sábado, 4 de dezembro de 2010

Jobim: nos tempos de Jango?

Reproduzo artigo de Gilson Caroni Filho, publicado no sítio Carta Maior:

O professor Boaventura de Souza Santos, da Universidade de Coimbra, escreveu, há 11 anos, que: “uma parte do que de importante ocorre no mundo é em segredo e em silêncio, fora do alcance dos cidadãos. E o dilema para a democracia daqui resultante é que os segredos só podem ser conhecidos a posteriori, depois de deixarem de ser, depois de produzirem fatos consumados que escaparam ao controle democrático”.

Referia-se ele, na época, ao Acordo Multilateral de Investimentos (AMI), que vinha sendo negociado na surdina, entre os países desenvolvidos da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), por iniciativa dos Estados Unidos e da União Européia, com cinco países observadores, entre eles o Brasil de FHC. Tratava-se de uma carta magna das corporações transnacionais que não deixava aos países da periferia qualquer margem de soberania.

Graças ao vazamento do site Wikileaks, organização que confirma o surgimento de uma nova esfera informativa mundial, os fatos e manobras que permaneciam ocultos, na lúcida observação de Boaventura, se tornaram de conhecimento público, expondo, no caso brasileiro, o tamanho da queda que nos querem impor, ou a que estamos sujeitos.

Os telegramas de Clifford Sobel, ex-embaixador dos EUA no Brasil, dando conta dos serviços prestados pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, a um país estrangeiro são emblemáticos. A presença de Jobim no futuro governo pode ter se tornado inviável. Mais do que nunca é importante lembrar a existência de uma relação íntima entre a intensidade da ameaça e a firmeza da resposta. Não há justificativa plausível, nem mesmo na lógica de uma estreita Realpolitik, para a continuação de Jobim à frente da pasta da Defesa. Um pequeno histórico se faz necessário quando mentalidades mórbidas voltam a atacar a soberania nacional, como se fosse praga e empecilho a ser removido.

Ao se abrirem os anos 1960, a diplomacia brasileira, refletindo tanto as novas realidades internacionais quanto a correlação interna das forças sociopolíticas, desenvolveu os seus primeiros esforços no sentido de divorciar-se do caduco alinhamento incondicional ao imperialismo, herança dos tempos da Guerra Fria. Foram dados, então, os passos do que, à época, ficou conhecido como “política externa independente”

O golpe de 1964 interrompeu esse processo. O regime emergente de 1º de abril, medularmente comprometido com o imperialismo estadunidense, acoplou à repressão no interior (“segurança nacional”) o reacionarismo na política externa (fronteiras ideológicas). O posicionamento internacional daí resultante só poderia ter sido aquilo que que sabemos: a subserviência mais lamentável aos desígnios do Império – de que permanece, como triste exemplo, a nossa intervenção na República Dominicana, no bojo da sinistra “Força Interamericana de Paz”.

Pouco a pouco, todavia, este posicionamento – lesivo à verdadeira soberania nacional, aviltante para uma república soberana – foi sendo ultrapassado pela realidade da vida. Entre as complicações de um mundo cada vez menos definível segundo o maniqueísmo dos “blocos” e as contradições do desenvolvimento das forças produtivas no país, a concepção das “fronteiras ideológicas” passou, de fato, à categoria de figura de retórica. Especialmente a partir dos primeiros anos da década de 70, os governos militares foram compelidos a descolar-se do jogo internacional do imperialismo.

E sempre que o fizeram, conflitando com sua política interna e com seu próprio discurso global, marcaram posições progressistas que lhes valeram significativos créditos entre a comunidade das nações. Basta pensar na postura brasileira em face da luta de libertação dos povos africanos, diante da Organização para Libertação da Palestina (OLP) e em relação às Malvinas.

