Reproduzo artigo de João Peres, publicado na Rede Brasil Atual:
Foi com espanto e tristeza que ouvi os xingamentos a mim dirigidos pelo senador eleito Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP). Na noite de segunda-feira (25), o ex-chefe da Casa Civil do governo paulista classificou-me como “pelego e filho da puta.” A agressão verbal ocorreu antes do debate realizado pela Rede Record entre os candidatos à Presidência da República.
Ao senador, não havia, até aquele momento, dirigido nenhuma palavra. Tudo o que ele sabe de mim, naquele instante e agora, é que trabalho para a Rede Brasil Atual e para a Revista do Brasil. Parece ser suficiente para que se sinta no direito de proferir insultos: são veículos produzidos por uma empresa privada cuja receita vem da prestação de serviço (venda de anúncios e assinaturas) a pessoas físicas e jurídicas – incluindo sindicatos de trabalhadores.
Foi por conta desse aspecto que o PSDB obteve liminar, via Tribunal Superior Eleitoral (TSE), vetando a continuidade da distribuição e a divulgação da edição 52 da revista na internet sob a argumentação de que dinheiro do trabalhador não pode financiar material eleitoral - este assunto já foi discutido aqui e a editora apresentou recurso ao TSE, não cabendo de minha parte qualquer argumentação.
O que a mim, como jornalista, é importante debater é a maneira como o senador se sente no direito de tratar a imprensa. É deplorável que, como repórter, tenha de me posicionar contra a agressão que sofri, deixando de exercer o fundamento básico da minha profissão, que é escrever sobre os outros, e não sobre minha vida. O único bem de um jornalista, ao menos daquele que não se presta a coleguismos com o poder, é a palavra: é ela que ouço, é com ela que conto histórias.
Quando o senador classifica a mim como “pelego filho da puta” porque trabalho em um veículo que jamais escondeu sua posição favorável à continuidade do atual projeto de governo, recorre a uma simplificação lamentável. Seguida a linha de pensamento do futuro parlamentar, todos os que trabalham em Veja, Folha, Estado e O Globo são, necessariamente, tucanos – e aí o leitor escolha o adjetivo que deve acompanhar a classificação.
A fala do senador é reveladora da propensão a não lidar com o contraditório. Talvez por maus costumes: quem circula pelos eventos políticos brasileiros sabe a cordialidade com que são tratados alguns líderes políticos, plenamente oposta à ferocidade dispensada a outros. Ao recorrer a esta simplificação, realiza-se um desmerecimento prévio de meu trabalho, numa triste tentativa de intimidação de minha atuação. Simplificação que teve continuidade no Twitter, em que o senador utilizou aspas para dizer que sou jornalista: "O 'jornalista' faz o que eu esperava dele: mente quando afirma que o xinguei de fdp. Chamei de pelego, o que é verdade e, a mim, muito pior."
O senador sabe as palavras que proferiu. Se quer admitir em público ou não, para mim é indiferente. O que não se pode colocar em dúvida é minha formação e minha integridade profissional. Sou jornalista – sem aspas – formado pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Minha passagem pelo Departamento de Jornalismo e Editoração, portanto, está lá registrada, caso alguém se interesse em averiguar.
Daqui por diante, como o senador espera que se proceda para entrevistar algum integrante do PSDB? Será que a democracia ideal contempla apenas a manifestação das vozes amigas (e queridas), sem espaço ao debate necessário para o amadurecimento da sociedade e, por consequência, da realização do bom jornalismo? O PSDB, que tem recorrido a simplificações para acusar adversários de quererem cercear a liberdade de pensamento, é quem mais nos fornece exemplos deste suposto cerceamento. Já não cabem nos dedos de uma mão: a restrição da circulação da Revista do Brasil, a censura ao jornal ABCD Maior, a tentativa de agressão do padre que se manifestou contra boatos, a ação no Paraná para impedir a publicação de pesquisas eleitorais, a "criminalização" de jornalistas que fazem perguntas efetivas a Serra e, agora, este xingamento.
Uma coisa é a opinião de um veículo. Outra, que não se confunde, é a opinião do jornalista. Esta, manifesto em blogues e nas redes sociais da internet, bem como outras centenas de profissionais da área, e deixo para trás quando estou na condição de repórter. Nas redações nas quais trabalhei, e há nesta lista algumas que o senador seguramente vê com bons olhos, sempre mantive minha posição de não deixar que interesses se misturem. Cumpro o compromisso de ouvir todos os lados. Como teria feito na última segunda-feira, se me tivesse sido conferida, pelo senador, tal oportunidade. Espero que, na próxima ocasião, Aloysio Nunes se mostre aberto ao diálogo. Sem ofensas, sem simplificações.
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quarta-feira, 27 de outubro de 2010
Turma do Serra desvia R$ 400 milhões em SP
Reproduzo artigo de Leandro Fortes, publicado no sítio da revista CartaCapital:
Quando assumir, pela terceira vez, o governo do estado de São Paulo em 1º de janeiro de 2011, o tucano Geraldo Alckmin terá que prestar contas de um sumiço milionário de recursos federais do Ministério da Saúde dimensionado, em março passado, pelo Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (Denasus). O dinheiro, quase 400 milhões de reais, deveria ter sido usado para garantir remédios de graça para 40 milhões de cidadãos, mas desapareceu na contabilidade dos governos do PSDB nos últimos 10 anos. Por recomendação dos auditores, com base na lei, o governo paulista terá que explicar onde foram parar essas verbas do SUS e, em seguida, ressarcir a União pelo prejuízo.
O relatório do Denasus foi feito a partir de auditorias realizadas em 21 estados. Na contabilidade que vai de janeiro de 1999 e junho de 2009. Por insuficiência de técnicos, restam ainda seis estados a serem auditados. O número de auditores-farmacêuticos do País, os únicos credenciados para esse tipo de fiscalização, não chega a 20. Nesse caso, eles focaram apenas a área de Assistência Farmacêutica Básica, uma das de maior impacto social do SUS. A auditoria foi pedida pelo Departamento de Assistência Farmacêutica (DAF), ligado à Secretaria de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde, para verificar denúncias de desvios de repasses de recursos do SUS para compra e distribuição de medicamentos nos sistemas estaduais de saúde.
O caso de São Paulo não tem parâmetro em nenhuma das demais 20 unidades da federação analisadas pelo Denasus até março de 2010, data de fechamento do relatório final. Depois de vasculhar todas as nuances do modelo de gestão de saúde estadual no setor de medicamentos, os analistas demoraram 10 meses para fechar o texto. No fim das contas, os auditores conseguiram construir um retrato bem acabado do modo tucano de gerenciar a saúde pública, inclusive durante o mandato de José Serra, candidato do PSDB à presidência. No todo, o período analisado atinge os governos de Mário Covas (primeiro ano do segundo mandato, até ele falecer, em março de 2001); dois governos de Geraldo Alckmin (de março de 2001 a março de 2006, quando ele renunciou para ser candidato a presidente); o breve período de Cláudio Lembo, do DEM (até janeiro de 2007); e a gestão de Serra, até março de 2010, um mês antes de ele renunciar para disputar a eleição.
Ao se debruçarem sobre as contas da Secretaria Estadual de Saúde, os auditores descobriram um rombo formidável no setor de medicamentos: 350 milhões de reais repassados pelo SUS para o programa de assistência farmacêutica básica no estado simplesmente desapareceram. O dinheiro deveria ter sido usado para garantir aos usuários potenciais do SUS acesso gratuito a remédios, sobretudo os mais caros, destinados a tratamentos de doenças crônicas e terminais. É um buraco e tanto, mas não é o único.
A avaliação dos auditores detectou, ainda, uma malandragem contábil que permitiu ao governo paulista internalizar 44 milhões de reais do SUS nas contas como se fossem recursos estaduais. Ou seja, pegaram dinheiro repassado pelo governo federal para comprar remédios e misturaram com as receitas estaduais numa conta única da Secretaria de Fazenda, de forma ilegal.
A Constituição Federal determina que para gerenciar dinheiro do SUS os estados abram uma conta específica, de movimentação transparente e facilmente auditável, de modo a garantir a plena fiscalização do Ministério da Saúde e da sociedade. Em São Paulo essa regra não foi seguida. O Denasus constatou que os recursos federais do SUS continuam movimentados na Conta Única do Estado. Os valores são transferidos imediatamente depois de depositados pelo ministério e pelo Fundo Nacional de Saúde (FNS), por meio de Transferência Eletrônica de Dados (TED).
Em fevereiro, reportagem de CartaCapital demonstrou que em três dos mais desenvolvidos estados do País, São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, todos governados pelo PSDB, e no Distrito Federal, durante a gestão do DEM, os recursos do SUS foram, ao longo dos últimos quatro anos, aplicados no mercado financeiro. O fato foi constatado pelo Denasus após um processo de auditoria em todas as 27 unidades da federação. Trata-se de manobra contábil ilegal para incrementar programas estaduais de choque de gestão, como manda a cartilha liberal seguida pelos tucanos e reforçada, agora, na campanha presidencial. Ao todo, de acordo com os auditores, o prejuízo gerado aos sistemas de saúde desses estados passava, à época, de 6,5 bilhões de reais, dos quais mais de 1 bilhão de reais apenas em São Paulo.
Ao analisar as contas paulistas, o Denasus descobriu que somente entre 2006 e 2009, nos governos de Alckmin e Serra, dos 77,8 milhões de reais do SUS aplicados no mercado financeiro paulista, 39,1 milhões deveriam ter sido destinados para programas de assistência farmacêutica – cerca de 11% do montante apurado, agora, apenas no setor de medicamentos, pelos auditores do Denasus. Além do dinheiro de remédios para pacientes pobres, a primeira auditoria descobriu outros desvios de dinheiro para aplicação no mercado financeiro: 12,2 milhões dos programas de gestão, 15,7 da vigilância epidemiológica, 7,7 milhões do combate a DST/Aids e 4,3 milhões da vigilância epidemiológica.
A análise ano a ano dos auditores demonstra ainda uma prática sistemática de utilização de remédios em desacordo com a Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename) estabelecida pelo Ministério da Saúde, atualizada anualmente. A lista engloba medicamentos usados nas doenças mais comuns pelos brasileiros, entre os quais antibióticos, antiinflamatórios, antiácidos e remédios para dor de cabeça. Entre 2006 e 2008, por exemplo, dos 178 medicamentos indicados por um acordo entre a Secretaria de Saúde de São Paulo e o programa de Assistência Farmacêutica Básica do Ministério da Saúde, 37 (20,7%) não atendiam à lista da Rename.
Além disso, o Denasus constatou outra falha. Em 2008, durante o governo Serra, 11,8 milhões do Fundo Nacional de Saúde repassados à Secretaria de Saúde de São Paulo para a compra de remédios foram contabilizados como “contrapartida estadual” no acordo de Assistência Farmacêutica Básica. Ou seja, o governo paulista, depois de jogar o recurso federal na vala comum da Conta Única do Estado, contabilizou o dinheiro como oriundo de receitas estaduais, e não como recurso recebido dos cofres da União.
Apenas em maio, dois meses depois de terminada a auditoria do Denasus, a Secretaria Estadual de Saúde resolveu se manifestar oficialmente sobre os itens detectados pelos auditores. Ao todo, o secretário Luís Roberto Barradas Barata, apontado como responsável direto pelas irregularidades por que era o gestor do sistema, encaminhou 19 justificativas ao Denasus, mas nenhuma delas foi acatada. “Não houve alteração no entendimento inicial da equipe, ficando, portanto, mantidas todas as constatações registradas no relatório final”, escreveram, na conclusão do trabalho, os auditores-farmacêuticos.
Barata faleceu em 17 de julho passado, dois meses depois de o Denasus invalidar as justificativas enviadas por ele. Por essa razão, a discussão entre o Ministério da Saúde e o governo de São Paulo sobre o sumiço dos 400 milhões de reais devidos ao programa de Assistência Farmacêutica Básica vai ser retomada somente no próximo ano, de forma institucional.
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Quando assumir, pela terceira vez, o governo do estado de São Paulo em 1º de janeiro de 2011, o tucano Geraldo Alckmin terá que prestar contas de um sumiço milionário de recursos federais do Ministério da Saúde dimensionado, em março passado, pelo Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (Denasus). O dinheiro, quase 400 milhões de reais, deveria ter sido usado para garantir remédios de graça para 40 milhões de cidadãos, mas desapareceu na contabilidade dos governos do PSDB nos últimos 10 anos. Por recomendação dos auditores, com base na lei, o governo paulista terá que explicar onde foram parar essas verbas do SUS e, em seguida, ressarcir a União pelo prejuízo.
O relatório do Denasus foi feito a partir de auditorias realizadas em 21 estados. Na contabilidade que vai de janeiro de 1999 e junho de 2009. Por insuficiência de técnicos, restam ainda seis estados a serem auditados. O número de auditores-farmacêuticos do País, os únicos credenciados para esse tipo de fiscalização, não chega a 20. Nesse caso, eles focaram apenas a área de Assistência Farmacêutica Básica, uma das de maior impacto social do SUS. A auditoria foi pedida pelo Departamento de Assistência Farmacêutica (DAF), ligado à Secretaria de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde, para verificar denúncias de desvios de repasses de recursos do SUS para compra e distribuição de medicamentos nos sistemas estaduais de saúde.
O caso de São Paulo não tem parâmetro em nenhuma das demais 20 unidades da federação analisadas pelo Denasus até março de 2010, data de fechamento do relatório final. Depois de vasculhar todas as nuances do modelo de gestão de saúde estadual no setor de medicamentos, os analistas demoraram 10 meses para fechar o texto. No fim das contas, os auditores conseguiram construir um retrato bem acabado do modo tucano de gerenciar a saúde pública, inclusive durante o mandato de José Serra, candidato do PSDB à presidência. No todo, o período analisado atinge os governos de Mário Covas (primeiro ano do segundo mandato, até ele falecer, em março de 2001); dois governos de Geraldo Alckmin (de março de 2001 a março de 2006, quando ele renunciou para ser candidato a presidente); o breve período de Cláudio Lembo, do DEM (até janeiro de 2007); e a gestão de Serra, até março de 2010, um mês antes de ele renunciar para disputar a eleição.
Ao se debruçarem sobre as contas da Secretaria Estadual de Saúde, os auditores descobriram um rombo formidável no setor de medicamentos: 350 milhões de reais repassados pelo SUS para o programa de assistência farmacêutica básica no estado simplesmente desapareceram. O dinheiro deveria ter sido usado para garantir aos usuários potenciais do SUS acesso gratuito a remédios, sobretudo os mais caros, destinados a tratamentos de doenças crônicas e terminais. É um buraco e tanto, mas não é o único.
A avaliação dos auditores detectou, ainda, uma malandragem contábil que permitiu ao governo paulista internalizar 44 milhões de reais do SUS nas contas como se fossem recursos estaduais. Ou seja, pegaram dinheiro repassado pelo governo federal para comprar remédios e misturaram com as receitas estaduais numa conta única da Secretaria de Fazenda, de forma ilegal.
A Constituição Federal determina que para gerenciar dinheiro do SUS os estados abram uma conta específica, de movimentação transparente e facilmente auditável, de modo a garantir a plena fiscalização do Ministério da Saúde e da sociedade. Em São Paulo essa regra não foi seguida. O Denasus constatou que os recursos federais do SUS continuam movimentados na Conta Única do Estado. Os valores são transferidos imediatamente depois de depositados pelo ministério e pelo Fundo Nacional de Saúde (FNS), por meio de Transferência Eletrônica de Dados (TED).
Em fevereiro, reportagem de CartaCapital demonstrou que em três dos mais desenvolvidos estados do País, São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, todos governados pelo PSDB, e no Distrito Federal, durante a gestão do DEM, os recursos do SUS foram, ao longo dos últimos quatro anos, aplicados no mercado financeiro. O fato foi constatado pelo Denasus após um processo de auditoria em todas as 27 unidades da federação. Trata-se de manobra contábil ilegal para incrementar programas estaduais de choque de gestão, como manda a cartilha liberal seguida pelos tucanos e reforçada, agora, na campanha presidencial. Ao todo, de acordo com os auditores, o prejuízo gerado aos sistemas de saúde desses estados passava, à época, de 6,5 bilhões de reais, dos quais mais de 1 bilhão de reais apenas em São Paulo.
Ao analisar as contas paulistas, o Denasus descobriu que somente entre 2006 e 2009, nos governos de Alckmin e Serra, dos 77,8 milhões de reais do SUS aplicados no mercado financeiro paulista, 39,1 milhões deveriam ter sido destinados para programas de assistência farmacêutica – cerca de 11% do montante apurado, agora, apenas no setor de medicamentos, pelos auditores do Denasus. Além do dinheiro de remédios para pacientes pobres, a primeira auditoria descobriu outros desvios de dinheiro para aplicação no mercado financeiro: 12,2 milhões dos programas de gestão, 15,7 da vigilância epidemiológica, 7,7 milhões do combate a DST/Aids e 4,3 milhões da vigilância epidemiológica.
A análise ano a ano dos auditores demonstra ainda uma prática sistemática de utilização de remédios em desacordo com a Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename) estabelecida pelo Ministério da Saúde, atualizada anualmente. A lista engloba medicamentos usados nas doenças mais comuns pelos brasileiros, entre os quais antibióticos, antiinflamatórios, antiácidos e remédios para dor de cabeça. Entre 2006 e 2008, por exemplo, dos 178 medicamentos indicados por um acordo entre a Secretaria de Saúde de São Paulo e o programa de Assistência Farmacêutica Básica do Ministério da Saúde, 37 (20,7%) não atendiam à lista da Rename.
Além disso, o Denasus constatou outra falha. Em 2008, durante o governo Serra, 11,8 milhões do Fundo Nacional de Saúde repassados à Secretaria de Saúde de São Paulo para a compra de remédios foram contabilizados como “contrapartida estadual” no acordo de Assistência Farmacêutica Básica. Ou seja, o governo paulista, depois de jogar o recurso federal na vala comum da Conta Única do Estado, contabilizou o dinheiro como oriundo de receitas estaduais, e não como recurso recebido dos cofres da União.
Apenas em maio, dois meses depois de terminada a auditoria do Denasus, a Secretaria Estadual de Saúde resolveu se manifestar oficialmente sobre os itens detectados pelos auditores. Ao todo, o secretário Luís Roberto Barradas Barata, apontado como responsável direto pelas irregularidades por que era o gestor do sistema, encaminhou 19 justificativas ao Denasus, mas nenhuma delas foi acatada. “Não houve alteração no entendimento inicial da equipe, ficando, portanto, mantidas todas as constatações registradas no relatório final”, escreveram, na conclusão do trabalho, os auditores-farmacêuticos.
Barata faleceu em 17 de julho passado, dois meses depois de o Denasus invalidar as justificativas enviadas por ele. Por essa razão, a discussão entre o Ministério da Saúde e o governo de São Paulo sobre o sumiço dos 400 milhões de reais devidos ao programa de Assistência Farmacêutica Básica vai ser retomada somente no próximo ano, de forma institucional.
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Folha vive de rabo preso com o passado
Reproduzo artigo de Ivan Seixas, publicado no sítio Carta Maior:
Sempre suspeita, Folha vive de rabo preso com o passado.
Qual pode ser o interesse da empresa Folha de São Paulo em colocar suas mãos no prontuário de Dilma Roussef, guardado no Supremo Tribunal Militar? Boa coisa não é.
A Folha, que deu carros para o DOI-CODI (Operação Bandeirante) armar ciladas e para transportar presos políticos para longas sessões de torturas, não tem boas intenções. Ela financiou e se beneficiou com a ditadura e acha que aquilo tudo foi uma “ditabranda”.
Como acreditar em algo que parta dessa empresa que cedeu um de seus jornais para o mesmo DOI-CODI usar como panfleto em defesa de seus assassinatos?
Essa empresa e essa família foi protegida pelo DOPS, que colocou o Delegado Roberto Ward como seu segurança particular, quando a esquerda queimou carros de entrega de jornais (aqueles carros que armavam ciladas e transportavam presos para torturas) como alerta de que a colaboração com os assassinos do DOI-CODI havia sido detectado. Seus interesses nunca foram os da sociedade brasileira.
E agora essa empresa, que nunca pediu desculpas pelo trabalho sujo que prestou aos torturadores, faz um cavalo de batalha para ter o “direito” de colocar suas mãos na ficha da candidata Dilma Roussef, às vésperas da votação do segundo turno da eleição presidencial. Nunca apoiou a abertura dos arquivos da repressão militar e agora fala em liberdade de imprensa? Muito suspeito.
Essa empresa já publicou uma “ficha da Dilma” forjada pelos torturadores abrigados e escondidos em sites e blogs de difamação e insulto à democracia. Será que tem mais dessas “fichas da Dilma” para apresentar em seu currículo político?
Ou talvez, produzirá alguma matéria com “a intenção de planejar o sequestro” de alguma figura do passado ainda atuante como fez com a suposta intenção de sequestro de Delfim Neto. Esse é seu estilo. Pegar uma possibilidade e transformá-la em matéria sensacionalista. Sempre a serviço de alguma manobra não explicitada.
O Supremo Tribunal Militar mantém sua posição republicana de não beneficiar ardis eleitorais em benefício ou em detrimento de quem quer que seja. A empresa Folha de São Paulo não comunga de ideais democráticos e republicanos quando insiste abertura seletiva da “ficha da Dilma”. Claro que há segundas intenções nessa manobra oportunista. Pode ser “apenas” vender jornais, mas pode ser algo mais sujo. Como ceder carros para torturadores, ceder um de seus jornais para esses mesmos carrascos, divulgar documentos forjados, defender a ditadura como se fosse ditabranda ou…
Irremediavelmente, a empresa dos Frias está de rabo preso com seu passado sórdido. A gente até que tenta ajudar na atualização da empresa, mas ela não quer.
(*) Integrante da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, filho de Joaquim Alencar de Seixas, militante do Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT) morto em 17/04/1971. Ivan Seixas foi preso pela Operação Bandeirantes, em São Paulo, em abril de 1971, aos 16 anos de idade, junto com seu pai, o metalúrgico Joaquim Seixas. Os dois foram torturados na Oban. Ivan é jornalista e coordenador do primeiro forum de presos e perseguidos políticos de SP.
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Sempre suspeita, Folha vive de rabo preso com o passado.
Qual pode ser o interesse da empresa Folha de São Paulo em colocar suas mãos no prontuário de Dilma Roussef, guardado no Supremo Tribunal Militar? Boa coisa não é.
A Folha, que deu carros para o DOI-CODI (Operação Bandeirante) armar ciladas e para transportar presos políticos para longas sessões de torturas, não tem boas intenções. Ela financiou e se beneficiou com a ditadura e acha que aquilo tudo foi uma “ditabranda”.
Como acreditar em algo que parta dessa empresa que cedeu um de seus jornais para o mesmo DOI-CODI usar como panfleto em defesa de seus assassinatos?
Essa empresa e essa família foi protegida pelo DOPS, que colocou o Delegado Roberto Ward como seu segurança particular, quando a esquerda queimou carros de entrega de jornais (aqueles carros que armavam ciladas e transportavam presos para torturas) como alerta de que a colaboração com os assassinos do DOI-CODI havia sido detectado. Seus interesses nunca foram os da sociedade brasileira.
E agora essa empresa, que nunca pediu desculpas pelo trabalho sujo que prestou aos torturadores, faz um cavalo de batalha para ter o “direito” de colocar suas mãos na ficha da candidata Dilma Roussef, às vésperas da votação do segundo turno da eleição presidencial. Nunca apoiou a abertura dos arquivos da repressão militar e agora fala em liberdade de imprensa? Muito suspeito.
Essa empresa já publicou uma “ficha da Dilma” forjada pelos torturadores abrigados e escondidos em sites e blogs de difamação e insulto à democracia. Será que tem mais dessas “fichas da Dilma” para apresentar em seu currículo político?
Ou talvez, produzirá alguma matéria com “a intenção de planejar o sequestro” de alguma figura do passado ainda atuante como fez com a suposta intenção de sequestro de Delfim Neto. Esse é seu estilo. Pegar uma possibilidade e transformá-la em matéria sensacionalista. Sempre a serviço de alguma manobra não explicitada.
O Supremo Tribunal Militar mantém sua posição republicana de não beneficiar ardis eleitorais em benefício ou em detrimento de quem quer que seja. A empresa Folha de São Paulo não comunga de ideais democráticos e republicanos quando insiste abertura seletiva da “ficha da Dilma”. Claro que há segundas intenções nessa manobra oportunista. Pode ser “apenas” vender jornais, mas pode ser algo mais sujo. Como ceder carros para torturadores, ceder um de seus jornais para esses mesmos carrascos, divulgar documentos forjados, defender a ditadura como se fosse ditabranda ou…
Irremediavelmente, a empresa dos Frias está de rabo preso com seu passado sórdido. A gente até que tenta ajudar na atualização da empresa, mas ela não quer.
