Por Marcelo Zero
É tocante ver a expectativa ansiosa com que a imprensa e certos setores políticos esperam algum gesto republicano, de conciliação, de comprometimento democrático, ou mesmo de mínima civilização por parte de Bolsonaro et caterva.
Mesmo após serem tratados como porcos em chiqueiro, há veículos e profissionais que dizem torcer pelo “êxito” do governo neofascista, que candidamente preveem que Bolsonaro deverá “governar para todos”, que ele fará concessões “em nome da governabilidade”, que ele terá de “conviver com as instituições democráticas”, que as “perspectivas para a economia são boas”, que isso tende a “distender o ambiente político”, que o “mercado está otimista” etc.
Vaticinam, enfim, que, ao ter de governar, Bolsonaro será um presidente “democrático” como outro qualquer e terá, eventualmente, de “descer do palanque” e abandonar a sua “retórica” belicosa e intolerante.
Tal vaticínio panglossiano é compartilhado até mesmo por setores da oposição, que fizeram do PT seu inimigo principal e consideram que Bolsonaro não representa “um perigo para a democracia”.
Porém, isso jamais acontecerá. Bolsonaro não “descerá do palanque”. Fascistas nunca “descem do palanque”. Ao contrário, fascistas constroem imensos palanques e, de lá, mandam a democracia às favas.
Fascistas chegam ao poder e nele se mantêm pelo recurso ideológico à guerra contra o inimigo.
Fascistas chegam ao poder e nele se mantêm pelo recurso político da destruição da democracia e de seus direitos e instituições.
Em condições de normalidade democrática, Hitler, um ex-cabo, não teria passado daquele indivíduo patético que fazia discursos de animada histeria em cervejarias de Munique.
Em condições de normalidade democrática, Hitler não teria convencido a população alemã de que judeus e “bolcheviques” eram seus grandes inimigos e de que ele poderia livrá-los dessas “grandes ameaças” enviando “essa sujeira” para grandes fornos crematórios.
Em condições de normalidade democrática, Bolsonaro, um ex-capitão, não teria passado daquilo que sempre foi, um deputado do baixo clero cujos discursos eram incapazes de motivar até mesmo a plateia bêbada de uma cervejaria de Munique.
Não vivemos mais numa democracia e o bolsonarismo é uma forma de fascismo.
Quem ainda não entendeu isso, não entendeu nada.
Bolsonaro é fruto direto de um processo que, em nome do desejo de tirar o PT do governo, levou de roldão o pacto democrático instituído pela Constituição de 1988 e o ciclo político da Nova República.
Vivemos hoje não num novo governo, como outro qualquer, mas num novo regime político, num brave new world, no qual a democracia é simulacro e no qual a governabilidade não se exerce mediante a negociação, mas pela guerra implacável ao “inimigo”.
É por isso que Bolsonaro e seus ministros fizeram discursos raivosos, de ódio, em suas posses.
Não fizeram gestos de conciliação, de republicanismo, de civilização.
Ao contrário, assestaram suas baterias belicosas contra o petismo, o “marxismo cultural”, o “politicamente correto”.
Ameaçam “acabar”, “destruir” e “expulsar” os “inimigos”.
Prometem guerra sem trégua contra aqueles que querem que “a bandeira brasileira seja vermelha” e “derramar o sangue” de quem se oponha ao novo Brasil “cristão”, “limpo” e “sem ideologias” que ora se ergue.
Esse novo Brasil não admite diálogo e conciliação democrática de divergências. Ame-o ou deixe-o. Ou então, morra. Afinal, o Brasil das milícias está no poder.
É por isso que o governo agora passa um “pente fino” entre servidores para identificar os “inimigos”.
Quem tiver feito alguma homenagem a Marielle Franco será sumariamente demitido.
Quem tiver feito alguma crítica a Bolsonaro também.
Pouco importa se o inimigo é imaginário ou inexistente.
O novo ministro da Casa Civil assumiu prometendo “despetizar” a máquina, equiparando petistas a insetos, como os hutus fizeram com os tutsis.
Ele sabe muito bem que os petistas, inclusive os garçons, há muito foram escorraçados do Planalto.
Ele sabe bem que o PT deixou de governar, de facto, desde meados de 2015, quando Eduardo Cunha passou a mandar e desmandar no Brasil.
Mas ele sabe também que é necessário manter o antipetismo vivo.
Ele sabe que essa é a muleta ideológica do bolsonarismo.
Ele sabe que, sem os “inimigos” do PT, do “marxismo cultural”, do “politicamente correto”, do “bolivarianismo”, do “ambientalismo”, do “feminismo”, o bolsonarismo não se sustenta. Até mesmo porque o fascismo tupiniquim não tem nada de novo e concreto a propor, só tem um passado idílico e quimérico a restaurar.
