Por Pep Valenzuela, na revista Fórum:
O presidente do governo espanhol anunciou no Parlamento, nesta quarta-feira (11/7), um pacote de cortes do gasto público, que será sacramentado hoje (13/7), numa reunião de governo presidida pelo chefe do Estado, o rei Juan Carlos. As medidas são um verdadeiro golpe de Estado sob comando da chamada troika (FMI, Comissão Europeia e Banco Central Europeu), que continua impondo aos europeus cortes de direitos, mesmo depois de estas políticas agravarem a crise numa série de países.
Cabe avaliar duas questões especiais. A primeira é submissão total, e assumida, do governo espanhol à troika. A própria mídia tradicional de mais prestígio (os diários El País e La Vanguardia, por exemplo), fala de “intervenção” na economia espanhola. Enric Juliana, colunista do segundo jornal citado, faz paralelo com o “18 Brumário de Luis Bonaparte”, e fala do “12 de Maio de Mariano (nome do presidente Rajoy) Bonaparte”.
De fato, o próprio presidente Rajoy afirmou, na sessão de apresentação da nova política, que ela não é o que ele pretendia, mas que “não haveria nenhuma outra opção”. Foi a ponto de relatar sua relação constrangedora com as autoridades europeias em Bruxelas. “Cheguei lá e me falaram: ‘olha, mas o déficit da Espanha não era só de até o 6%’? E aí, eu ia dizer o que?”. Isso mesmo, limita-se a receber ordens. A economia está sob intervenção, sem disfarce algum.
A segunda questão é que, mesmo reconhecendo a “intervenção”, as políticas em curso dão continuidade às praticadas até 2003 pelo governo de José Maria Aznar, no qual Rajoy foi ministro. Já àquela época, o Partido Popular adotou as teses mais duras do receituário neoliberal. Ou seja deixar tudo nas mãos “invisíveis” do mercado, eliminar a política e a possibilidade de definição consciente sobre os rumos do país.
O pacote a ser aplicado hoje tem como medida mais visível o aumento do Imposto sobre o Valor Agregado (IVA, equivalente ao ICMS brasileiro). Ou seja o tributo mais indireto, que menos incide sobre os ricos (pois entesouram a maior parte de sua riqueza) e mais castiga os setores populares (cuja renda é praticamente toda consumida a cada mês). Além disso, o governo vai eliminar o abono de Natal pago a milhões de servidores públicos e limitar direitos adquiridos como uma quota de dias de “livre disposição” para assuntos próprios.
Os servidores públicos já sofreram dois cortes anteriores de salários – o primeiro deles, com o presidente Zapatero, do Partido “Socialista”. Mas não serão os únicos atingidos. Haverá corte do seguro-desemprego, nova contra-reforma das aposentadorias (para torná-la mais difícil e precária), redução dos subsídios pagos a pessoas incapacitadas.
Outras medidas, também anunciadas ontem, provocam re-centralização do poder e limitação da democracia real. Anuncia-se uma redução de 30% do número de vereadores nos municípios, redução de empresas públicas locais, mais controle das contas das prefeituras por servidores da administração central. Isso no contexto de transferência de competências das prefeituras para as Diputaciones (um tipo de órgão administrativo eleito indiretamente, intermediário entre as prefeituras e os governos regionais). Ou seja, as prefeituras vão perder boa parte da atual capacidade de autogoverno. Com, isso a cidadania perde possibilidade de exercício efetivo e direto da democracia.
Ao mesmo tempo, serão reduzidas em 20% as subvenções para partidos políticos e sindicatos, o que significará limitar a ação dos mesmos e sua autonomia em relação aos governos.
O governo central vem culpando aos governos autônomos (semelhantes aos Estados brasileiros) por boa parte do déficit. Cobra deles maiores recortes e redução de gastos, o que aprofunda mais ainda a reconcentração de poder e a perda de espaços de democracia. Nada faz, enquanto isso, para conter a imensa transferência de recursos para a oligarquia financeira, que exige taxas de juros cada vez mais elevadas do Estado espanhol.
Mas os credores são impiedosos e nunca se satisfazem. Ontem, menos de 24 horas após o anúncio do pacote, exigiram, para rolar os títulos da dívida espanhola, taxas ainda mais altas. Tudo isso num contexto, segundo a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, de crescente deterioração da economia mundial e redução das previsões de crescimento para 2012.
A resposta popular não demorou. No mesmo dia em que o presidente Rajoy anunciava o pacote, mineiros em protesto enchiam as ruas centrais da capital, recebidos calorosamente pela população. Centenas de servidores públicos protestavam nas portas do Parlamento, onde falava o presidente do governo. Na quinta-feira houve passeatas e protestos em muitas cidades. Uma grande jornada de luta está marcada para a próxima quinta-feira (19 de julho), em dezenas de cidades. Somam-se para convocá-la setores que normalmente não estão juntos: Sindicatos majoritários (Comisiones Obreras e Unión General de los Trabajadores), centrais e sindicatos alternativos, setores do 15M, que articularam no ano passado o movimento dos indignados.
