o convívio com o velho Barão. Sempre alegre, buscando animar seus companheiros de infortúnio e aparentando um otimismo a toda prova. Mas, nesta mesma obra, podemos notar a amargura sentida por este homem nas noites sombrias da prisão, que mais parecia um campo de concentração. Talvez para ele, mais do que para qualquer outro, a cárcere tenha sido uma experiência atroz. O sentimento de desolação era aumentado pela morte de sua segunda esposa, ocorrida enquanto estava preso, e pela preocupação com seus filhos que estavam entregues a um amigo pouco confiável.

O Barão foi solto em dezembro de 1936 e, imediatamente, reorganizou A manha. Novamente ela se transformou numa trincheira na luta contra o fascismo e seus representantes no país. O golpe do Estado Novo, em dezembro de 1937, impediu a continuação de um jornal tão irreverente. O Barão teve que buscar outro “ganha pão” e foi trabalhar no Diário de Notícias, no qual ficaria por cerca de seis anos. A repressão política continuava seguindo seus passos. Em janeiro de 1939 voltou a fazer uma breve visita à carceragem da polícia política de Vargas. Em 1940 perdeu a sua segunda esposa num parto mal sucedido. Menos de quatro anos depois morreu uma das filhas de seu primeiro casamento, vítima de complicações pós-operatórias. Nuvens sombrias encobriam a vida do humorista.

Incansável, em 1945 encabeçou abaixo-assinado exigindo liberdades democráticas. No mesmo ano voltou a editar A Manha. O clima político marcado pela democratização do país era amplamente favorável a uma publicação daquele tipo. Entrou de cabeça na campanha eleitoral do Partido Comunista do Brasil. A vitória do PCB, que elegeu 14 deputados federais e um senador, encheu-o de alegria.

No início de 1947 seria ele próprio candidato a uma cadeira na Câmara Municipal do Distrito Federal. A cidade vivia uma constante falta de água e nas padarias os proprietários adicionavam água no leite, burlando a lei e prejudicando os pobres fregueses. Por isso, decidiu que seu lema de campanha seria “mais leite, mais água e menos água no leite”. Foi eleito vereador pela chapa comunista e passou a compor a maior bancada do legislativo municipal. Afirmou Prestes: “o Barão com seu espírito não só fez a Câmara rir, como as lavadeiras e os trabalhadores. As favelas suspendiam as novelas para ouvir as sessões da Câmara que eram transmitidas pelo rádio”.

Naqueles dias memoráveis, quando circulava pelos corredores do Senado, encontrou o ex-ditador, Getúlio Vargas. Este, sorridente, se dirigindo a ele exclamou: “Até tu, Barão?”, E ele, sem pestanejar, respondeu irônico: “Tubarão é o senhor, eu sou apenas o Barão de Itararé”. Por outro lado, a oposição liberal-conservadora criticava a constante mudança de posição dos comunistas em relação a Vargas. Sem perder a compostura respondeu aos críticos: “Não é triste mudar de idéias; triste é não ter idéias para mudar”.

O registro do PCB foi cancelado em maio de 1947 e, em janeiro de 1948, os parlamentares comunistas foram cassados. Entre as vítimas deste ato arbitrário estava o Barão. Ele afirmou solene: “saio da vida pública para entrar na privada”. Neste mesmo ano, devido à repressão política e a crise financeira, A Manha deixou de circular. A situação ficou feia para o seu lado. “Devo tanto que, seu chamar alguém de ‘meu bem’ o banco toma”, escreveu.

Na pendura, se uniu ao cartunista Guevara e lançou o Almanhaque – ou Almanaque d’A Manha. O sucesso levou-o e reorganizar o jornal desta vez na capital paulista. Mas, a alegria durou pouco e em 1952 deixou de circular definitivamente. O fim de A manha não significou o fim da carreira do velho Barão. Ele passou a colaborar com o jornal A Última Hora e lançou ainda dois Almanhaques em 1955. Diante da crise que ameaçava derrubar Getúlio em 1954 lançou a frase que fez carreira entre os comentaristas políticos: “Há qualquer coisa no ar, além dos aviões de carreira”.

Em 1955 casou-se pela quarta vez. Pouco depois ocorreu uma nova tragédia. Sua esposa se suicidou. A morte parecia acompanhá-lo, buscando retirar dele toda a alegria. Já cansado e doente voltou para o Rio de Janeiro. Sua última velhice passou sozinho e doente num pequeno apartamento. Estava pobre e quase esquecido. Dedicava-se aos estudos matemáticos e a numerologia. Parecia que tinha dificuldades a se adaptar as rápidas transformações pelas quais passava seu país. Seus olhos, possivelmente, viam com tristeza a constituição uma modernidade capitalista associada à miséria e ao autoritarismo. Vivíamos o auge ditadura militar. A boca pequena se dizia que ele enlouquecia dia-a-dia.

Mais do que nunca uma de suas máximas favoritas traduziria seus sentimentos mais profundos e a trágica situação em vivíamos: “Este mundo é redondo, mas está ficando muito chato”. No dia 27 de novembro de 1971 falecia o Barão de Itararé. Uma amiga afirmou: “Morreu sozinho para que não sofressem por ele”. Poucas pessoas compareceram ao seu enterro e um jornalista apressado afirmou, sem graça, que os tempos do velho Barão já haviam passado. Será mesmo? Eu, ao contrário, diria que talvez os tempos do velho Barão ainda não tenham chegado.

Escreveu ele: “Nunca desista de seu sonho. Se acabou numa padaria, procure em outra”. É isso aí, Torelly. As padarias do mundo ainda parecem infinitas.

A foto acima mostra o Barão de Itararé ao lado do dirigente comunista Maurício Grabois

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As greves por melhores salários no Vietnã



Sétimo artigo de Breno Altman, publicado no sítio Opera Mundi:

Quase vinte mil empregados da fábrica de sapatos Pouchen, de capital taiwanês, localizada na província de Dong Nai, cruzaram os braços e pararam as máquinas no início de abril. A lei vietnamita determina que as empresas concedam aumento salarial anualmente. Mas os donos dessa companhia, desde 2008, desobedecem a regra.

“Depois de tantas promessas não cumpridas e de tanto desrespeito aos direitos dos trabalhadores, a greve foi nossa última alternativa”, conta o operário Quan, um dos que participaram do movimento e que prefere não dar o nome completo por medo de demissão. “O que recebemos não é suficiente para acompanhar a alta dos alimentos”.

A legislação restritiva não foi um obstáculo para a paralisação. Apesar de uma greve ser considerada legal apenas se for chancelada pelo sindicato da fábrica ou da categoria, os contratados da Pouchen atropelaram a norma. “Não confiamos no sindicato”, afirma Quan. “Na nossa fábrica seus representantes estão mais próximos da administração da empresa do que dos trabalhadores”.

O protesto na Pouchen não foi um caso isolado nos últimos meses. Nos primeiros quatro meses do ano ocorreram 95 greves "fora-da-lei" no país. No ano passado, foram 216 paralisações desse tipo. Mais de 70% delas aconteceram em empresas de capital estrangeiro, segundo dado da Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT) do Vietnã.

