Por Natasha Bachini e João Feres Jr., no site Manchetômetro:
A despeito da bandeira anticorrupção que conduziu Jair Bolsonaro e seus filhos Flávio, Eduardo e Carlos ao sucesso eleitoral, não tardou a estourar um escândalo de corrupção envolvendo a família e que tem no senador eleito pelo Estado do Rio de Janeiro seu pivô.
Em dezembro de 2018, a imprensa [1]divulgou dados do relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividade Financeiras) para a Operação Furna de Onça, braço da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro, que identificou movimentações atípicas de cerca de R$1,2 milhões na conta do ex-assessor de Flávio Bolsonaro, Fabrício Queiroz, entre os anos 2016-2017. O relatório informava ainda que uma das favorecidas por essas movimentações foi Michele Bolsonaro, esposa do presidente, que teria recebido R$ 24mil reais em cheque. Na época, Flávio saiu em defesa de Queiroz, e Bolsonaro e a primeira-dama preferiram não se manifestar sobre o assunto.
Em 17 de janeiro de 2019, o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu temporariamente o inquérito no qual Queiroz era investigado a pedido do advogado de Flávio. Esta decisão causou perplexidade no meio jurídico e repercutiu negativamente na imprensa, visto que não houve, contrariamente ao que alegou o ministro, violação de prerrogativa do foro privilegiado do senador. Além de Flávio ser apenas citado no inquérito e não investigado por esse, o fato é anterior ao seu mandato.
No último dia 22, a imprensa noticiou outra bomba contra Flávio Bolsonaro: suas relações com milicianos da zona oeste do Rio de Janeiro. O Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Rio de Janeiro realizou uma operação na comunidade Rio das Pedras, e prendeu cinco suspeitos de envolvimento nos assassinatos da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes. Um deles, o miliciano e ex-capitão do Bope, Adriano Magalhães da Nóbrega, já fora homenageado por Flávio e teve sua mãe e esposa empregadas pelo senador quando este atuava como deputado na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ). Mais do que uma assessora, a mãe de Nóbrega é apontada como uma das servidoras que fizeram repasses para a conta de Fabrício Queiroz, estimados agora no valor total de 7 milhões de reais [2].
Tendo em vista que as mídias sociais têm sido o principal canal de comunicação da família Bolsonaro com o eleitorado, buscamos neste artigo avaliar os possíveis impactos dessas notícias na sua dinâmica. Para tanto, acompanhamos a evolução do número de fãs das páginas do Facebook de Jair e Flávio Bolsonaro, o engajamento gerado por seus posts no último mês e o ranking dos posts mais compartilhados na última semana. Trazemos também a repercussão dos escândalos no Twitter a partir de duas hashtags que chegaram ao Trending Topics.
Segundo os dados do site Socialbakers, as páginas da família Bolsonaro registraram aumento no número de fãs. A página do presidente foi a que mais conquistou fãs no Brasil no último mês, 254.760, e atualmente é página de política do Facebook mais curtida do país (9.157.019 fãs). A página de Flávio Bolsonaro, que possui 1.321.569 fãs, teve um aumento 43.041 curtidas no mesmo período. Outro filho do presidente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), tem a segunda página com maior aumento (60.370), registrando atualmente 2.334.961 fãs. Já o vereador Carlos Bolsonaro (PSL-RJ) é o membro da família cuja página possui menos curtidas na plataforma, 620.809 fãs, e não se destacou entre as páginas que registraram aumento no número de fãs em janeiro.
A página de Flávio Bolsonaro inicia o mês de janeiro gerando altos índices de engajamento. Estes posts consistiam em homenagens ao seu pai, que assumia a presidência da República. Nas duas semanas seguintes, o senador diminuiu sua frequência de postagens, voltando a usar o Facebook somente após as novas revelações sobre o caso, para defender-se. Nestas publicações, Flávio acusa o Ministério Público do Rio de Janeiro e a imprensa de realizarem uma campanha difamatória contra ele e afirma não haver ilegalidade nos depósitos.
Até o dia 22 de janeiro, o presidente não se pronunciou sobre o escândalo no Facebook. Seus posts mais compartilhados no período consistiram basicamente em vídeos do seu discurso em Davos e de sua posse. Jair Bolsonaro apoiou também a extradição de Cesare Battisti, criticou os indígenas e o governo do Estado de Ceará, afirmando que apesar de ele ser petista, o governo federal “jamais abandonaria o povo cearense nesse caos”.