A indignação social não pára de crescer. Ninguém poderia imaginar, há apenas dois anos, que o país chegaria onde está. Direito econômicos e sociais que fizeram parte da vida quotidiana, durante décadas, hoje estão sendo liquidados. Falamos sem dúvida de uma regressão civilizatória. Há muito para se fazer. E, como escreveu há dias Rafael Poch, outro colunista deLa Vanguardia, espalha-se na Europa a sensação de que “Agora, somos todos gregos!”
De fato, o próprio presidente Rajoy afirmou, na sessão de apresentação da nova política, que ela não é o que ele pretendia, mas que “não haveria nenhuma outra opção”. Foi a ponto de relatar sua relação constrangedora com as autoridades europeias em Bruxelas. “Cheguei lá e me falaram: ‘olha, mas o déficit da Espanha não era só de até o 6%’? E aí, eu ia dizer o que?”. Isso mesmo, limita-se a receber ordens. A economia está sob intervenção, sem disfarce algum.
A segunda questão é que, mesmo reconhecendo a “intervenção”, as políticas em curso dão continuidade às praticadas até 2003 pelo governo de José Maria Aznar, no qual Rajoy foi ministro. Já àquela época, o Partido Popular adotou as teses mais duras do receituário neoliberal. Ou seja deixar tudo nas mãos “invisíveis” do mercado, eliminar a política e a possibilidade de definição consciente sobre os rumos do país.
O pacote a ser aplicado hoje tem como medida mais visível o aumento do Imposto sobre o Valor Agregado (IVA, equivalente ao ICMS brasileiro). Ou seja o tributo mais indireto, que menos incide sobre os ricos (pois entesouram a maior parte de sua riqueza) e mais castiga os setores populares (cuja renda é praticamente toda consumida a cada mês). Além disso, o governo vai eliminar o abono de Natal pago a milhões de servidores públicos e limitar direitos adquiridos como uma quota de dias de “livre disposição” para assuntos próprios.
Os servidores públicos já sofreram dois cortes anteriores de salários – o primeiro deles, com o presidente Zapatero, do Partido “Socialista”. Mas não serão os únicos atingidos. Haverá corte do seguro-desemprego, nova contra-reforma das aposentadorias (para torná-la mais difícil e precária), redução dos subsídios pagos a pessoas incapacitadas.
Outras medidas, também anunciadas ontem, provocam re-centralização do poder e limitação da democracia real. Anuncia-se uma redução de 30% do número de vereadores nos municípios, redução de empresas públicas locais, mais controle das contas das prefeituras por servidores da administração central. Isso no contexto de transferência de competências das prefeituras para as Diputaciones (um tipo de órgão administrativo eleito indiretamente, intermediário entre as prefeituras e os governos regionais). Ou seja, as prefeituras vão perder boa parte da atual capacidade de autogoverno. Com, isso a cidadania perde possibilidade de exercício efetivo e direto da democracia.
Ao mesmo tempo, serão reduzidas em 20% as subvenções para partidos políticos e sindicatos, o que significará limitar a ação dos mesmos e sua autonomia em relação aos governos.
O governo central vem culpando aos governos autônomos (semelhantes aos Estados brasileiros) por boa parte do déficit. Cobra deles maiores recortes e redução de gastos, o que aprofunda mais ainda a reconcentração de poder e a perda de espaços de democracia. Nada faz, enquanto isso, para conter a imensa transferência de recursos para a oligarquia financeira, que exige taxas de juros cada vez mais elevadas do Estado espanhol.
Mas os credores são impiedosos e nunca se satisfazem. Ontem, menos de 24 horas após o anúncio do pacote, exigiram, para rolar os títulos da dívida espanhola, taxas ainda mais altas. Tudo isso num contexto, segundo a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, de crescente deterioração da economia mundial e redução das previsões de crescimento para 2012.
A resposta popular não demorou. No mesmo dia em que o presidente Rajoy anunciava o pacote, mineiros em protesto enchiam as ruas centrais da capital, recebidos calorosamente pela população. Centenas de servidores públicos protestavam nas portas do Parlamento, onde falava o presidente do governo. Na quinta-feira houve passeatas e protestos em muitas cidades. Uma grande jornada de luta está marcada para a próxima quinta-feira (19 de julho), em dezenas de cidades. Somam-se para convocá-la setores que normalmente não estão juntos: Sindicatos majoritários (Comisiones Obreras e Unión General de los Trabajadores), centrais e sindicatos alternativos, setores do 15M, que articularam no ano passado o movimento dos indignados.
A indignação social não pára de crescer. Ninguém poderia imaginar, há apenas dois anos, que o país chegaria onde está. Direito econômicos e sociais que fizeram parte da vida quotidiana, durante décadas, hoje estão sendo liquidados. Falamos sem dúvida de uma regressão civilizatória. Há muito para se fazer. E, como escreveu há dias Rafael Poch, outro colunista deLa Vanguardia, espalha-se na Europa a sensação de que “Agora, somos todos gregos!”
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