Os ramos afetados são variados, do setor têxtil ao siderúrgico, da fabricação de calçados aos serviços. Até em uma companhia de táxis da Cidade de Ho Chi Minh houve ação paredista sem pedir licença. A razão mais constante para essas demonstrações são baixos salários que não acompanham a inflação. Mas também as fraudes aparecem como motivos para as reclamações.

Há diversos registros de empresas privadas que sonegam pagamento de previdência social e seguros de saúde. Outra manobra é vender seus produtos a preço irrisório para um distribuidor no exterior, que por sua vez os revende por quantia cinco ou dez vezes superior. Trabalhadores vietnamitas, que têm direito à participação nos lucros, acabam vendo seu quinhão burlado, porque a participação é calculada com base na comercialização original.

Maus patrões

No início do período de renovação econômica, a atitude do governo e do Partido Comunista em relação a essas situações era rígida. O objetivo de atrair capitais exigia, pela visão oficial, um quadro de estabilidade a qualquer custo nos ambientes de produção. O crescimento da economia era prioritário em relação aos direitos individuais ou de classe dos trabalhadores.

Mas esse comportamento parece estar se modificando. A imprensa nacional, mesmo as edições em língua estrangeira, dispara matérias contra os maus patrões e em defesa da mobilização operária. A central sindical e o parlamento discutem uma novo código do trabalho, com mais direitos e maior facilidade para os protestos sindicais.

“Podem existir greves legais, em teoria”, declarou Dang Nhu Loi, vice-presidente da Comissão de Assuntos Sociais da Assembleia Nacional, ao jornal Than Nien. “Mas são tantos os obstáculos e formalidades que as empresas acabam protegidas das pressões e praticamente todas as greves podem ser consideradas irregulares”.

Algumas medidas governamentais também são propostas. “Os parques industriais, quando negociam os contratos de investimento, deveriam determinar sálarios, benefícios e condições de trabalho nas empresas que se estabelecerem, sob o risco de cassar licenças”, sugere Le Thi My Phuong, diretora do Departamento de Trabalho da província de Dong Nai.

Renovação

Não é apenas a administração pública que está buscando uma nova abordagem das relações de trabalho. Também o sindicalismo enfrenta os novos tempos. “Antes da economia de mercado, nosso papel principal era colaborar na gestão da economia e na educação política dos trabalhadores”, diz o vice-presidente da CGT, Hoang Ngoc Thanh. “Agora temos de assumir a vanguarda na defesa de remuneração digna, respeito aos direitos e melhoria das condições de trabalho”.

A central, criada em julho de 1929, conta com 6,7 milhões de filiados. Está presente nas 63 províncias e aglutina 20 sindicatos por ramo de atividade. As empresas com mais de 50 trabalhadores possuem seu próprio comitê sindical, uma espécie de sindicato por empresa. A entidade é financiada por verbas do orçamento estatal e pela contribuição de seus integrantes. Conta com um diário nacional, seis revistas e cinco jornais regionais, além de páginas na internet.

Mas Thanh reconhece que a CGT precisa se renovar. “Nossa palavra de ordem é ir para as bases”, afirma. “Precisamos ajudar nossos núcleos de fábrica a serem mais ativos, a representarem efetivamente os filiados, a mobilizá-los por suas reivindicações”.

Muitas das empresas privadas tentam proibir a organização sindical e partidária dentro de suas instalações, a revelia da lei. Mesmo grandes grupos, como a Samsung, arriscaram-se a adotar medidas nesse sentido, que violam a Constituição vietnamita. Esses arroubos, no entanto, podem estar com seus dias de impunidade contados.

Opção calculada

A mudança de linha da CGT, expressando possivelmente orientação mais agressiva do Partido Comunista, tem criado um novo cenário trabalhista. Apenas 104 greves ocorreram em 2007. No ano seguinte, foram 750. Caíram para 314 em 2009. “Companhias que estavam descumprindo leis e acordos coletivos estão percebendo que precisam rever seu comportamento”, analisa Thanh.

O espírito renovador do sindicalismo, pressionado pelo chão da fábrica, também parece ser movido pelo gradual reequilíbrio dos fatores de desenvolvimento. O aumento do poder aquisitivo interno, a melhoria da qualidade de vida e a proteção ambiental passam a contar mais na balança. O crescimento, antes necessidade desesperada, atualmente se apresenta como opção calculada.

O socialismo vietnamita, por outro lado, está descobrindo que a economia de mercado não vem desacompanhada. Traz consigo o conflito entre salário e lucro. Se os trabalhadores não se organizarem para defender a parte que lhes cabe, podem ficar a ver navios.

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Vietnã projeta-se como potência industrial



Sexto artigo de Breno Altman, publicado no sítio Opera Mundi:

A empresa May 10, estabelecida em Hanói, tem uma longa história. Fundada em 1946 com o nome de EX 10, pertencia às forças armadas e fabricava uniformes militares. A produção era determinada pelos planos do governo, que também era o único comprador. Tudo começou a mudar com o novo curso da economia, decidido em 1986.

Parte de uma corporação chamada Garco 10, que controla 15 plantas industriais e emprega oito mil trabalhadores, a May passou a produzir camisas, calças, abrigos e costumes. Noventa por cento de suas vendas, situadas em 40 milhões de dólares anuais, destinam-se à exportação. E abastece o mercado interno através de sua rede varejista.

Outra alteração importante: seu funcionamento hoje é determinado por regras de mercado. Investe, produz e comercializa conforme as tendências de oferta e procura. Ao menor custo possível, sempre em busca da maior taxa de lucro. "Tomamos nossas próprias decisões", explica a jovem gerente de vendas, Cao Thi Kim Danh. "O objetivo da fábrica é garantir divisas para o país e ganhos sólidos para seus acionistas."

O sócio majoritário continua a ser o Estado, com 51% de participação. Além dos eventuais dividendos, recebe 10% sobre a receita a título de imposto sobre valor agregado e 25% sobre os lucros. O outro parceiro são os trabalhadores, que controlam 49% da companhia.

O modo de operação da May é a regra predominante entre empresas estatais do Vietnã, ainda o núcleo forte de sua economia. A maioria dessas companhias são ou estão se transformando em sociedades por ações. Às vezes os sócios minoritários são capitalistas vietnamitas ou até investidores estrangeiros, formando as chamadas empresas mistas. O que caiu por terra, entretanto, foi o planejamento centralizado.

"Abandonamos a economia de comando", afirma o professor Vo Dai Luoc, 65 anos, presidente do Centro de Economia Vietnã, Ásia e Pacífico. "Nosso planos são indutores, de metas, com fortes mecanismos de regulação. Mas deixamos de funcionar com cotas de produção e vendas estabelecidas pelo Estado. Mesmo as empresas públicas trabalham pela lógica de mercado."

A entidade presidida por Luoc é um sinal dos novos tempos. "Somos a primeira organização não governamental criada no país", diz com um sorriso largo. Mas seu principal cliente é o governo. Um dos principais intelectuais vietnamitas e tido como um dos formuladores estratégicos da política de renovação, Luoc está encarregado de elaborar ambicioso plano para o futuro.

