Reproduzo artigo do professor Venício A. de Lima, publicado no Observatório da Imprensa:
Joseph T. Klapper (1917-1984), ex-diretor do departamento de pesquisa da CBS (Columbia Broadcasting System), é geralmente lembrado por ser o principal articulador da teoria dos efeitos limitados da comunicação. Seu clássico The Effects of Mass Communication (Free Press, NY, 1960), resultado de uma longa pesquisa realizada nos Estados Unidos e financiada pela própria CBS, concluiu que "a capacidade de influência da comunicação de massa limita-se, sobretudo, ao reforço de valores, comportamentos e atitudes, mais do que a uma capacidade real de os modificar ou manipular".
Muito aconteceu nas comunicações e na pesquisa desse campo de estudos nos últimos 50 anos. Passamos da era dos jornais, das revistas e do rádio para a era da televisão e, mais recentemente, para a era digital da internet. O leitor/espectador deixou de ser erroneamente considerado como um sujeito passivo e, claro, hoje se sabe que os poderosos "efeitos" da comunicação de massa se manifestam, sobretudo, no longo prazo.
De qualquer maneira, muito do que se supunha ser verdade "científica" em relação aos hábitos de consumo da mídia impressa – jornais e revistas – parece ainda fazer sentido. E muito.
Jornalões no Brasil
Há cerca de doze anos, o professor Bernardo Kucinski, referindo-se aos jornalões brasileiros, fez uma afirmação – à qual já recorri inúmeras vezes – que dizia o seguinte:
"A elite dominante é ao mesmo tempo a fonte, a protagonista e a leitora das notícias; uma circularidade que exclui a massa da população da dimensão escrita do espaço público definido pelos meios de comunicação de massa" ("Mídia da Exclusão" in A Síndrome da Antena Parabólica, Editora Perseu Abramo, 1998).
Os resultados da pesquisa Datafolha, divulgados no domingo (2/5) pela Folha de S.Paulo, confirmam tanto as conclusões de Klapper como a afirmação de Kucinski.
Pesquisa Datafolha
Matéria sob o título "Leitor aprova corbertura eleitoral da Folha” descreve a pesquisa Datafolha realizada junto a 350 leitores, assinantes e secundários (que leem o exemplar do assinante), moradores da Grande São Paulo e que leem a Folha ao menos uma vez por semana. A pesquisa foi realizada no período entre 19 e 20 de abril e a margem de erro máxima é de cinco pontos percentuais, para mais ou para menos.
Os dados revelam que a grande maioria dos leitores (74%) não considera que a Folha favoreça alguma das pré-candidaturas à Presidência. Entre os que veem algum favorecimento, 13% apontam o tucano José Serra como beneficiado pela cobertura e 6% a petista Dilma Rousseff.
Em relação especificamente à cobertura do governo Lula, 67% dos leitores avaliam a Folha como "crítica na medida certa", enquanto outros 21% consideram o jornal "menos crítico do que o necessário". Apenas 9% consideram o jornal "mais crítico do que o necessário" quando o assunto é a gestão de Lula.
Com relação à intenção de voto, a pesquisa mostra que 40% dos leitores disseram espontaneamente que devem votar em Serra para presidente. A ex-ministra Dilma tem 10% das preferências dos leitores. A senadora licenciada Marina Silva, 6%. Quando os leitores são estimulados pelos pesquisadores a escolher em quem votar a partir de uma lista de candidatos, a preferência a favor de Serra é ainda maior: chega a 54%, ante os 18% de Marina e 15% de Dilma.
Na análise por segmentos, Serra destaca-se entre os leitores de 70 anos ou mais (70%), os que possuem ensino fundamental e médio (61%) e entre os que ganham entre 10 e 20 salários mínimos (62%). Marina tem seu melhor desempenho entre os mais jovens, de 16 a 29 anos, e entre os que ganham até dez salários mínimos (23%). Dilma tem a preferência dos leitores homens (20%) e dos que ganham mais de 20 salários mínimos (23%).
Leitura alternativa
Uma outra leitura dos resultados da pesquisa Datafolha poderia corretamente afirmar que a Folha é um jornal cuja maioria dos leitores:
1. Tem renda acima de 10 salários mínimos (eleitores de Serra, 54% e Dilma, 15%);
2. Não considera que sua cobertura favoreça alguma das pré-candidaturas à Presidência da República;
3. Considera a cobertura do governo Lula "crítica na medida certa" (67%) ou "menos crítica do que o necessário" (21%);
4. Declara sua intenção de votar em José Serra (54%).
Ou ainda se poderia ler corretamente a pesquisa concluindo que a Folha é um jornal cuja maioria dos leitores tem renda acima de 10 salários mínimos, é tucana e, em boa parte, gostaria de ver o jornal mais crítico em relação ao governo Lula. Em resumo: os jornalões são "a cara" de seus leitores. Ou não são?
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