Por Amir Khair, no sítio Carta Maior:
Entre 1901 e 1980, o Brasil, juntamente com o Japão, foi o país que mais cresceu em sua economia. Esse período pode ser dividido em duas partes: de 1901 a 1930 cujo motor foi o modelo primário exportador, aproveitando a posição de destaque do País no café. De 1931 a 1980 o modelo foi baseado na substituição de importações industriais com proteção à indústria nascente.
Nesse período de 80 anos, o PIB cresceu em média 5,67% a cada ano e a população 2,43%, dando um crescimento per capita de 3,16% nessa importante fase da vida econômica do País.
A partir de 1981 até 2003 o País andou de lado, pilotado pelo que se denominou de Consenso de Washington, a fase neoliberal apoiada na soberania do mercado em contraposição ao Estado, considerado como um mal necessário.
Para esse Consenso, observou João Paulo de Almeida Magalhães “o recomendável para as nações emergentes seria, em primeiro lugar, a renúncia, pelo Estado, a qualquer intervenção na economia. Sua ação deveria se limitar às garantias das regras do jogo econômico, tais como o respeito à propriedade privada e o cumprimento das obrigações contratuais. A par disso, caberia ao Poder Público garantir os equilíbrios econômicos fundamentais, a saber, cambial, fiscal e monetário. Os mecanismos do mercado deveriam comandar a economia, o que implica a ampla e irrestrita abertura da economia nacional à movimentação de capitais e mercadorias estrangeiras.”
Nesse período de 23 anos o País se viu às voltas com sérios problemas nas suas contas externas, tendo que ser socorrido pelo Fundo Monetário Internacional de forma mais aguda em 1999 e 2002 sob o governo FHC, com a explosão da dívida interna e precárias reservas internacionais. O crescimento médio anual foi de 1,99% e de 0,25% no PIB per capita.
A partir de 2004 a 2008 o País atravessou um período contínuo de crescimento com o PIB anual evoluindo em média 4,81% e o PIB per capita 3,73%, superior até ao registrado no período de 1901 a 1980. Foram anos dourados em que o País surfou na forte expansão do comércio internacional, liderado pela China, com forte demanda de commodities, com preços elevados em termos históricos. O governo Lula abriu e fortaleceu relações políticas e comerciais com vários países, que não foram considerados pelos governos anteriores, que preferiram política externa alinhada aos Estados Unidos e Europa.
A par do bom momento internacional, o governo Lula adotou algumas medidas de estímulo ao consumo como: a) política de aumentos reais do salário mínimo; b) a criação do Bolsa Família; c) a maior abrangência do Benefício de Prestação Continuada (BPC) para idosos com idade a partir de 65 anos (antes era 67 anos) e; d) a criação e expansão do empréstimo consignado com garantia na folha de pagamento. Com isso ocorreu um aumento expressivo na classe média vinda das classes D e E, como nunca tinha ocorrido na história do País.
Mas, infelizmente a partir de 2011, arrastado pelos ventos internacionais desfavoráveis e por uma política econômica errática, sem rumo claro, e com medidas de estímulo de baixo alcance, o crescimento foi derrubado para o nível médio em 2011/2012 de 1,80% ao ano, correspondendo a um crescimento médio do PIB per capita de 0,96%. Esse crescimento correspondeu a 25% do alcançado no período 2004/2008.
O governo federal derrubou o crescimento, não por que quisesse. Ao contrário, usou de várias medidas visando estimular a oferta e a demanda, mas de pequeno alcance face aos desafios postos pela conjuntura interna e externa.
Porque de pequeno alcance? Porque de pouco adianta estimular o consumo, que é necessário, se não procura endereçar a expansão desse consumo para a produção local. Parte substancial da expansão do consumo das famílias está sendo atendida pelo produto importado, que é mais barato para o mesmo nível de qualidade.
Para romper com esse desvio prejudicial ao crescimento é necessário ter o câmbio no lugar. Está fora do ponto, que é de R$ 3,00. É com esse valor que se tornará viável competir no mercado interno e expandir as vendas ao exterior.
