terça-feira, 26 de junho de 2012

Um golpe de novo tipo contra Lugo

Foto: www.paraguayresiste.com
Por Tarso Genro, no sítio Carta Maior:

O que foi tentado contra Lula, na época do chamado mensalão – que por escassa margem de votos não teve o apoio da OAB Federal numa histórica decisão do seu Conselho ainda não revelada em todas as suas implicações políticas - foi conseguido plenamente contra o Presidente Lugo. E o foi num fulminante e sumário ritual, que não durou dois dias. Não se alegue, como justificativa para apoiar o golpe, que a destituição do Presidente Lugo foi feita “por maioria” democrática, pois a maioria exercida de forma ilegal também pode ser um atentado à democracia. É fácil dar um exemplo: “por maioria”, o Poder Legislativo paraguaio poderia legislar adotando a escravidão dos seus indígenas?


No Paraguai o Poder Legislativo na condição de Tribunal político atentou contra dois princípios básicos de qualquer democracia minimamente séria: o princípio da “ampla defesa” e o princípio do “devido processo legal”. É impossível um processo justo - mesmo de natureza política - que dispense um mínimo de provas. É impossível garantir o direito de defesa - mesmo num juízo político - sem que o réu tenha conhecimento pleno do crime ou da responsabilidade a partir da qual esteja sendo julgado. Tudo isso foi negado ao Presidente Lugo.

O que ocorreu no Paraguai foi um golpe de estado de “novo tipo”, que apeou um governo legitimamente eleito através de uma conspiração de direita, dominante nas duas casas parlamentares. Estas jamais engoliram Lugo, assim como a elite privilegiada do nosso país jamais engoliu o Presidente Lula. Lá, eles tiveram sucesso porque o Presidente Lugo não tinha uma agremiação partidária sólida e estava isolado do sistema tradicional de poder, composto por partidos tradicionais que jamais se conformaram com a chegada à presidência de um bispo ligado aos movimentos sociais. A conspiração contra Lugo estava no Palácio, através do Vice-Presidente que agora, “surpreso”, assume o governo, amparado nas lideranças parlamentares que certamente o “ajudarão” a governar dentro da democracia.

Aqui, eles não tiveram sucesso porque - a despeito das recomendações dos que sempre quiseram ver Lula isolado, para derrubá-lo ou destruí-lo politicamente - o nosso ex-Presidente soube fazer acordos com lideranças dos partidos fora do eixo da esquerda, para não ser colocado nas cordas. Seu isolamento, combinado com o uso político do”mensalão”, certamente terminaria em seu impedimento. Acresce-se que aqui no Brasil - sei isso por ciência própria pois me foi contado pelo próprio José Alencar- o nosso Vice presidente falecido foi procurado pelos golpistas “por dentro da lei” e lhes rejeitou duramente.

A tentativa de golpe contra o Presidente Chavez, a deposição de Lugo pelas “vias legais”, a rápida absorção do golpe “branco” em Honduras, a utilização do território colombiano para a instalação de bases militares estrangeiras têm algum nexo de causalidade? Sem dúvida têm, pois, esgotado o ciclo das ditaduras militares na América Latina, há uma mudança na hegemonia política do continente, inclusive com o surgimento de novos setores de classes, tanto no mundo do trabalho como no mundo empresarial. É o ciclo, portanto, da revolução democrática que, ou se aprofunda, ou se esgota. Estes novos setores não mais se alinham, mecanicamente, às posições políticas tradicionais e não se submetem aos velhos padrões autoritários de dominação política.

Os antigos setores da direita autoritária, porém, incrustados nos partidos tradicionais da América latina e apoiados por parte da grande imprensa (que apoiaram as ditaduras militares e agora reduzem sua influência nos negócios do Estado) tentam recuperar sua antiga força, a qualquer custo. São estes setores políticos - amantes dos regimes autoritários - que estão embarcando neste golpismo “novo tipo”, saudosos da época em que os cidadãos comuns não tinham como fazer valer sua influência sobre as grandes decisões públicas.

É a revolução democrática se esgotando na América Latina? Ou é o início de um novo ciclo? A queda de Lugo, se consolidada, é um brutal alerta para todos os democratas do continente, seja qual for o seu matiz ideológico. Os vícios da república e da democracia são infinitamente menores dos que os vícios e as violências ocultas de qualquer ditadura.

Pela queda de Lugo, agradecem os que apostam num autoritarismo “constitucionalizado” na A.L., de caráter antipopular e pró-ALCA. Agradecem os torturadores que não terão seus crimes revelados, agradecem os que querem resolver as questões dos movimentos sociais pela repressão. Agradece, também, a guerrilha paraguaia, que agora terá chance de sair do isolamento a que tinha se submetido, ao desenvolver a luta armada contra um governo legítimo, consagrado pelas urnas.