(*) Integrante da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, filho de Joaquim Alencar de Seixas, militante do Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT) morto em 17/04/1971. Ivan Seixas foi preso pela Operação Bandeirantes, em São Paulo, em abril de 1971, aos 16 anos de idade, junto com seu pai, o metalúrgico Joaquim Seixas. Os dois foram torturados na Oban. Ivan é jornalista e coordenador do primeiro forum de presos e perseguidos políticos de SP.
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Dossiê Serra: caos na segurança (3)
Por Altamiro Borges
No quesito segurança pública a demagogia tucana até poderia dar cadeia. As estatísticas indicam que de 1996 a 2001 houve um aumento da criminalidade em São Paulo. A partir deste ano, várias prefeituras foram forçadas a criar secretarias especiais de prevenção a crimes e a montar guardas municipais, em função do descaso do governo estadual. Em 2.003, com o advento do Estatuto do Desarmamento, milhares de armas de fogo foram recolhidas.
Estas e outras medidas reduziram a criminalidade, principalmente os homicídios dolosos. Mesmo assim, o quadro de insegurança ainda é grave e atemoriza cada vez mais os paulistas. Em 2008 ocorreram 24 chacinas, com 82 mortos. Nos três trimestres de 2009, houve aumento das várias modalidades criminosas, à exceção dos roubos aos bancos – os banqueiros gozam de privilégios. Neste ano, os casos de chacinas, homicídios e seqüestros relâmpagos voltaram a crescer.
Um cemitério de jovens
Os jovens são as maiores vítimas desta barbárie. O Cemitério São Luiz, na Zona Sul da capital paulista, é um símbolo desta tragédia. Ele reúne o maior número de jovens sepultados por metro quadrado no mundo. Sem política de inteligência e de prevenção, os tucanos apelam para a pura violência policial. Em 2007, 438 pessoas foram mortas pela polícia; em 2008, 431 mortos; e, até setembro de 2009, os policiais mataram 400 pessoas.
Segundo especialistas da área, muitos destes atos de violência sequer são registrados em boletins de ocorrência e muitas vítimas são inocentes. Comunidades carentes, como a Favela Paraisópolis e do Jardim Filhos na Terra, já sofreram brutais ataques policiais. A violência também se agrava com a ação dos grupos de extermínio, como os “highlanders”, esquadrão de morte integrado por policiais do 37º Batalhão da PM. Durante o governo José Serra, o grupo ficou famoso por cortar cabeças e mãos das vítimas para impedir a identificação dos mortos.
A rebelião dos policiais
No que se refere ao sistema penitenciário, o caos também é visível. Ele não oferece aos presos as mínimas condições de reinserção na sociedade. Em vários presídios paulistas, celas superlotadas e sem qualquer asseio obrigam o detentos a fazer rodízio para que todos possam dormir. Faltam funcionários, colchões, remédios e até água. São Paulo conta com 147 unidades prisionais, com capacidade para 96 mil presos. Mas os presídios estão abarrotados com cerca de 150 mil pessoas.
O tenebroso quadro de violência preocupa, inclusive, setores da própria polícia, Civil e Militar. Há muitas críticas à orientação tacanha dos governos tucanos. Os opositores desta política são perseguidos, censurados e punidos. Vários oficiais apontam que não há política de valorização da categoria, que recebe um dos piores salários do país. No ranking nacional, São Paulo aparece como décimo nono em rendimentos. O clima entre os policiais é de revolta, o que ficou patente na guerra campal de novembro de 2009 nas proximidades do Palácio dos Bandeirantes.
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No quesito segurança pública a demagogia tucana até poderia dar cadeia. As estatísticas indicam que de 1996 a 2001 houve um aumento da criminalidade em São Paulo. A partir deste ano, várias prefeituras foram forçadas a criar secretarias especiais de prevenção a crimes e a montar guardas municipais, em função do descaso do governo estadual. Em 2.003, com o advento do Estatuto do Desarmamento, milhares de armas de fogo foram recolhidas.
Estas e outras medidas reduziram a criminalidade, principalmente os homicídios dolosos. Mesmo assim, o quadro de insegurança ainda é grave e atemoriza cada vez mais os paulistas. Em 2008 ocorreram 24 chacinas, com 82 mortos. Nos três trimestres de 2009, houve aumento das várias modalidades criminosas, à exceção dos roubos aos bancos – os banqueiros gozam de privilégios. Neste ano, os casos de chacinas, homicídios e seqüestros relâmpagos voltaram a crescer.
Um cemitério de jovens
Os jovens são as maiores vítimas desta barbárie. O Cemitério São Luiz, na Zona Sul da capital paulista, é um símbolo desta tragédia. Ele reúne o maior número de jovens sepultados por metro quadrado no mundo. Sem política de inteligência e de prevenção, os tucanos apelam para a pura violência policial. Em 2007, 438 pessoas foram mortas pela polícia; em 2008, 431 mortos; e, até setembro de 2009, os policiais mataram 400 pessoas.
Segundo especialistas da área, muitos destes atos de violência sequer são registrados em boletins de ocorrência e muitas vítimas são inocentes. Comunidades carentes, como a Favela Paraisópolis e do Jardim Filhos na Terra, já sofreram brutais ataques policiais. A violência também se agrava com a ação dos grupos de extermínio, como os “highlanders”, esquadrão de morte integrado por policiais do 37º Batalhão da PM. Durante o governo José Serra, o grupo ficou famoso por cortar cabeças e mãos das vítimas para impedir a identificação dos mortos.
A rebelião dos policiais
No que se refere ao sistema penitenciário, o caos também é visível. Ele não oferece aos presos as mínimas condições de reinserção na sociedade. Em vários presídios paulistas, celas superlotadas e sem qualquer asseio obrigam o detentos a fazer rodízio para que todos possam dormir. Faltam funcionários, colchões, remédios e até água. São Paulo conta com 147 unidades prisionais, com capacidade para 96 mil presos. Mas os presídios estão abarrotados com cerca de 150 mil pessoas.
O tenebroso quadro de violência preocupa, inclusive, setores da própria polícia, Civil e Militar. Há muitas críticas à orientação tacanha dos governos tucanos. Os opositores desta política são perseguidos, censurados e punidos. Vários oficiais apontam que não há política de valorização da categoria, que recebe um dos piores salários do país. No ranking nacional, São Paulo aparece como décimo nono em rendimentos. O clima entre os policiais é de revolta, o que ficou patente na guerra campal de novembro de 2009 nas proximidades do Palácio dos Bandeirantes.
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A parceria da Folha com a ditadura
Reproduzo matéria de Rodrigo Vianna, publicada no blog Escrevinhador:
A “Folha” prepara-se para atacar Dilma Rousseff – com uma “reportagem bombástica”. A “Folha” quer mostrar a “Dilma guerrilheira”. Quer abrir arquivos, só os arquivos da Dilma (e os outros?) para gerar constrangimentos à candidata. Ok. Função de jornal não é agradar ninguém. Mas por que a “Folha” não faz o mesmo com o passado de Serra? Como ele viveu no Chile? Por que fugiu do Brasil? Onde foi parar o dinheiro que a UNE tinha guardado num cofre, em 1964, quando Serra presidia a entidade? A “Folha” não quer saber.
Além disso, a “Folha” tem um passado nebuloso de parceria com a ditadura. Não é o jornal mais indicado para levantar nenhuma suspeita, sobre fato nenhum, envolvendo a ditadura.
Republico, abaixo, entrevista desse Escrevinhador (feita no ano passado) com Carlos Eugênio Paz. Ele foi líder da ALN – uma das organizações que lutaram contra a ditadura, de armas na mão. Ele afirma, com todas a letras: “o Sr Frias [pai do atual diretor do jornal] ajudou a financiar a Oban”.
A “Folha é também o jornal que demitiu uma jornalista presa (e torturada) pela ditadura, por “abandono de emprego”. Como você pode ler aqui.
A “Folha” era parceira de um regime que torturava. Tem um mérito: não mudou de lado!
Esse é o jornal que quer investigar o passado de Dilma.
*****
(texto originalmente publicado em abril de 2009)
Carlos Eugênio Paz é um dos entrevistados no documentário “Cidadão Boilesen”, premiado como “melhor filme” no festival “É Tudo Verdade”.
O documentário conta a história de Albert Boilesen, executivo do grupo Ultragás que – segundo várias testemunhas – colaborou ativamente com o DOI-CODI (aparato de tortura e repressão montado durante a ditadura militar), e chegou a assistir sessões de tortura.
Como represália, Boilesen acabou morto por um comando da ALN – a Ação Libertadora Nacional. A ALN era uma das organizações de esquerda armada que lutaram contra a ditadura militar no Brasil.
Carlos Eugênio Paz foi militante da ALN (*). Na luta armada, ele usava o codinome de “Clemente”.
O “Escrevinhador” entrevistou Carlos Eugênio sobre o envolvimento do “Grupo Folha de S. Paulo” com o aparato repressivo: “Houve companheiros que, presos nas mão do DOI-CODI, foram transportados em carros da Folha ”, disse o ex-guerrilheiro. “O Grupo Folha apoiou o golpe de estado, financiou e participou diretamente da repressão e jamais fez autocrítica disso”, acrescentou.
Perguntei a Carlos Eugênio se a ALN planejou alguma ação direta contra a família Frias, na linha da execução de Boilesen: “Não (…), mas poderíamos ter chegado a isso, dada a participação direta deles na guerra, escolhendo o lado da ditadura de direita.”
O envolvimento dos Frias com o DOI-CODI não aparece só nos relatos de ex-militantes.
Em seu livro “Ditadura Escancarada”, Élio Gáspari (hoje, curiosamente, colunista da “Folha”) publica (sem grande alarde, porque ele não está aqui para causar constrangimentos à família Frias) uma informação interessante: “Carros da empresa [Folha] eram emprestados ao DOI, que os usava como cobertura para transportar presos na busca de ‘pontos’” (p. 395).
Podem checar: a frase está lá no livro do Gáspari.
Os Frias nunca negaram o fato. Fingem-se de mortos. Talvez, não seja mais suficiente. Até porque, daqui a pouco pode aparecer alguém pra fazer um documentário sobre o “Cidadão Frias”. Material e testemunhas não faltam.
(a seguir, a íntegra da entrevista com Carlos Eugênio Paz, feita por e-mail)
1) Durante o período em que voce esteve à frente da ALN (1970/1972), soube do envolvimento direto do grupo “Folha” com a OBAN/DOI-CODI?
O Grupo Folha, que apoiou o golpe de estado de direita de 31 de março de 1964 desde suas primeiras horas – basta ver as manchetes, as reportagens e os editoriais da Folha de São Paulo da época -, colaborou diretamente com a repressão política. Carros de suas publicações eram usados para disfarçar investigações e cercos e chegaram inclusive a transportar companheiros presos para o DOI-CODI. Agentes da Operação Bandeirantes serviam-se dos carros do grupo para transitarem sem serem identificados por nós como policiais.
2) A ALN chegou queimar carros da “Folha”? Por quê?
Sim, a Ação Libertadora Nacional queimou vários carros da Folha como represália à participação do Grupo Folha no financiamento da repressão e o uso de seus carros na repressão direta. Ao fazer isso, o Grupo Folha, participando diretamente da guerra, era passível de sofrer as sanções e as represálias da guerra.
3) A Familia Frias teria se mudado para o prédio do jornal, nos anos 70, temendo represálias dos grupos de esquerda. ALN chegou a planejar alguma ação contra o jornal ou os Frias?
A ALN não chegou a planejar nenhuma ação desse tipo, mas poderíamos ter chegado a isso, dada a participação direta deles na guerra, escolhendo o lado da ditadura de direita.
4) ALN chegou a elaborar lista com nomes dos principais financiadores da OBAN? Quem estava nessa lista? Alguém ligado à “Folha” constava? Havia provas contundentes? Sobrou algum documento da organização da época que faça referencia a isso?
A ALN tinha conhecimento de vários financiadores da OBAN. Entre eles estavam o Sr. Frias, Presidente do Grupo Folha, o Presidente da Ultragás, Henning Albert Boilesen, o Presidente do Grupo Ultra, Peri Igel, o Presidente do Banco Brasileiro de Descontos – Bradesco, Amador Aguiar, o Presidente da FIESP, Theobaldo de Nigris, que inclusive cedia a sede desta entidade para reuniões arrecadatórias, e muitos outros.
Havia provas cabais e contundentes. Uma amostra disso foi o justiçamento de Boilensen, que mesmo na época ficou claro ser um quadro do sistema repressivo. Hoje, com o filme “Cidadão Boilesen”, de Chaim Litewski, mais ainda. Como todos sabem, numa luta clandestina pouco se escreve por motivos de segurança, então evitávamos colocar no papel esse tipo de informação. Mesmo assim, alguns companheiros às vezes cometiam esse tipo de erro. Dessa maneira, em alguns aparelhos abandonados às pressas ou tomados pela repressão, chegaram a cair alguns papéis com nomes dessa lista. Quando os arquivos do DOI-CODI forem finalmente abertos, a população poderá tomar conhecimento de muitos fatos como esse.
5) Em seu livro (“Viagem à Luta Armada”) , você relata o caso de Solange (militante que foi torturada na OBAN, sobreviveu, e depois ajudou a reconhecer Boilesen como torturador). Você lembra de algum militante de esquerda ter dado informações diretas, semelhantes às de Solange, sobre a presença de carros da “Folha” nas operações da OBAN?
Lembro sim. Houve companheiros que, presos nas mão do DOI-CODI, foram transportados em carros da Folha. Assim como fiz no caso da companheira Solange, reservo-me o direito de não citar seus nomes, por respeito a eles e às normas de segurança. Quero dizer que compreendo o desejo de sigilo por parte de todos os companheiros da ALN e sempre o respeitarei.
6) Como avaliou o fato de a “Folha” – que nunca se pronunciou sobre esses episódios nebulosos – ter se referido à ditadura como “ditabranda”, em recente editorial?
O Grupo Folha apoiou o golpe de estado, financiou e participou diretamente da repressão e jamais fez autocrítica disso. Aliás, comportamento adotado pela direita brasileira em seu conjunto. Hoje falam de democracia como se tivessem sido democratas a vida inteira. Roberto Marinho, por ocasião de seu falecimento, foi saudado como um democrata, Frias também. Grupos econômicos que financiaram a repressão hoje saúdam a democracia. Um dos defensores e redatores do AI-5, o Cel. Jarbas Passarinho, posa de tolerante e democrata.
Ao mesmo tempo, quando falamos de abrir os arquivos da ditadura, quando pedimos os corpos de nossos desaparecidos para que suas famílias possam enfim chorá-los e descansar, quando queremos saber como esses assassinatos foram perpetrados, muitas vozes se levantam nos acusando de revanchistas. O Grupo Folha está, quando fala de “ditabranda”, onde sempre esteve, à direita da sociedade, e defende a ditadura. Talvez eles achem que se devesse, na época, ter cometido ainda mais e mais graves crimes contra o povo brasileiro.
*****
* A ALN foi comandada por Carlos Marighella até 1969 – quando o legendário militante comunista foi morto numa emboscada na alameda Casa Branca, em São Paulo. No lugar dele, assumiu Joaquim Câmara Fereira, o “Toledo” – que também morreu (sob tortura), em 1970.
Marighella e Toledo eram velhos militantes, formados na escola do Partidão. Romperam com o PCB e lançaram-se à luta armada nos anos 60. Mas sempre foram quadros políticos, mais do que quadros militares.
Depois da morte dos dois, a ALN passou a ser comandada por uma geração que já entrara na militância de armas na mão. Carlos Eugênio Paz fazia parte dessa geração. Quem quiser saber um pouco mais sobre a história de Carls Eugênio/Clemente pode ler:
- “Viagem à Luta Armada”, relato autobiográfico de Carlos Eugênio (Editora BestBolso);
- ou “Clemente” , de Denise Rollemberg – trata-se de um dos capítulos do livro “Perfis Cruzados” (Editora Imago), obra organizada por Beatriz Kushnir.
.
A “Folha” prepara-se para atacar Dilma Rousseff – com uma “reportagem bombástica”. A “Folha” quer mostrar a “Dilma guerrilheira”. Quer abrir arquivos, só os arquivos da Dilma (e os outros?) para gerar constrangimentos à candidata. Ok. Função de jornal não é agradar ninguém. Mas por que a “Folha” não faz o mesmo com o passado de Serra? Como ele viveu no Chile? Por que fugiu do Brasil? Onde foi parar o dinheiro que a UNE tinha guardado num cofre, em 1964, quando Serra presidia a entidade? A “Folha” não quer saber.
Além disso, a “Folha” tem um passado nebuloso de parceria com a ditadura. Não é o jornal mais indicado para levantar nenhuma suspeita, sobre fato nenhum, envolvendo a ditadura.
Republico, abaixo, entrevista desse Escrevinhador (feita no ano passado) com Carlos Eugênio Paz. Ele foi líder da ALN – uma das organizações que lutaram contra a ditadura, de armas na mão. Ele afirma, com todas a letras: “o Sr Frias [pai do atual diretor do jornal] ajudou a financiar a Oban”.
A “Folha é também o jornal que demitiu uma jornalista presa (e torturada) pela ditadura, por “abandono de emprego”. Como você pode ler aqui.
A “Folha” era parceira de um regime que torturava. Tem um mérito: não mudou de lado!
Esse é o jornal que quer investigar o passado de Dilma.
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(texto originalmente publicado em abril de 2009)
Carlos Eugênio Paz é um dos entrevistados no documentário “Cidadão Boilesen”, premiado como “melhor filme” no festival “É Tudo Verdade”.
O documentário conta a história de Albert Boilesen, executivo do grupo Ultragás que – segundo várias testemunhas – colaborou ativamente com o DOI-CODI (aparato de tortura e repressão montado durante a ditadura militar), e chegou a assistir sessões de tortura.
Como represália, Boilesen acabou morto por um comando da ALN – a Ação Libertadora Nacional. A ALN era uma das organizações de esquerda armada que lutaram contra a ditadura militar no Brasil.
Carlos Eugênio Paz foi militante da ALN (*). Na luta armada, ele usava o codinome de “Clemente”.
O “Escrevinhador” entrevistou Carlos Eugênio sobre o envolvimento do “Grupo Folha de S. Paulo” com o aparato repressivo: “Houve companheiros que, presos nas mão do DOI-CODI, foram transportados em carros da Folha ”, disse o ex-guerrilheiro. “O Grupo Folha apoiou o golpe de estado, financiou e participou diretamente da repressão e jamais fez autocrítica disso”, acrescentou.
Perguntei a Carlos Eugênio se a ALN planejou alguma ação direta contra a família Frias, na linha da execução de Boilesen: “Não (…), mas poderíamos ter chegado a isso, dada a participação direta deles na guerra, escolhendo o lado da ditadura de direita.”
O envolvimento dos Frias com o DOI-CODI não aparece só nos relatos de ex-militantes.
Em seu livro “Ditadura Escancarada”, Élio Gáspari (hoje, curiosamente, colunista da “Folha”) publica (sem grande alarde, porque ele não está aqui para causar constrangimentos à família Frias) uma informação interessante: “Carros da empresa [Folha] eram emprestados ao DOI, que os usava como cobertura para transportar presos na busca de ‘pontos’” (p. 395).
Podem checar: a frase está lá no livro do Gáspari.
Os Frias nunca negaram o fato. Fingem-se de mortos. Talvez, não seja mais suficiente. Até porque, daqui a pouco pode aparecer alguém pra fazer um documentário sobre o “Cidadão Frias”. Material e testemunhas não faltam.
(a seguir, a íntegra da entrevista com Carlos Eugênio Paz, feita por e-mail)
1) Durante o período em que voce esteve à frente da ALN (1970/1972), soube do envolvimento direto do grupo “Folha” com a OBAN/DOI-CODI?
O Grupo Folha, que apoiou o golpe de estado de direita de 31 de março de 1964 desde suas primeiras horas – basta ver as manchetes, as reportagens e os editoriais da Folha de São Paulo da época -, colaborou diretamente com a repressão política. Carros de suas publicações eram usados para disfarçar investigações e cercos e chegaram inclusive a transportar companheiros presos para o DOI-CODI. Agentes da Operação Bandeirantes serviam-se dos carros do grupo para transitarem sem serem identificados por nós como policiais.
2) A ALN chegou queimar carros da “Folha”? Por quê?
Sim, a Ação Libertadora Nacional queimou vários carros da Folha como represália à participação do Grupo Folha no financiamento da repressão e o uso de seus carros na repressão direta. Ao fazer isso, o Grupo Folha, participando diretamente da guerra, era passível de sofrer as sanções e as represálias da guerra.
3) A Familia Frias teria se mudado para o prédio do jornal, nos anos 70, temendo represálias dos grupos de esquerda. ALN chegou a planejar alguma ação contra o jornal ou os Frias?
A ALN não chegou a planejar nenhuma ação desse tipo, mas poderíamos ter chegado a isso, dada a participação direta deles na guerra, escolhendo o lado da ditadura de direita.
4) ALN chegou a elaborar lista com nomes dos principais financiadores da OBAN? Quem estava nessa lista? Alguém ligado à “Folha” constava? Havia provas contundentes? Sobrou algum documento da organização da época que faça referencia a isso?
A ALN tinha conhecimento de vários financiadores da OBAN. Entre eles estavam o Sr. Frias, Presidente do Grupo Folha, o Presidente da Ultragás, Henning Albert Boilesen, o Presidente do Grupo Ultra, Peri Igel, o Presidente do Banco Brasileiro de Descontos – Bradesco, Amador Aguiar, o Presidente da FIESP, Theobaldo de Nigris, que inclusive cedia a sede desta entidade para reuniões arrecadatórias, e muitos outros.
Havia provas cabais e contundentes. Uma amostra disso foi o justiçamento de Boilensen, que mesmo na época ficou claro ser um quadro do sistema repressivo. Hoje, com o filme “Cidadão Boilesen”, de Chaim Litewski, mais ainda. Como todos sabem, numa luta clandestina pouco se escreve por motivos de segurança, então evitávamos colocar no papel esse tipo de informação. Mesmo assim, alguns companheiros às vezes cometiam esse tipo de erro. Dessa maneira, em alguns aparelhos abandonados às pressas ou tomados pela repressão, chegaram a cair alguns papéis com nomes dessa lista. Quando os arquivos do DOI-CODI forem finalmente abertos, a população poderá tomar conhecimento de muitos fatos como esse.
5) Em seu livro (“Viagem à Luta Armada”) , você relata o caso de Solange (militante que foi torturada na OBAN, sobreviveu, e depois ajudou a reconhecer Boilesen como torturador). Você lembra de algum militante de esquerda ter dado informações diretas, semelhantes às de Solange, sobre a presença de carros da “Folha” nas operações da OBAN?
Lembro sim. Houve companheiros que, presos nas mão do DOI-CODI, foram transportados em carros da Folha. Assim como fiz no caso da companheira Solange, reservo-me o direito de não citar seus nomes, por respeito a eles e às normas de segurança. Quero dizer que compreendo o desejo de sigilo por parte de todos os companheiros da ALN e sempre o respeitarei.
6) Como avaliou o fato de a “Folha” – que nunca se pronunciou sobre esses episódios nebulosos – ter se referido à ditadura como “ditabranda”, em recente editorial?
O Grupo Folha apoiou o golpe de estado, financiou e participou diretamente da repressão e jamais fez autocrítica disso. Aliás, comportamento adotado pela direita brasileira em seu conjunto. Hoje falam de democracia como se tivessem sido democratas a vida inteira. Roberto Marinho, por ocasião de seu falecimento, foi saudado como um democrata, Frias também. Grupos econômicos que financiaram a repressão hoje saúdam a democracia. Um dos defensores e redatores do AI-5, o Cel. Jarbas Passarinho, posa de tolerante e democrata.
Ao mesmo tempo, quando falamos de abrir os arquivos da ditadura, quando pedimos os corpos de nossos desaparecidos para que suas famílias possam enfim chorá-los e descansar, quando queremos saber como esses assassinatos foram perpetrados, muitas vozes se levantam nos acusando de revanchistas. O Grupo Folha está, quando fala de “ditabranda”, onde sempre esteve, à direita da sociedade, e defende a ditadura. Talvez eles achem que se devesse, na época, ter cometido ainda mais e mais graves crimes contra o povo brasileiro.
*****
* A ALN foi comandada por Carlos Marighella até 1969 – quando o legendário militante comunista foi morto numa emboscada na alameda Casa Branca, em São Paulo. No lugar dele, assumiu Joaquim Câmara Fereira, o “Toledo” – que também morreu (sob tortura), em 1970.