É por isso que Bolsonaro fala em fazer o Brasil voltar ao que era há 50 anos.
Mais ambicioso, o chanceler templário fala saudoso de um passado pré-iluminista, quando a Terra era plana e o Sol, contrariando o “marxismo cultural” de Copérnico e Galileu, a orbitava.
Observe-se que a selvagem pauta ultraneoliberal do Posto Ipiranga, destruidora de direitos e do pacto social plasmado na Constituição, representará fator complicador, ou mesmo impeditivo, para a tradicional governabilidade democrática.
Num contexto interno de frontal enfrentamento de classes e num provável cenário externo de novo colapso financeiro, talvez seja melhor, do ponto de vista dos grandes interesses internos e externos que apoiam Bolsonaro, apostar na governabilidade de guerra do neofascismo.
Nesse sentido, acredito que a ruína da nossa democracia e do nosso sistema de representação, que deu origem à atual excrecência política, talvez não tenha sido mero acidente de percurso, como afirmam alguns, mas algo dissimuladamente intencional. Isso explicaria porque tratam um fenômeno político inteiramente anormal como se fosse parte da “normalidade democrática”.
Com toda certeza, os interesses externos articulados na nova ultradireita mundial de Steve Bannon, que tornaram o Brasil mero peão geopolítico a serviço da restauração da hegemonia dos EUA no mundo, apostam na governabilidade bélica do neofascismo brasileiro. Para tais interesses, nada mais funcional que um governo que despreza a soberania e faz dos interesses populares os inimigos a serem batidos.
Como corolário, um governo como esse também poderá tentar se afirmar e se legitimar contra “inimigos externos comuns”. Assim, uma intervenção na Venezuela, ainda que restrita à dimensão econômica e diplomática, poderá ser útil à governabilidade bélica do bolsonarismo.
Não se espere racionalidade e pragmatismo político de um governo assentado no fundamentalismo cristão e no neofascismo. Não se espere governabilidade democrática e republicanismo de quem elogia ditadura e tortura e de quem prometeu o extermínio de opositores.
Bolsonaro não descerá do palanque. Erguerá um imenso palanque político e digital de ódio, propaganda e fake news, de onde governará perseguindo adversários. De onde governará perseguindo seu principal “inimigo”: o povo do Brasil.
Bolsonaro sabe que, se deixar de pedalar a bicicleta do ódio e da intolerância, cairá.
É tocante ver a expectativa ansiosa com que a imprensa e certos setores políticos esperam algum gesto republicano, de conciliação, de comprometimento democrático, ou mesmo de mínima civilização por parte de Bolsonaro et caterva.
Mesmo após serem tratados como porcos em chiqueiro, há veículos e profissionais que dizem torcer pelo “êxito” do governo neofascista, que candidamente preveem que Bolsonaro deverá “governar para todos”, que ele fará concessões “em nome da governabilidade”, que ele terá de “conviver com as instituições democráticas”, que as “perspectivas para a economia são boas”, que isso tende a “distender o ambiente político”, que o “mercado está otimista” etc.
Vaticinam, enfim, que, ao ter de governar, Bolsonaro será um presidente “democrático” como outro qualquer e terá, eventualmente, de “descer do palanque” e abandonar a sua “retórica” belicosa e intolerante.
Tal vaticínio panglossiano é compartilhado até mesmo por setores da oposição, que fizeram do PT seu inimigo principal e consideram que Bolsonaro não representa “um perigo para a democracia”.
Porém, isso jamais acontecerá. Bolsonaro não “descerá do palanque”. Fascistas nunca “descem do palanque”. Ao contrário, fascistas constroem imensos palanques e, de lá, mandam a democracia às favas.
Fascistas chegam ao poder e nele se mantêm pelo recurso ideológico à guerra contra o inimigo.
Fascistas chegam ao poder e nele se mantêm pelo recurso político da destruição da democracia e de seus direitos e instituições.
Em condições de normalidade democrática, Hitler, um ex-cabo, não teria passado daquele indivíduo patético que fazia discursos de animada histeria em cervejarias de Munique.
Em condições de normalidade democrática, Hitler não teria convencido a população alemã de que judeus e “bolcheviques” eram seus grandes inimigos e de que ele poderia livrá-los dessas “grandes ameaças” enviando “essa sujeira” para grandes fornos crematórios.
Em condições de normalidade democrática, Bolsonaro, um ex-capitão, não teria passado daquilo que sempre foi, um deputado do baixo clero cujos discursos eram incapazes de motivar até mesmo a plateia bêbada de uma cervejaria de Munique.
Não vivemos mais numa democracia e o bolsonarismo é uma forma de fascismo.
Quem ainda não entendeu isso, não entendeu nada.