"Queremos ser um país plenamente industrializado até 2020", ressalta o economista. "Para atingirmos esse objetivo, porém, novas mudanças terão que ser realizadas. Precisamos de uma revolução tecnológica que nos permita ter indústria de ponta, agricultura mais produtiva, melhores empregos e qualidade ambiental."

O padrão que impera no país, de fato, ainda é o da produção de baixo valor agregado. Além dos bens agrícolas e do setor de serviços, seus principais ramos são a fabricação de têxteis e calçados, a extração de petróleo cru, o processamento de alimentos e a construção civil.

Esses segmentos estão diretamente associados com as riquezas naturais vietnamitas e a utilização extensiva de abundante mão de obra com baixa qualificação. Com essa matriz, nos últimos 25 anos, foi possível garantir expressivas taxas de crescimento e elevação do nível de vida. Mas os
dirigentes avaliam que há perigo de fadiga.

Um novo patamar de desenvolvimento permitiria enfrentar mais adequadamente o gargalo da balança comercial, através da substituição de importações em eletroeletrônica, máquinas e equipamentos, química fina e derivados do petróleo. A criação de uma indústria mais limpa também ajudaria na preservação ambiental. A alteração do perfil tecnológico, por fim, propiciaria uma requalificação mais sadia e bem paga do trabalho.

Também está em debate a forma de condução da política industrial. Atualmente o governo e as administrações de província criam parques produtivos. Há cerca de 150 em funcionamento e outros 230 com licença concedida, em 56 cidades. Para esses parques, geralmente organizados por ramo de atividade, são discutidos projetos de investimento, que devem ser aprovados pelo Ministério do Planejamento. Tanto o Estado quanto empresários participam de seu financiamento.

A febre da industrialização fez com que todas as cidades mais populosas desejem ter seus distritos fabris. Também é um jeito de solicitarem acesso aos fundos nacionais de desenvolvimento e para infraestrutura. Muitas dessas áreas, no entanto, estão com baixa ocupação, abaixo de 60%, como reconhecem funcionários do próprio governo.

Impacto sobre o campo

Um dos problemas mais graves desse mecanismo é o sacrifício eventualmente inútil de terras agrícolas para sua implementação. Aproximadamente 75 mil hectares ao ano são perdidos pelas zonas rurais em favor dos projetos industriais. No delta do rio Mekong, a área mais cultivada do país, até 2020 serão transferidos 8,5 mil hectares.

O impacto sobre os camponeses é forte. "Não podemos investir porque não sabemos até quando ficaremos em nossas terras", afirma Nguyen Van An, do município sulista de Can Tho. Ele e outros produtores de frutas estão temerosos pelo futuro desde que foi anunciado, em 2005, a construção de um novo parque industrial em sua província. "Os residentes ficam aguardando que apareçam os investidores para o parque e façam propostas de compensação financeira", reclama An.

O professor Luoc é outro crítico dessa política. "O governo tem que parar de dar licença para áreas incompatíveis e voltadas à indústria tradicional", afirma. "Apenas espaços com mais de mil hectares devem ser autorizados, com o objetivo de desenvolver prioritariamente a indústria de software, o ramo eletrônico e outros setores avançados. A expansão descontrolada significa baixos salários, camponeses sem terra e dano ambiental."

A estratégia que propõe também atingiria a agricultura. Os limites para concentração da propriedade - por exemplo, nos deltas dos rios Mekong e Vermelho, os mais importantes do Vietnã, ninguém pode ter mais que três hectares de terra - seriam cautelosamente eliminados. Os camponeses receberiam incentivos para fundir suas terras em empresas agrícolas ou os mais pobres a vender seu direito de usufruto aos mais ricos.

"Não é possível aumentar a produtividade no campo com pouco espaço", defende Luoc. "A pequena propriedade foi importante para a produção de alimentos e a estabilidade social, mas 80% da renda das famílias camponeses já são provenientes de atividades não-agrícolas. A indústria, o setor de serviços e o empreendedorismo urbano absorvem os filhos dos camponeses que vivem da autossubsistência."

São ideias que escandalizariam o país até o final dos anos 1980. "O velho socialismo morreu", afirma Dai Luoc. "Não existe mais nenhum país socialista no mundo. Apenas nações que estão em transição para esse sistema. O Vietnã é uma delas. Mas esse objetivo só é possível com desenvolvimento, riqueza e prosperidade. A garantia de que seguiremos nesse caminho é o poder politico dos trabalhadores, aliado ao papel regulador do Estado na economia."

Mas ninguém parece perder muito tempo com essa discussão ideológica. A palavra mágica no país é prosperidade, associada à compreensão de que apenas a industrialização pode assegurar bem-estar. Para conquistar esse nirvana, os vietnamitas se somam à máxima do líder chinês Deng Xiaoping: não importa a cor dos gatos, desde que cacem ratos.

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Os efeitos do agente laranja no Vietnã





Quinto artigo de Breno Altman sobre o Vietnã, publicado no sítio Opera Mundi:

Durante a Guerra do Vietnã (1964-1975), Washington e seus aliados despejaram 83 milhões de litros de herbicidas altamente tóxicos sobre centenas de milhares de hectares do Sudeste Asiático, a maioria no Vietnã, mas também no Laos e no Camboja. Os aviões norte-americanos arrasaram até 25% das florestas do país com um desfolhante herbicida conhecido como agente laranja.

Este produto, que contém grandes quantidades de dioxina, uma substância cancerígena, causou doenças e incapacidades tanto em soldados quanto em civis. Hoje, dois milhões de vietnamitas e dezenas de milhares de norte-americanos veteranos da guerra do Vietnã sofrem seus efeitos no organismo.

Filhos e netos das vítimas diretas do bombardeio químico estão afetados por mutações genéticas. Além dos danos causados aos seres humanos, o agente laranja devastou o meio ambiente vietnamita. Os mangues desapareceram totalmente. O solo e as colheitas sofreram envenenamento a longo prazo.

O Vietnã insistentemente cobra dos Estados Unidos uma reparação de guerra. A Casa Branca nega responsabilidade no caso e atribui eventuais malefícios aos fabricantes do produto. Associações de vítimas vietnamitas e norte-americanas entraram, em 2004, com um processo na Justiça Federal de Nova York contra 36 empresas que forneceram o desfolhante. A petição foi negada, em primeira instância, pelo juiz Jack Weinstein.

Indenização

Também o Tribunal de Apelações julgou a causa improcedente, alegando que o agente laranja não foi usado como arma de guerra contra a população, mas para proteger as tropas norte-americanas. A Corte Suprema, em março de 2009, indeferiu recurso das vítimas sem proferir comentários.

As mesmas companhias denunciadas concordaram em pagar, através de acordo extrajudicial assinado em 1984, 180 milhões de dólares a 291 mil veteranos norte-americanos afetados pelo herbicida. Mas contestam que a ciência tenha provado que o agente laranja provoque os horrores médicos atribuídos.

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quarta-feira, 5 de maio de 2010

“Operação-Serra” para bombardear Dilma

O presidente do PT, José Eduardo Dutra, anunciou na semana passada que o partido vai entrar com representação no Ministério Público para apuração de crimes eleitorais contra Eduardo Graeff, ex-secretário-geral da Presidência no reinado de FHC, atual tesoureiro nacional do PSDB e coordenador da campanha na internet do demotucano José Serra. A decisão foi tomada somente após as corajosas denúncias do deputado Brizola Neto (PDT-RJ) em plena tribuna da Câmara Federal. Ele provou que Graeff é o responsável por vários sítios com baixarias contra a pré-candidata Dilma Rousseff.