Marighella e Toledo eram velhos militantes, formados na escola do Partidão. Romperam com o PCB e lançaram-se à luta armada nos anos 60. Mas sempre foram quadros políticos, mais do que quadros militares.
Depois da morte dos dois, a ALN passou a ser comandada por uma geração que já entrara na militância de armas na mão. Carlos Eugênio Paz fazia parte dessa geração. Quem quiser saber um pouco mais sobre a história de Carls Eugênio/Clemente pode ler:
- “Viagem à Luta Armada”, relato autobiográfico de Carlos Eugênio (Editora BestBolso);
- ou “Clemente” , de Denise Rollemberg – trata-se de um dos capítulos do livro “Perfis Cruzados” (Editora Imago), obra organizada por Beatriz Kushnir.
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A maracutaia no Metrô e a caradura de Serra
Reproduzo artigo de Brizola Neto, publicado no blog Tijolaço:
Será que o José Serra acha que todo mundo é burro? Será que ele acha que uma dúzia de grandes empreiteiras de obras ia combinar sozinha quem ia pegar cada pedacinho dos 20 quilômetros da linha 5 do metrô de São Paulo sem que ninguém do governo ficasse sabendo? E ainda iam fazer isso reduzindo os preços para ganharem menos na obra?
Que história é essa de dizer que ele não tem nada com isso por ele não ser governador se a licitação foi aberta e “acertada” entre as empreiteiras enquanto ele estava no Palácios dos Bandeirantes?
Tenha paciência, né?! Primeiro, o senhor não conhecia o Sr. Paulo “Obscuro”. Agora, o senhor quer que a gente acredite que ninguém da sua equipe teve nada a ver com a maracutaia de R$4 bilhões da obra do metrô?
O senhor acha que a opinião pública é um bando de beócios?
Como é que o senhor vai dizer que “direcionamento” da licitação não houve? Assim, de plano, sem investigação? O senhor acha que as coisas são assim como fez com Paulo Preto, bastando dizer “não foi ele” e está tudo resolvido?
Mesmo que não tenha sido por ordem sua, o que garante que não foi um dos seus auxiliares que comandou esse arranjo indecoroso? E o que dizer de sua cara de pau em afirmar que “em todo caso isso transcorreu depois da minha saída”?
Quando a Folha de S.Paulo registrou em cartório o resultado da licitação quando o senhor se encontra na plenitude de seus poderes no Palácio dos Bandeirantes.
Pode haver dúvida do seu envolvimento, Sr. Serra. E o senhor, como toda pessoa, tem o direito ao princípio da presunção da inocência. Não é possível, mesmo diante da fraude em uma licitação, acusar ninguém de corrupto sem provas - como, aliás, o senhor faz a torto e a direito com os outros.
Mas do cinismo, isso sim, o senhor já dá provas cabais, mesmo sem qualquer investigação. A sua cara de pau excede e muito àquela que a população, infelizmente, se acostumou a ver nos políticos.
A bancada do PDT na Assembleia de São Paulo está coletando assinaturas para abertura de uma CPI para investigar está manipulação de resultados. Vamos ver se não será mais uma das dezenas de CPI’s que os governos tucanos, especialmente o seu, impediram que fossem instaladas.
Em relação aos seus adversários, o senhor sabe exigir a apuração célere, imediata, impiedosa. Não há problema. Quem se corrompeu que pague por isso. Agora, como dizia minha vó, macaco olha o seu rabo. Aliás, macaco não, tucano!
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Será que o José Serra acha que todo mundo é burro? Será que ele acha que uma dúzia de grandes empreiteiras de obras ia combinar sozinha quem ia pegar cada pedacinho dos 20 quilômetros da linha 5 do metrô de São Paulo sem que ninguém do governo ficasse sabendo? E ainda iam fazer isso reduzindo os preços para ganharem menos na obra?
Que história é essa de dizer que ele não tem nada com isso por ele não ser governador se a licitação foi aberta e “acertada” entre as empreiteiras enquanto ele estava no Palácios dos Bandeirantes?
Tenha paciência, né?! Primeiro, o senhor não conhecia o Sr. Paulo “Obscuro”. Agora, o senhor quer que a gente acredite que ninguém da sua equipe teve nada a ver com a maracutaia de R$4 bilhões da obra do metrô?
O senhor acha que a opinião pública é um bando de beócios?
Como é que o senhor vai dizer que “direcionamento” da licitação não houve? Assim, de plano, sem investigação? O senhor acha que as coisas são assim como fez com Paulo Preto, bastando dizer “não foi ele” e está tudo resolvido?
Mesmo que não tenha sido por ordem sua, o que garante que não foi um dos seus auxiliares que comandou esse arranjo indecoroso? E o que dizer de sua cara de pau em afirmar que “em todo caso isso transcorreu depois da minha saída”?
Quando a Folha de S.Paulo registrou em cartório o resultado da licitação quando o senhor se encontra na plenitude de seus poderes no Palácio dos Bandeirantes.
Pode haver dúvida do seu envolvimento, Sr. Serra. E o senhor, como toda pessoa, tem o direito ao princípio da presunção da inocência. Não é possível, mesmo diante da fraude em uma licitação, acusar ninguém de corrupto sem provas - como, aliás, o senhor faz a torto e a direito com os outros.
Mas do cinismo, isso sim, o senhor já dá provas cabais, mesmo sem qualquer investigação. A sua cara de pau excede e muito àquela que a população, infelizmente, se acostumou a ver nos políticos.
A bancada do PDT na Assembleia de São Paulo está coletando assinaturas para abertura de uma CPI para investigar está manipulação de resultados. Vamos ver se não será mais uma das dezenas de CPI’s que os governos tucanos, especialmente o seu, impediram que fossem instaladas.
Em relação aos seus adversários, o senhor sabe exigir a apuração célere, imediata, impiedosa. Não há problema. Quem se corrompeu que pague por isso. Agora, como dizia minha vó, macaco olha o seu rabo. Aliás, macaco não, tucano!
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O Jornal Nacional e o meteorito de papel
Reproduzo artigo de Washington Araújo, publicado no Observatório da Imprensa:
Ânimos exaltados fazem aflorar ainda mais a partidarização da imprensa no corrente pleito de 2010. Esta é uma campanha presidencial sui generis. Tudo o que não é fato vira notícia e tudo o que tem potencial de notícia deixa de ser divulgado. Chama a atenção o vocabulário corriqueiro dos candidatos à Presidência da República: o adversário é sempre mentiroso, não importa qual seja a situação, a mentira antecede o depoimento, a desfaçatez nubla a face da verdade e o que acusa o outro de mentiroso age da mesma forma e sem a contração de qualquer músculo facial.
Na tarde da quarta-feira (20/10), no Rio de Janeiro, tivemos o próprio "Efeito Borboleta": uma simples bolinha de papel, pesando não mais que 5 ou 8 gramas, bateu na cabeça do candidato José Serra. Mas foi suficiente para produzido o festejado efeito cinematográfico: ocupou espaço nobre no Jornal Nacional, edição mais que caprichada com direito a inserção de vídeo com foto, de entrevista de médico com áudio de repórter, ampliações desmesuradas com o intuito nada ingênuo de transformar o choque de uma bolinha de papel sobre um ser humano com a gravidade e contundência de meteorito se chocando com o planeta Terra.
Fabricação de realidades
A idéia da TV Globo era usar todos os recursos de dramaturgia acessíveis. Apenas a emissora líder não contava com o baixo desempenho da protagonista... Com uma bolinha de papel não dá para escrever capítulo muito emocionante, algo que seja digno de novela das 9.
A edição pareceu resultante de vitamina de atleta olímpico e tinha de tudo mesmo: bolinha de papel tocando o lado esquerdo da calva do presidenciável, caminhada de 20 minutos, presidenciável atendendo chamada no telefone celular, presidenciável passando a mão levemente sobre o lado direito da calva, presidenciável entrando na van, depois saindo da van, voltando a caminhar, e tudo isso tendo como pano de fundo bandeiras vermelhas e azuis, gritos, gente alvoroçada.
Depois corta para entrada do presidenciável em hospital, sinais de tontura e as primeiras aspas ouvidas por testemunhas de que "estou meio grogue". Depois saindo de clínica de saúde com médico dizendo que "o candidato não sofreu qualquer arranhão... nada externo".
Foi esse enredo que atravessou os programas dos presidenciáveis. O de José Serra, carregado de dramaticidade, tendo a locução de repórter desconhecida emulando a voz de Ilze Scamparini, aquela correspondente da TV Globo para assuntos do Vaticano e também da Itália em geral. Emula o rotineiro e grave estilo de enunciar crise cardinalícia ou mesmo morte do pontífice ou então a eleição do novo sucessor no trono de Pedro. Impressiona a avidez com que emissoras de televisão se sentem tão à vontade para criar a realidade que lhes pareça melhor, mais adequada, conveniente ou ao menos plausível.
"Misterioso caso"
Na quinta-feira (21/10), temos discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva embrulhando os parágrafos acima e amarrando todo esse minitiroteiro com barbantes apertados. O aperto de quem denuncia o conteúdo do pacote como farsa, nada mais que farsa. Até o goleiro Rojas, aquele que simulou ter sido atingido por foguete em jogo no Rio de Janeiro, foi mencionado na fala presidencial. Uma vez mais o pano de fundo era desmascarar mais mentiras, mais inverdades, mais falsidade, mais realidade fabricadas.
Na edição do Jornal Nacional de quinta-feira (21/10), repetição de cenas do arquivo do dia anterior acrescidas de aula sobre bolinha de papel, rolo de fita crepe e a teoria pouco convincente – penso – de dois eventos estanques, isolados, completamente distintos. A aula foi ministrada com raro didatismo pelo ex-professor da Unicamp Ricardo Molina de Figueiredo em um veículo e em um horário em que cada segundo vale literalmente ouro em pó. Onde a eternidade é condensada aos 5, 10 ou 15 segundos de matéria levada ao ar.
A TV Globo, ao escolher o especialista Molina, deixou claro que neste jogo quer maior protagonismo. Afinal é o mesmo Molina quem vem abastecendo dezenas de matérias produzidas pelo mesmo Jornal Nacional ao longo das décadas: Seu nome se encontra de alguma forma envolvido com casos como a compra de votos para a reeleição de Fernando Henrique Cardoso; o acidente aéreo com os integrantes da banda Mamonas Assassinas; o pagamento de suborno no caso Waldomiro Diniz; as mortes de Celso Daniel e de Paulo César Farias; os atentados do PCC em São Paulo; e o caso da menina Eloá, em São Paulo.
Apesar da notoriedade, em suas aparições na mídia, o ex-professor Molina comumente faz declarações sobre ações da perícia criminal oficial, mesmo sem nunca ter sido perito criminal oficial. Certamente passará a lustrar mais sua fama com este "misterioso caso da bolinha de papel" na reta final da campanha presidencial de 2010.
De joelhos
Chegamos a uma encruzilhada perigosa em que a credibilidade de boa parte de nossa grande imprensa parece uma vez mais afundar: se dispomos das conclusões e se estas parecem sólidas, quase pétreas, por que não montar as variáveis do problema que possam se harmonizar de forma indolor e quase imperceptível com as conclusões? E é um processo retroalimentado diariamente: primeiro surge na coluna do jornalista Merval Pereira, depois ganha mais substância com o comentário da historiadora Lucia Hippolito na rádio CBN e pronto: logo os engenhosos e incompletos raciocínios pautarão as falas do presidenciável José Serra ao longo do dia.
Para chegar a tais conclusões basta um pouco de paciência: visitar os blogs dos citados e conferir vídeos no Youtube do presidenciável, em especial aqueles com suas aparições nos telejornais das TVs Globo, SBT, Record e Band.
O que é mais escasso no episódio é a ausência total de análises profundas por parte da grande imprensa sobre o acirramento de ânimos de parte a parte. O excesso de uso dos carimbos contendo palavras como "mentira", "inverdade", "falsidade". Revistas e jornais proclamam completa independência dos partidos postulantes à Presidência da República ao mesmo tempo em que os profissionais que assinam suas matérias, colunas e também os simulacros de reportagens não fazem outra coisa que proclamar diária e semanalmente sua profissão de fé na capacidade e experiência demonstrados por seu candidato ao Palácio do Planalto. Tal profissão de fé é sempre recorrente como recorrente tem sido a demonização do tal "outro lado" que atende também pelo nome de "campanha adversária".
Como linha auxiliar da oposição, parte considerável da grande mídia verbaliza o que pode ser apenas intuído por esta campanha. E se a "campanha adversária" decide não deixar passar em branco tão engenhosa estratégia partidária, então veremos que 10 em 10 vezes esta será atacada como atentatória à liberdade de imprensa, estará mostrando ranço autoritário, demonstrará assimetria entre a liturgia que se espera de detentor de cargo público e a função de militante político. E partem para a desqualificação mesmo...
Ao momento, a profundidade (da análise) a que me refiro é tal que uma formiga de joelhos poderia atravessar sem o menor risco de afogamento.
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Ânimos exaltados fazem aflorar ainda mais a partidarização da imprensa no corrente pleito de 2010. Esta é uma campanha presidencial sui generis. Tudo o que não é fato vira notícia e tudo o que tem potencial de notícia deixa de ser divulgado. Chama a atenção o vocabulário corriqueiro dos candidatos à Presidência da República: o adversário é sempre mentiroso, não importa qual seja a situação, a mentira antecede o depoimento, a desfaçatez nubla a face da verdade e o que acusa o outro de mentiroso age da mesma forma e sem a contração de qualquer músculo facial.
Na tarde da quarta-feira (20/10), no Rio de Janeiro, tivemos o próprio "Efeito Borboleta": uma simples bolinha de papel, pesando não mais que 5 ou 8 gramas, bateu na cabeça do candidato José Serra. Mas foi suficiente para produzido o festejado efeito cinematográfico: ocupou espaço nobre no Jornal Nacional, edição mais que caprichada com direito a inserção de vídeo com foto, de entrevista de médico com áudio de repórter, ampliações desmesuradas com o intuito nada ingênuo de transformar o choque de uma bolinha de papel sobre um ser humano com a gravidade e contundência de meteorito se chocando com o planeta Terra.
Fabricação de realidades
A idéia da TV Globo era usar todos os recursos de dramaturgia acessíveis. Apenas a emissora líder não contava com o baixo desempenho da protagonista... Com uma bolinha de papel não dá para escrever capítulo muito emocionante, algo que seja digno de novela das 9.
A edição pareceu resultante de vitamina de atleta olímpico e tinha de tudo mesmo: bolinha de papel tocando o lado esquerdo da calva do presidenciável, caminhada de 20 minutos, presidenciável atendendo chamada no telefone celular, presidenciável passando a mão levemente sobre o lado direito da calva, presidenciável entrando na van, depois saindo da van, voltando a caminhar, e tudo isso tendo como pano de fundo bandeiras vermelhas e azuis, gritos, gente alvoroçada.
Depois corta para entrada do presidenciável em hospital, sinais de tontura e as primeiras aspas ouvidas por testemunhas de que "estou meio grogue". Depois saindo de clínica de saúde com médico dizendo que "o candidato não sofreu qualquer arranhão... nada externo".
Foi esse enredo que atravessou os programas dos presidenciáveis. O de José Serra, carregado de dramaticidade, tendo a locução de repórter desconhecida emulando a voz de Ilze Scamparini, aquela correspondente da TV Globo para assuntos do Vaticano e também da Itália em geral. Emula o rotineiro e grave estilo de enunciar crise cardinalícia ou mesmo morte do pontífice ou então a eleição do novo sucessor no trono de Pedro. Impressiona a avidez com que emissoras de televisão se sentem tão à vontade para criar a realidade que lhes pareça melhor, mais adequada, conveniente ou ao menos plausível.
"Misterioso caso"
Na quinta-feira (21/10), temos discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva embrulhando os parágrafos acima e amarrando todo esse minitiroteiro com barbantes apertados. O aperto de quem denuncia o conteúdo do pacote como farsa, nada mais que farsa. Até o goleiro Rojas, aquele que simulou ter sido atingido por foguete em jogo no Rio de Janeiro, foi mencionado na fala presidencial. Uma vez mais o pano de fundo era desmascarar mais mentiras, mais inverdades, mais falsidade, mais realidade fabricadas.
Na edição do Jornal Nacional de quinta-feira (21/10), repetição de cenas do arquivo do dia anterior acrescidas de aula sobre bolinha de papel, rolo de fita crepe e a teoria pouco convincente – penso – de dois eventos estanques, isolados, completamente distintos. A aula foi ministrada com raro didatismo pelo ex-professor da Unicamp Ricardo Molina de Figueiredo em um veículo e em um horário em que cada segundo vale literalmente ouro em pó. Onde a eternidade é condensada aos 5, 10 ou 15 segundos de matéria levada ao ar.
A TV Globo, ao escolher o especialista Molina, deixou claro que neste jogo quer maior protagonismo. Afinal é o mesmo Molina quem vem abastecendo dezenas de matérias produzidas pelo mesmo Jornal Nacional ao longo das décadas: Seu nome se encontra de alguma forma envolvido com casos como a compra de votos para a reeleição de Fernando Henrique Cardoso; o acidente aéreo com os integrantes da banda Mamonas Assassinas; o pagamento de suborno no caso Waldomiro Diniz; as mortes de Celso Daniel e de Paulo César Farias; os atentados do PCC em São Paulo; e o caso da menina Eloá, em São Paulo.
Apesar da notoriedade, em suas aparições na mídia, o ex-professor Molina comumente faz declarações sobre ações da perícia criminal oficial, mesmo sem nunca ter sido perito criminal oficial. Certamente passará a lustrar mais sua fama com este "misterioso caso da bolinha de papel" na reta final da campanha presidencial de 2010.
De joelhos
Chegamos a uma encruzilhada perigosa em que a credibilidade de boa parte de nossa grande imprensa parece uma vez mais afundar: se dispomos das conclusões e se estas parecem sólidas, quase pétreas, por que não montar as variáveis do problema que possam se harmonizar de forma indolor e quase imperceptível com as conclusões? E é um processo retroalimentado diariamente: primeiro surge na coluna do jornalista Merval Pereira, depois ganha mais substância com o comentário da historiadora Lucia Hippolito na rádio CBN e pronto: logo os engenhosos e incompletos raciocínios pautarão as falas do presidenciável José Serra ao longo do dia.
Para chegar a tais conclusões basta um pouco de paciência: visitar os blogs dos citados e conferir vídeos no Youtube do presidenciável, em especial aqueles com suas aparições nos telejornais das TVs Globo, SBT, Record e Band.
O que é mais escasso no episódio é a ausência total de análises profundas por parte da grande imprensa sobre o acirramento de ânimos de parte a parte. O excesso de uso dos carimbos contendo palavras como "mentira", "inverdade", "falsidade". Revistas e jornais proclamam completa independência dos partidos postulantes à Presidência da República ao mesmo tempo em que os profissionais que assinam suas matérias, colunas e também os simulacros de reportagens não fazem outra coisa que proclamar diária e semanalmente sua profissão de fé na capacidade e experiência demonstrados por seu candidato ao Palácio do Planalto. Tal profissão de fé é sempre recorrente como recorrente tem sido a demonização do tal "outro lado" que atende também pelo nome de "campanha adversária".
Como linha auxiliar da oposição, parte considerável da grande mídia verbaliza o que pode ser apenas intuído por esta campanha. E se a "campanha adversária" decide não deixar passar em branco tão engenhosa estratégia partidária, então veremos que 10 em 10 vezes esta será atacada como atentatória à liberdade de imprensa, estará mostrando ranço autoritário, demonstrará assimetria entre a liturgia que se espera de detentor de cargo público e a função de militante político. E partem para a desqualificação mesmo...
Ao momento, a profundidade (da análise) a que me refiro é tal que uma formiga de joelhos poderia atravessar sem o menor risco de afogamento.
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O "vírus oportunista" na campanha eleitoral
Reproduzo entrevista de Frei Betto ao jornal Folha de S.Paulo:
Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, 66, afirma que a forma como são abordados religião e aborto nesta campanha está "plantando no Brasil as sementes de um possível fundamentalismo religioso".
O frade dominicano responsabiliza a própria Igreja Católica por introduzir um "vírus oportunista" na disputa eleitoral.
E define como "oportunistas desesperados" os bispos da Regional Sul 1 da CNBB (São Paulo) que assinaram no fim de agosto uma nota, depois tornada panfleto, recomendando aos fieis não votar em candidatos do PT.
Em entrevista à Folha, o religioso analisa que os temas ganharam espaço na agenda porque "lidam com o emocional do brasileiro". "Na América Latina, a porta da razão é o coração, e a chave do coração é a religião. A religião tem um peso muito grande na concepção de mundo, de vida, de pessoa, que a população elabora."
Amigo do presidente Lula, de quem foi assessor entre 2003 e 2004 e a quem depois manteve apoio crítico, e eleitor de Dilma Rousseff, Frei Betto defende que as políticas sociais do atual governo evitaram milhões de mortes de crianças e, por isso, discuti-las é mais importante do que debater o aborto.
Desde que deixou o cargo de assessor de Lula, o sr. manteve um apoio crítico ao governo, um certo distanciamento. A pauta religiosa - ou a forma como ela foi introduzida na campanha - lhe reaproximou do governo e do PT?
Eu nunca me distanciei. Sempre apoiei o governo, embora fazendo críticas. O governo Lula é o melhor da nossa história republicana, mas não tão ideal quanto eu gostaria, porque não promoveu, por exemplo, nenhuma reforma na estrutura social brasileira, principalmente a reforma agrária.
Mas nunca deixei de dar o meu apoio, embora tenha escrito dois livros de análise do governo, mostrando os lados positivos e as críticas que tenho, que foram "A mosca azul" e "O calendário do poder", ambos publicados pela Rocco. Desde o início do processo eleitoral, embora seja amigo e admire muito a Marina Silva, no início até pensei que Dilma venceria com facilidade e que poderia apoiá-la [Marina], mas depois decidi apoiar a candidata do PT.
Mas você entrou com mais força na campanha por conta da pauta religiosa, sem a qual talvez não tivesse entrado tanto?
Eu teria entrado de qualquer maneira dando meu apoio, dentro das minhas limitações. Agora essa pauta me constrange duplamente, como cidadão e como religioso. Porque numa campanha eleitoral, penso que o mais importante é discutir o projeto Brasil. Mas como entrou o que considero um vírus oportunista, o tema do aborto e o tema religioso, lamentavelmente as duas campanhas tiveram, sobretudo agora no segundo turno, que ser desviadas para essas questões, que são bastante pontuais. Não são questões que dizem respeito ao projeto Brasil de futuro. Ou, em outras palavras: mais do que se posicionar agora na questão do aborto é se posicionar em relação às políticas sociais que evitam a morte de milhões de crianças. Nenhuma mulher, nenhuma, mesmo aquela que aprova a total liberalização do direito ao aborto, é feliz por fazer um aborto.
Agora o que uma parcela conservadora da Igreja se esquece é que políticas sociais evitam milhões de abortos. Porque as mulheres, quando fazem, é por insegurança, frente a um futuro incerto, de miséria, de seus filhos. Esses 7,5 anos do governo Lula certamente permitiram que milhares de mulheres que teriam pensado em aborto assumissem a gravidez. Tiveram seus filhos porque se sentem amparadas por uma certa distribuição de renda que efetivamente ocorreu no governo Lula, tirando milhões de pessoas da miséria.
Por que aborto, crença e religião entraram tão fortemente na pauta da campanha?
Porque eles lidam com o emocional do brasileiro. Como o latino-americano em geral, a primeira visão de mundo que o brasileiro tem é de conotação religiosa. Sempre digo que, na América Latina, a porta da razão é o coração, e a chave do coração é a religião. A religião tem um peso muito grande na concepção de mundo, de vida, de pessoa, que a população elabora.
Mas não foi a população que levou esse tema [à campanha], foram alguns oportunistas que, desesperados e querendo desvirtuar a campanha eleitoral, introduziram esses temas como se eles fossem fundamentais.
O próprio aborto é decorrência, na maior parte, das próprias condições sociais de uma parcela considerável da população.
Quem são esses oportunistas?
Primeiro os três bispos que assinaram aquela nota contra a Dilma, diga-se de passagem à revelia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Realmente eles se puseram no palanque, sinalizando diretamente uma candidata com acusações que considero infundadas, injustificadas e falsas.
A Dilma, que já defendeu a descriminalização do aborto, recuou em relação ao tema.
