Por Isa Penna e Fernanda Azevedo, na revista CartaCapital:
Depois de duas semanas de polêmica sobre os cortes no orçamento da cultura paulista, o governador João Doria e seu secretário da área, o ex-ministro de Temer Sérgio Sá Leitão, anunciaram, dia 15/4, uma nova composição do Conselho Estadual da Cultura. Com 30 componentes, dos quais apenas três mulheres, o Conselho tem 15 representantes do governo e – diz a grande mídia – 15 da “sociedade civil”. Detalhes: desses ilustres homens da civilíssima sociedade frequentada por João Dória, pelo menos 11 são empresários do setor de cultura, de eventos ou de entidades empresariais.
Foi o sinal definitivo que Doria leva à prática uma versão aprofundada da concepção do PSDB, visão empresarial, elitista, privatizadora e marqueteira, que vê nas atividades artísticas e culturais não um direito a garantir, mas mais um espaço a aferir lucros e encantar plateias endinheiradas. Uma visão que, além de render muitos milhões a poucos, reduz as atividades artísticas a ferramenta estéril, que reforça a já embolorada colonização do pensamento.
Trata-se da cereja do bolo de más notícias no âmbito cultural para o povo de São Paulo.
Senão, vejamos, enquanto a arrecadação de impostos impulsionou um crescimento no orçamento de SP de 81% de 2010 a 2019 (de R$ 140 bilhões para R$ 260 bilhões), no mesmo período a verba para a cultura teve uma redução de mais de 50% (levando em conta os possíveis contingenciamentos do governo Dória). Se não é de hoje a privatização da gestão das verbas públicas da cultura, a novidade é que nem mais a verba deve vir do poder público. A maior parte do incentivo à produção cultural estará submetida às “parcerias” com a iniciativa privada (a mesma lógica que aplica aos parques públicos, hospitais, escolas).
João Dória tentou destruir a cultura na cidade de São Paulo quando foi prefeito. Começou contingenciando 43,5% do orçamento da SMC, promoveu o desmonte de programas de formação, atacou projetos de criação artística, paralisou o Fomento ao Teatro, promoveu cortes e precarizações. Acinzentou a cidade. Agora, como governador, brinda os trabalhadores da arte e da cultura, e toda a população que dela usufrui, com uma ameaça de contingenciamento de 23%. A Secretaria de Cultura passaria a receber parcos 0,34% do orçamento estadual. Muito longe da meta de 1,5%, sugerida na PEC 150, prevista no Sistema Nacional de Cultura.
Após pressão popular e de alguns prefeitos, Dória (como assim faz Bolsonaro) voltou atrás em relação ao cortes de alguns projetos, como o Guri, e lançou um vídeo ambíguo prometendo que as atividades e projetos não vão parar e os espaços culturais não fecharão portas. Como ele vai equacionar a diminuição das verbas com a execução das ações prometidas não está explicado. Sabemos bem que este contingenciamento pode acabar com mais de 500 empregos e afetar o funcionamento de 23 equipamentos de cultura. Milhares podem deixar de ser atendidos por estes serviços.
O que a população de São Paulo, em particular os mais pobres, necessita, é de mais verba pública e mais programas culturais à altura dos nossos desejos de realização humana e necessidade de lazer e formação. É possível impedir cortes em área de tão pequenos gastos, se o governo deixar de isentar os impostos de grandes grupos empresariais.
Precisamos de um Fundo Estadual de Cultura, composto com parcela dos impostos dos mais ricos, regulamentado e funcionando através de leis, editais e iniciativas transparentes, desburocratizadas, democráticas, inclusivas e com continuidade. Precisamos de um Conselho Estadual de Cultura verdadeiramente democrático, com participação de homens e mulheres em igual proporção, com participação de negros, caiçaras e indígenas, com composição majoritária de artistas e gestores de equipamentos culturais de centros, interior e periferias.