Algumas análises corretamente imputam o problema da competitividade das empresas locais face às de fora do País a outras causas, como, a insuficiência e custo da precária infraestrutura, a alta carga tributária e de juros, burocracia, insegurança jurídica, etc., o chamado custo Brasil.
São fatores que de fato agem contra a empresa local, mas para resolver essas deficiências é muito mais complicado e demanda vários anos para mudar, e o problema de devolver parte da competitividade das empresas é urgente. Não pode esperar, pois muitas empresas podem ficar inviabilizadas face à agressividade do mercado internacional com países em férrea disputa para colocar seus produtos.
Há superoferta internacional de bens, com preços que exigem muita tecnologia, inovação e, principalmente, insumos no início das cadeias produtivas com custos competitivos internacionalmente, sem o excesso de proteção tarifária concedida erroneamente pelo governo federal, que faz política tarifária do comércio exterior às avessas, ou seja, protege os fabricantes do início das cadeias produtivas com tarifas elevadas e comprime os demais elos da cadeia com tarifas mais reduzidas, deslocando o lucro para as empresas formadoras de custos e preços localizadas no início das cadeias, contaminando o resto das cadeias produtivas. Isso possivelmente, junto com a elevada alíquota do ICMS, possa explicar o nível elevado dos preços no País.
Voltarei a essa questão das cadeias produtivas em próximos artigos, pois é questão central estratégica condicionante do crescimento.
O que importa no curtíssimo prazo é acabar de vez com o uso do câmbio para o controle da inflação, como fizeram sucessivos governos a partir do Plano Real. Esse para se viabilizar precisou atrair o capital especulativo internacional, que entrou fortemente atraído pelos juros convidativos, quadruplicando de 1994 para 1995 os rendimentos de estrangeiros nas aplicações em títulos do governo federal. Da sangria anterior ao Plano da ordem de US$ 1 bilhão anual se passou imediatamente pós Plano para US$ 4 bilhões e nos últimos doze anos (2001/2012) pulou para a média de US$ 9,7 bilhões por ano. Esse é apenas um dos danos causados pela Selic elevada.
Para colocar o câmbio no lugar não precisa fazer esforço. Basta fazer o que fizeram e fazem, de forma intensa, os países que querem desvalorizar suas moedas para fortalecer o poder competitivo das suas empresas, que é injetar liquidez na economia através de emissão maciça de moeda.
Mas lá vêm os guardiões da inflação bradando contra isso, pois irá, segundo eles, descambar com a inflação. Se fosse assim, os países que alteraram profundamente a liquidez, como Estados Unidos, Europa e Japão já teriam acusado inflação fora de controle. Não mexeu um milímetro. É, mas aqui seria diferente, pois eles não tiveram o passado inflacionário que o Brasil teve e, não vale a pena arriscar bradam, novamente esses guardiões.
Acontece que desde 2011 vem ocorrendo desvalorização cambial sem alterar um milímetro a inflação. Vejamos: em 2011 o câmbio nominal valia R$ 1,67/US$ e a inflação naquele ano foi para 6,5% (teto da meta). Em 2012 foi para R$ 2,00, com desvalorização de 20,0% e a inflação em vez de subir caiu para 5,8%, apesar do golpe desferido pela forte subida dos preços dos alimentos ocorrida na segunda metade de 2012. Atualmente gira ao redor de R$ 2,35/US$, ou seja, com uma desvalorização neste ano até agora de 17,5% e as previsões apontam para repetir a de 2012, ou seja, 5,8%.
Entre 2011 e agora, a desvalorização nominal do câmbio foi de 40,7% e, excluída a inflação, a desvalorização em termos reais foi de 24,8% e a inflação não cresceu. Portanto, está mais do que na hora de deixar o câmbio flutuar em direção ao rumo de R$ 3,00/US$, que se poderá devolver parte da competitividade da economia, ao mesmo tempo em que se poderá viabilizar o equilíbrio das contas externas e o crescimento pelo atendimento à demanda interna pela produção local.
O câmbio no lugar implica na elevação da liquidez e em posicionar a Selic ao nível da inflação como fazem os demais países. São alguns dos desafios ao crescimento.