Respeito a posição dela. Agora eu, pessoalmente, como frade, como religioso, como católico, sou a favor da descriminalização em determinados casos. Pode colocar aí com todas as letras. Porque conheço experiências em outros países, como a França, em que a descriminalização evitou milhões de abortos. Mulheres foram convencidas a ter o filho dentro de gravidez indesejada. Então todas as estatísticas comprovam que a descriminalização favorece mais a vida do que a criminalização. É importante que se diga isso, na minha boca. Na Itália, que é o país do Vaticano, predominantemente católico, foi aprovada a descriminalização.
O sr. acha que o recuo da Dilma é preço eleitoral a pagar?
Respeito a posição dos candidatos, tanto da Dilma quanto do Serra, sobre essas questões. Não vou me arvorar em juiz de ninguém. Como disse, acho que esse é um tema secundário no processo eleitoral e no projeto Brasil.
Pelo que se supõe, já que não há muita clareza nos candidatos, nem Dilma nem Serra são favoráveis ao aborto em si, mas ambos parecem abertos a discutir sua descriminalização. Por que é tão difícil para ambos debater esse tema com clareza e honestidade?
Porque é um tema que os surpreende. Não é um tema fundamental numa campanha presidencial. É um vírus oportunista, numa campanha em que você tem que discutir a infraestrutura do país, os programas sociais, a questão energética, a preservação ambiental. Entendo que eles se sintam constrangidos a ter que se calar diante dos temas importantes para a nação brasileira e entrar num viés que infelizmente está plantando no Brasil as sementes de um possível fundamentalismo religioso.
Como o sr. vê a participação direta de bispos, padres e pastores na campanha, pregando contra ou a favor de um ou outro candidato?
Eu defendo o direito de que qualquer cidadão brasileiro, seja bispo, seja até o papa, tenha a sua posição e a manifeste. O que considero um abuso é, em nome de uma instituição como a Igreja, como a CNBB, alguém se posicionar tentando direcionar o eleitorado. Eu, por exemplo, posso, como Frei Betto, manifestar a minha preferência eleitoral. Mas não posso, como a Ordem Dominicana a qual eu pertenço, dizer uma palavra sobre isso. Considero um abuso.
E a participação de uma diocese da CNBB na produção de panfletos recomendando fieis a não votarem na Dilma?
É uma posição ultramontana, abusiva, de tentar controlar a consciência dos fieis através de mentiras, de ilações injustificadas.
O sr. acredita, como aponta o PT, que o PSDB está por trás da produção dos panfletos?
Não, não posso me posicionar. Só me posiciono naquilo em que tenho provas e evidências. Prefiro não falar sobre isso.
Quais as diferenças de tratamento do tema aborto nas diferentes religiões?
Ih, meu caro, isso é muito complexo. Agora, na rua... Eu estou na rua, indo para a PUC [para ato de apoio a Dilma, na última terça à noite]. Para entrar nesse detalhe... Eu escrevi um artigo até para a Folha, anos atrás, sobre a questão do aborto. É muito delicado analisar as diferenças. Há nuances. Mesmo dentro da Igreja Católica há diferentes posições sobre quando é que o feto realmente se transforma num ser vivo. Não é uma questão fechada na Igreja. Ainda não há, nem do ponto de vista do papa, uma questão dizendo: o feto é um ser vivo a partir de tal data. É uma questão em discussão, teologicamente inclusive. São Tomás de Aquino dizia que 40 dias depois de engravidar. Isso aí depende muito, é uma questão em aberto.
Em artigo recente na Folha, o sr. disse que conhecia Dilma e que ela é "pessoa de fé cristã, formada na Igreja Católica". O que diria sobre a formação e a religiosidade de Serra?
Eu sou amigo do Serra, de muitos anos, desde a época do movimento estudantil. Nunca soube das suas opções religiosas. Da Dilma sim, porque fui vizinho dela na infância [em Belo Horizonte], estivemos juntos no mesmo cárcere aqui em São Paulo, onde ela participou de celebrações, e também no governo. Não posso de maneira alguma me posicionar em relação ao Serra. Respeito a religiosidade dele.
Se você me perguntasse antes da campanha sobre a posição religiosa do Serra, eu diria: não sei. Mas considero uma pessoa muito sensata, que respeita crenças religiosas, a tolerância religiosa, a liberdade religiosa. Nesse ponto os dois candidatos coincidem.
O que achou do material de campanha de Serra que destaca a frase "Jesus é a verdade e a vida" junto a uma foto do candidato?
Não cheguei a ver e duvido que seja material de campanha dele. Como bom mineiro, fico com pé atrás. Será que é material de campanha, será que é apócrifo?... Agora mesmo estão distribuindo na internet um texto, que me enviou hoje o senador [Eduardo] Suplicy, [intitulado] "13 razões para não votar em Dilma", com a logomarca da Folha, de um artigo que eu teria publicado na Folha, assinado por mim. Não dá para dizer que [o santinho] é da campanha dele.
Mas tem foto dele, o número dele [tem inclusive o CNPJ da coligação]...
Bem, espero que a campanha, o comitê dele desminta isso e, se não desmentir, quem cala, consente.
No mesmo artigo o sr. diz que torturadores praticavam "ateísmo militante". O sr. não respeita quem não crê em Deus?
Meu caro, eu tenho inúmeros amigos ateus. Nenhum deles tirou do contexto essa frase. Com essa pergunta você me permite aclarar uma coisa muito importante: que a pessoa professe ateísmo, tem todo o meu apoio, é um direito dentro de um mundo secularizado, de plena liberdade religiosa.
Agora, a minha concepção de Deus é que Deus se manifesta no ser humano. Então toda vez que alguém viola o ser humano, violenta, oprime, está realizando o ateísmo militante. Ateus que reivindicam o fim dos crucifixos em lugares públicos, o nome de Deus na Constituição - isso não é ateísmo militante, isso é laicismo, que eu apoio. O ateísmo militante para mim é profanar o templo vivo de Deus, que é o ser humano.
Tiraram do contexto, não entenderam...
É que houve queixas de ateus em relação àquele trecho do seu artigo, tido como discriminatório...
Podem ter se sentido ofendidos por não terem percebido isso. Para mim o ateísmo militante é você negar Deus lá onde, na concepção cristã, ele se manifesta, que é no ser humano. Você professar o ateísmo é um direito que eu defendo ardorosamente. Agora, você não pode é chutar a santa, como fez aquele pastor na Record. Ou seja, eu posso ser ateu, como eu sou cristão, mas eu não digo que a fé do muçulmano é um embuste ou que a fé do espírita é uma fantasia. Isso é um desrespeito.
O sr. relatou no artigo que encontrou Dilma no presídio Tiradentes [em São Paulo] e que lá fizeram orações. Como foram esses encontros?
Ela estava presa na ala feminina, eu na ala masculina e, como religioso, eu tinha direito de, aos domingos, passar para a ala feminina para fazer celebrações. E ela participava. O diretor do presídio autorizava isso.
O sr. já comparou o Bolsa Família a uma "esmola permanente"...
[interrompendo] Não, eu não usei essa expressão. Eu sempre falei que o Bolsa Família é um programa assistencialista e o Fome Zero era um programa emancipatório. Nunca chamei de esmola não. Se saiu isso aí, puseram na minha boca.
Deixa eu buscar aqui o contexto exato...
Quero ver o contexto. Dito assim como você falou agora eu não falei isso não.
Vou achar aqui o texto, espera aí.
Bem, mas não importa o que eu disse. Eu te digo agora o seguinte: o Bolsa Família é um programa compensatório e o Fome Zero era um programa emancipatório.
Você falou o seguinte [numa entrevista à Folha em 2007]: "Até hoje o Bolsa Família não tem porta de saída. O governo inteiro sabe qual é, mas não tem coragem: é a reforma agrária, a única maneira de 11 milhões de famílias passarem a produzir a própria renda e ficarem independentes, emancipadas do poder público. Você não pode fazer política social para manter as pessoas sob uma esmola permanente. Nem por isso considero o Bolsa Família negativo, devo dizer isso. O problema é que não pode se perenizar".
Ótimo que você pegou o texto, muito bem, é isso mesmo. Veja bem, não vamos tirar de contexto não.
O que o sr. pensa do Bolsa Família hoje?
Isso que eu te falei: é um programa compensatório. Eu gostaria que voltasse o Fome Zero, que tem um caráter emancipatório, tinha porta de saída para as famílias. E o Bolsa Família, embora seja positivo, até hoje não encontrou a porta de saída, o que eu lamento.
O sr. continua a ser um defensor inconteste do regime cubano? Ainda é amigo de Fidel?
Não, veja bem. A sua afirmação... Não põe na minha boca o que você acabou de falar. Eu sou solidário à Revolução Cubana. Eu faço um trabalho em Cuba há muitos anos, de reaproximação da Igreja e do Estado. Estou muito agradecido a Deus e feliz por poder ajudar esse processo, que resultou recentemente na liberação de vários presos políticos.
O sr. participou diretamente desse processo, dessa última libertação?
Indiretamente sim. Mas não é ainda o momento de eu entrar em detalhes.
O sr. acha que essa tendência de abertura do regime é inexorável?
Sim, claro, tem que haver mudanças. Cuba está preocupada em se adaptar. Mas nada disso indica a volta ao capitalismo.
Sobre o desrespeito aos direitos humanos em Cuba, ainda há presos políticos...
Meu caro, ninguém desrespeita mais os direitos humanos no mundo do que os Estados Unidos. E fala-se pouco, lamentavelmente. Basta ver o que os Estados Unidos fazem em Guantánamo.
Cuba ocupa o 51º no Índice de Desenvolvimento Humano da ONU, que é insuspeito. O Brasil, o 75º.
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Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, 66, afirma que a forma como são abordados religião e aborto nesta campanha está "plantando no Brasil as sementes de um possível fundamentalismo religioso".
O frade dominicano responsabiliza a própria Igreja Católica por introduzir um "vírus oportunista" na disputa eleitoral.
E define como "oportunistas desesperados" os bispos da Regional Sul 1 da CNBB (São Paulo) que assinaram no fim de agosto uma nota, depois tornada panfleto, recomendando aos fieis não votar em candidatos do PT.
Em entrevista à Folha, o religioso analisa que os temas ganharam espaço na agenda porque "lidam com o emocional do brasileiro". "Na América Latina, a porta da razão é o coração, e a chave do coração é a religião. A religião tem um peso muito grande na concepção de mundo, de vida, de pessoa, que a população elabora."
Amigo do presidente Lula, de quem foi assessor entre 2003 e 2004 e a quem depois manteve apoio crítico, e eleitor de Dilma Rousseff, Frei Betto defende que as políticas sociais do atual governo evitaram milhões de mortes de crianças e, por isso, discuti-las é mais importante do que debater o aborto.
Desde que deixou o cargo de assessor de Lula, o sr. manteve um apoio crítico ao governo, um certo distanciamento. A pauta religiosa - ou a forma como ela foi introduzida na campanha - lhe reaproximou do governo e do PT?
Eu nunca me distanciei. Sempre apoiei o governo, embora fazendo críticas. O governo Lula é o melhor da nossa história republicana, mas não tão ideal quanto eu gostaria, porque não promoveu, por exemplo, nenhuma reforma na estrutura social brasileira, principalmente a reforma agrária.
Mas nunca deixei de dar o meu apoio, embora tenha escrito dois livros de análise do governo, mostrando os lados positivos e as críticas que tenho, que foram "A mosca azul" e "O calendário do poder", ambos publicados pela Rocco. Desde o início do processo eleitoral, embora seja amigo e admire muito a Marina Silva, no início até pensei que Dilma venceria com facilidade e que poderia apoiá-la [Marina], mas depois decidi apoiar a candidata do PT.
Mas você entrou com mais força na campanha por conta da pauta religiosa, sem a qual talvez não tivesse entrado tanto?
Eu teria entrado de qualquer maneira dando meu apoio, dentro das minhas limitações. Agora essa pauta me constrange duplamente, como cidadão e como religioso. Porque numa campanha eleitoral, penso que o mais importante é discutir o projeto Brasil. Mas como entrou o que considero um vírus oportunista, o tema do aborto e o tema religioso, lamentavelmente as duas campanhas tiveram, sobretudo agora no segundo turno, que ser desviadas para essas questões, que são bastante pontuais. Não são questões que dizem respeito ao projeto Brasil de futuro. Ou, em outras palavras: mais do que se posicionar agora na questão do aborto é se posicionar em relação às políticas sociais que evitam a morte de milhões de crianças. Nenhuma mulher, nenhuma, mesmo aquela que aprova a total liberalização do direito ao aborto, é feliz por fazer um aborto.
Agora o que uma parcela conservadora da Igreja se esquece é que políticas sociais evitam milhões de abortos. Porque as mulheres, quando fazem, é por insegurança, frente a um futuro incerto, de miséria, de seus filhos. Esses 7,5 anos do governo Lula certamente permitiram que milhares de mulheres que teriam pensado em aborto assumissem a gravidez. Tiveram seus filhos porque se sentem amparadas por uma certa distribuição de renda que efetivamente ocorreu no governo Lula, tirando milhões de pessoas da miséria.
Por que aborto, crença e religião entraram tão fortemente na pauta da campanha?
Porque eles lidam com o emocional do brasileiro. Como o latino-americano em geral, a primeira visão de mundo que o brasileiro tem é de conotação religiosa. Sempre digo que, na América Latina, a porta da razão é o coração, e a chave do coração é a religião. A religião tem um peso muito grande na concepção de mundo, de vida, de pessoa, que a população elabora.
Mas não foi a população que levou esse tema [à campanha], foram alguns oportunistas que, desesperados e querendo desvirtuar a campanha eleitoral, introduziram esses temas como se eles fossem fundamentais.
O próprio aborto é decorrência, na maior parte, das próprias condições sociais de uma parcela considerável da população.
Quem são esses oportunistas?
Primeiro os três bispos que assinaram aquela nota contra a Dilma, diga-se de passagem à revelia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Realmente eles se puseram no palanque, sinalizando diretamente uma candidata com acusações que considero infundadas, injustificadas e falsas.
A Dilma, que já defendeu a descriminalização do aborto, recuou em relação ao tema.
Respeito a posição dela. Agora eu, pessoalmente, como frade, como religioso, como católico, sou a favor da descriminalização em determinados casos. Pode colocar aí com todas as letras. Porque conheço experiências em outros países, como a França, em que a descriminalização evitou milhões de abortos. Mulheres foram convencidas a ter o filho dentro de gravidez indesejada. Então todas as estatísticas comprovam que a descriminalização favorece mais a vida do que a criminalização. É importante que se diga isso, na minha boca. Na Itália, que é o país do Vaticano, predominantemente católico, foi aprovada a descriminalização.
O sr. acha que o recuo da Dilma é preço eleitoral a pagar?
Respeito a posição dos candidatos, tanto da Dilma quanto do Serra, sobre essas questões. Não vou me arvorar em juiz de ninguém. Como disse, acho que esse é um tema secundário no processo eleitoral e no projeto Brasil.
Pelo que se supõe, já que não há muita clareza nos candidatos, nem Dilma nem Serra são favoráveis ao aborto em si, mas ambos parecem abertos a discutir sua descriminalização. Por que é tão difícil para ambos debater esse tema com clareza e honestidade?
Porque é um tema que os surpreende. Não é um tema fundamental numa campanha presidencial. É um vírus oportunista, numa campanha em que você tem que discutir a infraestrutura do país, os programas sociais, a questão energética, a preservação ambiental. Entendo que eles se sintam constrangidos a ter que se calar diante dos temas importantes para a nação brasileira e entrar num viés que infelizmente está plantando no Brasil as sementes de um possível fundamentalismo religioso.
Como o sr. vê a participação direta de bispos, padres e pastores na campanha, pregando contra ou a favor de um ou outro candidato?
Eu defendo o direito de que qualquer cidadão brasileiro, seja bispo, seja até o papa, tenha a sua posição e a manifeste. O que considero um abuso é, em nome de uma instituição como a Igreja, como a CNBB, alguém se posicionar tentando direcionar o eleitorado. Eu, por exemplo, posso, como Frei Betto, manifestar a minha preferência eleitoral. Mas não posso, como a Ordem Dominicana a qual eu pertenço, dizer uma palavra sobre isso. Considero um abuso.
E a participação de uma diocese da CNBB na produção de panfletos recomendando fieis a não votarem na Dilma?
É uma posição ultramontana, abusiva, de tentar controlar a consciência dos fieis através de mentiras, de ilações injustificadas.
O sr. acredita, como aponta o PT, que o PSDB está por trás da produção dos panfletos?
Não, não posso me posicionar. Só me posiciono naquilo em que tenho provas e evidências. Prefiro não falar sobre isso.
Quais as diferenças de tratamento do tema aborto nas diferentes religiões?
Ih, meu caro, isso é muito complexo. Agora, na rua... Eu estou na rua, indo para a PUC [para ato de apoio a Dilma, na última terça à noite]. Para entrar nesse detalhe... Eu escrevi um artigo até para a Folha, anos atrás, sobre a questão do aborto. É muito delicado analisar as diferenças. Há nuances. Mesmo dentro da Igreja Católica há diferentes posições sobre quando é que o feto realmente se transforma num ser vivo. Não é uma questão fechada na Igreja. Ainda não há, nem do ponto de vista do papa, uma questão dizendo: o feto é um ser vivo a partir de tal data. É uma questão em discussão, teologicamente inclusive. São Tomás de Aquino dizia que 40 dias depois de engravidar. Isso aí depende muito, é uma questão em aberto.
Em artigo recente na Folha, o sr. disse que conhecia Dilma e que ela é "pessoa de fé cristã, formada na Igreja Católica". O que diria sobre a formação e a religiosidade de Serra?
Eu sou amigo do Serra, de muitos anos, desde a época do movimento estudantil. Nunca soube das suas opções religiosas. Da Dilma sim, porque fui vizinho dela na infância [em Belo Horizonte], estivemos juntos no mesmo cárcere aqui em São Paulo, onde ela participou de celebrações, e também no governo. Não posso de maneira alguma me posicionar em relação ao Serra. Respeito a religiosidade dele.
Se você me perguntasse antes da campanha sobre a posição religiosa do Serra, eu diria: não sei. Mas considero uma pessoa muito sensata, que respeita crenças religiosas, a tolerância religiosa, a liberdade religiosa. Nesse ponto os dois candidatos coincidem.
O que achou do material de campanha de Serra que destaca a frase "Jesus é a verdade e a vida" junto a uma foto do candidato?
Não cheguei a ver e duvido que seja material de campanha dele. Como bom mineiro, fico com pé atrás. Será que é material de campanha, será que é apócrifo?... Agora mesmo estão distribuindo na internet um texto, que me enviou hoje o senador [Eduardo] Suplicy, [intitulado] "13 razões para não votar em Dilma", com a logomarca da Folha, de um artigo que eu teria publicado na Folha, assinado por mim. Não dá para dizer que [o santinho] é da campanha dele.
Mas tem foto dele, o número dele [tem inclusive o CNPJ da coligação]...
Bem, espero que a campanha, o comitê dele desminta isso e, se não desmentir, quem cala, consente.
No mesmo artigo o sr. diz que torturadores praticavam "ateísmo militante". O sr. não respeita quem não crê em Deus?
Meu caro, eu tenho inúmeros amigos ateus. Nenhum deles tirou do contexto essa frase. Com essa pergunta você me permite aclarar uma coisa muito importante: que a pessoa professe ateísmo, tem todo o meu apoio, é um direito dentro de um mundo secularizado, de plena liberdade religiosa.
Agora, a minha concepção de Deus é que Deus se manifesta no ser humano. Então toda vez que alguém viola o ser humano, violenta, oprime, está realizando o ateísmo militante. Ateus que reivindicam o fim dos crucifixos em lugares públicos, o nome de Deus na Constituição - isso não é ateísmo militante, isso é laicismo, que eu apoio. O ateísmo militante para mim é profanar o templo vivo de Deus, que é o ser humano.
Tiraram do contexto, não entenderam...
É que houve queixas de ateus em relação àquele trecho do seu artigo, tido como discriminatório...
Podem ter se sentido ofendidos por não terem percebido isso. Para mim o ateísmo militante é você negar Deus lá onde, na concepção cristã, ele se manifesta, que é no ser humano. Você professar o ateísmo é um direito que eu defendo ardorosamente. Agora, você não pode é chutar a santa, como fez aquele pastor na Record. Ou seja, eu posso ser ateu, como eu sou cristão, mas eu não digo que a fé do muçulmano é um embuste ou que a fé do espírita é uma fantasia. Isso é um desrespeito.
O sr. relatou no artigo que encontrou Dilma no presídio Tiradentes [em São Paulo] e que lá fizeram orações. Como foram esses encontros?
Ela estava presa na ala feminina, eu na ala masculina e, como religioso, eu tinha direito de, aos domingos, passar para a ala feminina para fazer celebrações. E ela participava. O diretor do presídio autorizava isso.
O sr. já comparou o Bolsa Família a uma "esmola permanente"...
[interrompendo] Não, eu não usei essa expressão. Eu sempre falei que o Bolsa Família é um programa assistencialista e o Fome Zero era um programa emancipatório. Nunca chamei de esmola não. Se saiu isso aí, puseram na minha boca.
Deixa eu buscar aqui o contexto exato...
Quero ver o contexto. Dito assim como você falou agora eu não falei isso não.
Vou achar aqui o texto, espera aí.
Bem, mas não importa o que eu disse. Eu te digo agora o seguinte: o Bolsa Família é um programa compensatório e o Fome Zero era um programa emancipatório.
Você falou o seguinte [numa entrevista à Folha em 2007]: "Até hoje o Bolsa Família não tem porta de saída. O governo inteiro sabe qual é, mas não tem coragem: é a reforma agrária, a única maneira de 11 milhões de famílias passarem a produzir a própria renda e ficarem independentes, emancipadas do poder público. Você não pode fazer política social para manter as pessoas sob uma esmola permanente. Nem por isso considero o Bolsa Família negativo, devo dizer isso. O problema é que não pode se perenizar".
Ótimo que você pegou o texto, muito bem, é isso mesmo. Veja bem, não vamos tirar de contexto não.
O que o sr. pensa do Bolsa Família hoje?
Isso que eu te falei: é um programa compensatório. Eu gostaria que voltasse o Fome Zero, que tem um caráter emancipatório, tinha porta de saída para as famílias. E o Bolsa Família, embora seja positivo, até hoje não encontrou a porta de saída, o que eu lamento.
O sr. continua a ser um defensor inconteste do regime cubano? Ainda é amigo de Fidel?
Não, veja bem. A sua afirmação... Não põe na minha boca o que você acabou de falar. Eu sou solidário à Revolução Cubana. Eu faço um trabalho em Cuba há muitos anos, de reaproximação da Igreja e do Estado. Estou muito agradecido a Deus e feliz por poder ajudar esse processo, que resultou recentemente na liberação de vários presos políticos.
O sr. participou diretamente desse processo, dessa última libertação?
Indiretamente sim. Mas não é ainda o momento de eu entrar em detalhes.
O sr. acha que essa tendência de abertura do regime é inexorável?
Sim, claro, tem que haver mudanças. Cuba está preocupada em se adaptar. Mas nada disso indica a volta ao capitalismo.
Sobre o desrespeito aos direitos humanos em Cuba, ainda há presos políticos...
Meu caro, ninguém desrespeita mais os direitos humanos no mundo do que os Estados Unidos. E fala-se pouco, lamentavelmente. Basta ver o que os Estados Unidos fazem em Guantánamo.
Cuba ocupa o 51º no Índice de Desenvolvimento Humano da ONU, que é insuspeito. O Brasil, o 75º.
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terça-feira, 26 de outubro de 2010
Dossiê Serra: regressão na educação (2)
Por Altamiro Borges
Apesar do visível constrangimento ao falar sobre educação, já que seu principal aliado, o DEM, ingressou na Justiça contra o Prouni, José Serra gosta de se gabar das conquistas dos tucanos em São Paulo nesta área. É pura demagogia. Os professores do ensino público, vítimas constantes do cassetete da Polícia Militar, sabem bem que a rede estadual está complemente sucateada, que as escolas estão abandonadas e que os salários no estado estão entre os piores do país.
Numa população estimada de 40.624,140 pessoas, em 2008, as crianças com menos de 14 anos somam 22% - cerca de 8,8 milhões. No prolongado reinado tucano, o governo simplesmente se eximiu da responsabilidade com creches e educação infantil, que ficaram a cargo dos municípios. No ensino fundamental, a rede formada por 4,2 milhões de alunos e 238 mil profissionais atinge apenas 35% do atendimento às crianças com menos de nove anos. O número de escolas declinou – em 1996, eram 6.437; hoje são 5.735 –, também por culpa da municipalização do ensino.
