terça-feira, 21 de maio de 2019

Será Bolsonaro um novo Geisel?

Por Paulo Cannabrava Filho, no site Diálogos do Sul:

“Bolsonaro criminalizou o Parlamento”, dizia título de primeira página do Estadão, ao utilizar expressões como “velha” e “nova política”. Este é um fato, mas é apenas a ponta de um iceberg. O Judiciário já havia criminalizado a política, o que é muito mais grave. E tem mais.

Agora temos um governo de ocupação - com oito generais, um almirante e um brigadeiro e outros 100 de diferentes hierarquias nos mais diversos postos do governo - que criminalizou todos os que lhe são contrários. Está exacerbando o clima de enfrentamento da campanha eleitoral, só que no exercício do mandato.

A população já está percebendo isso. Pesquisa mostra que 32% da população percebe que não vale a pena conversar com gente que tem visão diferente da sua. O instituto IPSOS entrevistou quase 20 mil pessoas e o Brasil superou a média mundial, que ficou em torno de 20%. Onde? Nos países em que foi imposto o pensamento único.
A ingovernabilidade é histórica. Contam-se nos dedos os períodos governamentais estáveis.


No Brasil, por trás disso, estão os crentes neopentecostais, agora adeptos do sionismo radical, militares com a cabeça feita nas escolas estadunidenses e os olavetes, como são chamados os seguidores do astrólogo Olavo de Carvalho. Gente que pretende expurgar todo pensamento crítico de todas as instituições, como anunciou abertamente Ernesto Araújo, o ocupante do Itamaraty.

Até o Partido Social Liberal (PSL), que foi eleito com o presidente, já manifestou estar preocupado com a promoção do que qualifica de “verdadeiro Fla vs Flu provocado pelos olavetes”.

O deputado Waldir, presidente do PSL, ao externar essa preocupação argumentou que as bobagens ditas por Olavo de Carvalho no exterior sujam a imagem do país lá fora e aqui dentro está provocando atrito. Olavo afronta o Parlamento. E disse sem medo de perder a liderança na Câmara porque “seria muito pior na oposição, pois conheço os segredos da casa! Ops!”.

A Ingovernabilidade é histórica, implantada junto com a República, um modelo de democracia representativa feito para preservar o poder da plutocracia da vez. Contam-se nos dedos os períodos governamentais estáveis. Quando puderam ser aproveitados, foram períodos de grande desenvolvimento. Havia acordo em torno a um projeto de desenvolvimento.

Agora chegamos a uma ingovernabilidade aperfeiçoada. Funciona bem. Atomiza as oposições e os neófitos (aqueles que chegaram agora) em miríades de partidos que nunca terão chance de chegar ao poder a não ser por mágica, como fizeram para eleger o minúsculo PSL. O plano era eleger o presidente e garantir a governabilidade. Mas, impõe-se a realidade.

Vinte e oito partidos políticos compõem a Câmara Federal, 14 dos quais não ultrapassam 5% das cadeiras. A maioria é baixo clero. O próprio governo é baixo clero agregado aos neopentecostais. Pior não poderia ser.

Vimos em artigos anteriores que cada vez que se impõe forte impasse entre Executivo e Legislativo a solução vem através de golpe de Estado. Não se atrevem a chamar por novas eleições.

É bem provável que os militares estejam esperando a sociedade não aguentar mais tanta burrice, tanta safadeza e passar a implorar por um golpe para, assim, assumir o poder discricionariamente.

Foi o que fez o general Ernesto Geisel em 13 de abril de 1977. Fechou o Congresso temporariamente e baixou um pacote de maldades que incluía eleições indiretas para governadores, criou as sublegendas para garantir vitória do partido governista, criou o senador biônico (nomeado por ele) para garantir maioria no Senado, nomeando imediatamente 18, aumentou de cinco para seis anos seu mandato na Presidência.

Na área econômica, o Brasil sofria as consequência do choque do petróleo, que travou a economia, provocou recessão, inflação combatidas com forte arrocho salarial. Tudo o mais estava controlado, Judiciário, imprensa, movimento sindical, estudantes: tudo.

Não faz sentido as Forças Armadas terem realizado uma operação de inteligência para a captura do poder, com uma centena de oficiais ocupando os mais diversos cargos de governo, para ficar com o ônus de terem destruído as chances de desenvolvimento do país. Onde o ministro é civil, o secretário-geral ou o principal assessor é militar. Os únicos realmente civis nesse governo são os super ministros da Economia, Paulo Guedes, da Justiça, Sergio Moro, e da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. Araújo, das Relações Exteriores, está virtualmente sob intervenção, sob vigilância do general Mourão, o vice-presidente. Agora vamos ver quem é que manda.

Está aberta a disputa pela embaixada do Brasil em Washington. Ernesto Araújo, que ascendeu de 3º secretário para chanceler, quer colocar outro sênior como ele, um tal de Nestor Forster. De per se uma ofensa, dado que a baixa hierarquia será interpretada como desprestígio. O único mérito do indicado é ter sido quem apresentou Olavo de Carvalho ao ministro. Como são incompetentes, contratam uma empresa para assessorá-los, a Arko Advice. Isso é soberania? Vejam o que dizem:

Com 30 anos de experiência no coração político do Brasil, a nossa missão é usar a expertise que temos para prever riscos, antecipar tendências, identificar lideranças, disseminar mensagens, convencer públicos e desenhar estratégias institucionais de alto impacto.

Somos a única empresa de public affairs do Brasil a receber os prestigiados Pollie Awards, entregues anualmente pela Associação Americana de Consultores Políticos aos principais estrategistas políticos do mundo.

Em situações normais, o Itamaraty tem um plano de carreira: o 1º, 2º e 3º secretário ascende para conselheiro, depois ministro de segunda classe e ministro de primeira classe. O top da carreira, quando está apto, assume a representação do Brasil numa Embaixada, ou a função de representante comercial ou ainda cônsul geral em locais de importância estratégica. O cônsul-geral em uma cidade da importância de Nova York é o funcionário da mais alta hierarquia. Assim como também o cônsul-geral dos EUA em São Paulo é ministro de primeira classe.

* Paulo Cannabrava Filho é editor da Diálogos do Sul.

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