Caso a investigação do Ministério Público confirme as denúncias – o que não será difícil, já que o patético Graeff registrou várias destas páginas em nome do PSDB –, Dutra garante que partido entrará imediatamente com ação por danos morais contra o “brucutu” tucano. “O que a gente está vendo é uma tentativa vil de desclassificação, de ataques pessoais, de tudo aquilo que a gente não gostaria de ver numa campanha. A oposição fica entrando com ações para nos caracterizar como a margem da lei, mas por debaixo dos panos comete esses crimes”, justifica o presidente do PT.

A arrogância de Eduardo Graeff

Em entrevista ao portal Terra Magazine, Eduardo Graeff tentou aparentar tranqüilidade diante da representação petista. Segundo a reportagem, ele deu gargalhas e fez provocações. Arrogante, ele até se jactou da página “Gente que mente”, que divulga baixarias e ataques pessoais, e confessou o registro do domínio “Petralhas” – que está inativo, talvez aguardando o melhor momento para o bote. “Eles [os petistas] tiraram do ar o anúncio dos 45 anos da TV Globo. Agora eles querem tirar a nossa página”, lamentou, evidenciando a santa aliança com a famíglia Marinho.

O sítio “Petralhas” nasceu sob inspiração do psicopata Reinaldo Azevedo, “colunista” da revista Veja, e foi registrado pelo Instituto Social-Democrata, fundado pelo ex-presidente FHC. Graeff não esconde que está disposto a tudo na guerra suja deflagrada na globosfera. “A política tem um lado que é muito bruto, as piores coisas que as pessoas são capazes de fazer. A internet torna a difusão desse tipo de coisa mais rápido, mas também desconstrói”. Ele afirma que não teme as críticas. “Vão me atacar. Desespero. Não me importo’. E outra vez gargalha”, relata o Terra.

A tática diversionista dos tucanos

Toda esta arrogância, porém, parece ser sinal de fraqueza. Há indícios de que a sua agressividade não agrada nem o comando demotucano. Segundo Leandro Fortes, da CartaCapital, “Graeff organizou um grupo de tuiteiros e blogueiros para inserir mensagens na internet, inicialmente com conteúdo partidário a favor de Serra. A realidade, no entanto, tem sido outra. Em vez de militantes tucanos formais, a rede de Graeff virou um ninho de brucutus que preferem os palavrões e baixarias. O objetivo dessa turma é espalhar insultos ou replicar mentiras na rede mundial de computadores”.

Temendo o efeito negativo deste jogo sujo, “a assessoria jurídica de Serra o teria aconselhado a se afastar de Graeff e a impedir que o nome do ex-secretário seja associado, organicamente, à campanha presidencial”. Há boatos, inclusive, de que capacho de FHC poderia ser defenestrado. Afinal, os marqueteiros do demotucano continuam tentando vender a imagem do “Serrinha paz e amor”. Ele até elogiou o presidente Lula pelo título de líder mundial conferido pela revista Time. A tática do “Serra assopra e os delinqüentes mordem” correria riscos com os exageros de Graeff.

A guerra suja é inevitável

Para o deputado Brizola Neto, ninguém pode se iludir com esse diversionismo. “Nas entrevistas, Serra diz que vai manter o alto nível e não faz ataques ao presidente Lula, porque ele é popular. Mas a campanha no site do PSDB é o inverso do que Serra diz, desmente tudo isso. Na internet, eles usam de baixarias contra Dilma”. Para ele, o ex-secretário-geral de FHC é o “brucutu chefe da guerra suja tucana” e segue as orientações do comando de Serra. Ela lamenta que partido do presidente Lula e da candidata Dilma Rousseff seja tão brando no combate a estas baixarias.

Correta e corajosamente, o deputado insiste que é preciso “desafiar o discurso de bom-moço de Serra. Toda esta sujeira é feita pelos seus homens de confiança”. É urgente partir para a ofensiva para desmascarar a tática dos tucanos. A decisão do PT de ingressar com uma representação no Ministério Público Federal é apenas o primeiro passo – mas ainda tímido. As forças que apóiam a candidatura Dilma Rousseff precisarão de muito mais combatividade para enfrentar o jogo sujo dos demotucanos nesta verdadeira guerra eleitoral. Do contrário, o desastre será inevitável.

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As frases geniais do Barão de Itararé








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terça-feira, 4 de maio de 2010

Ho Chi Minh quer ser locomotiva da Ásia



Quarto artigo de Breno Altman, publicado no sítio Opera Mundi:

As avenidas amplas no centro da cidade e a arquitetura de seus prédios mais antigos remontam ao passado colonial, quando Saigon era parte da Indochina francesa. Fundado há mais de 300 anos, às beiras do rio que deu origem a seu nome, o município também foi tocado pelo dedo planificador de Georges-Eugène Haussmann, o barão que remodelou Paris entre 1852 e 1870.

Mas nas colônias tudo era impuro. Os funcionários do império, com suas roupas elegantes e costumes ocidentais, se misturavam à massa de camponeses que circundava e alimentava a cidade. A arquitetura que se pretendia imponente estava ilhada pelos campos de arroz e borracha.

A longa guerra pela independência, contra franceses e americanos, quebrou os muros que separavam aristocratas e camponeses na paisagem urbana. O desenvolvimento econômico, antes e bem depois do conflito, fez a sua parte. Os vietnamitas encravaram na antiga capital do sul seus edifícios estreitos e cumpridos, de dois ou três andares, sua lojinhas acanhadas, o comércio ambulante.

Depois que todas as levas de invasores foram empurradas da porta para fora, Saigon virou Cidade de Ho Chi Minh. Quando os últimos americanos escaparam de helicóptero, do telhado de sua embaixada, em 1975, pela primeira vez deixou de ter donos estrangeiros.

Os primeiros momentos foram dramáticos. Os empresários sulistas, ligados aos norte-americanos, levaram embora seu capital, tecnologia e muitos funcionários. O bloqueio ocidental interrompeu as artérias da economia. A miséria e a fome pareciam ser a vingança dos derrotados contra o burgo colonial que ganhara o nome do líder comunista.

Apenas o período de renovação, iniciado em 1986, tiraria Ho Chi Minh do cadafalso. Mais de 20 anos depois, transformou-se no principal centro econômico e urbano do país. Não disputa a primazia política com Hanói, a capital, mas é nas suas ruas que o mundo voltou a falar com o país da estrela dourada.

Um quinto do produto interno bruto do Vietnã sai da cidade. Um terço do orçamento federal por aqui é arrecadado. Quase 8 milhões de pessoas trabalham ou vivem em Ho Chi Minh, uma espetacular densidade demográfica de 3,4 mil habitantes por quilômetro quadrado. As bicicletas foram praticamente substituídas por vespas e pequenas motocicletas. Cinco milhões desses veículos com duas rodas transitam todos os dias.