Bolsonaro é fruto direto de um processo que, em nome do desejo de tirar o PT do governo, levou de roldão o pacto democrático instituído pela Constituição de 1988 e o ciclo político da Nova República.
Vivemos hoje não num novo governo, como outro qualquer, mas num novo regime político, num brave new world, no qual a democracia é simulacro e no qual a governabilidade não se exerce mediante a negociação, mas pela guerra implacável ao “inimigo”.
É por isso que Bolsonaro e seus ministros fizeram discursos raivosos, de ódio, em suas posses.
Não fizeram gestos de conciliação, de republicanismo, de civilização.
Ao contrário, assestaram suas baterias belicosas contra o petismo, o “marxismo cultural”, o “politicamente correto”.
Ameaçam “acabar”, “destruir” e “expulsar” os “inimigos”.
Prometem guerra sem trégua contra aqueles que querem que “a bandeira brasileira seja vermelha” e “derramar o sangue” de quem se oponha ao novo Brasil “cristão”, “limpo” e “sem ideologias” que ora se ergue.
Esse novo Brasil não admite diálogo e conciliação democrática de divergências. Ame-o ou deixe-o. Ou então, morra. Afinal, o Brasil das milícias está no poder.
É por isso que o governo agora passa um “pente fino” entre servidores para identificar os “inimigos”.
Quem tiver feito alguma homenagem a Marielle Franco será sumariamente demitido.
Quem tiver feito alguma crítica a Bolsonaro também.
Pouco importa se o inimigo é imaginário ou inexistente.
O novo ministro da Casa Civil assumiu prometendo “despetizar” a máquina, equiparando petistas a insetos, como os hutus fizeram com os tutsis.
Ele sabe muito bem que os petistas, inclusive os garçons, há muito foram escorraçados do Planalto.
Ele sabe bem que o PT deixou de governar, de facto, desde meados de 2015, quando Eduardo Cunha passou a mandar e desmandar no Brasil.
Mas ele sabe também que é necessário manter o antipetismo vivo.
Ele sabe que essa é a muleta ideológica do bolsonarismo.
Ele sabe que, sem os “inimigos” do PT, do “marxismo cultural”, do “politicamente correto”, do “bolivarianismo”, do “ambientalismo”, do “feminismo”, o bolsonarismo não se sustenta. Até mesmo porque o fascismo tupiniquim não tem nada de novo e concreto a propor, só tem um passado idílico e quimérico a restaurar.
É por isso que Bolsonaro fala em fazer o Brasil voltar ao que era há 50 anos.
Mais ambicioso, o chanceler templário fala saudoso de um passado pré-iluminista, quando a Terra era plana e o Sol, contrariando o “marxismo cultural” de Copérnico e Galileu, a orbitava.
Observe-se que a selvagem pauta ultraneoliberal do Posto Ipiranga, destruidora de direitos e do pacto social plasmado na Constituição, representará fator complicador, ou mesmo impeditivo, para a tradicional governabilidade democrática.
Num contexto interno de frontal enfrentamento de classes e num provável cenário externo de novo colapso financeiro, talvez seja melhor, do ponto de vista dos grandes interesses internos e externos que apoiam Bolsonaro, apostar na governabilidade de guerra do neofascismo.
Nesse sentido, acredito que a ruína da nossa democracia e do nosso sistema de representação, que deu origem à atual excrecência política, talvez não tenha sido mero acidente de percurso, como afirmam alguns, mas algo dissimuladamente intencional. Isso explicaria porque tratam um fenômeno político inteiramente anormal como se fosse parte da “normalidade democrática”.
Com toda certeza, os interesses externos articulados na nova ultradireita mundial de Steve Bannon, que tornaram o Brasil mero peão geopolítico a serviço da restauração da hegemonia dos EUA no mundo, apostam na governabilidade bélica do neofascismo brasileiro. Para tais interesses, nada mais funcional que um governo que despreza a soberania e faz dos interesses populares os inimigos a serem batidos.
Como corolário, um governo como esse também poderá tentar se afirmar e se legitimar contra “inimigos externos comuns”. Assim, uma intervenção na Venezuela, ainda que restrita à dimensão econômica e diplomática, poderá ser útil à governabilidade bélica do bolsonarismo.
Não se espere racionalidade e pragmatismo político de um governo assentado no fundamentalismo cristão e no neofascismo. Não se espere governabilidade democrática e republicanismo de quem elogia ditadura e tortura e de quem prometeu o extermínio de opositores.
Bolsonaro não descerá do palanque. Erguerá um imenso palanque político e digital de ódio, propaganda e fake news, de onde governará perseguindo adversários. De onde governará perseguindo seu principal “inimigo”: o povo do Brasil.
Bolsonaro sabe que, se deixar de pedalar a bicicleta do ódio e da intolerância, cairá.
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