Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:
Interessante observar como as relações da imprensa brasileira com o Ministério Público, em suas variadas instâncias, podem retratar certas motivações da pauta jornalística.
Na década passada, quando o procurador da República Luiz Francisco de Souza encarnou no ex-secretário geral da Presidência da República Eduardo Jorge Caldas Pereira, amontoando sobre ele acusações de tráfico de influência, os jornais se dividiram entre indícios que prometiam excelentes pautas e a desconfiança de que o procurador exagerava.
Eduardo Jorge acabou apanhado no fogo cruzado de interesses políticos e, mesmo inocentado das acusações, ainda tem sua reputação chamuscada. Luiz Francisco foi posteriormente queimado após denunciar o banqueiro Daniel Dantas.
Induzidos, pela própria natureza de seu trabalho, a atuar eventualmente contra poderes institucionais, em casos que envolvem representantes do Executivo, do Parlamento e até do Judiciário, os paladinos do MP também podem aparecer no noticiário no papel de vilões.
O ex-senador Demóstenes Torres é um caso exemplar dessa dupla possibilidade: sua carreira de procurador foi alavancada pela relação com o bicheiro Carlos Cachoeira e, depois de ser transformado pela imprensa em baluarte da moralidade pública, acabou caindo em desgraça justamente por seus negócios com o bicheiro.
No entanto, é mais comum ver um juiz ou desembargador do que um membro do Ministério Público acusado de falcatruas. Quando exercem seu papel com empenho, a ação desses auxiliares da Justiça ganha destaque na imprensa porque eles encarnam a figura do campeador solitário contra o crime. Realizam, de certa forma, o ideal de origem dos repórteres.
Essa talvez seja a principal causa do perfil radical que apresentam em suas incursões pela mídia: no papel de acusadores, eles encarnam a ponta de lança da Justiça e produzem sempre boas histórias. Se essas pautas vão conduzir a condenações, se serão confirmadas ou desmentidas pela Justiça, pouco importa: para o jornalista, vale a reportagem do dia.
Relação ambígua
Nesta quinta-feira (7/2), representantes do Ministério Público frequentam novamente o noticiário por motivos variados. O Estado de S. Paulo noticia que a Assembleia Legislativa paulista prepara emenda constitucional para tirar dos promotores a competência para executar investigações, concentrando essa função apenas nas mãos do procurador-geral de Justiça.
A motivação da iniciativa dos deputados não poderia ser mais rasteira: dois promotores, Saad Mazloum e Silvio Marques, acabam de obter uma liminar no processo para cortar o auxílio-moradia dos parlamentares, benefício que custa R$ 2,5 milhões por ano aos cofres do Estado.
Em outra reportagem, os jornais dão repercussão à iniciativa do Ministério Público Estadual de denunciar por formação de quadrilha e outros quatro crimes 55 estudantes, dez professores e doze funcionários da Universidade de São Paulo, envolvidos na ocupação da reitoria, ocorrida em novembro de 2011.
A ação, de iniciativa da promotora Eliana Passarelli, vem sendo criticada até mesmo por estudantes que se opuseram à invasão, segundo a imprensa. A tendência dos jornais é abrigar a opinião segundo a qual a promotora agiu movida por sentimentos pessoais, criminalizando uma questão que já estava resolvida no âmbito interno da universidade. De fato, parte dos acusados já havia sido absolvida na semana passada em processo administrativo conduzido por uma comissão de professores da USP.
Ao classificar a ocupação da reitoria de uma iniciativa “burra”, a promotora estaria manifestando sentimento que colocaria em questão seu equilíbrio para analisar o caso. O exagero de sua ação, de acordo com citações da imprensa, pode ser medido pelas possíveis consequências da denúncia: se condenados, os acusados podem ser presos por até oito anos.
Além disso, advogados ouvidos pelos jornais consideram a denúncia inepta, porque engloba os 72 acusados sob os mesmos crimes, quando a legislação exige que cada conduta deve ser individualizada.
A relação entre representantes do Ministério Público e a imprensa é marcada por uma interessante ambiguidade: promotores são uma fonte certa de bons casos jornalísticos, mas nem sempre as causas que defendem são simpáticas aos padrões dos jornais.
Como o repórter, o procurador ou promotor precisa se destacar em carreira solo, o que muitas vezes produz uma simbiose proveitosa para ambos os lados. Por isso, se quiser um impulso na carreira com a ajuda da imprensa, o integrante do Ministério Público precisa ler atentamente os editoriais.