A apenas 60 quilômetros do Mar da China, o porto fluvial de Ho Chi Minh tornou-se um atrativo para a instalação de grandes empresas importadoras e exportadoras. Os novos investimentos, associados às mudanças da vida no campo, promoveram a expansão de um amplo setor de serviços, da atividade turística e da produção industrial.

Motor do país

Hotéis de todas as categorias espetam a paisagem. Centros comerciais são construídos sem pausa. Ho Chi Minh pode não ter a elegância ou a organização de outras grandes cidades do mundo, mas não há nada no portifólio de suas congêneres que também não exista na velha Saigon.

Mais de 300 mil empresas foram criadas, algumas de grande porte, que atuam nas áreas de alta tecnologia, eletrônica, processamento de alimentos, construção civil e produtos agrícolas. Quinze parques industriais e zonas de exportação concentram as iniciativas de caráter estratégico.

Enquanto o Vietnã cresceu 5,3% em 2009, a cidade bateu nos 8%, repetindo a performance dos anos anteriores. Dos 3 milhões de turistas que visitaram o país, mais de 70% passaram pela ex-capital colonial.

“Nós somos o motor do país”, afirma Nguyen Trung Truc, integrante da comissão política do Partido Comunista. “Temos a responsabilidade de executar os principais projetos de infraestrutura e desenvolvimento”.

Os objetivos são ousados. O comitê popular da cidade, responsável por sua administração, desenvolveu um plano diretor que vai até o ano 2050, mas está detalhado para a próxima década. De acordo com esse planejamento, Ho Chi Minh terá de 20 a 22 milhões de habitantes em dez anos. Chegará ao fim do período estudado com 30 milhões de moradores.

Reforma

Além de sua área atual, a região do município passaria a abarcar imediatamente oito províncias ao sul, formando uma área de 30,4 mil km2 – atualmente são apenas 2 mil km2. Esse território hoje responde por 57% da produção industrial vietnamita, 60% das exportações e 47% do orçamento estatal. A meta, nada modesta, é fazer de Ho Chi Minh o maior polo econômico da Ásia.

Toda a nova megalópole seria distritalizada, fixando distintas atividades econômicas e projetos habitacionais para cada núcleo. A região central, transformada em centro financeiro, seria descongestionada. Bairros industriais seriam construídos nos arredores, perto da moradia dos trabalhadores que atualmente se deslocam quilômetros para seus empregos. As fábricas mais poluentes ficariam distantes.

Sistemas de metrô e ônibus constituiriam uma alternativa de transporte coletivo entre os distritos. Grandes parques e jardins seriam erguidos, como espaços de lazer e para reduzir os danos ambientais. A área central acabaria esvaziada sem afetar a paisagem, os locais históricos e a herança arquitetônica.

Pressão demográfica

A ambiciosa reforma urbana permitiria à cidade acomodar a pressão demográfica e estabelecer novos satélites de desenvolvimento. Desde que começou a abertura, muitos vietnamitas migram para Ho Chi Minh atrás de emprego, formando cinturões de residências precárias. O atual desenho do município não permite mais a expansão da economia em ritmo adequado e a construção de moradias decentes.

Alguns criticam a solução que está sendo estudada. Alegam que milhares de camponeses dos anéis periféricos perderiam o usufruto da terra. Ainda que recebessem compensações financeiras, como é previsto, teriam seu futuro ameaçado.

As autoridades, no entanto, afirmam que a produção agrícola estaria preservada na reorganização dos distritos. Mas enfatizam que os agricultores menos produtivos, ou seus filhos, irão preferir trabalhar nas novas empresas, aproveitando a indenização prometida para investir em algum pequeno negócio paralelo ou na construção de casas. Além do mais, apostam suas fichas nos polos tecnológicos do distrito de Go Vap, já em funcionamento, e que incluem terras para agricultura orgânica e de alta tecnologia.

Imóveis

Outro perigo atende pelo nome de especulação. Os mais ricos poderiam promover uma forte concentração imobiliária. O governo relativiza essa hipótese. “Nós temos uma estrutura de impostos crescentes para quem compra mais de uma residência”, afirma Truc. “Além do mais, o direito ao usufruto de terras e terrenos só pode ser adquirido mediante projetos de investimentos aprovados pela administração.”

As intenções dos administradores de Ho Chi Minh ainda dependem do governo central. Depois de concluídos os estudos, Hanói precisa dar sua concordância. Apesar de arrecadar impostos sobre moradia e serviços, a cidade depende do orçamento nacional para implementar seus fabulosos planos.

Não é só isso. Os chefes do país vão ter de aceitar o risco de criar uma megalópole que pode desequilibrar a relativa harmonia entre as distintas regiões. Apesar da reunificação do país, o norte parece seguir vigilante para que o sul, ao erguer a ponte principal em direção ao ocidente e ao capitalismo, não acabe abrindo caminho para novos dissabores ao Vietnã socialista.

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Vietnã cresce em ritmo de guerra



Terceiro artigo de Breno Altman sobre o Vietnã, publicado no sítio Opera Mundi:

Bat Trang é um pequeno vilarejo na zona suburbana ao sudeste de Hanói. Lá vivem cerca de mil famílias. Conhecida por muitos turistas e comerciantes, desde o século XIV é um centro de artesanato, especializado em cerâmica. Depois da guerra, como tantas outras cidades e regiões do país, sua vida econômica estava destruída.

Durante dez anos, até 1986, os artesãos eram obrigados a trabalhar em uma cooperativa, rompendo a tradição local da produção familiar. Era a fase que os vietnamitas chamam de “período do subsídio”: a economia funcionava de forma centralizada e a propriedade só podia ser estatal ou coletiva. Todas atividades eram comandadas pelo Estado, com seus planos anuais e quinquenais.

Na prática, não havia qualquer compensação tecnológica, financeira ou comercial para quem fosse cooperativizado. Os trabalhadores de Bat Trang foram perdendo o estímulo para a produção. Muitos voltaram para o campo, ao menos para tentar plantar o que comer. O povoado correu o risco de virar uma cidade fantasma.

Tudo começou a mudar no final dos anos 1980. Com o país vivendo uma profunda crise, incapaz de se reconstruir e afetado pela desagregação da União Soviética, o Vietnã socialista teve que se repensar. Adotou medidas de abertura econômica, permitindo outras formas de propriedade. O velho modelo estava com os dias contados.

As famílias de Bat Trang puderam voltar a produzir e vender com liberdade. Os mais bem-sucedidos foram os Minh Hai. Seu pequeno negócio, no ano 2000, cresceu a ponto de se transformar em uma pequena empresa privada, a Minh Hai Ceramic. “Hoje faturamos 1 milhão de dólares por ano”, conta o gerente Nguyen Mạnh Hung, 34 anos, formado em administração. “Setenta por cento de nossa produção é para exportação. Empregamos 65 trabalhadores. Crescemos 20% ao ano”.

Um desses operários é a jovem Nguyen Thi Thanh, 24 anos. Casada, com uma filha de 10 anos, é a primeira pessoa de sua família a sair do campo. Nas épocas de plantio e colheita do arroz ainda ajuda os pais, mas sua vida começou a mudar. “Estou na fábrica há sete meses”, conta Thanh. “É a primeira vez que trabalho apenas oito horas por dia e tenho um salário”.

