Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
Um mês depois das primeiras revelações do Intercept-Brasil sobre a Lava Jato, é hora de cobrar responsabilidades das autoridades que têm a obrigação de garantir o cumprimento da lei no país.
Como sempre acontece diante de um escândalo, não custa lembrar um ponto essencial. Mesmo envolvendo uma competência particular para investigações delicadas, tarefa para a qual o jornalista Glenn Greenwald já exibiu talento reconhecido e premiado, a fase das reportagens e denúncias é a menos difícil, quando se compara com as etapas seguintes.
O complicado, pois envolve confrontar interesses políticos e econômicos de vulto, a etapa que vem depois: apurar os fatos, definir responsabilidades e apontar os culpados, ainda mais quando se trata de cidadãos com influência reconhecida no próprio sistema de Justiça, como o ex-juiz Sérgio Moro e o chefe da força-tarefa Deltan Dallagnol.
Basta recordar o papel assumido pela Lava Jato nos rumos do país, de 2014 para cá, para se avaliar a dimensão do trabalho que a Procuradoria Geral da República e o Supremo Tribunal Federal têm pela frente.
Mesmo que tenha sido inspirada pelas melhores intenções por parte da PGR Raquel Dodge, a convocação de uma "reunião institucional" com Dallagnol e outros integrantes da força-tarefa da Lava Jato, não pode abrir espaço a nenhum tratamento privilegiado às partes envolvidas. Não pode ser vista como "reunião de trabalho" ou coisa semelhante.
Flagrados em inúmeros diálogos comprometedores, tanto no que diz respeito a isenção política nas investigações, como em constrangedoras iniciativas paralelas destinadas a extrair ganhos financeiras a partir de seu trabalho da Justiça, mais do que nunca Dallagnol e alguns membros do Ministério Público devem explicações ao Brasil e aos brasileiros.
Não podem ser ouvidos na condição de colegas de corporação. Mas como cidadãos passíveis de enfrentar uma investigação sobre atos praticando quando estavam à frente da Lava Jato. Se tem indícios concretos para contestar as acusações, o que só tem feito de modo vago, impreciso, é hora de fazer isso.
A leitura das mensagens e a audição de conversas - basta aquela pequena parcela já divulgada - aponta para um quadro temerário de fratura institucional, com sinais claros de participação de autoridades que deveriam ser as primeiras a impedir desvios e manobras à margem da lei, função pela qual recebem vencimentos nas mais altas faixas oferecidas pelo Estado brasileiro. (As mais altas, na verdade, quando se computam determinados ganhos e benefícios em paralelo).
Mais do que nunca a população está atenta ao que se passa na Lava Jato. Antes que as primeiras revelações do Intercept-Brasil tivessem completado um mês, o Data Folha mostrou, com base em 2086 entrevistas, que 58% dos entrevistados acreditam que os contatos de Moro com a força tarefa do Ministério Público revelam uma conduta inadequada -- uma forma delicada de condenar a parceria indevida entre o magistrado e a acusação, que viola o Código de Processo Penal e atinge o direito de defesa.
Numa demonstração de que essa opinião vai além das preferências políticas, e que a população procura refletir sobre o funcionamento da Justiça, uma maioria de 54% considera que a prisão de Lula foi justa. Mas uma maioria ainda maior, de 59%, considera que as decisões de Moro "são graves e devem ser revistas".
Em julho de 2015, o prestígio da Lava Jato levou Dallagnol a um templo batista na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, onde pediu apoio para uma abaixo assinado contra a corrupção. "Dentro de minha cosmovisão cristã, eu acredito que existe uma janela de oportunidade que Deus está dando para mudanças" disse Dallagnol, conforme relato do jornalista Bernardo Mello Franco, presente a cena. "Amém," reagiu a platéia. "É isso aí. Deus está respondendo", devolveu Dalagnol.
Quatro anos depois, religiosos ou não, cidadãos e cidadãs de um país com a democracia ameaçada e a economia destruída, todos têm o direito de reconhecer que o Brasil encara uma janela de oportunidade para recuperar o Estado Democrático de Direito. Ela passa pela investigação cuidadosa das irregularidades e crimes revelados por Glenn Greenwald, divulgados com o respaldo de jornais e colunistas insuspeitos de qualquer simpatia pelos alvos preferenciais da Lava Jato.
