Por Marco Weissheimer, no site Sul-21:
O general Sérgio Westphalen Etchegoyen, indicado pelo vice-presidente Michel Temer para assumir como ministro-chefe da Secretaria de Segurança Institucional – pasta à qual ficará subordinada a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) –, é um crítico feroz dos trabalhos de investigação dos crimes da ditadura realizados pela Comissão Nacional da Verdade. Etchegoyen vinha atuando, desde março de 2015, como chefe do Estado-Maior do Exército. De 2011 a 2012, comandou a 3ª Divisão do Exército em Santa Maria (RS).
O militar gaúcho natural de Cruz Alta foi o primeiro general da ativa a criticar publicamente o trabalho da comissão, qualificado por ele como “patético” e “leviano”. Isso porque a CNV incluiu o pai dele, general Leo Guedes Etchegoyen, entre os militares responsáveis por violações de direitos humanos durante a ditadura militar. Essa não foi a única citação envolvendo familiares do general. Um tio dele, Cyro Guedes Etchegoyen, foi apontado pelo coronel Paulo Malhães à Comissão Nacional da Verdade, como autoridade responsável pela Casa da Morte, local de tortura e morte de presos políticos da ditadura, localizada no município de Petrópolis, Rio de Janeiro.
Em nota divulgada em dezembro de 2014, o general Etchegoyen, juntamente com outros quatro irmãos e a mãe dele, protestaram contra a inclusão do nome do pai no relatório da CNV, dizendo ela tinha o único propósito de “denegrir” a imagem do general Leo Etchegoyen. A nota afirmou:
“Ao apresentar seu nome, acompanhado de apenas três das muitas funções que desempenhou a serviço do Brasil, sem qualquer vinculação a fatos ou vítimas, os integrantes da CNV deixaram clara a natureza leviana de suas investigações e explicitaram o propósito de seu trabalho, qual seja o de puramente denegrir. (…) No seu patético esforço para reescrever a história, a CNV apontou um culpado para um crime que não identifica, sem qualquer respeito aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa”.
A resposta da Comissão da Verdade
Diante da reação da família do general, a assessoria de comunicação da Comissão Nacional da Verdade divulgou nota, no dia 11 de dezembro de 2014, relatando os fatos que basearam a inclusão de Leo Etchegoyen no capítulo 16 do volume I do relatório final, categoria B: “responsável pela gestão de estruturas onde ocorreram graves violações de direitos humanos”. Segundo o relato da CNV, “após o golpe de 1964, Leo Guedes Etchegoyen assumiu a chefia de Polícia do Estado do Rio Grande do Sul, período no qual recebeu Daniel Anthony Mitrione, notório especialista norte-americano em métodos de tortura contra presos políticos, para ministrar curso à Guarda Civil do Estado, realizado no período de 19 a 26 de junho”.
Em novembro de 1964, Etchegoyen assumiu a Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul, permanecendo no caro até fevereiro de 1965. Mais tarde, o militar foi chefe do Estado Maior do II Exército, de 1979 a julho de 1981, período no qual serviu sob as ordens do general Milton Tavares de Souza, comandante do II Exército que chefiou o Centro de Informações do Exército no período Médici. Ainda segundo a Comissão da Verdade, em 28 de dezembro de 1979, o general Leo Etchegoyen, na qualidade de chefe do Estado Maior e supervisor das atividades do DOI-CODI, elogiou os serviços prestados pelo tenente coronel Dalmo Lúcio Muniz Cyrillo, chefe do DOI CODI do II Exército, destacando “sua experiência no campo das informações e por sua dedicação, boa vontade, capacidade de trabalho e espírito de cooperação”.
Cyrillo atuou no DOI-CODI do II Exército como chefe de equipes de interrogatório e desempenhou a função de subcomandante nos períodos de Carlos Alberto Brilhante Ustra e Audir Santos Maciel. Em 1979, ele assumiu o comando do DOI-CODI de São Paulo, período no qual atuou sob as ordens de Leo Etchegoyen e Milton Tavares de Souza.
Em 19 de abril de 1980, assinala ainda a CNV, quando Leo Etchegoyen era chefe do Estado Maior do II Exército, seu comando esteve vinculado ao planejamento da prisão de sindicalistas e lideranças dos metalúrgicos da região do ABC, bem como do sequestro de integrantes de organizações de direitos humanos que prestavam solidariedade aos trabalhadores, como os advogados José Carlos Dias (então presidente da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo) e Dalmo Dallari (ex-presidente da mesma comissão). Essas prisões, diz a Comissão, foram efetuadas com violência, sem mandado de prisão e sem a devida comunicação às famílias. Essa operação foi planejada pelo comando do II Exército e executada por agentes do DOI-CODI, no período em que Leo Etchegoyen era o chefe do Estado Maior do II Exército, principal instância de planejamento de ações daquele comando.
A Casa da Morte e a morte de Malhães
Essa não foi a única menção a um familiar de Sergio Etchegoyen nos trabalhos da Comissão da Verdade. Em depoimento concedido à CNV, o coronel reformado Paulo Malhães apontou o coronel Cyro Guedes Ethegoyen, tio de Sergio Etchegoyen, como a autoridade responsável pela Casa da Morte, residência localizada em Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, que serviu de cárcere e local de tortura e execução de vários presos políticos. Segundo Malhães, Cyro Etchegoyen era a autoridade do Centro de Informações do Exército (CEI), responsável pela Casa. Ele foi chefe da seção de Informações e Contrainformações do CIE, atuando também sob as ordens do general Milton Tavares.
Em seu depoimento à Comissão da Verdade, Malhães admitiu ter participado de diversas sessões de tortura e de ter ordenado e participado de várias ocultações de cadáveres que envolviam, entre outras práticas, a mutilação dos corpos, com a retirada das digitais, mediante o corte das mãos, e da arcada dentária. Questionado em seu depoimento sobre as torturas e as mutilações de cadáveres, ele defendeu a prática como “uma necessidade” e disse que os corpos eram mutilados “para não deixar rastros”. “Quebrava os dentes. As mãos (cortava) daqui para cima”, afirmou, apontando as próprias falanges. Cerca de um mês depois de prestar depoimento à Comissão da Verdade, Malhães foi assassinado por asfixia em sua casa localizada na zona rural de Nova Iguaçu.
A nota divulgada por Sérgio Etchegoyen e familiares, em dezembro de 2014, qualifica o relatório da CNV como “patético esforço para reescrever a história” e afirma que “Leo Guedes Etchegoyen representa a segunda geração de uma família de generais que serve o Brasil, com retidão e patriotismo, há 96 anos”. E acrescenta: “Seguiremos defendendo sua honrada memória e responsabilizando os levianos que a atacarem”.
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