Ela estudou até o ensino médio e planeja fazer faculdade de contabilidade. Ganha apenas 1,5 milhão de dongs por mês (algo como 85 dólares). O chefe da fábrica, Hung, salário mais alto da empresa, recebe cinco vezes esse valor. Ambos estão convencidos, porém, de que a vida está melhorando.

A história de Bac Trang, dos Min Hai, de Thanh e Hung é um retrato do Vietnã atual. O país escolheu um modelo para se desenvolver que seus dirigentes chamam de “economia de mercado orientada ao socialismo”. Ao lado de pequenas empresas convivem companhias estatais, propriedades familiares, cooperativas e corporações estrangeiras. O Estado tem um forte papel regulador, mas os velhos métodos aprendidos com os soviéticos estão enterrados.

“A economia de mercado é produto da História, não uma invenção do capitalismo”, afirma Nguyen Viet Thong, secretário-geral do Conselho Teórico do Partido Comunista. “Para nós é um instrumento de desenvolvimento. Não se pode falar a sério em socialismo e igualdade com pobreza e atraso. Não abdicamos das ideias marxistas, ao contrário. Apenas julgamos que o igualitarismo não é o melhor caminho. Já o experimentamos. Foi um fracasso”.

Na primeira década do pós-guerra, o Vietnã quase sucumbiu. Asfixiado pelo bloqueio norte-americano e da maioria dos países europeus, convivia também com o ocaso da União Soviética e seus aliados. O custo da reunificação tinha sido muito elevado. Os empresários do sul, com seu capital, fugiram depois da vitória comunista. A política de coletivização geral da propriedade, abaixo do paralelo 17, repetindo a receita aplicada no norte, não era capaz de impulsionar a economia.

O país cresceu, entre 1976-1986, abaixo de 1% ao ano. Mais de 50% dos vietnamitas viviam na miséria, ganhando menos de 1 dólar ao dia. A produção agrícola, desorganizada, deixou a população de várias regiões sem ter o que comer. Centenas de milhares lançaram-se ao mar em barcos improvisados, desesperados pela sobrevivência. A nação heróica, que tinha vencido inúmeras guerras impossíveis, corria o risco de ser derrotada na paz.

Veio, então, a grande virada de 1986. Os comunistas, no sexto congresso de seu partido, decidiram aplicar uma política chamada dao moi (renovação, em vietnamita). A primeira medida tomada foi uma reforma agrária. Os camponeses, que compunham mais de 90% da população, receberam parcelas de terra em usufruto privado. Ganhavam também liberdade para plantar, vender e aplicar como quisessem o eventual lucro de suas atividades.

Logo essas reformas se difundiram para outros setores, como serviços e certos ramos da indústria. Os pequenos negócios se multiplicaram no país. Dentro de uma mesma família várias atividades passaram a se cruzar. Os camponeses capazes de extrair excedentes de sua produção começaram a construir casas de dois pisos nas cidades que abrigavam suas cotas de terra, quase sempre na margem das estradas. Viviam no segundo andar e abriam lojinhas ou artesanatos no primeiro.

Os filhos das famílias com menor produtividade agrária eram contratados pelas empresas recém-abertas. A indústria, impulsionada também por esse nascente mercado interno, entrou em uma etapa de florescimento. Mas a alavanca primordial veio da abertura de portas para o investimento estrangeiro. As reservas naturais do Vietnã, sua privilegiada posição geográfica e o baixo custo da mão de obra foram atrativos irrecusáveis para vários empresários.

Os resultados da política de dao moi provam que a pátria de Ho Chi Minh foi redesenhada. O produto interno bruto, entre 1990 e 1997, prosperou a uma média anual de 8%, um ritmo que seguiria ao redor de 7% até 2008. O Vietnã, mesmo com a crise mundial, cresceu 5,3% em 2009. Somente a China suplanta esse padrão de expansão econômica.

A pobreza extrema caiu, em 23 anos, para 12,3%. A taxa de desemprego não chega a 3%. A agricultura ainda emprega 51,8% dos vietnamitas, cujo lastro é a pequena propriedade familiar inferior a 3 hectares, mas não representa mais que 20,7% da economia. A fatia industrial é de 40,3%; a de serviços, 39,1%. Mais de 30 mil empresas foram criadas, com diferentes tipos de propriedade.

A queda relativa da produção agrícola deriva da rápida industrialização. O país é hoje o segundo maior exportador mundial de arroz, o maior de caju e pimenta negra, além de desempenho relevante na venda de chá, café, borracha e peixe. A fome rondava o Vietnã nos anos 1980. Hoje o país exporta comida.

Planejamento

O Estado ainda controla 45% da economia, através de empresas próprias ou em sociedades acionárias (nas quais geralmente os trabalhadores de cada companhia detêm 49% das ações, contra 51% que pertencem ao governo). O restante das formas de propriedade se divide entre privada, estrangeira ou cooperativa.

O poder público, além de predominar sobre setores estratégicos como o sistema financeiro, a produção de energia e a indústria militar, exerce a direção prática da economia. Qualquer projeto de investimento privado ou associativo tem que ser negociado com o Ministério do Planejamento, que determina a região e as demais condições de implantação do negócio, incluindo compensações ambientais e sociais.

“Quando ressaltamos nossa orientação ao socialismo, estamos definindo que a lógica de nosso modelo é determinada pelo controle social sobre a acumulação de renda e riqueza”, afirma Thong. “Não somos uma economia de livre mercado. O papel do Estado é colocar os métodos capitalistas a serviço do desenvolvimento, do combate à pobreza e do enriquecimento dos vietnamitas”.

Não é um caminho fácil. O Vietnã sofre das dores de parir um crescimento tão acelerado. Os problemas de corrupção, tráfico de drogas e contaminação ambiental alarmam seus dirigentes. A taxa de inflação, atualmente mais domesticada, chega perto de 8%. A balança comercial registra déficits crescentes, pois o país exporta cerca de 57 bilhões de dólares em produtos agrícolas e de baixo valor agregado, mas importa 70 bilhões de dólares em máquinas e equipamentos para garantir seu desenvolvimento. O rombo só é coberto porque os investimentos internacionais continuam a trazer divisas.

Novos ricos

O desequilíbrio comercial também se explica pelo consumo cada vez maior de bens luxuosos, adquiridos pelos novos ricos vietnamitas, que o governo busca sustar com elevação de taxas e impostos. Mas esse quadro é revelador de que o país, hoje mais desenvolvido que no período anterior, é também mais desigual.

“A desigualdade não nos assusta. É possível atenuá-la com a intervenção do Estado”, diz Thong. “Uma certa diferenciação social é inevitável em nosso modelo, e até positiva. O estímulo material é uma força propulsora do crescimento. Quem produzir mais e melhor, deve ganhar mais e viver melhor”.

Muitos comunistas ortodoxos se assustam com a posição dos vietnamitas. Não são poucos que insinuam um suposto abandono das ideias socialistas. Pode ser. Mas também não faltava quem, durante a guerra contra franceses e americanos, achasse absurda a estratégia de enfrentar exércitos poderosos com armas de caça, emboscadas na selva e deslocamento de tropas debaixo da terra.