Alguma dúvida?
Como sempre acontece diante de um escândalo, não custa lembrar um ponto essencial. Mesmo envolvendo uma competência particular para investigações delicadas, tarefa para a qual o jornalista Glenn Greenwald já exibiu talento reconhecido e premiado, a fase das reportagens e denúncias é a menos difícil, quando se compara com as etapas seguintes.
O complicado, pois envolve confrontar interesses políticos e econômicos de vulto, a etapa que vem depois: apurar os fatos, definir responsabilidades e apontar os culpados, ainda mais quando se trata de cidadãos com influência reconhecida no próprio sistema de Justiça, como o ex-juiz Sérgio Moro e o chefe da força-tarefa Deltan Dallagnol.
Basta recordar o papel assumido pela Lava Jato nos rumos do país, de 2014 para cá, para se avaliar a dimensão do trabalho que a Procuradoria Geral da República e o Supremo Tribunal Federal têm pela frente.
Mesmo que tenha sido inspirada pelas melhores intenções por parte da PGR Raquel Dodge, a convocação de uma "reunião institucional" com Dallagnol e outros integrantes da força-tarefa da Lava Jato, não pode abrir espaço a nenhum tratamento privilegiado às partes envolvidas. Não pode ser vista como "reunião de trabalho" ou coisa semelhante.
Flagrados em inúmeros diálogos comprometedores, tanto no que diz respeito a isenção política nas investigações, como em constrangedoras iniciativas paralelas destinadas a extrair ganhos financeiras a partir de seu trabalho da Justiça, mais do que nunca Dallagnol e alguns membros do Ministério Público devem explicações ao Brasil e aos brasileiros.
Não podem ser ouvidos na condição de colegas de corporação. Mas como cidadãos passíveis de enfrentar uma investigação sobre atos praticando quando estavam à frente da Lava Jato. Se tem indícios concretos para contestar as acusações, o que só tem feito de modo vago, impreciso, é hora de fazer isso.
A leitura das mensagens e a audição de conversas - basta aquela pequena parcela já divulgada - aponta para um quadro temerário de fratura institucional, com sinais claros de participação de autoridades que deveriam ser as primeiras a impedir desvios e manobras à margem da lei, função pela qual recebem vencimentos nas mais altas faixas oferecidas pelo Estado brasileiro. (As mais altas, na verdade, quando se computam determinados ganhos e benefícios em paralelo).
Mais do que nunca a população está atenta ao que se passa na Lava Jato. Antes que as primeiras revelações do Intercept-Brasil tivessem completado um mês, o Data Folha mostrou, com base em 2086 entrevistas, que 58% dos entrevistados acreditam que os contatos de Moro com a força tarefa do Ministério Público revelam uma conduta inadequada -- uma forma delicada de condenar a parceria indevida entre o magistrado e a acusação, que viola o Código de Processo Penal e atinge o direito de defesa.
Numa demonstração de que essa opinião vai além das preferências políticas, e que a população procura refletir sobre o funcionamento da Justiça, uma maioria de 54% considera que a prisão de Lula foi justa. Mas uma maioria ainda maior, de 59%, considera que as decisões de Moro "são graves e devem ser revistas".
Em julho de 2015, o prestígio da Lava Jato levou Dallagnol a um templo batista na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, onde pediu apoio para uma abaixo assinado contra a corrupção. "Dentro de minha cosmovisão cristã, eu acredito que existe uma janela de oportunidade que Deus está dando para mudanças" disse Dallagnol, conforme relato do jornalista Bernardo Mello Franco, presente a cena. "Amém," reagiu a platéia. "É isso aí. Deus está respondendo", devolveu Dalagnol.
Quatro anos depois, religiosos ou não, cidadãos e cidadãs de um país com a democracia ameaçada e a economia destruída, todos têm o direito de reconhecer que o Brasil encara uma janela de oportunidade para recuperar o Estado Democrático de Direito. Ela passa pela investigação cuidadosa das irregularidades e crimes revelados por Glenn Greenwald, divulgados com o respaldo de jornais e colunistas insuspeitos de qualquer simpatia pelos alvos preferenciais da Lava Jato.
Alguma dúvida?
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