Na década passada, quando o procurador da República Luiz Francisco de Souza encarnou no ex-secretário geral da Presidência da República Eduardo Jorge Caldas Pereira, amontoando sobre ele acusações de tráfico de influência, os jornais se dividiram entre indícios que prometiam excelentes pautas e a desconfiança de que o procurador exagerava.
Eduardo Jorge acabou apanhado no fogo cruzado de interesses políticos e, mesmo inocentado das acusações, ainda tem sua reputação chamuscada. Luiz Francisco foi posteriormente queimado após denunciar o banqueiro Daniel Dantas.
Induzidos, pela própria natureza de seu trabalho, a atuar eventualmente contra poderes institucionais, em casos que envolvem representantes do Executivo, do Parlamento e até do Judiciário, os paladinos do MP também podem aparecer no noticiário no papel de vilões.
O ex-senador Demóstenes Torres é um caso exemplar dessa dupla possibilidade: sua carreira de procurador foi alavancada pela relação com o bicheiro Carlos Cachoeira e, depois de ser transformado pela imprensa em baluarte da moralidade pública, acabou caindo em desgraça justamente por seus negócios com o bicheiro.
No entanto, é mais comum ver um juiz ou desembargador do que um membro do Ministério Público acusado de falcatruas. Quando exercem seu papel com empenho, a ação desses auxiliares da Justiça ganha destaque na imprensa porque eles encarnam a figura do campeador solitário contra o crime. Realizam, de certa forma, o ideal de origem dos repórteres.
Essa talvez seja a principal causa do perfil radical que apresentam em suas incursões pela mídia: no papel de acusadores, eles encarnam a ponta de lança da Justiça e produzem sempre boas histórias. Se essas pautas vão conduzir a condenações, se serão confirmadas ou desmentidas pela Justiça, pouco importa: para o jornalista, vale a reportagem do dia.
Relação ambígua
Nesta quinta-feira (7/2), representantes do Ministério Público frequentam novamente o noticiário por motivos variados. O Estado de S. Paulo noticia que a Assembleia Legislativa paulista prepara emenda constitucional para tirar dos promotores a competência para executar investigações, concentrando essa função apenas nas mãos do procurador-geral de Justiça.
A motivação da iniciativa dos deputados não poderia ser mais rasteira: dois promotores, Saad Mazloum e Silvio Marques, acabam de obter uma liminar no processo para cortar o auxílio-moradia dos parlamentares, benefício que custa R$ 2,5 milhões por ano aos cofres do Estado.
Em outra reportagem, os jornais dão repercussão à iniciativa do Ministério Público Estadual de denunciar por formação de quadrilha e outros quatro crimes 55 estudantes, dez professores e doze funcionários da Universidade de São Paulo, envolvidos na ocupação da reitoria, ocorrida em novembro de 2011.
A ação, de iniciativa da promotora Eliana Passarelli, vem sendo criticada até mesmo por estudantes que se opuseram à invasão, segundo a imprensa. A tendência dos jornais é abrigar a opinião segundo a qual a promotora agiu movida por sentimentos pessoais, criminalizando uma questão que já estava resolvida no âmbito interno da universidade. De fato, parte dos acusados já havia sido absolvida na semana passada em processo administrativo conduzido por uma comissão de professores da USP.
Ao classificar a ocupação da reitoria de uma iniciativa “burra”, a promotora estaria manifestando sentimento que colocaria em questão seu equilíbrio para analisar o caso. O exagero de sua ação, de acordo com citações da imprensa, pode ser medido pelas possíveis consequências da denúncia: se condenados, os acusados podem ser presos por até oito anos.
Além disso, advogados ouvidos pelos jornais consideram a denúncia inepta, porque engloba os 72 acusados sob os mesmos crimes, quando a legislação exige que cada conduta deve ser individualizada.
A relação entre representantes do Ministério Público e a imprensa é marcada por uma interessante ambiguidade: promotores são uma fonte certa de bons casos jornalísticos, mas nem sempre as causas que defendem são simpáticas aos padrões dos jornais.
Como o repórter, o procurador ou promotor precisa se destacar em carreira solo, o que muitas vezes produz uma simbiose proveitosa para ambos os lados. Por isso, se quiser um impulso na carreira com a ajuda da imprensa, o integrante do Ministério Público precisa ler atentamente os editoriais.
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