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Leitor da Veja ataca Lula na internet



Reproduzido do sítio Conversa Afiada

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O mais plebeu dos barões



No dia 14 de maio, às 19 horas, será lançado em São Paulo o Centro de Estudos da Mídia Alternativa “Barão de Itararé”. O nome é uma homenagem a um dos criadores da imprensa alternativa no país e o “pai do humorismo brasileiro”. Reproduzo abaixo a singela biografia redigida pelo jornalista e cartunista Gilberto Maringoni, publicada na Revista de História da Biblioteca Nacional:

- O que o senhor deseja?

- Trabalhar no seu jornal.

- E o que o senhor sabe fazer?

- Tudo, desde varrer o chão até dirigir o jornal, mesmo porque não há muita diferença.

Testemunhas desse diálogo, acontecido em meados de 1925 na redação de O Globo, no Rio de Janeiro, garantem que um dos protagonistas era o diretor da empresa, Irineu Marinho. As mesmas testemunhas dividem-se quanto à identidade de seu interlocutor. Algumas dizem tratar-se de um gaúcho baixo, um tanto rechonchudo, e muito abusado, chamado Apparício Fernando de Brinkerhoff Torelly. Outros juram ser aquele nada mais, nada menos que o ilustre fidalgo Barão de Itararé, o Brando, senhor feudal de Bangu-sur-Mer.

É possível que os primeiros tivessem mais razão, por um pequeno detalhe. O Barão de Itararé só chegaria ao mundo seis anos depois. Já Apparício nascera em 29 de janeiro de 1895, no Rio Grande do Sul, perto da fronteira com o Uruguai. A imprecisão do local tem sua razão de ser. Ele próprio conta: “Minha mãe queria ter o parto na fazenda do meu avô”, em Pueblo Vergara, no país vizinho. Ela e o marido saíram da cidade de Rio Grande de barco, até Artigas. “De lá até a fazenda viajaram de diligência. No meio do caminho, uma das rodas se partiu e houve um tremendo choque. Com todo aquele barulho e movimento, nada mais natural que eu me apressasse a sair, para ver o que se passava”.

O Barão só viria à luz bem mais tarde, no ano seguinte da Revolução de 1930. O nome foi dado em homenagem a um dos episódios mais dramáticos dos conflitos entre as tropas legalistas, de Washington Luís, e as forças leais a Getúlio Vargas, que subiam do Rio Grande do Sul em direção ao Rio de Janeiro. A cidadezinha de Itararé, no sul do estado de São Paulo, se desenhava como o palco da mais sangrenta batalha na disputa pelo poder. Rota natural para a Capital Federal, todas as suas casas foram evacuadas e tomadas pelas tropas da Força Pública paulista, no início de outubro de 1930. Os batalhões rebeldes, liderados pelo ex-comandante da Coluna Prestes, Miguel Costa, com maior efetivo, cercam o lugar por mais de duas semanas, à espera do melhor momento para atacar. No dia marcado para o confronto, chega a notícia de que Washington Luís fora deposto. A batalha de Itararé jamais aconteceu.

Pacifista e acompanhando a situação com humor, Apparício aproveita para se autoconceder o título de duque de Itararé, logo rebaixado para barão, “como prova de modéstia”. Assim, as duas personalidades passaram a conviver numa só pessoa, um dos mais criativos e irreverentes humoristas de que o Brasil tem notícia, um “herói que a Pátria chora em vida e há de sorrir incrédula quando o souber morto”, segundo suas próprias palavras.

Mas voltemos a fita. Quando trava aquele diálogo com Irineu Marinho, o jovem Apparício havia abandonado há pouco seus estudos de medicina na capital gaúcha – onde já se dedicava ao jornalismo – e se aventurava pela então sede da República. Para sua surpresa, é admitido em O Globo, no qual assina uma crônica por alguns meses, sob o pseudônimo de Apporelly.

Depois de passar por A Manhã, de Mario Rodrigues, Apparício junta dinheiro para lançar seu próprio jornal, em 13 de maio de 1926. O nome é uma óbvia gozação com o diário do pai do dramaturgo Nelson Rodrigues: A Manha. Sob o dístico “quem não chora não mama”, o Barão fez uma verdadeira revolução no jornalismo de humor brasileiro, superando as já gastas fórmulas das revistas O Malho, Careta e Fon-fon, lançadas na primeira década do século.

Enquanto as três praticavam um gênero de sátira política e de costumes bastante comportados – apesar de contarem com a colaboração de caricaturistas geniais, como J. Carlos, Raul Pederneiras e K. Lixto Cordeiro – Apporelly voltava-se contra o lado conservador da sociedade. Demolindo falsos mitos, tripudiando sobre a pompa de fraque e casaca do mundo político, Itararé praticou um gênero de humor que buscava laços com quem estava por baixo na sociedade.

A Manha, tablóide que alcançava quase todo o país, torna-se um sucesso editorial, num tempo em que não existiam pesquisas de opinião, estratégias de marketing ou verificação de circulação. Era “o único quinta-feirino que sai às sextas”, alardeava seu editor, fazendo troça das dificuldades de produzir praticamente sozinho o jornal inteiro. Graficamente, além de apresentar desenhos de Nássara, Mendez e Martiniano, A Manha publicava colagens e fotos retocadas de políticos e personalidades, numa molecagem editorial que os expunha ao ridículo a cada edição. A contrapartida era clara: ao contrário da maioria dos órgãos de imprensa, a folha de Apparício não recebia nenhum tipo de verba governamental.

As notícias primavam pelo absurdo. “A Manha propõe a regularização dos horários dos desastres da Central do Brasil”, “Foi admitido nos quadros de redatores desta folha o simpático senador Lauro Müller, general de divisão e profundo conhecedor das outras três operações de guerra – adição, multiplicação e subtração” e “O dia é hoje consagrado a Tiradentes, uma das grandes vítimas da política mineira” são exemplos de que os disparos verbais de seu editor quase não tinham limites.

Na edição de 5 de julho de 1930, ao comentar o manifesto de Luiz Carlos Prestes aderindo ao comunismo, A Manha assegurava que “as teorias explanadas pelo chefe revolucionário estão muito aquém das idéias vigorosas e radicais predicadas e praticadas pelo talentoso homem de letras que está à frente desta empresa”. O jornal classificava de "ridícula, simplesmente ridícula" a parte do manifesto que reivindicava a redução da jornada de trabalho para oito horas, perguntando “por que não pleiteia, como nosso chefe, a abolição completa do trabalho?”

A irreverência do Barão levou-o inúmeras vezes à cadeia, após a chegada de Getúlio ao poder. A primeira delas se deu em 2 de setembro de 1932 e durou apenas um dia. Mas inauguraria uma série de agressões que se repetiriam pelos anos seguintes. Se ainda não era um homem claramente de esquerda, o Barão, por essa época, já exibia sua forte ojeriza ao integralismo, movimento de extrema-direita que se espelhava no fascismo europeu.

