terça-feira, 17 de janeiro de 2023

Conversa com o ministro Flávio Dino

Foto: Amanda Perobelli/Reuters
Por Luiz Carlos Azenha


O ministro da Justiça Flávio Dino conversou hoje cedo com integrantes do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé. Participei do encontro e faço um relato:

Para Dino, houve um claro encadeamento entre os 4 anos de bolsonarismo no poder e "o que vimos no 8 de janeiro". Não foi por "geração espontânea". Elencou os seguintes fatos: fechamento de estradas, instigação política contra a diplomação da chapa Lula/Alckmin no dia 12/12, planejamento do estado de defesa no TSE, tentativa de atentado a bomba no dia 24/12, ameaças à posse e, finalmente, o 8 de janeiro.

Segundo o ministro, cinco pontos chamam atenção na articulação: a ofensiva de comunicação através das redes sociais, a dimensão internacional do golpismo de direita, a "visão idílica de uma segurança perdida" que levou a apelos junto aos pilares da segurança, dentre os quais se inclui o Exército; a crise política desatada em 2013/2014, que fortaleceu instâncias judiciárias e os militares; o fato de que parte substantiva da elite brasileira não é "fã dos procedimentos democráticos".

No campo político, Dino disse que sua atuação no momento é de dar sustentação à frente ampla democrática que elegeu Lula.

"Chegamos ao golpe de Estado entre as 16 e as 17 horas do 8 de janeiro", disse Dino, fazendo referência à tomada do Palácio do Inverno na revolução russa. "Não tínhamos o controle físico das sedes dos 3 Poderes", disse.

Porém, dada à rápida reação, a realidade fática não se transformou em realidade jurídica, ironicamente graças ao WhatsApp, através do qual ele enviou e recebeu de volta o decreto do presidente Lula declarando intervenção na segurança pública do Distrito Federal. "Isso aconteceu em menos de uma hora", disse Dino.

Ele afirmou que, em 1964, João Goulart teria tido mais chances de permanecer no poder se a comunicação fosse instantânea. Quando, no Congresso, a vacância da presidência da República foi declarada por Auro de Moura Andrade, Goulart ainda estava no Brasil, em Porto Alegre, e portanto, do ponto-de-vista jurídico, não havia abandonado o cargo.

O ministro da Justiça disse que deve encaminhar ao presidente Lula na próxima semana o chamado "pacote da democracia", que tratará de direito de resposta e retirada de conteúdo das redes sociais. "A Constituição não se interpreta em tirinhas", afirmou o ministro, dizendo que a liberdade de expressão "não é ilimitada" e não pode servir para incitar o racismo, a pedofilia ou invasão do Palácio do Planalto.

Dino disse que está tratando do fortalecimento dos canais de cooperação internacional diante da ação "blocada" da direita global, numa referência à presença de Jair Bolsonaro nos Estados Unidos.

Afirmou que, apesar de instadas, as Forças Armadas como instituição não deram o golpe de Estado pretendido, por isso o momento é de "separar o joio do trigo".

Flávio Dino afirmou estar ciente de que a direita quer tomar para si a bandeira da liberdade como um todo, inclusive liberdade de expressão, mas disse que o governo Lula vai travar a disputa politica argumentando que defende a liberdade de todos, não apenas "que os mais fortes fiquem livres para esmagar os mais fracos" -- foi assim que ele definiu a liberdade pregada pelos bolsonaristas.

Dino rebateu como "canalhice" as críticas de inação que recebeu à esquerda, argumentando que o governo estava há apenas seis dias no poder, que não tinha havido tempo de tratar da "desinfiltração", que era impossível fazer mágica e que só no dia 24 de janeiro o governo Lula terá ocupado formalmente a burocracia estatal.

Exemplificou que seria inconstitucional, por exemplo, colocar a Polícia Federal ou a Polícia Rodoviária Federal para atuar na Esplanada dos Ministérios. As críticas, segundo ele, são "falsas, mentirosas e acanalhadas".

"O que houve foi fruto de infiltração dentro das instituições", inclusive no Palácio do Planalto, disse Dino. "Uma parte significativa do aparato de segurança ou se omitiu ou concordou com o que acontecia".

Se tivesse agido antecipadamente e fora da Constituição, o ministro imagina que seria chamado de ditador insano e a mídia trataria de falar dos fantasmas da Coreia do Norte, Cuba ou Venezuela.

Dino também informou que neste momento estão reunidos o ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, integrantes da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal e operadores privados de energia com o objetivo de definir medidas para evitar a penalizar os autores de atos de sabotagem contra torres de transmissão.

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