O crime da “promoção automática”
No seu total descaso com a juventude, os tucanos impuseram o chamado regime da “promoção automática”, que reduziu drasticamente a qualidade do ensino. O número de crianças até nove anos que não sabe ler e escrever subiu de 56 mil, em 2007, para 79 mil, em 2008; na faixa até 14 anos, ele subiu de 29 para 51 mil no mesmo período. Devido à “promoção automática”, manobra que visa cortar gastos no setor, muitos jovens concluem o ensino fundamental como “analfabetos funcionais”. Apesar da crescente crítica da sociedade, o PSDB se recusa a alterar esta política.
Já no ensino médio, 13,2% dos adolescentes paulistas estão fora da escola – cerca 240 mil jovens de 13 a 17 anos. O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) comprova que também nesta faixa a qualidade da educação piora a cada ano. São Paulo perdeu o posto que ocupou de melhor nível educacional do Brasil. Para Izabel Noronha, a Bebel, presidente do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), a política educacional tucana é um desastre, um crime. “Sofre a sociedade, os alunos e os pais, e sofrem os profissionais do ensino”.
Arrocho salarial e precarização
O menosprezo do PSDB pelos profissionais do setor é total. Os professores são desvalorizados, com salários arrochados, baixo investimento em qualificação e reciclagem e péssimas condições de trabalho. No reinado tucano, houve até redução na folha de pagamento. José Serra instituiu a “bonificação por resultado” como mecanismo para arrochar salários e enfraquecer a ação sindical da categoria. Dados da pesquisa “Análise comparativa salarial”, patrocinada pelo Sindicato dos Professores do Ceará (Apeoc), revelam que São Paulo está em 11º lugar no ranking nacional.
Em 2002, o gasto com pessoal e encargos era de 15,1% do orçamento, sendo que somente 12,7% foram aplicados. Em 2009, ele foi reduzido para 13,1%, sendo que apenas 9,2% foram aplicados. Além do arrocho, o PSDB estimulou a contratação de professores temporários. Em abril de 2009, estes trabalhadores precarizados somavam 108.441 do total de 238.252 professores do estado. Eles não possuem qualquer estabilidade e é elevada a rotatividade no emprego.
Em decorrência destes e de outros problemas, a situação dos professores é de incerteza. Pesquisa feita pela Apeoesp em 2007 revela que eles sofrem de doenças como estresse, problemas na voz, Lesão por Esforço Repetido (LER) e tendinite. Os motivos dos adoecimentos vão das salas muito cheias – de 45 a 50 alunos – às jornadas triplas (muitos fazem até três cadeiras para garantir um bom nível salarial) e à ausência de boas condições de trabalho.
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Apesar do visível constrangimento ao falar sobre educação, já que seu principal aliado, o DEM, ingressou na Justiça contra o Prouni, José Serra gosta de se gabar das conquistas dos tucanos em São Paulo nesta área. É pura demagogia. Os professores do ensino público, vítimas constantes do cassetete da Polícia Militar, sabem bem que a rede estadual está complemente sucateada, que as escolas estão abandonadas e que os salários no estado estão entre os piores do país.
Numa população estimada de 40.624,140 pessoas, em 2008, as crianças com menos de 14 anos somam 22% - cerca de 8,8 milhões. No prolongado reinado tucano, o governo simplesmente se eximiu da responsabilidade com creches e educação infantil, que ficaram a cargo dos municípios. No ensino fundamental, a rede formada por 4,2 milhões de alunos e 238 mil profissionais atinge apenas 35% do atendimento às crianças com menos de nove anos. O número de escolas declinou – em 1996, eram 6.437; hoje são 5.735 –, também por culpa da municipalização do ensino.
O crime da “promoção automática”
No seu total descaso com a juventude, os tucanos impuseram o chamado regime da “promoção automática”, que reduziu drasticamente a qualidade do ensino. O número de crianças até nove anos que não sabe ler e escrever subiu de 56 mil, em 2007, para 79 mil, em 2008; na faixa até 14 anos, ele subiu de 29 para 51 mil no mesmo período. Devido à “promoção automática”, manobra que visa cortar gastos no setor, muitos jovens concluem o ensino fundamental como “analfabetos funcionais”. Apesar da crescente crítica da sociedade, o PSDB se recusa a alterar esta política.
Já no ensino médio, 13,2% dos adolescentes paulistas estão fora da escola – cerca 240 mil jovens de 13 a 17 anos. O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) comprova que também nesta faixa a qualidade da educação piora a cada ano. São Paulo perdeu o posto que ocupou de melhor nível educacional do Brasil. Para Izabel Noronha, a Bebel, presidente do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), a política educacional tucana é um desastre, um crime. “Sofre a sociedade, os alunos e os pais, e sofrem os profissionais do ensino”.
Arrocho salarial e precarização
O menosprezo do PSDB pelos profissionais do setor é total. Os professores são desvalorizados, com salários arrochados, baixo investimento em qualificação e reciclagem e péssimas condições de trabalho. No reinado tucano, houve até redução na folha de pagamento. José Serra instituiu a “bonificação por resultado” como mecanismo para arrochar salários e enfraquecer a ação sindical da categoria. Dados da pesquisa “Análise comparativa salarial”, patrocinada pelo Sindicato dos Professores do Ceará (Apeoc), revelam que São Paulo está em 11º lugar no ranking nacional.
Em 2002, o gasto com pessoal e encargos era de 15,1% do orçamento, sendo que somente 12,7% foram aplicados. Em 2009, ele foi reduzido para 13,1%, sendo que apenas 9,2% foram aplicados. Além do arrocho, o PSDB estimulou a contratação de professores temporários. Em abril de 2009, estes trabalhadores precarizados somavam 108.441 do total de 238.252 professores do estado. Eles não possuem qualquer estabilidade e é elevada a rotatividade no emprego.
Em decorrência destes e de outros problemas, a situação dos professores é de incerteza. Pesquisa feita pela Apeoesp em 2007 revela que eles sofrem de doenças como estresse, problemas na voz, Lesão por Esforço Repetido (LER) e tendinite. Os motivos dos adoecimentos vão das salas muito cheias – de 45 a 50 alunos – às jornadas triplas (muitos fazem até três cadeiras para garantir um bom nível salarial) e à ausência de boas condições de trabalho.
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Dossiê Serra: saúde terceirizada (1)
Por Altamiro Borges
Na propaganda eleitoral de rádio e TV, nos debates e nas suas andanças pelo país, o demotucano José Serra mostra São Paulo como se fosse o “paraíso na terra”, um modelo de gestão eficiente e vitorioso. Tudo funciona em perfeita harmonia – educação, saúde, transporte, segurança pública, habitação. Um desavisado seria induzido a pegar um avião da Europa direto para Congonhas ou Cumbica para curtir o “primeiro mundo”. Sorte que lá não passa a falsa propaganda do Serra.
Para os paulistas que vivem do trabalho – e não do rentismo e das migalhas jogadas à parcela da classe média que come mortadela e arrota caviar – esse cenário paradisíaco não existe. É obra de marqueteiro, que exibe o invólucro bonito e esconde o conteúdo podre. Tanto que já no primeiro turno da eleição, Dilma Rousseff obteve vitória nos bairros da capital e cidades mais carentes do interior. Serra, blindado pela mídia e com forte aparato, só venceu com folga nas áreas ricas.
O caos nos hospitais
Nesta série de artigos na reta final da eleição a idéia é mostrar os estragos causados pelas gestões tucanas em São Paulo. O PSDB detém a hegemonia no estado há 16 anos – por razões que serão apontadas no final da série. Com a eleição de Alckmin para governador, o partido completará 20 anos de domínio total do estado – logo ele que fala tanto em alternância no poder para fustigar o presidente Lula. Este pequeno dossiê visa denunciar o que a mídia demotucana oculta e ofusca.
Os efeitos mais graves do “modelo tucano de governar” se manifestam nas áreas sociais. Apesar de José Serra se jactar tanto dos seus feitos na saúde, o quadro em São Paulo é dramático. É só ir a um hospital público ou centro de saúde para esbarrar em pessoas, crianças e idosos, espalhadas em macas pelos corredores, gemendo pelos cantos, aguardando horas em filas quilométricas. Os médicos e enfermeiros, com seus péssimos salários, angustiam-se sem poder atender a demanda.
Corte nos investimentos
As carências na área decorrem da política de “ajuste fiscal” dos tucanos, com os seus constantes cortes de verbas. Pelo firmado no Sistema Único de Saúde (SUS), uma conquista da sociedade – consagrada na Constituição de 1988 e que passou a vigorar somente em 2000 –, os estados devem aportar, no mínimo, 12% das suas receitas líquidas neste setor vital. São Paulo, apesar de ser o estado mais rico da federação, não tem cumprindo com sua responsabilidade nesta área.
Para driblar os 12% fixados na Constituição, os governos tucanos baixaram decreto ampliando o conceito sobre investimentos na saúde, incluindo gastos na Agricultura, Gestão Pública e até na Justiça. No orçamento de 2010, os investimentos específicos na saúde foram de apenas 9,6% da receita. Com esta manobra contábil, os recursos são desviados para outros fins, como pagamento de aposentadoria ou no programa Viva Leite. Entre 2001 e 2009, o governo deixou de aplicar R$ 4,1 bilhões na saúde da população. Esse montante seria o suficiente para construir 82 hospitais
Terceirização criminosa
Para reduzir ainda mais os investimentos na saúde, os tucanos também inventaram as chamadas Organizações Sociais. Sem licitação pública ou mecanismos rígidos de fiscalização, o que abre brechas para inúmeras maracutaias, estas estranhas “organizações sociais” administram hoje 23 hospitais, todos os laboratórios e mais de uma dezena de ambulatórios especializados. Com o tempo, esta terceirização “disfarçada” da saúde pública deve gerar graves problemas sociais.
Em 2010, elas receberão R$ 1,96 bilhão (51,2% da verba total do setor), enquanto todo o restante gerido diretamente pelo estado receberá R$ 1,97 bilhão (48,8% da verba pública). Quem garante que os recursos serão usados no atendimento à população, que não serão desviados para engordar os lucros dos novos capitalistas do setor ou para financiar as campanhas tucanas? Enquanto isto, a população sofre com o péssimo atendimento e os servidores têm os seus salários arrochados.
Piora nos indicadores
Os indicadores revelam o crescimento das doenças medievais no estado. Em 2001, 2002 e 2006 ocorreram epidemias de dengue e a infecção pelo mosquito foi registrada em 75% das cidades – em 249 municípios. A própria Secretaria de Saúde estima a existência de 580 mil portadores crônicos do vírus da hepatite B e 420 mil de hepatite C. Há também deficiências nos programas de vigilância sanitária, vacinação, combate às endemias e no controle e uso do sangue. Já o número de leitos hospitalares teve queda de 11,5% na sua ocupação entre 2003 e 2006.
Ao mesmo tempo, cresce o número de doenças decorrentes da falta de saneamento, em especial na região metropolitana. As doenças diarréicas passaram de 403 mil, em 2004, para 617 mil, em 2007. A piora geral nas condições de saúde decorre do baixo investimento neste setor. São Paulo até possui uma extensa rede do SUS de serviços ambulatoriais e hospitalares, com mais de 4 mil unidades básicas, 1.277 unidades de atendimento de especialidades e 680 hospitais. Mas toda ela tem sido sucateada nos últimos anos, o que ocasiona a redução dos atendimentos.
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Na propaganda eleitoral de rádio e TV, nos debates e nas suas andanças pelo país, o demotucano José Serra mostra São Paulo como se fosse o “paraíso na terra”, um modelo de gestão eficiente e vitorioso. Tudo funciona em perfeita harmonia – educação, saúde, transporte, segurança pública, habitação. Um desavisado seria induzido a pegar um avião da Europa direto para Congonhas ou Cumbica para curtir o “primeiro mundo”. Sorte que lá não passa a falsa propaganda do Serra.
Para os paulistas que vivem do trabalho – e não do rentismo e das migalhas jogadas à parcela da classe média que come mortadela e arrota caviar – esse cenário paradisíaco não existe. É obra de marqueteiro, que exibe o invólucro bonito e esconde o conteúdo podre. Tanto que já no primeiro turno da eleição, Dilma Rousseff obteve vitória nos bairros da capital e cidades mais carentes do interior. Serra, blindado pela mídia e com forte aparato, só venceu com folga nas áreas ricas.
O caos nos hospitais
Nesta série de artigos na reta final da eleição a idéia é mostrar os estragos causados pelas gestões tucanas em São Paulo. O PSDB detém a hegemonia no estado há 16 anos – por razões que serão apontadas no final da série. Com a eleição de Alckmin para governador, o partido completará 20 anos de domínio total do estado – logo ele que fala tanto em alternância no poder para fustigar o presidente Lula. Este pequeno dossiê visa denunciar o que a mídia demotucana oculta e ofusca.
Os efeitos mais graves do “modelo tucano de governar” se manifestam nas áreas sociais. Apesar de José Serra se jactar tanto dos seus feitos na saúde, o quadro em São Paulo é dramático. É só ir a um hospital público ou centro de saúde para esbarrar em pessoas, crianças e idosos, espalhadas em macas pelos corredores, gemendo pelos cantos, aguardando horas em filas quilométricas. Os médicos e enfermeiros, com seus péssimos salários, angustiam-se sem poder atender a demanda.
Corte nos investimentos
As carências na área decorrem da política de “ajuste fiscal” dos tucanos, com os seus constantes cortes de verbas. Pelo firmado no Sistema Único de Saúde (SUS), uma conquista da sociedade – consagrada na Constituição de 1988 e que passou a vigorar somente em 2000 –, os estados devem aportar, no mínimo, 12% das suas receitas líquidas neste setor vital. São Paulo, apesar de ser o estado mais rico da federação, não tem cumprindo com sua responsabilidade nesta área.
Para driblar os 12% fixados na Constituição, os governos tucanos baixaram decreto ampliando o conceito sobre investimentos na saúde, incluindo gastos na Agricultura, Gestão Pública e até na Justiça. No orçamento de 2010, os investimentos específicos na saúde foram de apenas 9,6% da receita. Com esta manobra contábil, os recursos são desviados para outros fins, como pagamento de aposentadoria ou no programa Viva Leite. Entre 2001 e 2009, o governo deixou de aplicar R$ 4,1 bilhões na saúde da população. Esse montante seria o suficiente para construir 82 hospitais
Terceirização criminosa
Para reduzir ainda mais os investimentos na saúde, os tucanos também inventaram as chamadas Organizações Sociais. Sem licitação pública ou mecanismos rígidos de fiscalização, o que abre brechas para inúmeras maracutaias, estas estranhas “organizações sociais” administram hoje 23 hospitais, todos os laboratórios e mais de uma dezena de ambulatórios especializados. Com o tempo, esta terceirização “disfarçada” da saúde pública deve gerar graves problemas sociais.
Em 2010, elas receberão R$ 1,96 bilhão (51,2% da verba total do setor), enquanto todo o restante gerido diretamente pelo estado receberá R$ 1,97 bilhão (48,8% da verba pública). Quem garante que os recursos serão usados no atendimento à população, que não serão desviados para engordar os lucros dos novos capitalistas do setor ou para financiar as campanhas tucanas? Enquanto isto, a população sofre com o péssimo atendimento e os servidores têm os seus salários arrochados.
Piora nos indicadores
Os indicadores revelam o crescimento das doenças medievais no estado. Em 2001, 2002 e 2006 ocorreram epidemias de dengue e a infecção pelo mosquito foi registrada em 75% das cidades – em 249 municípios. A própria Secretaria de Saúde estima a existência de 580 mil portadores crônicos do vírus da hepatite B e 420 mil de hepatite C. Há também deficiências nos programas de vigilância sanitária, vacinação, combate às endemias e no controle e uso do sangue. Já o número de leitos hospitalares teve queda de 11,5% na sua ocupação entre 2003 e 2006.
Ao mesmo tempo, cresce o número de doenças decorrentes da falta de saneamento, em especial na região metropolitana. As doenças diarréicas passaram de 403 mil, em 2004, para 617 mil, em 2007. A piora geral nas condições de saúde decorre do baixo investimento neste setor. São Paulo até possui uma extensa rede do SUS de serviços ambulatoriais e hospitalares, com mais de 4 mil unidades básicas, 1.277 unidades de atendimento de especialidades e 680 hospitais. Mas toda ela tem sido sucateada nos últimos anos, o que ocasiona a redução dos atendimentos.
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Licitação do metrô e falsa ética de Serra
Por Altamiro Borges
Na reta final das eleições, José Serra voltou a posar de paladino da ética. Ele insiste em dizer que “meu passado é limpo” e que “não tenho amigos corruptos”. Numa primeira fase da campanha, o candidato havia abandonado este figurino. Afinal, era difícil explorar eleitoralmente a questão da ética quando ele mesmo sondou o ex-governador do Distrito Federal, o presidiário Arruda, para ser seu “vice-careca”. Serra também tinha ao seu lado a governadora tucana Yeda Crusius, a da mansão bilionária, rechaçada pelos gaúchos nas urnas. A fantasia ética não lhe cabia nada bem.
Nos últimos dias, porém, o tucano voltou a criticar os corruptos na maior caradura. Só que a vida é cruel. Nem bem ele retomou o tema é surgiu a grave denúncia contra Paulo Preto, ex-diretor da Dersa e “operador” da sua campanha que sumiu com R$ 4 milhões do caixa-dois tucano. Agora, para desmoralizar de vez seu falso discurso, a própria Folha notícia que “soube seis meses antes da divulgação do resultado quem seriam os vencedores da licitação para concorrência dos lotes de três a oito da Linha-5 (Lilás) do metrô da capital paulista”. Quem será o novo Paulo Preto?
Folha evita opinar
Segundo o repórter Ricardo Feltrin, o resultado foi divulgado na quinta-feira (21), mas o jornal há havia registrado o nome dos ganhadores em vídeo e cartório em abril. “A licitação foi aberta em outubro de 2008, quando o governador de São Paulo era José Serra (PSDB) – ele deixou o cargo no início de abril para disputar a presidência da República... O Metrô, estatal do governo paulista, afirma que vai investigar. Os consórcios também negam irregularidades ou ‘acertos’”. Mas, não resta dúvida, o grave episódio fede muito. O valor dos lotes passava de R$ 4 bilhões.
A relação promíscua entre o PSDB e as empreiteiras já é conhecida. Há tempos corre o boato de que o tucanato privilegia determinadas empresas e que estas, para compensar a gentileza, ajudam financeiramente nas campanhas eleitorais e na melhoria de alguns patrimônios individuais. Entre as vencedoras desta “licitação” estão as gigantes do setor: Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Odebrecht e OAS/Queiroz Galvão. A Folha preferiu não especular sobre o suspeito episódio, bem diferente da sua conduta quando se refere ao governo Lula. E o Metrô jurou inocência!
Mais sujos do que pau de galinheiro
A falsa licitação cai como bomba no colo de Serra. Ele já se mostrava irritado com as denúncias envolvendo Paulo Preto, seu “homem-bomba”. Agora terá que responder as perguntas de Dilma Rousseff sobre as maracutaias no Metrô. O material é inflamável e deverá ser explorado na TV nesta reta final das eleições. Não dá para aceitar a hipocrisia tucana na questão da ética. PSDB e DEM são mais sujos do que pau de galinheiro, sempre estiveram metidos em casos suspeitos de desvio de recursos públicos. Listo apenas quinze casos para refrescar as memórias mais fracas:
1 - Conivência com a corrupção
O PSDB sempre foi conivente com a corrupção. Um dos primeiros gestos de FHC ao assumir a presidência, em 1995, foi extinguir, por decreto, a Comissão Especial de Investigação, composta por representantes da sociedade e que visava combater a corrupção. Em 2001, para abortar a CPI da Corrupção, FHC criou a Controladoria-Geral da União, órgão famoso por abafar denúncias.
2 - O escândalo do Sivam
O contrato para execução do Sivam, de vigilância área, carimbou de sujeira o início do reinado de FHC. A empresa Esca, associada à estadunidense Raytheon e responsável pelo gerenciamento do projeto, foi extinta por fraudar a Previdência. Denúncias de tráfico de influência derrubaram o então embaixador Júlio César dos Santos e o ministro da Aeronáutica, Brigadeiro Mauro Gandra.
3 - A farra do Proer
O Proer, criado em 1996, uniu os tucanos ao sistema financeiro. Para FHC, o custo do programa foi de 1% do PIB, mas para os economistas da Cepal, os gastos chegaram a 12,3% do PIB, ou R$ 111,3 bilhões, incluindo recapitalização do Banco do Brasil, CEF e socorro aos bancos estaduais. Um enorme rombo nos cofres públicos para ajudar os banqueiros.
4 - Caixa-dois de campanhas
As campanhas de FHC em 1994 e em 1998 teriam se beneficiado do esquema de caixa-dois. Em 1994, pelo menos R$ 5 milhões não apareceram na prestação de contas entregue ao TSE. Em 1998, teriam passado pela contabilidade paralela R$ 10,1 milhões.
5 - Propina na privatização
A privatização da Telebrás e da Vale do Rio Doce foi marcada pela suspeição. Ricardo Sérgio de Oliveira, ex-caixa de campanha de FHC e de José Serra e ex-diretor da Área Internacional do Banco do Brasil, foi acusado de pedir propina de R$ 15 milhões para obter apoio dos fundos de pensão ao consórcio do empresário Benjamin Steinbruch, que levou a Vale, e de ter cobrado R$ 90 milhões para ajudar na montagem do consórcio Telemar.
6 - A emenda da reeleição
FHC garantiu a emenda da sua reeleição a um preço alto. Gravações revelaram que os deputados Ronivon Santiago e João Maia, PFL-AC, ganharam R$ 200 mil para votar a favor do projeto. Os dois renunciaram aos mandatos. Já outros três parlamentares acusados de venda do voto, Chicão Brígido, Osmir Lima e Zila Bezerra, foram absolvidos pelo plenário da Câmara.
7 - Os ralos do DNER
O DNER foi um dos principais focos de corrupção no governo de FHC. Através dos precatórios, manobra contábil que consiste em furar a fila para o pagamento de títulos públicos, estima-se que os beneficiados pela fraude pagavam 25% do valor real para a quadrilha que comandava o órgão.
8 - Desvalorização do real
Para se reeleger em1998, FHC segurou a artificial paridade entre o real e o dólar. Reeleito, deu o golpe. No processo da desvalorização da moeda, que afundou a economia, ainda houve denúncia de vazamento de informações do Banco Central. 24 bancos lucraram com a mudança cambial e outros quatro que registraram movimentação especulativa às vésperas do anúncio da medida.
9 - O caso Marka/FonteCindam
Durante a desvalorização do real, os bancos Marka e FonteCindam foram socorridos pelo Banco Central com R$ 1,6 bilhão. O pretexto é que a quebra dos bancos criaria riscos para a economia. Chico Lopes, ex-presidente do BC, e Salvatore Cacciola, ex-dono do Marka, até foram detidos. Cacciola, ex-sogro do vice do Serra, Índio da Costa, fugiu para a Itália, mas foi novamente preso.
10 - Eduardo Jorge, personagem suspeito
Eduardo Jorge Caldas, o mesmo que agora se diz vitima da quebra do sigilo fiscal, é uma figura sinistra. Ex-secretário-geral de FHC, ele esteve envolvido no esquema de liberação de verba para o TRT/SP [do famoso Lalau], superfaturamento do Serpro, montagem do caixa-dois da reeleição de FHC, lobby junto às empresas de informática e de manipular recursos dos fundos de pensão nas privatizações. Se houvesse Justiça no Brasil, seu sigilo fiscal já teria sido quebrado há tempo.
11- O esquema do FAT
A Fundação Teotônio Vilela, ligado ao PSDB, foi acusada de envolvimento em desvios de R$ 4,5 milhões do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Descobriu-se que parte do dinheiro, que deveria ser usado no treinamento de 54 mil trabalhadores do Distrito Federal, sumiu. Na gestão de FHC, as fraudes com recursos do FAT ocorreram em 17 unidades da federação.
12 - Obras irregulares
Levantamento do Tribunal de Contas da União, feito em 2001, indicou a existência de 121 obras federais com indícios de irregularidades graves. As falcatruas envolviam vários integrantes do governo FHC. Uma dessas obras, a hidrelétrica de Serra da Mesa, interior de Goiás, deveria ter custado 1,3 bilhão de dólares, mas consumiu o dobro dos recursos.
13 - Verbas do BNDES
Além de vender o patrimônio público a preço de banana, o governo FHC, por meio do BNDES, destinou cerca de R$ 10 bilhões para socorrer empresas que assumiram o controle de ex-estatais privatizadas. As maiores beneficiárias pela ajudinha tucana foram as operadoras de telefonia e as empresas do setor elétrico. Em uma das diversas operações, o BNDES injetou R$ 686,8 milhões na Telemar, assumindo 25% do controle acionário da empresa.