A importância deste descolamento, conduzido consequentemente após a redemocratização, configurou o perfil que as forças democráticas reclamam para o Brasil: o de um país independente, com uma posição internacional e soberana e autônoma. Este cenário, evidentemente, é função da situação nacional. Somente um regime democrático, como o que temos hoje, assentado na mais ampla participação popular, pode aprofundar as tendências progressistas de nossa política externa. Vale dizer: a luta pela reorganização democrática da sociedade continua sendo conjugada à luta para sistematizar uma inserção internacional que corresponda aos interesses da maioria do nosso povo.

No limiar do futuro, a sociedade brasileira aparenta ser prisioneira do seu passado que, por ainda não ter sido dominado, ameaça se voltar contra ela. Pois é na hora do vôo livre para uma área ainda por construir, porém promissora, que a vontade não pode se distrair na desconfiança de que, mais uma vez, reiteramos antigos erros.

Quando disse ao diplomata americano que o ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Samuel Pinheiro Guimarães, “odeia os Estados Unidos e trabalha para criar problemas na relação entre Brasília e Washington”, Nelson Jobim se afigurou como triste personagem de uma geopolítica de vice-reinado.

Por aí, estaríamos condenados a viver em um território estranho à dialética, oscilando mecanicamente entre velhas sístoles e diástoles, vítimas de uma conspiração da nossa própria história. Cabe à presidente eleita avaliar se vale a pena apostar no atual ministro da Defesa. Por seu desempenho nos últimos anos e pelas confidências reveladas pelo site, Jobim está empenhado em uma aventura que lhe permita tomar o passado de assalto, obrigando o país a viver uma vida que não é a sua, como se fosse a única possível. Seria Jango o seu alvo?

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sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

"Nos porões da tortura" ganha prêmio









Foram anunciados ontem os vencedores do 27ª edição do Prêmio Direitos Humanos de Jornalismo. Rodrigo Vianna, a equipe de produtores – Luiz Malavolta, Tony Chastinet e Pedro T – e a editora Angela Canguçu ganharam o prêmio “Verdade, Justiça e Transparência”, pela série de reportagens “Nos porões da ditadura”, veiculada na TV Record. Um prêmio justo e merecido.

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Gilmar perde ação contra CartaCapital

Reproduzo artigo de Leandro Fortes, publicado no blog "Brasilia, eu vi":

Na edição de 8 de outubro de 2008 da CartaCapital, em uma reportagem de minha autoria intitulada “O empresário Gilmar Mendes”, revelei a ligação societária entre o então presidente do Supremo Tribunal Federal e o Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). Trata-se de uma escola de cursinhos de direito cujo prédio foi construído com dinheiro do Banco do Brasil sobre um terreno, localizado em área nobre de Brasília, praticamente doado (80% de desconto) a Mendes pelo ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz.

O IDP, à época da matéria, havia fechado 2,4 milhões em contratos sem licitação com órgãos federais, tribunais e entidades da magistratura, volume de dinheiro que havia sido sensivelmente turbinado depois da ida de Mendes para o STF, por indicação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. O corpo docente do IDP era formado, basicamente, por ministros de Estado e de tribunais superiores, desembargadores e advogados com interesses diretos em processos no Supremo, o que, por si só, já era passível de uma investigação jornalística decente. O que, aliás, foi feito pela CartaCapital quando toda a imprensa restante, ou se calava, ou fazia as vontades do ministro em questão.

Foi a época da Operação Satiagraha, dos dois habeas corpus concedidos por Mendes ao banqueiro Daniel Dantas, em menos de 48 horas. Em seguida, a mídia encampou a farsa do grampo sem áudio, publicado pela revista Veja, que serviu para afastar da Agência Brasileira de Inteligência o delegado Paulo Lacerda, com o auxílio luxuoso do ministro da Defesa, Nelson Jobim, autor de uma falsa denúncia sobre existência de equipamentos secretos de escuta telefônica que teriam sido adquiridos pela Abin.