Entre 1901 e 1980, o Brasil, juntamente com o Japão, foi o país que mais cresceu em sua economia. Esse período pode ser dividido em duas partes: de 1901 a 1930 cujo motor foi o modelo primário exportador, aproveitando a posição de destaque do País no café. De 1931 a 1980 o modelo foi baseado na substituição de importações industriais com proteção à indústria nascente.
Nesse período de 80 anos, o PIB cresceu em média 5,67% a cada ano e a população 2,43%, dando um crescimento per capita de 3,16% nessa importante fase da vida econômica do País.
A partir de 1981 até 2003 o País andou de lado, pilotado pelo que se denominou de Consenso de Washington, a fase neoliberal apoiada na soberania do mercado em contraposição ao Estado, considerado como um mal necessário.
Para esse Consenso, observou João Paulo de Almeida Magalhães “o recomendável para as nações emergentes seria, em primeiro lugar, a renúncia, pelo Estado, a qualquer intervenção na economia. Sua ação deveria se limitar às garantias das regras do jogo econômico, tais como o respeito à propriedade privada e o cumprimento das obrigações contratuais. A par disso, caberia ao Poder Público garantir os equilíbrios econômicos fundamentais, a saber, cambial, fiscal e monetário. Os mecanismos do mercado deveriam comandar a economia, o que implica a ampla e irrestrita abertura da economia nacional à movimentação de capitais e mercadorias estrangeiras.”
Nesse período de 23 anos o País se viu às voltas com sérios problemas nas suas contas externas, tendo que ser socorrido pelo Fundo Monetário Internacional de forma mais aguda em 1999 e 2002 sob o governo FHC, com a explosão da dívida interna e precárias reservas internacionais. O crescimento médio anual foi de 1,99% e de 0,25% no PIB per capita.
A partir de 2004 a 2008 o País atravessou um período contínuo de crescimento com o PIB anual evoluindo em média 4,81% e o PIB per capita 3,73%, superior até ao registrado no período de 1901 a 1980. Foram anos dourados em que o País surfou na forte expansão do comércio internacional, liderado pela China, com forte demanda de commodities, com preços elevados em termos históricos. O governo Lula abriu e fortaleceu relações políticas e comerciais com vários países, que não foram considerados pelos governos anteriores, que preferiram política externa alinhada aos Estados Unidos e Europa.
A par do bom momento internacional, o governo Lula adotou algumas medidas de estímulo ao consumo como: a) política de aumentos reais do salário mínimo; b) a criação do Bolsa Família; c) a maior abrangência do Benefício de Prestação Continuada (BPC) para idosos com idade a partir de 65 anos (antes era 67 anos) e; d) a criação e expansão do empréstimo consignado com garantia na folha de pagamento. Com isso ocorreu um aumento expressivo na classe média vinda das classes D e E, como nunca tinha ocorrido na história do País.
Mas, infelizmente a partir de 2011, arrastado pelos ventos internacionais desfavoráveis e por uma política econômica errática, sem rumo claro, e com medidas de estímulo de baixo alcance, o crescimento foi derrubado para o nível médio em 2011/2012 de 1,80% ao ano, correspondendo a um crescimento médio do PIB per capita de 0,96%. Esse crescimento correspondeu a 25% do alcançado no período 2004/2008.
O governo federal derrubou o crescimento, não por que quisesse. Ao contrário, usou de várias medidas visando estimular a oferta e a demanda, mas de pequeno alcance face aos desafios postos pela conjuntura interna e externa.
Porque de pequeno alcance? Porque de pouco adianta estimular o consumo, que é necessário, se não procura endereçar a expansão desse consumo para a produção local. Parte substancial da expansão do consumo das famílias está sendo atendida pelo produto importado, que é mais barato para o mesmo nível de qualidade.
Para romper com esse desvio prejudicial ao crescimento é necessário ter o câmbio no lugar. Está fora do ponto, que é de R$ 3,00. É com esse valor que se tornará viável competir no mercado interno e expandir as vendas ao exterior.
