Por Fernando Brito, no blog Tijolaço:
O IBGE divulgou a taxa de desemprego de julho: 5,6%.
Quatro décimos de ponto percentual a menos que em junho, quando foi de 6%.
Se tivesse subido 0,4%, a esta hora, manchetes estariam apregoando a alta do desemprego.
Teríamos até malandragens estatísticas dizendo que a taxa de desemprego aumentou em quase 7% (0,4 em 6,0%) em apenas um mês.
Claro que isso é um besteirol terrorista, pelas mesmas razões de equilíbrio, aqui ninguém vai fazer o raciocínio inverso, porque o índice baixou.
A verdade é que chegamos a um patamar próximo do pleno emprego e as variações, agora, precisam ser maiores ou se repetir mais para que definam uma tendência.
Só a má-fé e a politicagem podem explicar coisas assim, como a que ontem “saudou” o “aumento” da inflação medido pelo IPCA-15 – prévia da inflação oficial -, que passou de 0,07% para 0,16%.
Os dados do IBGE servem, porém, para algo mais útil: trazer para cá o excelente artigo de análise sobre o tema do professor João Saboia, da UFRJ, publicado anteontem no Valor, que sai do ti-ti-ti de 0,1% pra cá ou para lá e consolida os dados, para avaliar a situação e as mudanças de características do emprego no Brasil.
Desaceleração sim, piora ainda não
João Sabóia
Nos últimos meses tem crescido a sensação de que o mercado de trabalho está piorando ao longo de 2013. O fato da economia estar rateando tem levado muitos analistas econômicos a apontarem para diversos problemas no mercado de trabalho do país, que estaria piorando, ou na melhor das hipóteses, passando por uma forte desaceleração.
O principal objetivo deste artigo é procurar relativizar os movimentos que estão ocorrendo, mostrando que o mercado de trabalho urbano ainda poderia estar distante de uma piora em relação ao passado recente.
Conforme é sabido, o mercado de trabalho passou por um longo processo de recuperação a partir de 2004. Mesmo com o crescimento econômico relativamente baixo em alguns anos, o movimento de melhora teve continuidade, a ponto de alguns afirmarem que teríamos chegado recentemente a uma situação próxima ao pleno emprego.
A única variável que piorou foi o percentual de chefes entre os desempregados que foi de 26,2% para 26,8%
Uma das maiores dificuldades na análise mensal do mercado de trabalho é a existência de um forte componente sazonal. Mesmo com correções para dar conta da sazonalidade, as comparações mensais ficam dificultadas, pois os movimentos costumam ser mínimos de um mês ao outro, ficando dentro da margem de erro das pesquisas amostrais, como no caso da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE. Portanto, o mais aconselhável para se tirar conclusões mais seguras é a comparação dos dados de um mesmo mês em anos subsequentes.
A partir dos dados das seis regiões metropolitanas cobertas pela PME montamos um indicador para o mercado de trabalho baseado na metodologia do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) utilizando nove variáveis agregadas em três grupos. Para medir o componente de desemprego são utilizadas a taxa de desemprego, o desemprego dos chefes de família e o desemprego de longa duração (mais de 1 ano). Para o componente de renda as variáveis são a remuneração média, o diferencial entre a remuneração dos empregados com e sem carteira e a sub-remuneração (abaixo do salário mínimo). Finalmente, em relação ao componente de inserção no mercado de trabalho são considerados o percentual de empregados com carteira assinada, o nível de escolaridade dos ocupados e a taxa de subocupação (poucas horas trabalhadas). O indicador síntese varia entre zero e um, indicando uma melhor situação quanto maior for o seu valor.
O resultado do índice síntese das nove variáveis está apresentado no gráfico. Conforme pode ser verificado, ao longo do primeiro semestre de 2013 o indicador continuava acima dos valores encontrados no mesmo semestre do triênio 2010/2012. É verdade que a melhora entre 2012 e 2013 tem sido bem menor do que nos anos anteriores, mas o indicador manteve-se na primeira metade do ano sistematicamente acima do encontrado no primeiro semestre de 2012.