Naqueles tempos duros, fazer uma cobertura crítica da atuação de Gilmar Mendes no STF era uma tarefa quase suicida. Mesmo o governo federal, instado a não comprar briga com Mendes justo no momento em que o inquérito do chamado “mensalão” passava às barras do Supremo, manteve-se amedrontado. Emblema daquela circunstância foi a submissão do presidente Lula às idiossincrasias de Mendes, chamado pelo ministro “às falas” para responder pela inverossímil denúncia de espionagem no STF. CartaCapital e este repórter, por revelarem as atividades comerciais paralelas de Gilmar Mendes, acabaram processados pelo ministro, evidencie-se, dentro das regras democráticas e legais do Estado de direito.

Acusou-nos, Mendes, de termos elaborado a referida reportagem com o intuito de lhe “denegrir a imagem” e “macular sua credibilidade”. Alegou, ainda, que a leitura da reportagem atacava não somente a ele, mas serviria, ainda, para “desestimular alunos e entidades que buscam seu ensino”. Essa argumentação foi desmontada ainda antes da sentença, por este blog, no post que pode ser acessado aqui.

Em 26 de novembro de 2010, portanto, na semana passada, a juíza Adriana Sachsida Garcia, do Tribunal de Justiça de São Paulo, julgou improcedente a ação de Gilmar Mendes e extinguiu o processo contra mim e a CartaCapital. Dentre outras considerações, afirmou:

“As informações divulgadas são verídicas, de notório interesse público e escritas com estrito animus narrandi. A matéria publicada apenas suscita o debate sob o enfoque da ética, em relação à situação narrada pelo jornalista. Não restou configurado o dolo ou culpa, condição sine qua non para autorizar a condenação no pagamento de indenização. A população tem o direito de ser informada de forma completa e correta, motivo pelo qual esse direito deve sobrepor-se às garantias individuais, sob determinadas circunstâncias, como são as objeto de análise.”

Abaixo, alguns trechos da sentença proferida pela juíza Adriana Garcia. A decisão ainda é passível de recurso por parte da defesa do ministro Gilmar Mendes:

“(…) Desnecessária a colheita de outras provas, pois a matéria é eminentemente de direito e os fatos controversos vieram bem comprovados por documentos, de maneira que autorizado o julgamento antecipado, em conformidade com a regra do artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil. O pedido é improcedente. (…) Ocorre que, a documentação trazida com a defesa revela que a situação exposta é verídica; o que, aliás, não foi negado pelo autor.”

“Considerado o modelo da reportagem e as palavras utilizadas, não vislumbro ofensa ao ordenamento jurídico, condição indispensável para a condenação no pagamento de indenização.”

“O tema exige cautela do julgador para que não incida na odiosa restrição das liberdades de informação e de expressão, as quais contêm o direito de criticar. Careceria de justa causa a notícia falsa ou imprudentemente divulgada, mas não a baseada em fatos reais e de manifesto interesse público.”

“Insta aqui destacar que a reportagem de fato assevera não haver ilegalidade no proceder do autor ou de qualquer das pessoas físicas mencionadas, tanto que eminentes juristas foram entrevistados para emitir opinião técnica sobre a participação de magistrados em sociedades empresariais e restou registrada a controvérsia existente sobre o tema.”

“Não se considera ‘caviloso’ o texto do jornalista porque não criou fatos ou incluiu inverdades, nem omitiu dados importantes ao bom entendimento da notícia. De fato, já na inicial, o autor reconhece que o Ministro Gilmar Mendes é sócio da empresa e detém uma terça parte das quotas sociais. (…) Bem assim, a inicial admite a realização de contratos com vários órgãos do Poder Público no âmbito federal, com dispensa de licitação, por inexigibilidade.”

“Ainda, o autor relata que possui corpo discente de alto gabarito, ilustrado por figuras ocupantes do alto escalão dos diferentes Poderes da República. E se os fatos não são mentirosos, não vejo fundamento jurídico para coibir o livre exercício do questionamento e da crítica pela imprensa.”