Um Estado com a importância política, econômica e a diversidade cultural como São Paulo não pode ter sua atividade artística e cultural estrangulada. A cultura ajuda a imprimir nossa identidade, embala nossos sonhos, prepara nosso espírito e nossas mentes para sermos mais do que máquinas, para pensarmos por conta própria e inventarmos um mundo muito melhor do que este em que vivemos.
* Isa Penna é deputada estadual (PSOL-SP) e Fernanda Azevedo é atriz e ativista no movimento da cultura de São Paulo.
Foi o sinal definitivo que Doria leva à prática uma versão aprofundada da concepção do PSDB, visão empresarial, elitista, privatizadora e marqueteira, que vê nas atividades artísticas e culturais não um direito a garantir, mas mais um espaço a aferir lucros e encantar plateias endinheiradas. Uma visão que, além de render muitos milhões a poucos, reduz as atividades artísticas a ferramenta estéril, que reforça a já embolorada colonização do pensamento.
Trata-se da cereja do bolo de más notícias no âmbito cultural para o povo de São Paulo.
Senão, vejamos, enquanto a arrecadação de impostos impulsionou um crescimento no orçamento de SP de 81% de 2010 a 2019 (de R$ 140 bilhões para R$ 260 bilhões), no mesmo período a verba para a cultura teve uma redução de mais de 50% (levando em conta os possíveis contingenciamentos do governo Dória). Se não é de hoje a privatização da gestão das verbas públicas da cultura, a novidade é que nem mais a verba deve vir do poder público. A maior parte do incentivo à produção cultural estará submetida às “parcerias” com a iniciativa privada (a mesma lógica que aplica aos parques públicos, hospitais, escolas).
João Dória tentou destruir a cultura na cidade de São Paulo quando foi prefeito. Começou contingenciando 43,5% do orçamento da SMC, promoveu o desmonte de programas de formação, atacou projetos de criação artística, paralisou o Fomento ao Teatro, promoveu cortes e precarizações. Acinzentou a cidade. Agora, como governador, brinda os trabalhadores da arte e da cultura, e toda a população que dela usufrui, com uma ameaça de contingenciamento de 23%. A Secretaria de Cultura passaria a receber parcos 0,34% do orçamento estadual. Muito longe da meta de 1,5%, sugerida na PEC 150, prevista no Sistema Nacional de Cultura.
Após pressão popular e de alguns prefeitos, Dória (como assim faz Bolsonaro) voltou atrás em relação ao cortes de alguns projetos, como o Guri, e lançou um vídeo ambíguo prometendo que as atividades e projetos não vão parar e os espaços culturais não fecharão portas. Como ele vai equacionar a diminuição das verbas com a execução das ações prometidas não está explicado. Sabemos bem que este contingenciamento pode acabar com mais de 500 empregos e afetar o funcionamento de 23 equipamentos de cultura. Milhares podem deixar de ser atendidos por estes serviços.
O que a população de São Paulo, em particular os mais pobres, necessita, é de mais verba pública e mais programas culturais à altura dos nossos desejos de realização humana e necessidade de lazer e formação. É possível impedir cortes em área de tão pequenos gastos, se o governo deixar de isentar os impostos de grandes grupos empresariais.
Precisamos de um Fundo Estadual de Cultura, composto com parcela dos impostos dos mais ricos, regulamentado e funcionando através de leis, editais e iniciativas transparentes, desburocratizadas, democráticas, inclusivas e com continuidade. Precisamos de um Conselho Estadual de Cultura verdadeiramente democrático, com participação de homens e mulheres em igual proporção, com participação de negros, caiçaras e indígenas, com composição majoritária de artistas e gestores de equipamentos culturais de centros, interior e periferias.
Um Estado com a importância política, econômica e a diversidade cultural como São Paulo não pode ter sua atividade artística e cultural estrangulada. A cultura ajuda a imprimir nossa identidade, embala nossos sonhos, prepara nosso espírito e nossas mentes para sermos mais do que máquinas, para pensarmos por conta própria e inventarmos um mundo muito melhor do que este em que vivemos.
* Isa Penna é deputada estadual (PSOL-SP) e Fernanda Azevedo é atriz e ativista no movimento da cultura de São Paulo.
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