Em outubro de 1934, o editor d’A Manha partia para uma nova empreitada. Juntamente com Aníbal Machado, Pedro Mota Lima e Osvaldo Costa, lança o Jornal do Povo. As tensões políticas se acentuavam. Em São Paulo, no dia 7, integralistas e comunistas haviam se enfrentado numa batalha campal na Praça da Sé. Quatro dias depois, vários militantes aqui radicados há anos são expulsos do país. No meio desse torvelinho, o novo diário sobrevive por dez dias. A publicação de uma série sobre a Revolta da Chibata (1910), dos marinheiros no Rio de Janeiro, foi o que bastou para o Barão ser seqüestrado e espancado por seis oficiais da Marinha. Após cuidar dos ferimentos, ele volta para A Manha. Coloca na porta a tabuleta: “Entre sem bater”.

Cada vez mais simpático ao Partido Comunista do Brasil (PCB), o “talentoso homem de letras” é preso novamente em dezembro de 1935. A acusação é ser fundador e militante da Aliança Nacional Libertadora (ANL), frente política liderada pelos comunistas. Agora a repressão é dura: são encarcerados, também, centenas de militantes e simpatizantes do PCB, como o escritor Graciliano Ramos, a cronista Eneida de Moraes e o jornalista Moacir Werneck de Castro, além de Luiz Carlos Prestes, sua esposa Olga Benario e boa parte da cúpula do partido.

O Barão foi interrogado pelo juiz Castro Nunes, da Vara Federal, na Polícia Central, que lhe perguntou a que atribuía sua prisão.

– Tenho pensado muito, excelência, e só posso atribuí-la ao cafezinho.

– Ao cafezinho?

– Vou explicar, excelência. Eu estava sentado num bar, na avenida Rio Branco, tomando meu oitavo cafezinho e pensando em minha mãe, que sempre me advertia contra o consumo excessivo do café. Nesse momento chegaram os policiais e me deram voz de prisão... Só pode ter sido isso, por eu ter desobedecido aos conselhos de mamãe.

Apesar do humor, a situação era séria. Vários presos foram barbaramente torturados. Olga Benario seria entregue aos nazistas. Graciliano recorda-se do Barão em numerosas passagens de seu Memórias do Cárcere como um companheiro afável e bem humorado. A Manha, por motivos evidentes, deixa de circular. Por um ano seu editor permanece encarcerado, sem culpa formal.

Quando volta às ruas, percebe que os tempos andam difíceis. No plano pessoal, Itararé havia perdido sua esposa, pouco antes da prisão, vítima de câncer. No mundo à sua volta, avançava o nazi-fascismo na Europa e o regime lançava as bases para um endurecimento. Mesmo assim, tentou relançar A Manha, que circula precariamente em 1937. No fim daquele ano, Getúlio dá novo golpe e instaura a ditadura do Estado Novo, com suspensão de direitos constitucionais, banimento dos partidos políticos e censura à imprensa. Para o nosso humorista, esse era apenas “o estado a que chegamos”.

Tentando sobreviver, mantém uma crônica regular no Diário de Notícias por seis anos. Evita provocar a direita enquanto dura a colaboração, voltando suas baterias para temas mais amenos. Algo mudara radicalmente no Barão desde que saíra da cadeia. Era sua aparência. Agora exibia uma vasta barba, precocemente grisalha, o que lhe dava ainda mais aparência de um nobre dos tempos da monarquia. Sua figura fica ainda mais popular.

Em abril de 1945, A Manha é relançada. Aproveitando-se do clima de mobilizações populares pelo fim do regime ditatorial, contando com a sociedade do político Arnon de Mello (pai de Fernando Collor de Mello) e a colaboração de intelectuais como José Lins do Rego, Marques Rebelo, Rubem Braga, Raymundo Magalhães Júnior e outros, o sucesso é ainda maior que na fase anterior. Quem escrevia e editava a maior parte das matérias, além de fazer a direção de arte, era mesmo o ilustre fidalgo, que por seu talento, chegou a ser chamado de o "Bernard Shaw do Brasil", em referência ao dramaturgo inglês. “Seria mais lógico que se considerasse a Shaw como o Itararé da Inglaterra”, respondeu nossa ilustre figura.

Suas posições políticas o aproximam do PCB. Depois de participar ativamente da campanha presidencial do comunista Yedo Fiúza, em dezembro de 1945, o Barão candidata-se a vereador pelo Distrito Federal. Na ocasião, duas denúncias inquietavam a população: a constante falta d´água e as adulterações no leite. O slogan da campanha não poderia ser mais certeiro: “Mais água, mais leite, mas menos água no leite”. Ainda candidato, seu primeiro ato foi promover seus cabos eleitorais a sargentos. É eleito com relativa folga.

Na Câmara Municipal, o Barão caracteriza-se como um parlamentar combativo e espirituoso na defesa dos interesses da população pobre. Divide seu tempo entre o legislativo e a direção d´A Manha, o que significa uma jornada exaustiva. Mas sua carreira parlamentar dura pouco tempo. Influenciado pelos ventos da guerra fria, o Tribunal Superior Eleitoral suspende o registro do PCB, em maio de 1947. Sete meses depois, todos os parlamentares do partido são cassados, incluindo Itararé.

Nesse meio tempo, apesar da grande aceitação popular, seu jornal não ia bem das pernas. Sem capital e estrutura empresarial para garantir a regularidade, A Manha é novamente suspensa, em 1948. Mas o último nobre da República não desiste e logo vem com mais uma novidade. Chama seu antigo colaborador, o artista gráfico paraguaio Andres Guevara, para lançar o primeiro de seus Almanhaques, em 1949. Aproveitando o sucesso que faziam os almanaques populares com dicas, conselhos e curiosidades astrológicas, o Barão acrescenta à fórmula seu humor anárquico. Essa edição traz logo na abertura uma biografia da impoluta personalidade, cuja “vida pública é uma continuidade da privada”. Ali ficamos sabendo que Itararé, “cioso como ninguém da pureza de sua estirpe, é o único nobre do mundo que, pelo menos uma vez por mês, injeta, por via endovenosa, uma certa quantidade de azul de metileno, para manter inalterada a cor da nobreza do sangue”.

O que era para ser uma publicação semestral só voltou a circular por duas vezes, em 1955. Aos 60 anos, cansado, o Barão colabora por algum tempo na Última Hora, de Samuel Wainer. Quando vem o golpe de 1964, com a volta da repressão, cassações e prisões, Apparício vê repetir-se um filme já conhecido. “Esse mundo é redondo”, dizia ele, “mas está ficando chato”.

Nos últimos anos, Itararé torna-se um recluso em seu apartamento no bairro de Laranjeiras. Lê vorazmente e estuda matemática, biologia e eletrônica, paixões desde a juventude. Cercado de livros, vivia também rodeado de baratas, tratadas por ele como “companheiras”, por terem exercido tarefas importantes nos tempos de cadeia, levando amarrados nas costas papeizinhos com mensagens para seus colegas de cárcere. Com a saúde abalada e só – sua quarta mulher se suicidara anos antes e seus filhos não moravam com ele – Apparício Torelly morre em casa, aos 76 anos, em 27 de novembro de 1971. Era o fim do herói de dois séculos”, como se autodenominava, parodiando o revolucionário italiano Giuseppe Garibaldi (1807-1882), que lutara em seu país, no Brasil e Uruguai, conhecido como “o herói de dois mundos”.

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