“A reportagem impugnada consubstancia regular exercício de direito, consubstanciado em crítica jornalística própria dos regimes democráticos. A doutrina e a jurisprudência concordam que, pelo menos para efeito de responsabilidade civil, a licitude da matéria jornalística decorre do interesse público, da veracidade e pertinência de seu conteúdo.”

“E, finalmente, também o conteúdo é pertinente – não obstante a crítica inserida – havendo articulação lógica entre o conteúdo narrado e as conclusões expostas. A relevância dos fatos narrados foi apresentada de modo adequado em relação ao contexto dos fatos noticiados. A documentação acostada pela defesa demonstra que foi apurada a procedência dos fatos narrados, de modo a neutralizar a alegação de que houve divulgação precipitada e indevida de fatos aptos a arruinar a reputação das pessoas citadas.”

“Não se pode cogitar de verdadeira liberdade de informação e expressão sem a possibilidade da crítica, a possibilidade de emitir juízo de valor – favorável ou não – em relação a determinado comportamento.”

“Reconhecer ilicitude, sem provas sobre animus injuriandi ou animus nocendi, constitui, pelo peso da indenização por dano moral, restrição que se aproxima da censura”

“Condeno o autor no pagamento das verbas oriundas de sua sucumbência, com honorária que fixo em R$ 5.000,00 para cada um dos co-réus, atualizados monetariamente a partir da data desta sentença pelos índices da Tabela Prática editada pelo Egrégio Tribunal de Justiça deste Estado, nos termos do que preceitua o artigo 20, § 4º, do mesmo Código de Processo Civil. Transcorrido o prazo para recurso, ou processado o que houver, diligencie a serventia o arquivamento dos autos, observadas as formalidades legais e cautelas de praxe.

P.R.I. São Paulo, 26 de novembro de 2010.

Adriana Sachsida Garcia Juíza de Direito”


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Folha, de rabo preso com o terror

Reproduzo artigo de Ricardo Galuppo, intitulado "Liberdade de imprensa", publicado no jornal Brasil Econômico:

Mais uma vez, a voz da concorrência se ergue contra a Ejesa, empresa jornalística que edita o Brasil Econômico e é proprietária de O Dia, no Rio de Janeiro. Desta vez, o ataque partiu da Folha de S. Paulo — que paga o salário da presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Judith Brito.

Talvez para não deixar nas mãos das Organizações Globo (empresa a cujos interesses a ANJ está subordinada) o papel exclusivo de tentar impedir que um novo concorrente se consolide no mercado, a Folha de S.Paulo publicou ontem uma extensa reportagem sobre o grupo português Ongoing (dono de 30% da Ejesa) e seus negócios no Brasil.

Em tempo: Globo e Folha dividem o controle do principal concorrente do Brasil Econômico, o Valor Econômico. A reportagem, mais uma vez, toma a parte pelo todo e confunde a Ejesa com um de seus acionistas.

Citando uma auditoria aberta pelo Ministério Público Federal a pedido da entidade presidida por sua funcionária Judith Brito, a Folha de S.Paulo partiu para o ataque.

São tantas mentiras, tantas tolices e tantas baboseiras distribuídas por uma página e meia do jornal que seria enfadonho responder a cada uma delas. A mais gritante diz respeito à suposta compra, no Distrito Federal, de um jornal chamado Alô Brasília.

A Folha de S.Paulo garante que 49% do jornal já pertencem à Ejesa. Não existe, no entanto, qualquer acordo, acerto, ensaio ou negociação nesse sentido. Mas, para a Folha de S.Paulo, a verdade é o que menos interessa.

O ataque da Folha de S.Paulo não causa espanto. Esperar que aquele diário pratique jornalismo sério é o mesmo que imaginar a hipótese de a torcida do Palmeiras vibrar com uma eventual conquista do título brasileiro pelo Corinthians. Não há possibilidade de isso acontecer.