Eduardo Bolsonaro pouco se pronunciou sobre o assunto. Postou somente um vídeo em defesa do irmão, no qual o advogado Alexandre Pacheco acusa a imprensa de não apurar devidamente os fatos, e o Ministério Público de perseguir o senador e ter quebrado indevidamente seu sigilo bancário. Segundo o advogado, a investigação é parte de um conluio para atingir seu pai, Jair Bolsonaro, por ter substituído os “macacos velhos de Brasília” e para que este não consiga aprovar a Reforma da Previdência e assim acabar com as “regalias” da capital federal.
Seus posts mais compartilhados no período trataram da posse de Bolsonaro e do Fórum Econômico de Davos, ressaltando “o início de um novo tempo para o Brasil”, “que não enxerga o criminoso como vítima da sociedade, que não se associa a ditaduras e que sabe que um Estado gigante dá grandes margens a corrupção e ineficiência”.
Seu irmão Carlos Bolsonaro, o menos ativo da família no Facebook, não se pronunciou sobre o assunto na rede. Seus posts mais compartilhados exaltavam a primeira-dama e criticavam a imprensa (especialmente a Rede Globo), as feministas e o Partido dos Trabalhadores.
Embora a família Bolsonaro tenha se manifestado pouco sobre o assunto, quando observamos abaixo o ranking dos posts mais compartilhados da última semana, vemos que este teve ampla repercussão na rede.
Metade dos posts da lista trataram do escândalo. A maioria deles foi publicado pela imprensa, que enquadrou negativamente o senador. Tivemos também posts críticos da página de esquerda Deboas na Revolução, cujo post irônico sobre o discurso contra a corrupção do presidente alcançou a terceira colocação na lista, e de João Amôedo (NOVO), que criticou o argumento do foro privilegiado e afirmou que se espera outra postura dos políticos.
Já no Twitter, duas hashtags distintas alcançaram os Trending Topics no Brasil nos últimos dias: #flaviobolsonaronacadeia e #laranjadaglobonews. A primeira, evidentemente, foi utilizada por usuários indignados com o escândalo e que exigiam a prisão do senador. A segunda foi usada por apoiadores da família Bolsonaro, que acusam a Rede Globo de perseguição política e procuram desacreditar a emissora a partir do último depoimento de Antonio Palocci, que acusou o jornalista Roberto Davilla de ter se oferecido como “laranja” para arrecadar dinheiro para financiar o filme: Lula, o filho do Brasil.
Considerações Finais
Observamos que apesar da família Bolsonaro ter se manifestado pouco sobre o assunto na rede, os escândalos envolvendo Flávio Bolsonaro mobilizaram as mídias sociais nos últimos dias, dividindo seus usuários entre defensores e críticos. As páginas dos movimentos de direita que se declaravam fervorosamente contra a corrupção, como o Movimento Brasil Livre e o Vem Pra Rua Brasil, exigiram explicações do senador em alguns de seus posts, mas estes não foram numerosos e nem viralizaram como aqueles que se dedicam a criticar os governos de esquerda, e sobretudo, o PT.
É difícil saber o quanto do engajamento gerado pelas notícias desfavoráveis a Flávio Bolsonaro é espontâneo ou produto da atividade de robôs. É também difícil estimar se os grupos da Nova Direita no Facebook e Twitter vão manter seu apoio ao clã Bolsonaro, caso notícias relativas ao escândalo Queiróz e ao envolvimento do senador eleito com milícias continuem a habitar o noticiário. É possível que a pouca disposição que os membros da família mostraram para reagir às acusações por meio de suas páginas se explique por uma estratégia de não botar mais lenha nessa fogueira que os pode queimar. É importante notar, por fim, que os conteúdos produzidos pela imprensa tradicional mostraram neste episódio um alto poder de penetração nas redes sociais, ou seja, a velha mídia conseguiu impor sua pauta.
Bolsonaro conseguiu “derrotar” a grande mídia na eleição. A estratégia de comunicação baseada em redes sociais adotada por sua campanha funcionou a despeito da cobertura negativa que a grande imprensa dedicou ao candidato. Coisa bem diferente é saber se os meios de comunicação nas redes sociais a serviço do agora presidente serão capazes de competir com a imprensa durante o longo período que separa uma eleição da próxima, caso, é claro, se estabeleça um clima de dissonância e enfrentamento entre esses dois atores políticos.
Notas
[1] https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2018/12/06/coaf-aponta-que-ex-motorista-de-flavio-bolsonaro-movimentou-mais-de-r-12-milhao-em-operacoes-suspeitas.ghtml
[2] https://exame.abril.com.br/brasil/de-queiroz-a-marielle-todos-os-casos-que-esbarram-em-flavio-bolsonaro/
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