Por Fabio Serapião, na revista CartaCapital:
Nenhum estado da federação reúne tantos cidadãos indignados quanto São Paulo. Nos restaurantes, aeroportos, filas de cinema, os paulistanos, em especial aqueles da classe média, não se cansam de expressar seu horror à corrupção, ao patrimonialismo, ao atraso das práticas políticas. Surpreende, portanto, que em uma unidade federativa com habitantes tão conscientes de seus direitos um sujeito como Robson Riedel Marinho, contra quem se acumulam provas cabais de atos ilícitos, continue incólume, intocável, no posto de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado. Tão protegido a ponto de se sentir confortável para dar declarações na linha “daqui não saio, daqui ninguém me tira”.
Talvez o DNA tucano de Marinho torne os paulistanos mais complacentes em relação a seus malfeitos. De qualquer forma, mesmo essa paciência budista parece perto do fim. Subscrito pelos promotores Silvio Marques, José Carlos Blat, Saad Mazloum e Marcelo Daneluzzi, o pedido cautelar de afastamento de Marinho é examinado pela 13ª Vara da Fazenda Pública da Capital. No entendimento da Promotoria, enquanto aprovava as contas públicas estaduais, o conselheiro movimentava milhões na offshore Higgins Finance, de sua titularidade, no banco francês Crédit Agricole. Cerca de 3 milhões de dólares em nome de Marinho estão bloqueados e aguardam uma decisão da Justiça brasileira para ser repatriados. Desse total, segundo a promotoria, 2,7 milhões de dólares são oriundos de pagamentos de propina recebida entre 1998 e 2005.
O conselheiro terá até o fim da primeira semana de junho para enviar sua defesa à Justiça. Intocável, o ex-chefe da Casa Civil do falecido governador Mario Covas passou incólume pelos governos de Geraldo Alckmim e José Serra, com os quais contribuiu com a aprovação das contas e contratos milionários da administração direta e indireta. Ao longo desse tempo, Marinho fez fortuna não só no exterior, como aponta a documentação enviada pela Suíça aos promotores paulistas, mas também aqui no Brasil. É dono de uma ilha de 63 mil metros quadrados em Paraty e colocou à venda sua singela casa na praia Domingas Dias, em Ubatuba, por módicos 7 milhões de reais.
Mas não é só o dinheiro, segundo os promotores proveniente de propina, que levou Marinho a colecionar uma lista invejável de bens e imóveis no litoral. CartaCapital encontrou uma decisão da Justiça paulista, datada de 11 de fevereiro deste ano, na qual o Estado concede a Marinho a posse por usucapião de um terreno de 20 mil metros quadrados localizados em uma das áreas mais valorizadas de Ilhabela, o Saco de Indaiá. “De outro óculo, sempre existirá a possibilidade de fraudes e erros, assim como prejuízos a terceiros de boa-fé. No entanto, não se pode presumir a má-fé dos autores, nem mesmo a existência de erros nas informações por eles trazidas a juízo”, aponta a decisão que, em 9 de maio, transformou-se em registro definitivo do imóvel.
No terreno, alvo de investigação do Ministério Público por enriquecimento ilícito, Marinho tem como sócio um amigo de infância e responsável por aproximá-lo ainda mais da Alstom e de todo escândalo que sustenta os pedidos para seu afastamento da corte de contas. Ex-secretário da gestão de Marinho à frente da prefeitura de São José dos Campos, na década de 80, seu sócio Sabino Indelicato é apontado pelas autoridades suíças como um dos pagadores de propina da multinacional. De acordo com as investigações, Indelicato utilizou-se da empresa Acqualux para assinar um contrato fictício com a multinacional para intermediar a distribuição de propina a agentes públicos paulistas, entre eles Marinho.
Um acórdão de 28 páginas enviado pelo Tribunal Penal de Bellinzona, na Suíça, às autoridades paulistas mostra a movimentação bancária entre Marinho e Indelicato. Segundo os suíços, Indelicato depositou 950 mil dólares na conta do conselheiro registrada no país europeu. A peça jurídica é uma resposta ao pedido de Indelicato no qual ele sustentava ser ilegal a remessa de documentos relacionados ao caso às autoridades brasileiras. Ainda segundo o documento, Marinho teria ido à França, em 1998, para assistir à Copa do Mundo de futebol com todos os gastos custeados pela Alstom.