A história da Folha de S.Paulo e da empresa que a edita fala por si mesma. O chamado Grupo Folha era, no passado, conhecido pelas ligações estreitas de seu proprietário, Octavio Frias de Oliveira, com os órgãos de repressão da ditadura.

Tanto isso é verdade que circula entre os jornalistas a história de que um dos títulos da casa, a Folha da Tarde, era, na época da ditadura militar, o jornal de maior "tiragem" do Brasil. Não porque imprimisse mais exemplares do que os concorrentes, mas porque empregava em sua redação uma grande quantidade de "tiras".

Depois dos expedientes nos porões da repressão, e alguns talvez até trazendo ainda as mãos sujas com o sangue dos prisioneiros que torturavam, os policiais/jornalistas iam para a redação do jornal e deixavam suas armas sobre a mesa enquanto datilografavam seus textos.

Um desses textos foi publicado no dia 20 de dezembro de 1975. Sob a manchete "Desbaratada a gangue do nazismo vermelho", o jornal trazia, em oito páginas, a reprodução do Inquérito Policial Militar (IPM) com a versão da ditadura para a morte do jornalista Vladimir Herzog.

O texto acusava companheiros de Vlado, presos na mesma época, de responsáveis por sua morte.

Por volta de 1978, a Folha de S. Paulo, certamente por perceber que o país evoluiria para a democracia, deu uma guinada radical. E, como sempre acontece com os vira-casacas, passou a defender as novas convicções com tanto ímpeto que deu a impressão de que sempre esteve ao lado da democracia.

Mas, no fundo, nunca mudou de lado. Tanto que, em fevereiro de 2009, o jornal expôs o ponto de vista que ainda está incrustado na cabeça de sua direção ao chamar de "ditabranda" os anos sofridos da ditadura.

E mais: ao longo da campanha presidencial deste ano, mais uma vez deu crédito aos IPM da repressão ao tentar colar na figura da então candidata Dilma Rousseff a pecha de "terrorista".

Era assim que os porões se referiam aos adversários do regime. Tristes e vergonhosos, esses episódios expõem a verdadeira face da Folha de S.Paulo, um jornal que ilude seus leitores tentando se fazer passar pelo que não é.

A defesa que faz da democracia, da ética e da honestidade é de viés udenista: cobra dos outros uma postura que o próprio jornal não adota.

Todo o verniz democrático não passa de uma cortina de fumaça para que — exatamente como fez na reportagem que visa atingir a Ejesa — o jornal defenda posições ditatoriais, oportunistas e chauvinistas, sempre de olho em seus próprios interesses comerciais e concorrenciais.

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Morte de Bacuri e a cumplicidade da Folha

Reproduzo matéria publicada no blog "Limpinho e cheiroso":

Na próxima terça-feira, dia 7 de dezembro, às 19 horas, na Câmara dos Vereadores de São Paulo, Eduardo Leite, o Bacuri, receberá, in memoriam, o título de Cidadão Paulistano por iniciativa dos vereadores Juliana Cardoso e Ítalo Cardoso.

Para quem não o conheceu, trata-se de mais um dos casos de absoluta crueldade da repressão. Na madrugada da véspera de ser retirado do Dops para ser assassinado, a repressão lhe entregou – na cela onde estava sozinho – um exemplar da Folha da Tarde que noticiava sua “fuga”.

Para que jamais esqueçamos a história, a Folha da Tarde era aquele pasquim que o senhor Otávio Frias – pai do senhor Otávio Frias Filho – cedeu graciosamente ao esquadrão da morte durante os dois anos finais dos 1960 e que assim continuou até o final dos anos de 1970.

Bacuri tem uma das histórias mais bonitas de nossa resistência. Quando foi preso, sua companheira – a camarada Denize – estava grávida. Meses depois, nasceu a Maria Eduarda.