3 comentários:

José da Mota disse...

Acordar com um artigo de Tarso Genro é um chamado, ainda que para um soldado solitário como eu, repetindo, solitários ainda, pois aguardo minha de tempos remotos casa, o chamado. Pois morrer pela pátria ou viver sem razão é sentido, mas viver sem razão quando nos traem em pátria, como se pátria traísee e não traída, aí pátria deixa de ser razão, como o viver.
Em outros comentários e até artigos que arrisquei em meu semi-analfabetismo escrever sobre o mensalão "da tentativa de golpe de estado" no Brasil e que só não aconteceu porque o Supremo Tribunal Federal e principalmente Gilmar Mendes se não me engano ainda procurador Geral da União, ou que seja ou fosse já como ministro, juntos, acordaram a tempo e impediram o impeachiment de Lula. Porque até a maioria dos petistas já haviam caído no conto do vigário do mensalão e ameaçavam se rebelar contra o governo.
ALguns petistas, desavisados ou influênciados por uma pequena parcela de petistas bloguistas principalmente que conscientemente alteram os rumos desta história por outras intrigas com Gilmar Mendes, ficam indignados quando deixo comentário dizendo que o PT lhe deve gratidão eterna, como à todo o Supremo Tribunal Federal. E deveria agradeço-los com honrarias em nome da pátria, porque sustentaram corajosamente a democracia. Pois a rasteira havia sido dada e sorrateiramente rápida, e caso alguém não ficasse de pé logo como o STF e Gilmar Mendes, a derrubada do governo era certeira, estaria concretizada.
Tarso Genro conta-nos duas histórias em uma, Fernando Lugo e Lula vem de um mesmo movimento. Mexer com uma elite intocável desde séculos pela primeira vez. Não se venderam e não se venderão, por isso esteve, no caso do Lula, e estará no caso de Fernando Lugo, em risco de sofrer um golpe de estado o tempo todo.
Está na hora de aproveitar o ensejo, porque estamos em plena pressão para votar o mensalão o mais breve possível, apressadamente, para criar mais um pandemônio político no país e diminuir a força do Lula. Também, aos petistas como Tarso Genro no mesmo ensejo, humildemente das inicio ao reconhecimento ao STF e Gilmar Mendes pelo impedimento do golpe de estado no Brasil com o mensalão, e o fortalecimento da democracia.
Também não cabe a você, Tarso Genro, político de sua envergadura, se manter ocupado só com os problemas do Rio Grande do Sul. Esta aqui um exemplo prático do que falo, a falta de manifestações coerentes e verídicas sobre temas como o golpe de estado no paraguay, por um político de sua consciência e importância.
José da Mota.

Ana Cruzzeli disse...

O Collor falou no Senado muito bonito a respeito do impedimento do Lugo. Eu li todo o discurso do cara achando que ele tinha sido muito lucido até ele se esquecer do MALDITO amplo direito a defesa. O Canese fez com brilhantismo ...
http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/canese-lugo-teve-menos-tempo-para-se-defender-que-motorista-multado-no-paraguai.html

Até motorista de carro no Paraguai tem mais tempo para se defender do que presidente da republica se for de esquerda é claro.

Aí Collor foi mal, mas lá foi golpe sim e um dos piores se analisarmos as leis comuns do proprio Paraguai.

O MERCOSUL pode sim suspender o Paraguai, o MERCOSUL pode sim incluir a Venezuela, afinal no Paraguai até uma multa de transito tem mais tempo para o contraditorio do que foi dado ao Lugo. Esse conceito juridico é basico senhor senador da republica federativa do Brasil.
O Collor está com medo da Venezuela fazer parte do MERCOSUL ou é neura minha? Ah duvida cruel, essa que invadi meus pensamentos.
Esse rococo de pensamento collorido é no fundo no fundo para colocar empecilho ao avançado momento pro Venezuela que sim incomoda os EUA. Esse Collor vai enganar sua marequicas que de gente que trabalha para os EUA no CONGRESSO estamos cheios
O Lugo vai perder poder, acho que não tem como reverter o que aconteceu no Paraguai, ele infelizmente vai ter que ceder espaço para outro até que seus direitos politicos sejam retomados. Na eleição de 2013 a esquerda volta ao poder renovam o congresso e aí o Lugo vai, fortalecendo sua liderança politica perdido, mas juridicamente o Brasil não cometeu erro algum e pode ir sim para a ASSEMBLEIA do MERCOSUL pronto a dar uma resposta firme ao que foi feito no Paraguai.

Anônimo disse...

Honduras, Paraguai. Estão testando o "golpe legalizado".