Das nove variáveis utilizadas houve melhoria em oito quando comparados os dados do primeiro semestre de 2013 com 2012. Tomando-se como referência os valores médios obtidos no primeiro semestre dos dois anos podemos destacar os seguintes resultados:
- O percentual de empregados com carteira assinada passou de 53,5% para 54,4%;
- O percentual de ocupados com no mínimo o segundo grau completo aumentou de 62,1% para 63,6%;
- A remuneração média subiu de R$ 1.847 para R$ 1.875 (reais de junho de 2013);
- A taxa de desemprego caiu de 5,9% para 5,7%;
- O percentual de desempregados de longa duração caiu de 6,0% para 4,9%;
A única variável que piorou no período foi o percentual de chefes entre os desempregados que aumentou de 26,2% para 26,8%.
Conforme pode ser verificado no gráfico, a tendência nos últimos três anos tem sido de aumento do indicador ao longo de cada ano. Tal fato está associado à própria melhoria do mercado de trabalho no período 2010/2013, assim como a efeitos sazonais verificados durante cada ano. Exceto em 2010 quando a economia teve forte crescimento, em geral há uma flutuação no indicador no primeiro semestre, seguido de aumento no segundo.
Neste ano não tem sido diferente. O indicador flutuou no primeiro semestre de forma bastante semelhante ao que se verificou em 2012. A dúvida que fica é em relação ao que ocorrerá ao longo do segundo semestre. Se mantiver a tendência dos anos anteriores o indicador deverá aumentar refletindo o próprio movimento sazonal favorável encontrado na segunda metade de cada ano. Se isso não ocorrer, aí sim poderemos falar em piora no mercado de trabalho e teríamos o cruzamento das curvas de 2013 e 2012 em algum ponto do segundo semestre.
Em resumo, o mercado de trabalho continua apresentando resultados favoráveis em 2013, mas encontra-se em processo de desaceleração da melhoria. O segundo semestre deste ano será fundamental para a ocorrência ou não de uma reversão nesse processo que já dura uma década. Se o governo conseguir uma recuperação no estado das expectativas dos agentes é possível que o país feche o ano ainda apresentando resultados favoráveis no mercado de trabalho. Caso contrário, corremos o risco da desaceleração se transformar efetivamente numa piora.
O IBGE divulgou a taxa de desemprego de julho: 5,6%.
Quatro décimos de ponto percentual a menos que em junho, quando foi de 6%.
Se tivesse subido 0,4%, a esta hora, manchetes estariam apregoando a alta do desemprego.
Teríamos até malandragens estatísticas dizendo que a taxa de desemprego aumentou em quase 7% (0,4 em 6,0%) em apenas um mês.
Claro que isso é um besteirol terrorista, pelas mesmas razões de equilíbrio, aqui ninguém vai fazer o raciocínio inverso, porque o índice baixou.
A verdade é que chegamos a um patamar próximo do pleno emprego e as variações, agora, precisam ser maiores ou se repetir mais para que definam uma tendência.
Só a má-fé e a politicagem podem explicar coisas assim, como a que ontem “saudou” o “aumento” da inflação medido pelo IPCA-15 – prévia da inflação oficial -, que passou de 0,07% para 0,16%.
Os dados do IBGE servem, porém, para algo mais útil: trazer para cá o excelente artigo de análise sobre o tema do professor João Saboia, da UFRJ, publicado anteontem no Valor, que sai do ti-ti-ti de 0,1% pra cá ou para lá e consolida os dados, para avaliar a situação e as mudanças de características do emprego no Brasil.
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Desaceleração sim, piora ainda não
João Sabóia
Nos últimos meses tem crescido a sensação de que o mercado de trabalho está piorando ao longo de 2013. O fato da economia estar rateando tem levado muitos analistas econômicos a apontarem para diversos problemas no mercado de trabalho do país, que estaria piorando, ou na melhor das hipóteses, passando por uma forte desaceleração.
O principal objetivo deste artigo é procurar relativizar os movimentos que estão ocorrendo, mostrando que o mercado de trabalho urbano ainda poderia estar distante de uma piora em relação ao passado recente.
Conforme é sabido, o mercado de trabalho passou por um longo processo de recuperação a partir de 2004. Mesmo com o crescimento econômico relativamente baixo em alguns anos, o movimento de melhora teve continuidade, a ponto de alguns afirmarem que teríamos chegado recentemente a uma situação próxima ao pleno emprego.