Quem não puder comparecer ao evento, envie uma mensagem dirigida a essas duas mulheres para o endereço da Denize Crispim Perez: zdenize@gmail.com

Leia a seguir, o texto sobre Bacuri que está no sítio Tortura Nunca Mais:

Cumplicidade entre a mídia e a repressão

O relato abaixo serve para demonstrar a ação combinada e orgânica entre a repressão da ditadura militar de 64 e os órgãos da mídia oligárquica no Brasil.

O assassinato de Eduardo Collen Leite, o “Bacuri”, é um dos mais terríveis dos que se tem notícia, já que as torturas a ele infligidas duraram 109 dias consecutivos, deixando-o completamente mutilado. Quando o corpo foi entregue aos familiares estava sem orelhas, com olhos vazados e com mutilações e cortes profundos em toda a sua extensão.

Foi preso no dia 21 de agosto de 1970, no Rio de Janeiro, pelo delegado Sérgio Fleury e sua equipe, quando chegava em sua casa. Passou pelo Cenimar/RJ e DOI-Codi/RJ, onde foi visto pela ex-presa política Cecília Coimbra, já quase sem poder se locomover.

Do local da prisão, Eduardo foi levado a uma residência particular onde foi torturado. Seus gritos e de seus torturadores chamaram a atenção dos vizinhos, que avisaram a polícia. Ao constatar de que se tratava da equipe do delegado Fleury, pediram apenas para que mudassem o local das torturas.

Após ser torturado na sede do Cenimar, no Rio de Janeiro, Eduardo foi transferido para o 41° Distrito Policial, São Paulo, cujo delegado titular era o próprio Fleury.

Novamente transferido para o Cenimar/RJ, Eduardo permaneceu sendo torturado até meados de setembro, quando voltou novamente para São Paulo, sendo levado para a sede do DOI-Codi. Em outubro, foi removido para o Dops paulista, sendo encarcerado na cela 4 do chamado “fundão” (celas totalmente isoladas).

Em 25 de outubro, todos os jornais do País divulgaram a nota oficial do Dops/SP relatando a morte de Joaquim Câmara Ferreira (comandante da ALN), ocorrida em 23 de outubro. Nesta nota, foi inserida a informação de que Bacuri havia conseguido fugir, sendo ignorado seu destino. Foi encontrado nos arquivos do Dops a transcrição de uma mensagem recebida do Dops/SP pela 2ª seção do IV Exército, assinada pelo coronel Erar de Campos Vasconcelos, chefe da 2ª Seção do II Exército, dizendo “que foi dado a conhecer a repórteres da imprensa falada e escrita o seguinte roteiro para ser explorado dentro do esquema montado”.

O tal roteiro falava da morte súbita de Câmara Ferreira após ferir a dentadas e pontapés vários investigadores. E mais adiante diz “Eduardo Leite, o Bacuri, cuja prisão vinha sendo mantida em sigilo pelas autoridades, havia sido levado ao local para apontar Joaquim Câmara Ferreira (...) Aproveitando-se da confusão, Bacuri (...) logrou fugir (...)”. Estava evidenciado o plano para assassinar Eduardo Collen Leite

O testemunho de cerca de 50 presos políticos recolhidos às celas do Dops paulista (entre eles, o gaúcho Ubiratan de Souza, da VPR) neste período prova que Eduardo jamais saíra de sua cela naqueles dias, a não ser quando era carregado para as sessões diárias de tortura. Eduardo era carregado porque não tinha mais condições de manter-se em pé, muito menos de caminhar ou fugir, após dois meses de torturas diárias.

O comandante da tropa de choque do Dops/SP, tenente Chiari da PM paulista, mostrou a Eduardo e a inúmeros outros presos políticos, no dia 25, os jornais que noticiavam sua fuga.