14 - Intervenção na Previ
Em 2002, FHC decretou intervenção na Previ, o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, com patrimônio de R$ 38 bilhões. Afastou seis diretores, inclusive os três eleitos pelos funcionários do BB. O ato truculento ocorreu a pedido do banqueiro Daniel Dantas, dono do Opportunity. Dias antes da intervenção, FHC recebeu Dantas no Palácio Alvorada. O banqueiro teria ameaçado divulgar alguns dossiês sobre o processo das privatizações – ou privatarias.
15 - Relações perigosas de José Serra
Estes e outros casos são do conhecimento de Serra, que agora posa de paladino da ética. Muitos dos envolvidos em corrupção no governo FHC têm relações intimas com o candidato. Entre eles destacam-se três figuras: Ricardo Sérgio de Oliveira, ex-caixa de campanha de Serra e de FHC, acusado de tráfico de influência quando era diretor do BB e de cobrar propina nos processos de privatização; o empresário espanhol Gregório Preciado, que obteve perdão de uma dívida de R$ 73 milhões junto ao BB e foi casado com uma prima de Serra; e Vladimir Antonio Rioli, ex-vice-presidente do Banespa e ex-sócio de Serra numa empresa de consultoria, que teria facilitado operações para repatriar US$ 3 milhões depositados nas Ilhas Cayman - paraíso fiscal do Caribe.
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Na reta final das eleições, José Serra voltou a posar de paladino da ética. Ele insiste em dizer que “meu passado é limpo” e que “não tenho amigos corruptos”. Numa primeira fase da campanha, o candidato havia abandonado este figurino. Afinal, era difícil explorar eleitoralmente a questão da ética quando ele mesmo sondou o ex-governador do Distrito Federal, o presidiário Arruda, para ser seu “vice-careca”. Serra também tinha ao seu lado a governadora tucana Yeda Crusius, a da mansão bilionária, rechaçada pelos gaúchos nas urnas. A fantasia ética não lhe cabia nada bem.
Nos últimos dias, porém, o tucano voltou a criticar os corruptos na maior caradura. Só que a vida é cruel. Nem bem ele retomou o tema é surgiu a grave denúncia contra Paulo Preto, ex-diretor da Dersa e “operador” da sua campanha que sumiu com R$ 4 milhões do caixa-dois tucano. Agora, para desmoralizar de vez seu falso discurso, a própria Folha notícia que “soube seis meses antes da divulgação do resultado quem seriam os vencedores da licitação para concorrência dos lotes de três a oito da Linha-5 (Lilás) do metrô da capital paulista”. Quem será o novo Paulo Preto?
Folha evita opinar
Segundo o repórter Ricardo Feltrin, o resultado foi divulgado na quinta-feira (21), mas o jornal há havia registrado o nome dos ganhadores em vídeo e cartório em abril. “A licitação foi aberta em outubro de 2008, quando o governador de São Paulo era José Serra (PSDB) – ele deixou o cargo no início de abril para disputar a presidência da República... O Metrô, estatal do governo paulista, afirma que vai investigar. Os consórcios também negam irregularidades ou ‘acertos’”. Mas, não resta dúvida, o grave episódio fede muito. O valor dos lotes passava de R$ 4 bilhões.
A relação promíscua entre o PSDB e as empreiteiras já é conhecida. Há tempos corre o boato de que o tucanato privilegia determinadas empresas e que estas, para compensar a gentileza, ajudam financeiramente nas campanhas eleitorais e na melhoria de alguns patrimônios individuais. Entre as vencedoras desta “licitação” estão as gigantes do setor: Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Odebrecht e OAS/Queiroz Galvão. A Folha preferiu não especular sobre o suspeito episódio, bem diferente da sua conduta quando se refere ao governo Lula. E o Metrô jurou inocência!
Mais sujos do que pau de galinheiro
A falsa licitação cai como bomba no colo de Serra. Ele já se mostrava irritado com as denúncias envolvendo Paulo Preto, seu “homem-bomba”. Agora terá que responder as perguntas de Dilma Rousseff sobre as maracutaias no Metrô. O material é inflamável e deverá ser explorado na TV nesta reta final das eleições. Não dá para aceitar a hipocrisia tucana na questão da ética. PSDB e DEM são mais sujos do que pau de galinheiro, sempre estiveram metidos em casos suspeitos de desvio de recursos públicos. Listo apenas quinze casos para refrescar as memórias mais fracas:
1 - Conivência com a corrupção
O PSDB sempre foi conivente com a corrupção. Um dos primeiros gestos de FHC ao assumir a presidência, em 1995, foi extinguir, por decreto, a Comissão Especial de Investigação, composta por representantes da sociedade e que visava combater a corrupção. Em 2001, para abortar a CPI da Corrupção, FHC criou a Controladoria-Geral da União, órgão famoso por abafar denúncias.
2 - O escândalo do Sivam
O contrato para execução do Sivam, de vigilância área, carimbou de sujeira o início do reinado de FHC. A empresa Esca, associada à estadunidense Raytheon e responsável pelo gerenciamento do projeto, foi extinta por fraudar a Previdência. Denúncias de tráfico de influência derrubaram o então embaixador Júlio César dos Santos e o ministro da Aeronáutica, Brigadeiro Mauro Gandra.
3 - A farra do Proer
O Proer, criado em 1996, uniu os tucanos ao sistema financeiro. Para FHC, o custo do programa foi de 1% do PIB, mas para os economistas da Cepal, os gastos chegaram a 12,3% do PIB, ou R$ 111,3 bilhões, incluindo recapitalização do Banco do Brasil, CEF e socorro aos bancos estaduais. Um enorme rombo nos cofres públicos para ajudar os banqueiros.
4 - Caixa-dois de campanhas
As campanhas de FHC em 1994 e em 1998 teriam se beneficiado do esquema de caixa-dois. Em 1994, pelo menos R$ 5 milhões não apareceram na prestação de contas entregue ao TSE. Em 1998, teriam passado pela contabilidade paralela R$ 10,1 milhões.
5 - Propina na privatização
A privatização da Telebrás e da Vale do Rio Doce foi marcada pela suspeição. Ricardo Sérgio de Oliveira, ex-caixa de campanha de FHC e de José Serra e ex-diretor da Área Internacional do Banco do Brasil, foi acusado de pedir propina de R$ 15 milhões para obter apoio dos fundos de pensão ao consórcio do empresário Benjamin Steinbruch, que levou a Vale, e de ter cobrado R$ 90 milhões para ajudar na montagem do consórcio Telemar.
6 - A emenda da reeleição
FHC garantiu a emenda da sua reeleição a um preço alto. Gravações revelaram que os deputados Ronivon Santiago e João Maia, PFL-AC, ganharam R$ 200 mil para votar a favor do projeto. Os dois renunciaram aos mandatos. Já outros três parlamentares acusados de venda do voto, Chicão Brígido, Osmir Lima e Zila Bezerra, foram absolvidos pelo plenário da Câmara.
7 - Os ralos do DNER
O DNER foi um dos principais focos de corrupção no governo de FHC. Através dos precatórios, manobra contábil que consiste em furar a fila para o pagamento de títulos públicos, estima-se que os beneficiados pela fraude pagavam 25% do valor real para a quadrilha que comandava o órgão.
8 - Desvalorização do real
Para se reeleger em1998, FHC segurou a artificial paridade entre o real e o dólar. Reeleito, deu o golpe. No processo da desvalorização da moeda, que afundou a economia, ainda houve denúncia de vazamento de informações do Banco Central. 24 bancos lucraram com a mudança cambial e outros quatro que registraram movimentação especulativa às vésperas do anúncio da medida.
9 - O caso Marka/FonteCindam
Durante a desvalorização do real, os bancos Marka e FonteCindam foram socorridos pelo Banco Central com R$ 1,6 bilhão. O pretexto é que a quebra dos bancos criaria riscos para a economia. Chico Lopes, ex-presidente do BC, e Salvatore Cacciola, ex-dono do Marka, até foram detidos. Cacciola, ex-sogro do vice do Serra, Índio da Costa, fugiu para a Itália, mas foi novamente preso.
10 - Eduardo Jorge, personagem suspeito
Eduardo Jorge Caldas, o mesmo que agora se diz vitima da quebra do sigilo fiscal, é uma figura sinistra. Ex-secretário-geral de FHC, ele esteve envolvido no esquema de liberação de verba para o TRT/SP [do famoso Lalau], superfaturamento do Serpro, montagem do caixa-dois da reeleição de FHC, lobby junto às empresas de informática e de manipular recursos dos fundos de pensão nas privatizações. Se houvesse Justiça no Brasil, seu sigilo fiscal já teria sido quebrado há tempo.
11- O esquema do FAT
A Fundação Teotônio Vilela, ligado ao PSDB, foi acusada de envolvimento em desvios de R$ 4,5 milhões do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Descobriu-se que parte do dinheiro, que deveria ser usado no treinamento de 54 mil trabalhadores do Distrito Federal, sumiu. Na gestão de FHC, as fraudes com recursos do FAT ocorreram em 17 unidades da federação.
12 - Obras irregulares
Levantamento do Tribunal de Contas da União, feito em 2001, indicou a existência de 121 obras federais com indícios de irregularidades graves. As falcatruas envolviam vários integrantes do governo FHC. Uma dessas obras, a hidrelétrica de Serra da Mesa, interior de Goiás, deveria ter custado 1,3 bilhão de dólares, mas consumiu o dobro dos recursos.
13 - Verbas do BNDES
Além de vender o patrimônio público a preço de banana, o governo FHC, por meio do BNDES, destinou cerca de R$ 10 bilhões para socorrer empresas que assumiram o controle de ex-estatais privatizadas. As maiores beneficiárias pela ajudinha tucana foram as operadoras de telefonia e as empresas do setor elétrico. Em uma das diversas operações, o BNDES injetou R$ 686,8 milhões na Telemar, assumindo 25% do controle acionário da empresa.
14 - Intervenção na Previ
Em 2002, FHC decretou intervenção na Previ, o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, com patrimônio de R$ 38 bilhões. Afastou seis diretores, inclusive os três eleitos pelos funcionários do BB. O ato truculento ocorreu a pedido do banqueiro Daniel Dantas, dono do Opportunity. Dias antes da intervenção, FHC recebeu Dantas no Palácio Alvorada. O banqueiro teria ameaçado divulgar alguns dossiês sobre o processo das privatizações – ou privatarias.
15 - Relações perigosas de José Serra
Estes e outros casos são do conhecimento de Serra, que agora posa de paladino da ética. Muitos dos envolvidos em corrupção no governo FHC têm relações intimas com o candidato. Entre eles destacam-se três figuras: Ricardo Sérgio de Oliveira, ex-caixa de campanha de Serra e de FHC, acusado de tráfico de influência quando era diretor do BB e de cobrar propina nos processos de privatização; o empresário espanhol Gregório Preciado, que obteve perdão de uma dívida de R$ 73 milhões junto ao BB e foi casado com uma prima de Serra; e Vladimir Antonio Rioli, ex-vice-presidente do Banespa e ex-sócio de Serra numa empresa de consultoria, que teria facilitado operações para repatriar US$ 3 milhões depositados nas Ilhas Cayman - paraíso fiscal do Caribe.
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Aloysio Nunes ofende jornalista
Reproduzo matéria de Thiago Domenici, publicada no blog "notaderodape":
João Peres, nosso colaborador do NR e repórter da Rede Brasil Atual, profissional da mais alta competência teve ontem uma experiência desagradável e desrespeitosa. Ele estava na cobertura do debate entre os presidenciáveis da Record, na noite de ontem, e na entrada da emissora, como todo repórter faz e é da profissão, foi conversar com os políticos que chegavam para acompanhar o evento.
O senador eleito por São Paulo, do PSDB, Aloysio Nunes, amigão do Serra, foi abordado pelo repórter que fazia a cobertura para a Rede Brasil Atual, que pertence ao mesmo grupo da Revista do Brasil, censurada recentemente pelo partido do senador em questão. Era perto da hora do debate, que começou às 23h, quando o senador eleito com mais de 11 milhões de votos indagou ao repórter:
- É ligada a quem essa revista?
- Aos sindicatos
- Que sindicatos? - falou a assessora do lado dele
- Bancários, metalúrgicos, químicos...
- Pelego, você é pelego - falou o senador
- Não podemos conversar, senador?
- Pelego. sua revista é financiada pelo PT...
- E a Veja, quem financia, senador?
- Pelego
- Que educação, senador
- Pelego filha da puta. Pelego filha da puta!
João me escreveu: "Foi assim, gratuito. Fiquei passado, triste mesmo. Não que não devesse esperar isso, mas agora vai ser isso, vou ser rotulado logo de cara pelo veículo em que eu trabalho? Ninguém associa a tucano-demo logo de cara um sujeito que trabalha na Folha? Uma noite horrível".
Digo o seguinte: é preciso que os políticos respeitem o trabalho dos jornalistas. Essa clima de guerra entre PT e PSDB está doentio. João Peres é um trabalhador, um empregado de um veículo que, sim, tem ligações com os sindicatos. E daí? Isto é público e notório. Nada está escondido. Pergunto ao distinto senador: todos os metalúrgicos, químicos e afins são "filhos da puta", então? Eu sou "filho da puta" também, pois apesar de não ser petista, trabalhei na revista durante um ano. Eis mais um absurdo que se tornou estas eleições. Lastimável.
"A Editora Atitude, que publica os dois veículos (Rede Brasil Atual e Revista do Brasil), condena a postura do senador eleito e entende que liberdade de expressão não é agredir verbalmente quem está em seu direito constitucional de exercer a liberdade de imprensa, muito menos a função de um representante de um Estado no Senado Federal", diz o diretor da editora, Paulo Salvador.
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João Peres, nosso colaborador do NR e repórter da Rede Brasil Atual, profissional da mais alta competência teve ontem uma experiência desagradável e desrespeitosa. Ele estava na cobertura do debate entre os presidenciáveis da Record, na noite de ontem, e na entrada da emissora, como todo repórter faz e é da profissão, foi conversar com os políticos que chegavam para acompanhar o evento.
O senador eleito por São Paulo, do PSDB, Aloysio Nunes, amigão do Serra, foi abordado pelo repórter que fazia a cobertura para a Rede Brasil Atual, que pertence ao mesmo grupo da Revista do Brasil, censurada recentemente pelo partido do senador em questão. Era perto da hora do debate, que começou às 23h, quando o senador eleito com mais de 11 milhões de votos indagou ao repórter:
- É ligada a quem essa revista?
- Aos sindicatos
- Que sindicatos? - falou a assessora do lado dele
- Bancários, metalúrgicos, químicos...
- Pelego, você é pelego - falou o senador
- Não podemos conversar, senador?
- Pelego. sua revista é financiada pelo PT...
- E a Veja, quem financia, senador?
- Pelego
- Que educação, senador
- Pelego filha da puta. Pelego filha da puta!
João me escreveu: "Foi assim, gratuito. Fiquei passado, triste mesmo. Não que não devesse esperar isso, mas agora vai ser isso, vou ser rotulado logo de cara pelo veículo em que eu trabalho? Ninguém associa a tucano-demo logo de cara um sujeito que trabalha na Folha? Uma noite horrível".
Digo o seguinte: é preciso que os políticos respeitem o trabalho dos jornalistas. Essa clima de guerra entre PT e PSDB está doentio. João Peres é um trabalhador, um empregado de um veículo que, sim, tem ligações com os sindicatos. E daí? Isto é público e notório. Nada está escondido. Pergunto ao distinto senador: todos os metalúrgicos, químicos e afins são "filhos da puta", então? Eu sou "filho da puta" também, pois apesar de não ser petista, trabalhei na revista durante um ano. Eis mais um absurdo que se tornou estas eleições. Lastimável.
"A Editora Atitude, que publica os dois veículos (Rede Brasil Atual e Revista do Brasil), condena a postura do senador eleito e entende que liberdade de expressão não é agredir verbalmente quem está em seu direito constitucional de exercer a liberdade de imprensa, muito menos a função de um representante de um Estado no Senado Federal", diz o diretor da editora, Paulo Salvador.
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A arrogância de Serra no debate da Record
Reproduzo artigo de Cláudio Gonzalez, publicado no sítio Vermelho:
O debate entre os presidenciáveis Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) na rede Record, ocorrido na madrugada desta segunda para terça-feira (26), foi bem mais quente que o embate da semana passada na RedeTV! O candidato tucano, orientado a ser mais assertivo, exagerou na dose e mostrou-se grosseiro e indelicado durante todo o debate, ao ponto de tomar um pito de sua adversária Dilma Rousseff nos últimos blocos do programa.
A atitude arrogante de Serra, que em diversas ocasiões chamou Dilma de mentirosa e procurou o tempo todo desqualificar a adversária, contraria a regra número um dos marqueteiros, que sempre pedem para seus clientes controlarem a agressividade.
Já a candidata petista começou um pouco nervosa, mas foi ganhando confiança ao longo do debate e terminou mostrando-se bem mais segura que no debate anterior. Dilma manteve um tom assertivo, mas com moderação e não perdeu a oportunidade de dizer, em três ocasiões, que seu adversário estava sendo arrogante. Dilma cobrou de Serra "um pouco mais de humildade e elegância" e disse ao tucano que "a auto-suficiência e a soberba não levam a um bom resultado, nem num debate e nem a frente de um governo!".
Pré-sal foi o tema dominante
O debate foi repetitivo em muitos temas. Mais uma vez, assuntos religiosos e moralistas, como o aborto ficaram de fora. E o pré-sal e a ameaça de privatização deste recurso surgiu como tema dominante. Trata-se de assunto colocado na campanha pela candidatura de Dilma, portanto desfavorável a José Serra. Enquanto a petista reforça a proposta de transformar a riqueza do pré-sal para financiar o desenvolvimento social, Serra não deixa claro o que fará com esse recursos.
O tucano tentou jogar no colo da petista a alcunha de “privatista”, mas os argumentos que trouxe não convenceram e Dilma teve a oportunidade de esclarecer as diferenças existentes entre o modelo de exploração do pré-sal defendido pelos tucanos e o modelo defendido pelo governo Lula. Dilma afirmou que, ao defender a privatização do pré-sal, Serra quer privatizar o "filé mignon" do Brasil.
O grande problema de Serra neste tema que envolve o pré-sal e a Petrobras é que ele tenta vender um discurso estatizante que não combina com as práticas e a história de seu partido e dele próprio. Assim, suas tentativas de carimbar Dilma como “privatista” não surtem efeito, e pior, podem até mesmo desagradar a base social do tucanato que defende as privatizações.
Outro tema que no começo do debate parecia que ia dominar a discussão - mas não prosperou - foi o dos “malfeitos” de pessoas ligadas a cada candidato. Serra citou o depoimento da ex-ministra Erenice Guerra à Polícia Federal e Dilma respondeu colocando Paulo Preto no meio da roda. Mais uma vez, a petista disse que a diferença entre o governo Lula e os tucanos é que no governo Lula as denúncias são apuradas e nas gestões tucanas os denunciados são protegidos.
O Nordeste também compareceu em várias ocasiões durante o debate. Notou-se um esforço de ambos os candidatos em tentar cativar o eleitor nordestino, que hoje vota majoritariamente em Dilma.
Negação da realidade
Para os eleitores mais informados chegou a ser chocante a sistemática negação que Serra fez dos avanços alcançados pelo atual governo em diversas áreas. Em muitos momentos, o tucano precisou apelar para a mentira deslavada para sustentar este discurso. Quando o assunto era o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), Serra praticamente negou que existam obras no país. Quando o tema foi economia, o tucano atacou a política econômica do atual governo, que segundo ele é caracterizada por "juros siderais, a maior carga tributária do mundo desenvolvido e a menor taxa de investimento do mundo civilizado", esquecendo que na gestão FHC os juros ultrapassaram os 20% e que em todos debates anteriores ele próprio disse que na economia Lula apenas “repetiu” os supostos acertos da gestão FHC. Além disso, minimizou a geração de 14 milhões de empregos da atual gestão. Em sua visão, o que mudou foi o "aumento da fiscalização", o que colaborou para incrementar a formalização do trabalho.
Quando trataram de segurança, Serra novamente tentou desqualificar as ações do governo federal e chegou a chamar de “disco voador” uma tecnologia de vigilância aérea de fronteiras – os veículos não tripulados - reconhecida internacionalmente como uma das maneiras mais eficazes de vigiar grandes extensões territoriais.
Ao comentar uma pergunta de Dilma sobre o processo que o DEM move na Justiça contra o Prouni, Serra disse que não havia ameaça nenhuma ao programa que beneficia estudantes universitários e não assumiu o compromisso de barrar a ação do DEM. Dilma cobrou esta posição do candidato em momento posterior.
Emprego: pior momento de Serra
O pior momento de Dilma no debate foi quando falou sobre segurança pública. Apesar de o tema ter sido amplamente debatido no debate da RedeTV!, a petista novamente não soube defender seu ponto de vista e se atrapalhou ao falar a palavra “política penitenciária”. Um erro banal, mas que costuma virar motivo de piada na plateia e entre a militância adversária.
Já o candidato José Serra teve seu pior momento ao fugir deliberadamente do tema emprego. Dilma perguntou ao tucano sobre sua política de criação de empregos e frisou que gostaria de ter esta resposta pois em três debates anteriores ele não a respondeu. E o que Serra fez? Para desespero de seus aliados e de seu marqueteiro, ele mais uma vez não respondeu. Ficou falando da Petrobras. Só foi responder no último bloco do debate, quando Dilma voltou a perguntar sobre o tema emprego.
Meio ambiente comparece no debate
Por iniciativa de Dilma, o tema ambiental compareceu ao debate depois de ter sido esquecido em eventos anteriores. A candidata questionou Serra sobre política de desmatamento e quis saber qual é a posição do tucano sobre o plano nacional de mudanças climáticas. Ao tratar do tema, Dilma exibiu conhecimento técnico aprofundado do assunto. Na resposta, Serra extrapolou e disse estar comprometido com o “desmatamento zero”. Com isso, pode ter ganho o aplauso de meia dúzia de ambientalistas mais radicais, mas certamente perdeu o apoio de setores agrícolas que enxergam na política de desmatamento zero uma ameaça à expansão da agricultura.
O tucano também não conseguiu expor sua visão nacional para o problema do meio ambiente e, mais uma vez, usou quase todo seu tempo para atacar a adversária.
MST: guerra x diálogo
No último bloco, Serra apostou no discurso direitista e tentou alvejar Dilma vinculando a candidata ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). A mídia demonizou o MST de tal modo que hoje o movimento é realmente mal visto pela maioria dos brasileiros. Mas Dilma conseguiu escapar da armadilha reafirmando sua política de diálogo com os movimentos sociais e estabelecendo uma distinção entre a política do governo e a política do MST.
Já Serra focou o debate deste assunto apenas na suposta contradição de Dilma em dizer que não vestiria o boné do MST e depois vestir. Também criticou os sem-terra dizendo que que o movimento usa a reforma agrária como pretexto para desrespeitar a Justiça e promover destruições. A fragilidade destes argumento deixou Dilma com a faca e o queijo na mão para colar em Serra o adesivo de político que não sabe dialogar. "Nós sempre deixamos claro para o MST que éramos a favor da legalidade", disse Dilma.
A petista acrescentou que o governo federal foi muito mais efetivo para resolver o problema dos sem-terra, e deu como exemplo o programa Luz Para Todos. "Compramos diretamente do agricultor. Demos assistência técnica. Criamos todas as condições para que o pequeno agricultor tivesse acesso ao crédito", afirmou a petista. "Não está certo você achar que o MST é questão de polícia. MST é questão de política pública", acrescentou.
Os sucessivos ataques a entidades como o MST são um grande problema para José Serra. O tucano sairá da campanha como inimigo número um dos movimentos sociais.
Considerações finais
Nas considerações finais, Dilma aproveitou para reforçar a mensagem de que Serra baixou o nível do debate. No restante do tempo, “passeou” pelas regiões do país relatando como cada região foi beneficiada pelo atual governo. Dilma ainda incorporou uma mensagem que costuma ser usada pelos tucanos ao afirmar que as pessoas são mais importantes do que os números da economia: "Quero dizer que meu olhar não é para o PIB e para os juros, é para as pessoas". E terminou, mais uma vez, dizendo que está preparada para ser a primeira mulher presidente do Brasil.
Serra, por sua vez, concluiu o debate dizendo defender a união de todas as regiões do país, e não o antagonismo. "Sempre fui um político nacional, brasileiro", afirma. Em seguida, promete oferecer ao país o seu "passado de lutas". O tom emotivo que tentou imprimir à fala final soou falso e exagerado. A coroação da falsidade ocorreu no momento em que o tucano disse: "eu quero um Brasil onde a verdade prevaleça", isso depois de apelar para mentiras em série durante todo o debate.