Mas não é só Indelicato quem coloca Marinho no centro do Caso Alstom. Em sua conta na Suíça, o conselheiro também recebeu cerca de 100 mil dólares da MCA Uruguay, de propriedade do lobista Romeu Pinto Júnior. Em depoimento à Polícia Federal, Pinto Júnior confessou ter “servido de intermediário do pagamento de propina a funcionários públicos paulistas a mando da Alstom e por meio da MCA”. Não bastasse, Marinho manteve relações com o lobista Arthur Teixeira, condenado na Suíça e, segundo as autoridades brasileiras, principal nome do cartel de trens da qual participaram a Siemens e a Alstom. Em 1999, o conselheiro comprou uma casa de mil metros quadrados no Morumbi, construída por Teixeira.
Tamanho volume de provas e indícios do recebimento de propina resultou até no apoio de um tucano aos pedidos de afastamento de Marinho. Em discurso na Assembleia Legislativa, o ex-presidente estadual da sigla Pedro Tobias não mediu palavras para apoiar a saída do conselheiro. “Robson Marinho, saia. Peça afastamento, pois está desgastando a imagem do governo. Está desgastando a Assembleia, está desgastando o Tribunal de Contas.”
Responsável pela defesa de Marinho, o advogado criminalista Celso Vilardi afirma que o conselheiro pretende permanecer no cargo, uma vez que no Brasil “vigora o princípio da presunção de inocência”. Segundo Vilardi, não há qualquer processo instaurado até o momento e o material enviado pela Justiça suíça foi obtido em investigação anulada naquele país. Portanto, acrescenta, resta esperar que a Justiça brasileira anule todo o caso.
Enquanto se aguarda uma posição da Justiça sobre o pedido do Ministério Público, falta apenas o governador Geraldo Alckmin utilizar sua força política para pressionar pelo afastamento de Marinho. Mas, para o governador, é bem menos perigoso discursar ao inaugurar o volume morto do Sistema Cantareira do que pressionar um arquivo tão vivo quanto Marinho.
Nenhum estado da federação reúne tantos cidadãos indignados quanto São Paulo. Nos restaurantes, aeroportos, filas de cinema, os paulistanos, em especial aqueles da classe média, não se cansam de expressar seu horror à corrupção, ao patrimonialismo, ao atraso das práticas políticas. Surpreende, portanto, que em uma unidade federativa com habitantes tão conscientes de seus direitos um sujeito como Robson Riedel Marinho, contra quem se acumulam provas cabais de atos ilícitos, continue incólume, intocável, no posto de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado. Tão protegido a ponto de se sentir confortável para dar declarações na linha “daqui não saio, daqui ninguém me tira”.
Talvez o DNA tucano de Marinho torne os paulistanos mais complacentes em relação a seus malfeitos. De qualquer forma, mesmo essa paciência budista parece perto do fim. Subscrito pelos promotores Silvio Marques, José Carlos Blat, Saad Mazloum e Marcelo Daneluzzi, o pedido cautelar de afastamento de Marinho é examinado pela 13ª Vara da Fazenda Pública da Capital. No entendimento da Promotoria, enquanto aprovava as contas públicas estaduais, o conselheiro movimentava milhões na offshore Higgins Finance, de sua titularidade, no banco francês Crédit Agricole. Cerca de 3 milhões de dólares em nome de Marinho estão bloqueados e aguardam uma decisão da Justiça brasileira para ser repatriados. Desse total, segundo a promotoria, 2,7 milhões de dólares são oriundos de pagamentos de propina recebida entre 1998 e 2005.
O conselheiro terá até o fim da primeira semana de junho para enviar sua defesa à Justiça. Intocável, o ex-chefe da Casa Civil do falecido governador Mario Covas passou incólume pelos governos de Geraldo Alckmim e José Serra, com os quais contribuiu com a aprovação das contas e contratos milionários da administração direta e indireta. Ao longo desse tempo, Marinho fez fortuna não só no exterior, como aponta a documentação enviada pela Suíça aos promotores paulistas, mas também aqui no Brasil. É dono de uma ilha de 63 mil metros quadrados em Paraty e colocou à venda sua singela casa na praia Domingas Dias, em Ubatuba, por módicos 7 milhões de reais.