Para facilitar a retirada de Eduardo de sua cela, sem que os demais prisioneiros do Dops percebessem, o delegado Luiz Gonzaga dos Santos Barbosa, responsável pela carceragem do Dops àquela época, exigiu o remanejamento total dos presos, e a remoção de Eduardo para a cela n° 1, que ficava defronte à carceragem e longe da observação dos demais presos. Seu nome foi retirado da relação de presos, as dobradiças e fechaduras de sua cela foram lubrificadas de forma a evitar ruídos que chamassem a atenção.

Os prisioneiros políticos, na tentativa de salvar a vida de seu companheiro, montaram um sistema de vigília permanente. Aos 50 minutos do dia 27 de outubro de 1970, Eduardo foi retirado de sua cela, arrastado pelos braços, pela falta total de condições de pôr-se em pé, com o corpo repleto de hematomas, cortes e queimaduras, sob os protestos desesperados de seus companheiros.

Segundo testemunho de Ubiratan, todos os presos chegaram junto às grades e estendiam braços e mãos para cumprimentar ou simplesmente tocar em Bacuri, ao mesmo tempo que vibravam talheres e copos metálicos no ferro das grades numa demonstração de protesto pela iminente morte de um companheiro. Todos sabiam que Bacuri seria executado.

Eduardo não foi mais visto. Os carcereiros do Dops, frequentemente questionados sobre o destino de Bacuri, só respondiam que ele havia sido levado para interrogatórios em um andar superior. Os policiais da equipe do delegado Fleury respondiam apenas que não sabiam; apenas o policial conhecido pelo nome de Carlinhos Metralha é que afirmou que Eduardo estava no sítio particular do delegado Fleury. Tal sítio era usado pelo delegado e sua equipe para torturar os presos considerados especiais ou os que seriam certamente assassinados e, por isso, deveriam permanecer escondidos.

Em 8 de dezembro, 109 dias após sua prisão, e 42 dias após seu sequestro do Dops, os grandes jornais do País publicavam nota oficial informando a morte de Eduardo em “um tiroteio nas imediações da cidade de São Sebastião”, no litoral paulista. Era evidente o conluio entre a repressão e a mídia, nesta farsa montada para eliminar Eduardo Leite.

A notícia oficial da morte de Eduardo teve um objetivo claro: tirar as condições da inclusão de seu nome na lista das pessoas a serem trocadas pela vida do embaixador da Suíça no Brasil, que havia sido sequestrado em 7 de dezembro. Seu nome seria incluído nessa lista e seria impossível soltar o preso Eduardo que, oficialmente, estava foragido e, além do mais, completamente desfigurado e mutilado pela tortura.

As informações são do grupo Tortura Nunca Mais e de Ubiratan de Souza.

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Lula anuncia "grande debate" sobre mídia

Reproduzo artigo de André Lux, publicado no blog "Tudo em cima":

Os ativistas da comunicação no Brasil devem se preparar para um importante debate que vai ganhar corpo a partir do ano que vem: a mudança na regulação dos meios de comunicação do País. O alerta foi dado pelo presidente Lula nesta quinta-feira (2/12) no Palácio do Planalto, em Brasília (DF), em entrevista coletiva a oito rádios comunitárias.

Segundo informou, o Ministério das Comunicações do governo Dilma Rousseff vai priorizar esse debate, com ampla participação da sociedade, porque a legislação brasileira é ultrapassada e não reflete o mundo altamente tecnológico e conectado à internet que temos hoje.

De acordo com o presidente, depois da realização da 1a. Conferência Nacional de Comunicação, "ficou claro pra todo mundo que no mundo inteiro tem regulação, que tem algum tipo de regulação (dos meios de comunicação)" e que será possível, com esta discussão, "conquistar muitas coisas na elaboração deste marco regulatório".