Repercussão
No Twitter, durante a madrugada, cinco hashtags ligadas ao debate alcançaram os Trending Topics (assuntos mais comentados): #serramente #debatenarecord Petrobrax PROUNI e Desmatamento Zero. A maioria das mensagens postadas era de apoiadores de Dilma comemorando o bom desempenho da candidata e criticando a postura agressiva de Serra.
A coluna Radar Político, do portal Estadão, reuniu dois cientistas políticos para comentarem o debate durante o evento. A síntese da discussão foi: “Dilma evolui e Serra não convence”.
Vencer Dilma nos debates desta última semana de campanha era uma das apostas que o comando da campanha tucana fazia para tentar reverter a desvantagem de Serra nas pesquisas. Mas pelo que se viu no debate de ontem na Record, foi mais uma oportunidade perdida para a oposição.
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O debate entre os presidenciáveis Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) na rede Record, ocorrido na madrugada desta segunda para terça-feira (26), foi bem mais quente que o embate da semana passada na RedeTV! O candidato tucano, orientado a ser mais assertivo, exagerou na dose e mostrou-se grosseiro e indelicado durante todo o debate, ao ponto de tomar um pito de sua adversária Dilma Rousseff nos últimos blocos do programa.
A atitude arrogante de Serra, que em diversas ocasiões chamou Dilma de mentirosa e procurou o tempo todo desqualificar a adversária, contraria a regra número um dos marqueteiros, que sempre pedem para seus clientes controlarem a agressividade.
Já a candidata petista começou um pouco nervosa, mas foi ganhando confiança ao longo do debate e terminou mostrando-se bem mais segura que no debate anterior. Dilma manteve um tom assertivo, mas com moderação e não perdeu a oportunidade de dizer, em três ocasiões, que seu adversário estava sendo arrogante. Dilma cobrou de Serra "um pouco mais de humildade e elegância" e disse ao tucano que "a auto-suficiência e a soberba não levam a um bom resultado, nem num debate e nem a frente de um governo!".
Pré-sal foi o tema dominante
O debate foi repetitivo em muitos temas. Mais uma vez, assuntos religiosos e moralistas, como o aborto ficaram de fora. E o pré-sal e a ameaça de privatização deste recurso surgiu como tema dominante. Trata-se de assunto colocado na campanha pela candidatura de Dilma, portanto desfavorável a José Serra. Enquanto a petista reforça a proposta de transformar a riqueza do pré-sal para financiar o desenvolvimento social, Serra não deixa claro o que fará com esse recursos.
O tucano tentou jogar no colo da petista a alcunha de “privatista”, mas os argumentos que trouxe não convenceram e Dilma teve a oportunidade de esclarecer as diferenças existentes entre o modelo de exploração do pré-sal defendido pelos tucanos e o modelo defendido pelo governo Lula. Dilma afirmou que, ao defender a privatização do pré-sal, Serra quer privatizar o "filé mignon" do Brasil.
O grande problema de Serra neste tema que envolve o pré-sal e a Petrobras é que ele tenta vender um discurso estatizante que não combina com as práticas e a história de seu partido e dele próprio. Assim, suas tentativas de carimbar Dilma como “privatista” não surtem efeito, e pior, podem até mesmo desagradar a base social do tucanato que defende as privatizações.
Outro tema que no começo do debate parecia que ia dominar a discussão - mas não prosperou - foi o dos “malfeitos” de pessoas ligadas a cada candidato. Serra citou o depoimento da ex-ministra Erenice Guerra à Polícia Federal e Dilma respondeu colocando Paulo Preto no meio da roda. Mais uma vez, a petista disse que a diferença entre o governo Lula e os tucanos é que no governo Lula as denúncias são apuradas e nas gestões tucanas os denunciados são protegidos.
O Nordeste também compareceu em várias ocasiões durante o debate. Notou-se um esforço de ambos os candidatos em tentar cativar o eleitor nordestino, que hoje vota majoritariamente em Dilma.
Negação da realidade
Para os eleitores mais informados chegou a ser chocante a sistemática negação que Serra fez dos avanços alcançados pelo atual governo em diversas áreas. Em muitos momentos, o tucano precisou apelar para a mentira deslavada para sustentar este discurso. Quando o assunto era o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), Serra praticamente negou que existam obras no país. Quando o tema foi economia, o tucano atacou a política econômica do atual governo, que segundo ele é caracterizada por "juros siderais, a maior carga tributária do mundo desenvolvido e a menor taxa de investimento do mundo civilizado", esquecendo que na gestão FHC os juros ultrapassaram os 20% e que em todos debates anteriores ele próprio disse que na economia Lula apenas “repetiu” os supostos acertos da gestão FHC. Além disso, minimizou a geração de 14 milhões de empregos da atual gestão. Em sua visão, o que mudou foi o "aumento da fiscalização", o que colaborou para incrementar a formalização do trabalho.
Quando trataram de segurança, Serra novamente tentou desqualificar as ações do governo federal e chegou a chamar de “disco voador” uma tecnologia de vigilância aérea de fronteiras – os veículos não tripulados - reconhecida internacionalmente como uma das maneiras mais eficazes de vigiar grandes extensões territoriais.
Ao comentar uma pergunta de Dilma sobre o processo que o DEM move na Justiça contra o Prouni, Serra disse que não havia ameaça nenhuma ao programa que beneficia estudantes universitários e não assumiu o compromisso de barrar a ação do DEM. Dilma cobrou esta posição do candidato em momento posterior.
Emprego: pior momento de Serra
O pior momento de Dilma no debate foi quando falou sobre segurança pública. Apesar de o tema ter sido amplamente debatido no debate da RedeTV!, a petista novamente não soube defender seu ponto de vista e se atrapalhou ao falar a palavra “política penitenciária”. Um erro banal, mas que costuma virar motivo de piada na plateia e entre a militância adversária.
Já o candidato José Serra teve seu pior momento ao fugir deliberadamente do tema emprego. Dilma perguntou ao tucano sobre sua política de criação de empregos e frisou que gostaria de ter esta resposta pois em três debates anteriores ele não a respondeu. E o que Serra fez? Para desespero de seus aliados e de seu marqueteiro, ele mais uma vez não respondeu. Ficou falando da Petrobras. Só foi responder no último bloco do debate, quando Dilma voltou a perguntar sobre o tema emprego.
Meio ambiente comparece no debate
Por iniciativa de Dilma, o tema ambiental compareceu ao debate depois de ter sido esquecido em eventos anteriores. A candidata questionou Serra sobre política de desmatamento e quis saber qual é a posição do tucano sobre o plano nacional de mudanças climáticas. Ao tratar do tema, Dilma exibiu conhecimento técnico aprofundado do assunto. Na resposta, Serra extrapolou e disse estar comprometido com o “desmatamento zero”. Com isso, pode ter ganho o aplauso de meia dúzia de ambientalistas mais radicais, mas certamente perdeu o apoio de setores agrícolas que enxergam na política de desmatamento zero uma ameaça à expansão da agricultura.
O tucano também não conseguiu expor sua visão nacional para o problema do meio ambiente e, mais uma vez, usou quase todo seu tempo para atacar a adversária.
MST: guerra x diálogo
No último bloco, Serra apostou no discurso direitista e tentou alvejar Dilma vinculando a candidata ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). A mídia demonizou o MST de tal modo que hoje o movimento é realmente mal visto pela maioria dos brasileiros. Mas Dilma conseguiu escapar da armadilha reafirmando sua política de diálogo com os movimentos sociais e estabelecendo uma distinção entre a política do governo e a política do MST.
Já Serra focou o debate deste assunto apenas na suposta contradição de Dilma em dizer que não vestiria o boné do MST e depois vestir. Também criticou os sem-terra dizendo que que o movimento usa a reforma agrária como pretexto para desrespeitar a Justiça e promover destruições. A fragilidade destes argumento deixou Dilma com a faca e o queijo na mão para colar em Serra o adesivo de político que não sabe dialogar. "Nós sempre deixamos claro para o MST que éramos a favor da legalidade", disse Dilma.
A petista acrescentou que o governo federal foi muito mais efetivo para resolver o problema dos sem-terra, e deu como exemplo o programa Luz Para Todos. "Compramos diretamente do agricultor. Demos assistência técnica. Criamos todas as condições para que o pequeno agricultor tivesse acesso ao crédito", afirmou a petista. "Não está certo você achar que o MST é questão de polícia. MST é questão de política pública", acrescentou.
Os sucessivos ataques a entidades como o MST são um grande problema para José Serra. O tucano sairá da campanha como inimigo número um dos movimentos sociais.
Considerações finais
Nas considerações finais, Dilma aproveitou para reforçar a mensagem de que Serra baixou o nível do debate. No restante do tempo, “passeou” pelas regiões do país relatando como cada região foi beneficiada pelo atual governo. Dilma ainda incorporou uma mensagem que costuma ser usada pelos tucanos ao afirmar que as pessoas são mais importantes do que os números da economia: "Quero dizer que meu olhar não é para o PIB e para os juros, é para as pessoas". E terminou, mais uma vez, dizendo que está preparada para ser a primeira mulher presidente do Brasil.
Serra, por sua vez, concluiu o debate dizendo defender a união de todas as regiões do país, e não o antagonismo. "Sempre fui um político nacional, brasileiro", afirma. Em seguida, promete oferecer ao país o seu "passado de lutas". O tom emotivo que tentou imprimir à fala final soou falso e exagerado. A coroação da falsidade ocorreu no momento em que o tucano disse: "eu quero um Brasil onde a verdade prevaleça", isso depois de apelar para mentiras em série durante todo o debate.
Repercussão
No Twitter, durante a madrugada, cinco hashtags ligadas ao debate alcançaram os Trending Topics (assuntos mais comentados): #serramente #debatenarecord Petrobrax PROUNI e Desmatamento Zero. A maioria das mensagens postadas era de apoiadores de Dilma comemorando o bom desempenho da candidata e criticando a postura agressiva de Serra.
A coluna Radar Político, do portal Estadão, reuniu dois cientistas políticos para comentarem o debate durante o evento. A síntese da discussão foi: “Dilma evolui e Serra não convence”.
Vencer Dilma nos debates desta última semana de campanha era uma das apostas que o comando da campanha tucana fazia para tentar reverter a desvantagem de Serra nas pesquisas. Mas pelo que se viu no debate de ontem na Record, foi mais uma oportunidade perdida para a oposição.
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Militância na rua e a revolução cidadã
Reproduzo artigo de Juarez Guimarães, publicado no sítio Carta Maior:
Se a figura anônima, sinistra e multiforme do caluniador dominou a cena da última quinzena do primeiro turno das eleições, parece ser agora a figura pública, irradiante e multitudinária do cidadão ativo que vai ao centro. Se a primeira fazia da mídia empresarial a sua morada e espelho de amplificação, a segunda está nas ruas, das cidades ou virtuais, com suas vozes e gestos insubmissos.
Se, ao final do primeiro turno, a candidatura Serra havia se encorpado à direita, como se o inconsciente conservador brasileiro tivesse vindo à tona, de fanáticos religiosos ao que há de protofascismo entendido como reação agressiva à presença dos pobres e negros na democracia brasileira, a candidatura Dilma Roussef está se encorpando claramente à esquerda.
À postura saliente do clero de ultra-direita, a tradição da Teologia da Libertação, com Dom Pedro Casaldáliga, Dom Tomaz Balduíno, Leonardo Boff e Frei Betto à frente, tomou em uníssomo o seu posicionamento político unitário mais importante nos últimos dez anos. O voto crítico do PSOL em Dilma Roussef, com a derrota dos setores mais sectários, deve ser justamente valorizado para diálogos futuros. O engajamento nítido e vibrante do MST, que já havia decidido o “voto contra Serra” no primeiro turno, assim como da Consulta Popular, ajudaram a criar uma espécie de frente única dos movimentos sociais.
Em torno ao posicionamento de Chico Buarque, esta espécie de fundamento gauche do que há de melhor na tradição cultural brasileira, promoveu-se, enfim, o encontro dos artistas e intelectuais no Rio de Janeiro, elaborando pela primeira vez uma espécie de aura lírica da campanha. Reitores de universidades federais, professores e cientistas de todo o país, a UNE com suas tradições e rebeldias estudantis, vieram a público dar testemunho dos progressos qualitativos alcançados nos governos Lula.
O que havia de esquerda e progressista em torno à candidatura de Marina decidiu-se pelo apoio à candidatura Dilma. Esta consciência ecológica crítica é fundamental pois nela está, de novo, a reivindicação do eco-socialismo, da fusão do vermelho e do verde. O posicionamento equívoco de Marina, equilibrando-se com os setores fisiológicos e conservadores do PV, frustrou e entristeceu quem apostava na reafirmação dos seus compromissos com os pobres e oprimidos do Brasil.
Houve, de enorme importância, um fenômeno novo: a formação de uma vastíssima rede democrática na Internet, informativa e argumentativa, com picos que eram registrados inclusive como recordes na rede mundial. Alguns blogs – como o da Cidadania de Eduardo Guimarães, o Blog de Rodrigo Vianna, de Nassif, o portal da Carta Maior e o portal da Carta Capital, e dezenas de outros – passaram a centralizar e dialogar com centenas de milhares de pessoas cotidianamente. Jornais eletrônicos diários de campanha passaram a ser feitos.
Mas, principalmente, tomada de um sentimento dramático, a militância cidadã da esquerda brasileira, entendida em uma significação muito ampla, como social, política e cultural ao mesmo tempo, como centenas de milhares, talvez como alguns milhões de ativistas, entraram decididamente na campanha. Em Belo Horizonte, mesmo após as divisões e derrotas amargas colhidas no primeiro turno, esta militância cidadã fez o que parecia impossível e que desde 1989 não era feito: conseguiu abraçar a Avenida do Contorno, a principal avenida da cidade, em um encontro de antigas e novas gerações, repondo no centro da vida pública da capital de Minas os motivos e esperanças da esquerda. O jornal Estado de Minas, de domingo 24 de outubro, trazia a chamada discretamente estampada na página 13: "Militância do PT repete a campanha de Lula e volta às ruas em apoio à candidatura de Dilma" e a manchete: “Abraço à Contorno depois de 21 anos”.
Como anotou Maria Inez Nassif, no jornal Valor Econômico, desde 2002 a esquerda brasileira não alcançava um arco tão amplo. Mas talvez, nem aí, no momento daquela vitória histórica, este arco fosse socialmente tão vasto e tão colorido.
Revolução democrática: o nome que precisa ser dito
O segundo turno das eleições de 2006 pode ser entendido historicamente como uma derrota política programática dos neoliberais, mais nítida ainda daquela que ocorreu em 2002. O ataque central feito às privatizações desmontou a identidade da candidatura Alckmin que, certamente obedecendo aos estímulos do marketing político que lhe soprava que esta agenda era impopular, apareceu vestido em uma camiseta da Caixa Econômica Federal. Não é apenas por ser uma imagem, mas exatamente por expressar um conceito, que a figura algo ridícula do conservador de terno preto Alckmin vestindo uma camiseta de uma estatal significou o segundo turno: ele veio a ter menos votos do que aqueles obtidos no primeiro turno.
E como se expressasse imediatamente a conquista pública obtida neste segundo turno, uma nova legitimidade para a ação econômica do Estado e para as políticas sociais, o segundo governo Lula foi exatamente marcado pelo PAC e pela expansão do emprego, do salário-mínimo, das políticas sociais, da agricultura familiar, que vieram coladas e impulsionando as novas dinâmicas macro-econômicas.
Mas se fomos capazes de compreender que Serra estava escavando uma possibilidade de vitória, articulando uma frente ampla liberal-conservadora, fanática religiosa e proto-fascista, é absolutamente necessário que revelemos claramente para o cidadão brasileiro – e para nós próprios! – o sentido e o nome do que estamos construindo. No caso de Serra, trata-se exatamente de um projeto de uma contra-revolução democrática, no sentido de que todas as conquistas democráticas obtidas nos dois mandatos de Lula – de não repressão e participação dos movimentos sociais, de direitos do trabalho e novos direitos sociais, de soberania nacional e reposicionamento público do estado – estariam em perigo com uma eventual vitória.
Se compreendemos a política democrática como formação de consensos sociais amplos, de razões argumentativas que disputam legitimidades e interesses publicamente, então, a comunicação não pode ser mais vista como externa à política. Não se faz a política e, depois, a comunicação. O conceito e a imagem estão já no próprio ato da política democrática. Assim, se não falamos inteiramente a linguagem da democracia, um campo será aberto, como foi no primeiro turno, para que um discurso liberal conservador ocupe o centro da cena. Se não falamos que lutamos contra a corrupção – é impressionante que este tema não tenho sido sequer abordado nos programas de Dilma – então, ficamos vulneráveis à acusação incessante e diariamente repetida que o PT e o governo Lula são corruptos.
Quando se fala dos feitos do governo Lula mas não se fala da sua base cidadã ativa, que tornou possível estes feitos, então, é como se um recado de desmobilização fosse transmitido. Quando criticamos a mídia empresarial, é porque ela seca o pluralismo de opiniões, dá voz aos poderosos e fecha a boca da população, é porque queremos uma opinião pública democrática, mais plural, mais informada e mais reflexiva no país. Se não falamos isto, então, ficamos de novo vulneráveis à campanha que somos a favor da volta da censura do estado quando criticamos a mídia empresarial.
Neste segundo turno, a campanha de Dilma adquiriu claramente – desde o debate decisivo da tv Bandeirantes, logo no início do segundo turno – um discurso político antagonístico ( ao contrário da propaganda auto-referida do primeiro turno), passou a dialogar com o movimento ativo das suas bases democráticas e sociais e, principalmente, foi capaz de recolocar no centro da agenda de campanha o eixo aprofundamento das mudanças ou retrocesso do Brasil. Todas as pesquisas publicadas – na média de seus índices e nas linhas dinâmicas da definição de voto – refletem estas vitórias políticas da campanha de Dilma sobre a campanha reacionária dirigida pelo PSDB.
Mas o que acontecerá nesta última semana?
O retorno do caluniador?
Utilizando-se de uma analogia militar para caracterizar a “fúria midiática” nestes últimos dias das eleições, Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania, fala em “bombardeio de saturação”. Utilizando-se de um raciocínio semelhante, um outro analista fala da “concentração de todas as calúnias” a partir de um artifício – “uma igreja evangélica queimada”, um carro de reportagem da Globo depredado ou qualquer outro fato que se possa imaginar. Uma “armação” imprevista será feita no último debate da Globo?
Esperar expectante, angustiado e ansioso ou, pior ainda, dar já por vencida uma eleição que não foi conquistada?
Decididamente, esta não é a melhor atitude: é preciso uma iniciativa política central, que marque os dias finais da provável vitória de Dilma e que neutralize a ação potencial dos reacionários. Nos seus últimos dias de campanha, a candidatura Tarso Genro conseguiu neutralizar a pressão de voto pelo segundo turno e o anti-petismo forte no Sul, ocupando a cena política com um “Pacto Republicano”, frente a entidades sociais e democráticas do Estado, assumindo compromissos de direitos e participação cidadã, soldando sua base política e social.
Já se elaborou no centro do governo Lula, a proposta da Consolidação das Leis Sociais, articulada à institucionalização das Conferências Nacionais e de todo uma cultura participativa no governo federal. Por que não trazê-la à público agora, como síntese que solda e aglutine toda a base política e social que sustenta a candidatura Dilma?
Voto a voto, até a última hora do último dia, a militância cidadã da campanha de Dilma está em expansão. Confirmando que estamos diante do maior épico feminino de nossa história, a foto de Dilma - militante dos anos sessenta, candidata à presidência – já aparece em dezenas de milhares de camisetas militantes em todo o Brasil. Esta Dilma presentificada estava por todos os lados, por mais de vinte pontos, no abraço à avenida do Contorno em Belo Horizonte. Nesta imagem da multiplicação democrática de sua figura, na linha do passado e do futuro, mora o conceito da revolução democrática.
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Se a figura anônima, sinistra e multiforme do caluniador dominou a cena da última quinzena do primeiro turno das eleições, parece ser agora a figura pública, irradiante e multitudinária do cidadão ativo que vai ao centro. Se a primeira fazia da mídia empresarial a sua morada e espelho de amplificação, a segunda está nas ruas, das cidades ou virtuais, com suas vozes e gestos insubmissos.
Se, ao final do primeiro turno, a candidatura Serra havia se encorpado à direita, como se o inconsciente conservador brasileiro tivesse vindo à tona, de fanáticos religiosos ao que há de protofascismo entendido como reação agressiva à presença dos pobres e negros na democracia brasileira, a candidatura Dilma Roussef está se encorpando claramente à esquerda.
À postura saliente do clero de ultra-direita, a tradição da Teologia da Libertação, com Dom Pedro Casaldáliga, Dom Tomaz Balduíno, Leonardo Boff e Frei Betto à frente, tomou em uníssomo o seu posicionamento político unitário mais importante nos últimos dez anos. O voto crítico do PSOL em Dilma Roussef, com a derrota dos setores mais sectários, deve ser justamente valorizado para diálogos futuros. O engajamento nítido e vibrante do MST, que já havia decidido o “voto contra Serra” no primeiro turno, assim como da Consulta Popular, ajudaram a criar uma espécie de frente única dos movimentos sociais.
Em torno ao posicionamento de Chico Buarque, esta espécie de fundamento gauche do que há de melhor na tradição cultural brasileira, promoveu-se, enfim, o encontro dos artistas e intelectuais no Rio de Janeiro, elaborando pela primeira vez uma espécie de aura lírica da campanha. Reitores de universidades federais, professores e cientistas de todo o país, a UNE com suas tradições e rebeldias estudantis, vieram a público dar testemunho dos progressos qualitativos alcançados nos governos Lula.
O que havia de esquerda e progressista em torno à candidatura de Marina decidiu-se pelo apoio à candidatura Dilma. Esta consciência ecológica crítica é fundamental pois nela está, de novo, a reivindicação do eco-socialismo, da fusão do vermelho e do verde. O posicionamento equívoco de Marina, equilibrando-se com os setores fisiológicos e conservadores do PV, frustrou e entristeceu quem apostava na reafirmação dos seus compromissos com os pobres e oprimidos do Brasil.
Houve, de enorme importância, um fenômeno novo: a formação de uma vastíssima rede democrática na Internet, informativa e argumentativa, com picos que eram registrados inclusive como recordes na rede mundial. Alguns blogs – como o da Cidadania de Eduardo Guimarães, o Blog de Rodrigo Vianna, de Nassif, o portal da Carta Maior e o portal da Carta Capital, e dezenas de outros – passaram a centralizar e dialogar com centenas de milhares de pessoas cotidianamente. Jornais eletrônicos diários de campanha passaram a ser feitos.
Mas, principalmente, tomada de um sentimento dramático, a militância cidadã da esquerda brasileira, entendida em uma significação muito ampla, como social, política e cultural ao mesmo tempo, como centenas de milhares, talvez como alguns milhões de ativistas, entraram decididamente na campanha. Em Belo Horizonte, mesmo após as divisões e derrotas amargas colhidas no primeiro turno, esta militância cidadã fez o que parecia impossível e que desde 1989 não era feito: conseguiu abraçar a Avenida do Contorno, a principal avenida da cidade, em um encontro de antigas e novas gerações, repondo no centro da vida pública da capital de Minas os motivos e esperanças da esquerda. O jornal Estado de Minas, de domingo 24 de outubro, trazia a chamada discretamente estampada na página 13: "Militância do PT repete a campanha de Lula e volta às ruas em apoio à candidatura de Dilma" e a manchete: “Abraço à Contorno depois de 21 anos”.
Como anotou Maria Inez Nassif, no jornal Valor Econômico, desde 2002 a esquerda brasileira não alcançava um arco tão amplo. Mas talvez, nem aí, no momento daquela vitória histórica, este arco fosse socialmente tão vasto e tão colorido.
Revolução democrática: o nome que precisa ser dito
O segundo turno das eleições de 2006 pode ser entendido historicamente como uma derrota política programática dos neoliberais, mais nítida ainda daquela que ocorreu em 2002. O ataque central feito às privatizações desmontou a identidade da candidatura Alckmin que, certamente obedecendo aos estímulos do marketing político que lhe soprava que esta agenda era impopular, apareceu vestido em uma camiseta da Caixa Econômica Federal. Não é apenas por ser uma imagem, mas exatamente por expressar um conceito, que a figura algo ridícula do conservador de terno preto Alckmin vestindo uma camiseta de uma estatal significou o segundo turno: ele veio a ter menos votos do que aqueles obtidos no primeiro turno.
