Por Luiz Gonzaga Belluzzo, na revista CartaCapital:
Publicado na quarta-feira 4 de julho no jornal Valor, o artigo de Martin Wolf, editor do Financial Times, denuncia as manobras de Donald Trump para implodir a ordem mundial. “São características destacadas do comportamento de Trump suas invenções, sua autocomiseração e sua prática da intimidação: os outros, inclusive os aliados históricos, estão “zombando de nós” em relação ao clima ou “nos enganando” em relação ao comércio exterior. A União Europeia, argumenta ele, “foi implantada para tirar proveito dos EUA, certo? Não mais... Esse tempo acabou”.
Trump exprime o declínio dos valores e das ideias que inspiraram os Estados Unidos na construção da chamada ordem mundial do pós-guerra. Terminado o conflito, as forças vitoriosas, democráticas e antifascistas trataram de criar instituições destinadas a impedir a repetição da desordem destrutiva que nascera da rivalidade entre as potências e da economia destravada.
O projeto hegemônico dos vencedores, os Estados Unidos, foi desenhado com o propósito de eliminar os fatores políticos e econômicos que levaram às duas conflagrações globais. Só o maniqueísmo típico da Guerra Fria se atreveria a negar que as forças sociais e o imaginário político predominantes no New Deal tinham uma visão progressista acerca do papel a ser exercido pelos Estados Unidos.
Em oposição ao isolacionismo praticado na posteridade da Primeira Guerra Mundial, os Estados Unidos – tomando em conta o autointeresse de forma esclarecida – empenharam-se na reconstrução europeia e apoiaram as lutas pela descolonização.
O que se observou, a partir de então, foi um ensaio – apenas um ensaio – de uma nova ordem internacional com aspirações de garantir os direitos do homem e do cidadão, os princípios da democracia e da legalidade internacional. Isto ocorreu num ambiente de tensão permanente entre as duas superpotências e de competição entre os seus sistemas de vida.
Ao mesmo tempo acentuaram-se a interdependência e a rivalidade econômica entre a Europa Ocidental, os Estados Unidos e o Japão, assim como se aceleraram os processos de desenvolvimento em meio à sucessão de crises políticas e golpes de Estado na periferia.
Depois de 30 anos de progresso material, redução das desigualdades nos países centrais, a estagflação dos anos 70 foi entendida como uma advertência e uma recomendação: era preciso dar adeus a tudo aquilo. O mal é a política. O intervencionismo do Estado, o poder dos sindicatos, o controle público da finança e os obstáculos ao livre movimento de capitais.
O conto de fadas da globalização acenava com o fim da história: as questões essenciais relativas às formas de convivência e ao regime de produção em escala mundial estariam resolvidas com a generalização da democracia liberal e da economia de mercado. Não haveria mais sentido na discussão de questões anacrônicas como as da pertinência cívica, laica e republicana, sentimento desenvolvido a partir do nascimento do Estado-Nação e consolidado com o Estado do Bem-Estar Social.
No crepúsculo do capitalismo regulado e solidário do pós-guerra, reemergiu a Grande Narrativa dos valores da concorrência e do mérito que estimula os cidadãos a se tornarem “empreendedores de si mesmos”, proprietários do seu “capital humano”. Essa aspiração bateu de frente com as realidades da exportação de empregos na manufatura globalizada, colidiu com a centralização do controle nas megaempresas “financeirizadas”, trombou com os avanços da Tecnologia da Informação e da automação.
Os choques deflagraram uma forte desvalorização do estoque de capital humano (sic), mesmo o cultivado com os empenhos da educação. Os mercados de trabalho estão infestados pelo vírus da precarização e pela continuada perda da segurança outrora proporcionada pelos direitos sociais e econômicos.
A frustração dos perdedores está na raiz do protecionismo nacionalista e agressivamente xenófobo de Trump. As classes médias, sobretudo nos Estados Unidos, mas também na Europa, ziguezagueiam entre os fetiches do individualismo e as realidades cruéis do declínio social e econômico. A individualização do fracasso já não consegue ocultar o destino comum reservado aos derrotados pela desordem do sistema social.