A única variável que piorou foi o percentual de chefes entre os desempregados que foi de 26,2% para 26,8%
Uma das maiores dificuldades na análise mensal do mercado de trabalho é a existência de um forte componente sazonal. Mesmo com correções para dar conta da sazonalidade, as comparações mensais ficam dificultadas, pois os movimentos costumam ser mínimos de um mês ao outro, ficando dentro da margem de erro das pesquisas amostrais, como no caso da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE. Portanto, o mais aconselhável para se tirar conclusões mais seguras é a comparação dos dados de um mesmo mês em anos subsequentes.
A partir dos dados das seis regiões metropolitanas cobertas pela PME montamos um indicador para o mercado de trabalho baseado na metodologia do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) utilizando nove variáveis agregadas em três grupos. Para medir o componente de desemprego são utilizadas a taxa de desemprego, o desemprego dos chefes de família e o desemprego de longa duração (mais de 1 ano). Para o componente de renda as variáveis são a remuneração média, o diferencial entre a remuneração dos empregados com e sem carteira e a sub-remuneração (abaixo do salário mínimo). Finalmente, em relação ao componente de inserção no mercado de trabalho são considerados o percentual de empregados com carteira assinada, o nível de escolaridade dos ocupados e a taxa de subocupação (poucas horas trabalhadas). O indicador síntese varia entre zero e um, indicando uma melhor situação quanto maior for o seu valor.
O resultado do índice síntese das nove variáveis está apresentado no gráfico. Conforme pode ser verificado, ao longo do primeiro semestre de 2013 o indicador continuava acima dos valores encontrados no mesmo semestre do triênio 2010/2012. É verdade que a melhora entre 2012 e 2013 tem sido bem menor do que nos anos anteriores, mas o indicador manteve-se na primeira metade do ano sistematicamente acima do encontrado no primeiro semestre de 2012.
Das nove variáveis utilizadas houve melhoria em oito quando comparados os dados do primeiro semestre de 2013 com 2012. Tomando-se como referência os valores médios obtidos no primeiro semestre dos dois anos podemos destacar os seguintes resultados:
- O percentual de empregados com carteira assinada passou de 53,5% para 54,4%;
- O percentual de ocupados com no mínimo o segundo grau completo aumentou de 62,1% para 63,6%;
- A remuneração média subiu de R$ 1.847 para R$ 1.875 (reais de junho de 2013);
- A taxa de desemprego caiu de 5,9% para 5,7%;
- O percentual de desempregados de longa duração caiu de 6,0% para 4,9%;
A única variável que piorou no período foi o percentual de chefes entre os desempregados que aumentou de 26,2% para 26,8%.
Conforme pode ser verificado no gráfico, a tendência nos últimos três anos tem sido de aumento do indicador ao longo de cada ano. Tal fato está associado à própria melhoria do mercado de trabalho no período 2010/2013, assim como a efeitos sazonais verificados durante cada ano. Exceto em 2010 quando a economia teve forte crescimento, em geral há uma flutuação no indicador no primeiro semestre, seguido de aumento no segundo.
Neste ano não tem sido diferente. O indicador flutuou no primeiro semestre de forma bastante semelhante ao que se verificou em 2012. A dúvida que fica é em relação ao que ocorrerá ao longo do segundo semestre. Se mantiver a tendência dos anos anteriores o indicador deverá aumentar refletindo o próprio movimento sazonal favorável encontrado na segunda metade de cada ano. Se isso não ocorrer, aí sim poderemos falar em piora no mercado de trabalho e teríamos o cruzamento das curvas de 2013 e 2012 em algum ponto do segundo semestre.
Em resumo, o mercado de trabalho continua apresentando resultados favoráveis em 2013, mas encontra-se em processo de desaceleração da melhoria. O segundo semestre deste ano será fundamental para a ocorrência ou não de uma reversão nesse processo que já dura uma década. Se o governo conseguir uma recuperação no estado das expectativas dos agentes é possível que o país feche o ano ainda apresentando resultados favoráveis no mercado de trabalho. Caso contrário, corremos o risco da desaceleração se transformar efetivamente numa piora.
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