Algumas análises corretamente imputam o problema da competitividade das empresas locais face às de fora do País a outras causas, como, a insuficiência e custo da precária infraestrutura, a alta carga tributária e de juros, burocracia, insegurança jurídica, etc., o chamado custo Brasil.
São fatores que de fato agem contra a empresa local, mas para resolver essas deficiências é muito mais complicado e demanda vários anos para mudar, e o problema de devolver parte da competitividade das empresas é urgente. Não pode esperar, pois muitas empresas podem ficar inviabilizadas face à agressividade do mercado internacional com países em férrea disputa para colocar seus produtos.
Há superoferta internacional de bens, com preços que exigem muita tecnologia, inovação e, principalmente, insumos no início das cadeias produtivas com custos competitivos internacionalmente, sem o excesso de proteção tarifária concedida erroneamente pelo governo federal, que faz política tarifária do comércio exterior às avessas, ou seja, protege os fabricantes do início das cadeias produtivas com tarifas elevadas e comprime os demais elos da cadeia com tarifas mais reduzidas, deslocando o lucro para as empresas formadoras de custos e preços localizadas no início das cadeias, contaminando o resto das cadeias produtivas. Isso possivelmente, junto com a elevada alíquota do ICMS, possa explicar o nível elevado dos preços no País.
Voltarei a essa questão das cadeias produtivas em próximos artigos, pois é questão central estratégica condicionante do crescimento.
O que importa no curtíssimo prazo é acabar de vez com o uso do câmbio para o controle da inflação, como fizeram sucessivos governos a partir do Plano Real. Esse para se viabilizar precisou atrair o capital especulativo internacional, que entrou fortemente atraído pelos juros convidativos, quadruplicando de 1994 para 1995 os rendimentos de estrangeiros nas aplicações em títulos do governo federal. Da sangria anterior ao Plano da ordem de US$ 1 bilhão anual se passou imediatamente pós Plano para US$ 4 bilhões e nos últimos doze anos (2001/2012) pulou para a média de US$ 9,7 bilhões por ano. Esse é apenas um dos danos causados pela Selic elevada.
Para colocar o câmbio no lugar não precisa fazer esforço. Basta fazer o que fizeram e fazem, de forma intensa, os países que querem desvalorizar suas moedas para fortalecer o poder competitivo das suas empresas, que é injetar liquidez na economia através de emissão maciça de moeda.
Mas lá vêm os guardiões da inflação bradando contra isso, pois irá, segundo eles, descambar com a inflação. Se fosse assim, os países que alteraram profundamente a liquidez, como Estados Unidos, Europa e Japão já teriam acusado inflação fora de controle. Não mexeu um milímetro. É, mas aqui seria diferente, pois eles não tiveram o passado inflacionário que o Brasil teve e, não vale a pena arriscar bradam, novamente esses guardiões.
Acontece que desde 2011 vem ocorrendo desvalorização cambial sem alterar um milímetro a inflação. Vejamos: em 2011 o câmbio nominal valia R$ 1,67/US$ e a inflação naquele ano foi para 6,5% (teto da meta). Em 2012 foi para R$ 2,00, com desvalorização de 20,0% e a inflação em vez de subir caiu para 5,8%, apesar do golpe desferido pela forte subida dos preços dos alimentos ocorrida na segunda metade de 2012. Atualmente gira ao redor de R$ 2,35/US$, ou seja, com uma desvalorização neste ano até agora de 17,5% e as previsões apontam para repetir a de 2012, ou seja, 5,8%.
Entre 2011 e agora, a desvalorização nominal do câmbio foi de 40,7% e, excluída a inflação, a desvalorização em termos reais foi de 24,8% e a inflação não cresceu. Portanto, está mais do que na hora de deixar o câmbio flutuar em direção ao rumo de R$ 3,00/US$, que se poderá devolver parte da competitividade da economia, ao mesmo tempo em que se poderá viabilizar o equilíbrio das contas externas e o crescimento pelo atendimento à demanda interna pela produção local.
O câmbio no lugar implica na elevação da liquidez e em posicionar a Selic ao nível da inflação como fazem os demais países. São alguns dos desafios ao crescimento.
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