Mas não é só o dinheiro, segundo os promotores proveniente de propina, que levou Marinho a colecionar uma lista invejável de bens e imóveis no litoral. CartaCapital encontrou uma decisão da Justiça paulista, datada de 11 de fevereiro deste ano, na qual o Estado concede a Marinho a posse por usucapião de um terreno de 20 mil metros quadrados localizados em uma das áreas mais valorizadas de Ilhabela, o Saco de Indaiá. “De outro óculo, sempre existirá a possibilidade de fraudes e erros, assim como prejuízos a terceiros de boa-fé. No entanto, não se pode presumir a má-fé dos autores, nem mesmo a existência de erros nas informações por eles trazidas a juízo”, aponta a decisão que, em 9 de maio, transformou-se em registro definitivo do imóvel.
No terreno, alvo de investigação do Ministério Público por enriquecimento ilícito, Marinho tem como sócio um amigo de infância e responsável por aproximá-lo ainda mais da Alstom e de todo escândalo que sustenta os pedidos para seu afastamento da corte de contas. Ex-secretário da gestão de Marinho à frente da prefeitura de São José dos Campos, na década de 80, seu sócio Sabino Indelicato é apontado pelas autoridades suíças como um dos pagadores de propina da multinacional. De acordo com as investigações, Indelicato utilizou-se da empresa Acqualux para assinar um contrato fictício com a multinacional para intermediar a distribuição de propina a agentes públicos paulistas, entre eles Marinho.
Um acórdão de 28 páginas enviado pelo Tribunal Penal de Bellinzona, na Suíça, às autoridades paulistas mostra a movimentação bancária entre Marinho e Indelicato. Segundo os suíços, Indelicato depositou 950 mil dólares na conta do conselheiro registrada no país europeu. A peça jurídica é uma resposta ao pedido de Indelicato no qual ele sustentava ser ilegal a remessa de documentos relacionados ao caso às autoridades brasileiras. Ainda segundo o documento, Marinho teria ido à França, em 1998, para assistir à Copa do Mundo de futebol com todos os gastos custeados pela Alstom.
Mas não é só Indelicato quem coloca Marinho no centro do Caso Alstom. Em sua conta na Suíça, o conselheiro também recebeu cerca de 100 mil dólares da MCA Uruguay, de propriedade do lobista Romeu Pinto Júnior. Em depoimento à Polícia Federal, Pinto Júnior confessou ter “servido de intermediário do pagamento de propina a funcionários públicos paulistas a mando da Alstom e por meio da MCA”. Não bastasse, Marinho manteve relações com o lobista Arthur Teixeira, condenado na Suíça e, segundo as autoridades brasileiras, principal nome do cartel de trens da qual participaram a Siemens e a Alstom. Em 1999, o conselheiro comprou uma casa de mil metros quadrados no Morumbi, construída por Teixeira.
Tamanho volume de provas e indícios do recebimento de propina resultou até no apoio de um tucano aos pedidos de afastamento de Marinho. Em discurso na Assembleia Legislativa, o ex-presidente estadual da sigla Pedro Tobias não mediu palavras para apoiar a saída do conselheiro. “Robson Marinho, saia. Peça afastamento, pois está desgastando a imagem do governo. Está desgastando a Assembleia, está desgastando o Tribunal de Contas.”
Responsável pela defesa de Marinho, o advogado criminalista Celso Vilardi afirma que o conselheiro pretende permanecer no cargo, uma vez que no Brasil “vigora o princípio da presunção de inocência”. Segundo Vilardi, não há qualquer processo instaurado até o momento e o material enviado pela Justiça suíça foi obtido em investigação anulada naquele país. Portanto, acrescenta, resta esperar que a Justiça brasileira anule todo o caso.
Enquanto se aguarda uma posição da Justiça sobre o pedido do Ministério Público, falta apenas o governador Geraldo Alckmin utilizar sua força política para pressionar pelo afastamento de Marinho. Mas, para o governador, é bem menos perigoso discursar ao inaugurar o volume morto do Sistema Cantareira do que pressionar um arquivo tão vivo quanto Marinho.
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