E como se expressasse imediatamente a conquista pública obtida neste segundo turno, uma nova legitimidade para a ação econômica do Estado e para as políticas sociais, o segundo governo Lula foi exatamente marcado pelo PAC e pela expansão do emprego, do salário-mínimo, das políticas sociais, da agricultura familiar, que vieram coladas e impulsionando as novas dinâmicas macro-econômicas.
Mas se fomos capazes de compreender que Serra estava escavando uma possibilidade de vitória, articulando uma frente ampla liberal-conservadora, fanática religiosa e proto-fascista, é absolutamente necessário que revelemos claramente para o cidadão brasileiro – e para nós próprios! – o sentido e o nome do que estamos construindo. No caso de Serra, trata-se exatamente de um projeto de uma contra-revolução democrática, no sentido de que todas as conquistas democráticas obtidas nos dois mandatos de Lula – de não repressão e participação dos movimentos sociais, de direitos do trabalho e novos direitos sociais, de soberania nacional e reposicionamento público do estado – estariam em perigo com uma eventual vitória.
Se compreendemos a política democrática como formação de consensos sociais amplos, de razões argumentativas que disputam legitimidades e interesses publicamente, então, a comunicação não pode ser mais vista como externa à política. Não se faz a política e, depois, a comunicação. O conceito e a imagem estão já no próprio ato da política democrática. Assim, se não falamos inteiramente a linguagem da democracia, um campo será aberto, como foi no primeiro turno, para que um discurso liberal conservador ocupe o centro da cena. Se não falamos que lutamos contra a corrupção – é impressionante que este tema não tenho sido sequer abordado nos programas de Dilma – então, ficamos vulneráveis à acusação incessante e diariamente repetida que o PT e o governo Lula são corruptos.
Quando se fala dos feitos do governo Lula mas não se fala da sua base cidadã ativa, que tornou possível estes feitos, então, é como se um recado de desmobilização fosse transmitido. Quando criticamos a mídia empresarial, é porque ela seca o pluralismo de opiniões, dá voz aos poderosos e fecha a boca da população, é porque queremos uma opinião pública democrática, mais plural, mais informada e mais reflexiva no país. Se não falamos isto, então, ficamos de novo vulneráveis à campanha que somos a favor da volta da censura do estado quando criticamos a mídia empresarial.
Neste segundo turno, a campanha de Dilma adquiriu claramente – desde o debate decisivo da tv Bandeirantes, logo no início do segundo turno – um discurso político antagonístico ( ao contrário da propaganda auto-referida do primeiro turno), passou a dialogar com o movimento ativo das suas bases democráticas e sociais e, principalmente, foi capaz de recolocar no centro da agenda de campanha o eixo aprofundamento das mudanças ou retrocesso do Brasil. Todas as pesquisas publicadas – na média de seus índices e nas linhas dinâmicas da definição de voto – refletem estas vitórias políticas da campanha de Dilma sobre a campanha reacionária dirigida pelo PSDB.
Mas o que acontecerá nesta última semana?
O retorno do caluniador?
Utilizando-se de uma analogia militar para caracterizar a “fúria midiática” nestes últimos dias das eleições, Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania, fala em “bombardeio de saturação”. Utilizando-se de um raciocínio semelhante, um outro analista fala da “concentração de todas as calúnias” a partir de um artifício – “uma igreja evangélica queimada”, um carro de reportagem da Globo depredado ou qualquer outro fato que se possa imaginar. Uma “armação” imprevista será feita no último debate da Globo?
Esperar expectante, angustiado e ansioso ou, pior ainda, dar já por vencida uma eleição que não foi conquistada?
Decididamente, esta não é a melhor atitude: é preciso uma iniciativa política central, que marque os dias finais da provável vitória de Dilma e que neutralize a ação potencial dos reacionários. Nos seus últimos dias de campanha, a candidatura Tarso Genro conseguiu neutralizar a pressão de voto pelo segundo turno e o anti-petismo forte no Sul, ocupando a cena política com um “Pacto Republicano”, frente a entidades sociais e democráticas do Estado, assumindo compromissos de direitos e participação cidadã, soldando sua base política e social.
Já se elaborou no centro do governo Lula, a proposta da Consolidação das Leis Sociais, articulada à institucionalização das Conferências Nacionais e de todo uma cultura participativa no governo federal. Por que não trazê-la à público agora, como síntese que solda e aglutine toda a base política e social que sustenta a candidatura Dilma?
Voto a voto, até a última hora do último dia, a militância cidadã da campanha de Dilma está em expansão. Confirmando que estamos diante do maior épico feminino de nossa história, a foto de Dilma - militante dos anos sessenta, candidata à presidência – já aparece em dezenas de milhares de camisetas militantes em todo o Brasil. Esta Dilma presentificada estava por todos os lados, por mais de vinte pontos, no abraço à avenida do Contorno em Belo Horizonte. Nesta imagem da multiplicação democrática de sua figura, na linha do passado e do futuro, mora o conceito da revolução democrática.
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União e olho vivo contra as provocações
Reproduzo artigo enviado pelo amigo Beto Almeida, membro do conselho diretivo da Telesur:
É cama de gato
Olha a garra dele
É cama de gato
Melhor se cuidar
No campo do adversário
É bom jogar com muita calma
Procurando pela brecha
Pra poder ganhar. Gonzaguinha
Não se trata de paranóia, mas de leis da história, pelas quais, as classes poderosas na sociedade usam de todos os métodos, inclusive armações truculentas, inventam conflitos ou os promovem diretamente, para evitar que a vontade soberana de um povo seja vencedora.
Não há aqui nenhuma novidade, nem exagero. É bom se cuidar contra a cama-de-gato e manter total calma e atenção. A própria campanha conservadora marcada pela clara linha de sufocar o debate democrático de projetos e propostas para o país, impondo uma pauta de corte moralista obscurantista, já tem a envergadura de um golpe midiático. E foi articulada junto aos laboratórios dos grandes poderes internacionais que alimentam a malignidade intrínseca da mídia comercial. A frustrada tentativa de transformar a bolinha de papel e uma fita adesiva, até agora invisível, em agressões que se equivaleriam a “terrorismo” revela uma intenção. Sinistra intenção.
Lições que ficam
Vale relembrar alguns episódios mais recentes. Em 2002, uma passeata da oposição que percorria as ruas de Caracas com autorização dos poderes públicos foi repentinamente desviada em direção ao Palácio Presidencial, mesmo sabendo que nas proximidades havia já outra manifestação de partidários do governo bolivariano. Ao chegar próxima à Ponte Llaguno, num determinado horário, assim que os líderes da passeata opositora retiraram-se, emblemáticamente, uma enorme balaceira vinda dos terraços dos prédios começa a atingir fatalmente muitos dos manifestantes. Dezenas perderam a vida.
A responsabilidade pelos tiros foi imediatamente atribuída ao governo, antes de qualquer investigação ou prova. Mas provocou uma comoção tal que horas mais tarde estava concretizado o golpe de estado que tirou da presidência, por 47 horas, mediante sequestro, o presidente da república, Hugo Chávez. O brilhante documentário “Puente Llaguno”, acessível na internet, já desmacarou a farsa. Os responsáveis já foram identificados, processados e muitos já estão presos. Pertenciam à Guarda Municipal, comandada pelo prefeito de Caracas, atuante no grupo de articuladores do golpe de estado.
Rafael Correa, presidente do Equador, acaba de ser alvo de tentativa similar. Não será perdoado nunca por ter recuperado a soberania nacional sobre a Base Aérea Manta, antes sob comando militar dos EUA...
Outro episódio que deixa lições: as explosões na estação ferroviária de Atocha, em Madrid, em 11 de março de 2004, às vésperas das eleições gerais na Espanha. Imediatamente, o primeiro-ministro José Maria Aznar, candidato à reeleição, responsabilizou a ETA, e, de certo modo a oposição por, segundo política conservadora, que incluía o envio de tropas para o Iraque e o Afeganistão, não permitir um enfrentamento mais duro com a questão basca.
Seu pronunciamento era totalmente dirigido a pesar negativamente na tendência das eleições, com o apoio dos grandes meios de comunicação, quando já se evidenciava a vitória do PSOE, do hoje primeiro ministro José Luiz Zapatero. Não fora uma rebelião social de jovens, intelectuais, sindicalistas, usando as novas tecnologias de comunicação, que conseguiu parar o intuito golpista, quem sabe o candidato direitista, Aznar, não tivesse sido finalmente derrotado como foi. Vitorosioso Zapatero, alguns meses depois a Espanha retirava suas tropas do Iraque.
Nem é preciso ir tão longe. O Brasil tem lamentáveis e traumáticas histórias de ações provocadoras organizadas para justificar guinadas mais à direita, para desestabilizar governantes democráticamente eleitos, para justificar golpes, enfim, para defender os interesses do grande capital em cada momento. A popularidade de Lula é um indicador singular, nem há a mesma condição do pré golpe de 64, mas Jango tinha uma popularidade de 71 por cento ao ser derrubado da presidência.
Uma história trágica
Alguém já lembrou por aí o crime da Rua Toneleiros, quando foi morto o Major Vaz e, como desdobramento, instala-se uma Comissão de Inquérito no Galeão, instrumento de desestabilização do Governo Vargas. Era uma iniciativa combinada com uma ação midiática golpista que proclamava abertamente, diuturnamente, a deposição do presidente eleito. Este preferiu paralisar o golpe com o tiro no coração que despertou a fúria popular.
Seguindo a trilha, para nos acautelar e ter consciência, mas não para nos intimidar, vale citar que a história do Brasil tem, nestas páginas lúgubres, o Plano Cohen, o Plano da Explosão do Gasômetro do Rio, a explosão do Rio-Centro, o Proconsult e o sequestro do empresário Abílio Diniz, na antevéspera da eleição presidencial de 1989.
Nem sempre há como evitar estas sinistras ações tramadas nos porões. Nem sempre funcionam. Mas sempre que a sociedade vai avançando em conquistas democráticas, em participação popular organizada, consolidando instituições, partidos, sindicatos, em distribuição de renda, setores conservadores e reacionários tentam impedir que as mudanças sociais sejam irreversíveis, que se consolide a popularidade e se afirmem as lideranças mais avançadas. Tentam usar o processo eleitoral que é o mais manipulável, mas quando fracassam, como na Venezuela, buscam o caminho da conspiração, sem medir esforços e sem qualquer escrúpulo.
Mesmo quando os grandes meios de comunicação comercial estejam pouco dispostos a investigar a sua verdadeira autoria, ou até mesmo ecoem tais episódios com o sensacionalismo mais exacerbado, destacando eventuais coincidências com sua linha editorial, na proporção inversamente contrária aos procedimentos obrigatórios para uma verdadeira apuração jornalística. O Rio-Centro, por exemplo, permanece em penumbra até hoje...
Nunca se sabe o que irá ocorrer, mas, sabemos sempre que quando bilionários ou trilionários interesses estiverem em jogo - como os do petróleo pré-sal, da riqueza imensa do nióbio e do urãnio, apenas para dar alguns exemplos - as oligarquias internacionais que promoveram guerras, golpes de estado, ditaduras, carnificinas mil, etc, estarão sempre cogitando a utilização de meios que lhes assegurem seus nefastos e injustificáveis privilégios sobre o patrimônio de outros povos.
Fiscalização
Da mesma forma que as mobilizações de rua, muito comuns em momento tão decisivo como este, devem ser organizadas com detalhes e contar algum dispositivo adequado de segurança, feita pelos próprios militantes, prática usada em muitos países de maior estabilidade democrática.
É preciso evitar enfrentamentos de militância nas ruas, que ofereçam às forças conservadoras o pretexto que buscam para alterar o processo democrático. O episódio da bolinha de papel é emblemático, imagine-se se houvesse um ferido da oposição: escândalo nacional! O dia 31 está chegando...
Mas, há sim o que pode ser feito e é um procedimento em que a militância pode ter papel decisivo. Trata-se da fiscalização da votação, do começo ao fim.
As fragilidades
Deve-se estar atento às conclusões do Fórum do Voto Seguro - votoseguro.org.br - indicando que a urna eletrônica brasileira foi rejeitada por todos os mais de 50 países que vieram conhecê-la. Que é proibida em dezenas de países por não materializar o voto e por identificar o eleitor (exemplo: Alemanha, Holanda, Reino Unido, 40 estados dos EUA, Argentina, México e Paraguai) e que até mesmo o inventor da Assinatura Digital condena a ausência da materialização do voto.
E também quando aponta que é a Autoridade Eleitoral que executa/administra, legisla/regulamenta (a fiscalização permitida é feita com regras do próprio fiscalizado) julga e muitas vezes ignora as próprias regras, que recebe as denúncias, protela ou arquiva, e finalmente, julga-se e normalmente absolve-se, só a participação militante pode fazer alguma diferença
Especialmente nos maiores colégios eleitorais, a militância deve estar atualizada sobre as fragilidades mais evidentes e com sua presença atenta e cidadã poderá evitar a ocorrência das irregularidades mais comuns.
Urna no cerrado
Entre elas, aquela que é feita ao final da votação. Os mapas eleitorais indicam que uma grande afluxo de votação estaria ocorrendo nos momentos finais, prestes ao fechamento da urna. Será? É indispensável que o fiscal esteja até o momento da totalização de cada seção eleitoral e exige uma cópia impressa do boletim de urna, conforme reza a lei eleitoral, mas nem sempre é cumprido. Uma fiscalização ausente, omissa, facilita esta irregularidade super comum, pois, sem emissão impressa da totalização de cada seção, no transporte da urna para o Tribunal muitos eventos heteroxos podem ocorrer, desde a troca do cartão ou pura e simplesmente a troca da própria urna.
O deputado federal Geraldo Magela, candidato derrotado ao governo do Distrito Federal em 2002, relatou em Comissão na Câmara Federal sobre uma certa quantidade de urnas eletrônica encontradas abandonadas em pleno cerrado que rodeia Brasília naquele pleito. Mas, com a totalização impressa em mãos, aquela emitida na seção no ato de fechamento da urna, qualquer discrepância relevante poderá ser detectada quando do ato de se fazer a totalização em escala superior, já no Tribunal.
União e olho vivo
Assim, de olho em nossa complexa história, vale manter muita calma e maracujina diante de provocações, como diz a música do Gonzaguinha. E que toda a militância que apareceu pouco até momento, apareça agora generosa, atuante, inteligente e perspicaz na fiscalização cidadã e republicana.
Sem falar que muito mais importante e agradável que qualquer empurra-empurra de rua é a tarefa de dirigir argumentos convincentes aos que se abstiveram, aos que ainda acham, apesar de tudo, que os candidatos são iguais e por isso votaram nulo ou em branco. Este contingente está na escala dos milhões. Decide qualquer eleição. E pode decidir se o país seguirá construindo sua soberania com justiça social ou se retorna à era da vassalagem internacional e “à mania de falar fino com Washington”, como disse o Chico Buarque.
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É cama de gato
Olha a garra dele
É cama de gato
Melhor se cuidar
No campo do adversário
É bom jogar com muita calma
Procurando pela brecha
Pra poder ganhar. Gonzaguinha
Não se trata de paranóia, mas de leis da história, pelas quais, as classes poderosas na sociedade usam de todos os métodos, inclusive armações truculentas, inventam conflitos ou os promovem diretamente, para evitar que a vontade soberana de um povo seja vencedora.
Não há aqui nenhuma novidade, nem exagero. É bom se cuidar contra a cama-de-gato e manter total calma e atenção. A própria campanha conservadora marcada pela clara linha de sufocar o debate democrático de projetos e propostas para o país, impondo uma pauta de corte moralista obscurantista, já tem a envergadura de um golpe midiático. E foi articulada junto aos laboratórios dos grandes poderes internacionais que alimentam a malignidade intrínseca da mídia comercial. A frustrada tentativa de transformar a bolinha de papel e uma fita adesiva, até agora invisível, em agressões que se equivaleriam a “terrorismo” revela uma intenção. Sinistra intenção.
Lições que ficam
Vale relembrar alguns episódios mais recentes. Em 2002, uma passeata da oposição que percorria as ruas de Caracas com autorização dos poderes públicos foi repentinamente desviada em direção ao Palácio Presidencial, mesmo sabendo que nas proximidades havia já outra manifestação de partidários do governo bolivariano. Ao chegar próxima à Ponte Llaguno, num determinado horário, assim que os líderes da passeata opositora retiraram-se, emblemáticamente, uma enorme balaceira vinda dos terraços dos prédios começa a atingir fatalmente muitos dos manifestantes. Dezenas perderam a vida.
A responsabilidade pelos tiros foi imediatamente atribuída ao governo, antes de qualquer investigação ou prova. Mas provocou uma comoção tal que horas mais tarde estava concretizado o golpe de estado que tirou da presidência, por 47 horas, mediante sequestro, o presidente da república, Hugo Chávez. O brilhante documentário “Puente Llaguno”, acessível na internet, já desmacarou a farsa. Os responsáveis já foram identificados, processados e muitos já estão presos. Pertenciam à Guarda Municipal, comandada pelo prefeito de Caracas, atuante no grupo de articuladores do golpe de estado.
Rafael Correa, presidente do Equador, acaba de ser alvo de tentativa similar. Não será perdoado nunca por ter recuperado a soberania nacional sobre a Base Aérea Manta, antes sob comando militar dos EUA...
Outro episódio que deixa lições: as explosões na estação ferroviária de Atocha, em Madrid, em 11 de março de 2004, às vésperas das eleições gerais na Espanha. Imediatamente, o primeiro-ministro José Maria Aznar, candidato à reeleição, responsabilizou a ETA, e, de certo modo a oposição por, segundo política conservadora, que incluía o envio de tropas para o Iraque e o Afeganistão, não permitir um enfrentamento mais duro com a questão basca.
Seu pronunciamento era totalmente dirigido a pesar negativamente na tendência das eleições, com o apoio dos grandes meios de comunicação, quando já se evidenciava a vitória do PSOE, do hoje primeiro ministro José Luiz Zapatero. Não fora uma rebelião social de jovens, intelectuais, sindicalistas, usando as novas tecnologias de comunicação, que conseguiu parar o intuito golpista, quem sabe o candidato direitista, Aznar, não tivesse sido finalmente derrotado como foi. Vitorosioso Zapatero, alguns meses depois a Espanha retirava suas tropas do Iraque.
Nem é preciso ir tão longe. O Brasil tem lamentáveis e traumáticas histórias de ações provocadoras organizadas para justificar guinadas mais à direita, para desestabilizar governantes democráticamente eleitos, para justificar golpes, enfim, para defender os interesses do grande capital em cada momento. A popularidade de Lula é um indicador singular, nem há a mesma condição do pré golpe de 64, mas Jango tinha uma popularidade de 71 por cento ao ser derrubado da presidência.
Uma história trágica
Alguém já lembrou por aí o crime da Rua Toneleiros, quando foi morto o Major Vaz e, como desdobramento, instala-se uma Comissão de Inquérito no Galeão, instrumento de desestabilização do Governo Vargas. Era uma iniciativa combinada com uma ação midiática golpista que proclamava abertamente, diuturnamente, a deposição do presidente eleito. Este preferiu paralisar o golpe com o tiro no coração que despertou a fúria popular.
Seguindo a trilha, para nos acautelar e ter consciência, mas não para nos intimidar, vale citar que a história do Brasil tem, nestas páginas lúgubres, o Plano Cohen, o Plano da Explosão do Gasômetro do Rio, a explosão do Rio-Centro, o Proconsult e o sequestro do empresário Abílio Diniz, na antevéspera da eleição presidencial de 1989.
Nem sempre há como evitar estas sinistras ações tramadas nos porões. Nem sempre funcionam. Mas sempre que a sociedade vai avançando em conquistas democráticas, em participação popular organizada, consolidando instituições, partidos, sindicatos, em distribuição de renda, setores conservadores e reacionários tentam impedir que as mudanças sociais sejam irreversíveis, que se consolide a popularidade e se afirmem as lideranças mais avançadas. Tentam usar o processo eleitoral que é o mais manipulável, mas quando fracassam, como na Venezuela, buscam o caminho da conspiração, sem medir esforços e sem qualquer escrúpulo.
Mesmo quando os grandes meios de comunicação comercial estejam pouco dispostos a investigar a sua verdadeira autoria, ou até mesmo ecoem tais episódios com o sensacionalismo mais exacerbado, destacando eventuais coincidências com sua linha editorial, na proporção inversamente contrária aos procedimentos obrigatórios para uma verdadeira apuração jornalística. O Rio-Centro, por exemplo, permanece em penumbra até hoje...
Nunca se sabe o que irá ocorrer, mas, sabemos sempre que quando bilionários ou trilionários interesses estiverem em jogo - como os do petróleo pré-sal, da riqueza imensa do nióbio e do urãnio, apenas para dar alguns exemplos - as oligarquias internacionais que promoveram guerras, golpes de estado, ditaduras, carnificinas mil, etc, estarão sempre cogitando a utilização de meios que lhes assegurem seus nefastos e injustificáveis privilégios sobre o patrimônio de outros povos.
Fiscalização
Da mesma forma que as mobilizações de rua, muito comuns em momento tão decisivo como este, devem ser organizadas com detalhes e contar algum dispositivo adequado de segurança, feita pelos próprios militantes, prática usada em muitos países de maior estabilidade democrática.
É preciso evitar enfrentamentos de militância nas ruas, que ofereçam às forças conservadoras o pretexto que buscam para alterar o processo democrático. O episódio da bolinha de papel é emblemático, imagine-se se houvesse um ferido da oposição: escândalo nacional! O dia 31 está chegando...
Mas, há sim o que pode ser feito e é um procedimento em que a militância pode ter papel decisivo. Trata-se da fiscalização da votação, do começo ao fim.
As fragilidades
Deve-se estar atento às conclusões do Fórum do Voto Seguro - votoseguro.org.br - indicando que a urna eletrônica brasileira foi rejeitada por todos os mais de 50 países que vieram conhecê-la. Que é proibida em dezenas de países por não materializar o voto e por identificar o eleitor (exemplo: Alemanha, Holanda, Reino Unido, 40 estados dos EUA, Argentina, México e Paraguai) e que até mesmo o inventor da Assinatura Digital condena a ausência da materialização do voto.
E também quando aponta que é a Autoridade Eleitoral que executa/administra, legisla/regulamenta (a fiscalização permitida é feita com regras do próprio fiscalizado) julga e muitas vezes ignora as próprias regras, que recebe as denúncias, protela ou arquiva, e finalmente, julga-se e normalmente absolve-se, só a participação militante pode fazer alguma diferença
Especialmente nos maiores colégios eleitorais, a militância deve estar atualizada sobre as fragilidades mais evidentes e com sua presença atenta e cidadã poderá evitar a ocorrência das irregularidades mais comuns.
Urna no cerrado
Entre elas, aquela que é feita ao final da votação. Os mapas eleitorais indicam que uma grande afluxo de votação estaria ocorrendo nos momentos finais, prestes ao fechamento da urna. Será? É indispensável que o fiscal esteja até o momento da totalização de cada seção eleitoral e exige uma cópia impressa do boletim de urna, conforme reza a lei eleitoral, mas nem sempre é cumprido. Uma fiscalização ausente, omissa, facilita esta irregularidade super comum, pois, sem emissão impressa da totalização de cada seção, no transporte da urna para o Tribunal muitos eventos heteroxos podem ocorrer, desde a troca do cartão ou pura e simplesmente a troca da própria urna.
O deputado federal Geraldo Magela, candidato derrotado ao governo do Distrito Federal em 2002, relatou em Comissão na Câmara Federal sobre uma certa quantidade de urnas eletrônica encontradas abandonadas em pleno cerrado que rodeia Brasília naquele pleito. Mas, com a totalização impressa em mãos, aquela emitida na seção no ato de fechamento da urna, qualquer discrepância relevante poderá ser detectada quando do ato de se fazer a totalização em escala superior, já no Tribunal.
União e olho vivo
Assim, de olho em nossa complexa história, vale manter muita calma e maracujina diante de provocações, como diz a música do Gonzaguinha. E que toda a militância que apareceu pouco até momento, apareça agora generosa, atuante, inteligente e perspicaz na fiscalização cidadã e republicana.
Sem falar que muito mais importante e agradável que qualquer empurra-empurra de rua é a tarefa de dirigir argumentos convincentes aos que se abstiveram, aos que ainda acham, apesar de tudo, que os candidatos são iguais e por isso votaram nulo ou em branco. Este contingente está na escala dos milhões. Decide qualquer eleição. E pode decidir se o país seguirá construindo sua soberania com justiça social ou se retorna à era da vassalagem internacional e “à mania de falar fino com Washington”, como disse o Chico Buarque.
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