Os revoltados de Trump são indivíduos de carne e osso que não aceitam a retórica das elites globais e de seus fâmulos na mídia e na academia. Arengas pseudocientíficas incumbidas de justificar e naturalizar os escandalosos desequilíbrios de poder e riqueza.
Trump exprime o declínio dos valores e das ideias que inspiraram os Estados Unidos na construção da chamada ordem mundial do pós-guerra. Terminado o conflito, as forças vitoriosas, democráticas e antifascistas trataram de criar instituições destinadas a impedir a repetição da desordem destrutiva que nascera da rivalidade entre as potências e da economia destravada.
O projeto hegemônico dos vencedores, os Estados Unidos, foi desenhado com o propósito de eliminar os fatores políticos e econômicos que levaram às duas conflagrações globais. Só o maniqueísmo típico da Guerra Fria se atreveria a negar que as forças sociais e o imaginário político predominantes no New Deal tinham uma visão progressista acerca do papel a ser exercido pelos Estados Unidos.
Em oposição ao isolacionismo praticado na posteridade da Primeira Guerra Mundial, os Estados Unidos – tomando em conta o autointeresse de forma esclarecida – empenharam-se na reconstrução europeia e apoiaram as lutas pela descolonização.
O que se observou, a partir de então, foi um ensaio – apenas um ensaio – de uma nova ordem internacional com aspirações de garantir os direitos do homem e do cidadão, os princípios da democracia e da legalidade internacional. Isto ocorreu num ambiente de tensão permanente entre as duas superpotências e de competição entre os seus sistemas de vida.
Ao mesmo tempo acentuaram-se a interdependência e a rivalidade econômica entre a Europa Ocidental, os Estados Unidos e o Japão, assim como se aceleraram os processos de desenvolvimento em meio à sucessão de crises políticas e golpes de Estado na periferia.
Depois de 30 anos de progresso material, redução das desigualdades nos países centrais, a estagflação dos anos 70 foi entendida como uma advertência e uma recomendação: era preciso dar adeus a tudo aquilo. O mal é a política. O intervencionismo do Estado, o poder dos sindicatos, o controle público da finança e os obstáculos ao livre movimento de capitais.
O conto de fadas da globalização acenava com o fim da história: as questões essenciais relativas às formas de convivência e ao regime de produção em escala mundial estariam resolvidas com a generalização da democracia liberal e da economia de mercado. Não haveria mais sentido na discussão de questões anacrônicas como as da pertinência cívica, laica e republicana, sentimento desenvolvido a partir do nascimento do Estado-Nação e consolidado com o Estado do Bem-Estar Social.
No crepúsculo do capitalismo regulado e solidário do pós-guerra, reemergiu a Grande Narrativa dos valores da concorrência e do mérito que estimula os cidadãos a se tornarem “empreendedores de si mesmos”, proprietários do seu “capital humano”. Essa aspiração bateu de frente com as realidades da exportação de empregos na manufatura globalizada, colidiu com a centralização do controle nas megaempresas “financeirizadas”, trombou com os avanços da Tecnologia da Informação e da automação.
Os choques deflagraram uma forte desvalorização do estoque de capital humano (sic), mesmo o cultivado com os empenhos da educação. Os mercados de trabalho estão infestados pelo vírus da precarização e pela continuada perda da segurança outrora proporcionada pelos direitos sociais e econômicos.
A frustração dos perdedores está na raiz do protecionismo nacionalista e agressivamente xenófobo de Trump. As classes médias, sobretudo nos Estados Unidos, mas também na Europa, ziguezagueiam entre os fetiches do individualismo e as realidades cruéis do declínio social e econômico. A individualização do fracasso já não consegue ocultar o destino comum reservado aos derrotados pela desordem do sistema social.
Os revoltados de Trump são indivíduos de carne e osso que não aceitam a retórica das elites globais e de seus fâmulos na mídia e na academia. Arengas pseudocientíficas incumbidas de justificar e naturalizar os escandalosos desequilíbrios de poder e riqueza.
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