A discussão está na mesa: "O novo Ministério está diante de um novo paradigma de comunicação. Quero alertar vocês porque esse debate vai ser envolvente, tem muita gente contra e muita gente a favor. Certamente, o governo não vai ganhar 100% e quem é contra não vai ganhar 100%. Eu peço que vocês se preparem para esse debate. Se a gente fizer um bom debate conseguiremos encontrar um caminho do meio. Esse será o papel do novo Ministério de Comunicações", disse o presidente.

Lula expressou a vontade de se dedicar às discussões a respeito do marco regulatório das comunicações após o fim do mandato, já que, segundo disse, poderá ter um discurso que não podia ter na função de presidente da República. Ele disse que como militante político exercerá um papel centralizador dos debates da sociedade brasileira para politizar a questão do marco regulatório e “resolver a história das telecomunicações de uma vez”. Para isso, "é preciso ter força política” e embasamento, para vencer “o monopólio” que existe atualmente nas comunicações.

Democratização da comunicação

Na opinião do presidente, é preciso mudar urgentemente o padrão da comunicação brasileira, que não reflete a pluralidade do País e não contribui para a difusão da diversidade cultural. Lula disse que não é mais possível que uma pessoa que mora na região Norte, por exemplo, só tenha acesso à programação de São Paulo e do Rio de Janeiro. Na opinião dele, “sem querer tirar nada de ningúem”, é preciso que se dê a oportunidade para que moradores do Sudeste tenham acesso às informações de todo o País e para que todas as regiões estejam em contato com sua própria cultura. "Daqui a pouco no Nordeste, os companheiros vão esquecer de falar macaxeira e vão falar só aipim", ironizou.

"A democracia tem uma mão para ir e uma para voltar. Por isso é que nós trabalhamos a necessidade que você tenha uma programação regional para uma interação mais forte. Acho que poderemos avançar", disse Lula.

O presidente enfatizou ainda a necessidade de travar este debate sem cair na ladainha da "ameaça" à liberdade de imprensa. Ele disse que esta é uma tese propagada pelos "monopólios" que consideram as propostas de democratização dos meios de comunicação como um cerceamento à liberdade de imprensa no Brasil: "É uma briga histórica. Tratam (o assunto) como se fosse cerceamento à liberdade de imprensa. É uma coisa absurda alguém achar que não pode receber críticas, que são intocáveis", afirmou.

Ele ainda lembrou que, quando chegou ao Planalto, ouviu muita reclamação porque decidiu "democratizar" e "regionalizar" a publicidade do governo quando passaram de 499 meios de comunicação que recebem dinheiro do governo para 8010. "Tinha um pequeno grupo acostumado a comer sozinho e quando você reparte, as pessoas reclamam", comentou.

Lula não citou o nome de Paulo Bernardo, cotado para assumir o Ministério das Comunicações no próximo governo, mas falou a respeito da escolha que a presidente eleita Dilma Rousseff deve fazer. Segundo o presidente, deve ser algum que tenha "afinidade" com a ideia da democratização.

Rovai: donos da mídia "estão nervosos"

O presidente já havia abordado longamente o tema mídia em entrevista coletiva que deu na semana passada a blogs de diferentes pontos do Brasil.

O jornalista Renato Rovai, da revista Fórum, que participou da entrevista de blogueiros com Lula, avalia que "como presidente da República, Lula teve a percepção nítida de que se fosse contar apenas com a mídia tradicional para se dirigir à sociedade estaria perdido. A experiência de muitos anos de contato com esses meios, como líder sindical e depois político, deu a ele a possibilidade de entendê-los com muita clareza". Segundo Rovai, "jornalões e televisões ficaram nervosos ao perceberem que eles não são mais o único canal existente de contato entre os governantes e a sociedade", o que torna ainda mais relevante o debate sobre a mídia no país.

"Curioso lembrar as várias teses publicadas sobre a sociedade mediatizada, onde se tenta demonstrar como os meios de comunicação estabelecem os limites do espaço público e fazem a intermediação entre governos e sociedade. Pois não é que o governo Lula rompeu até mesmo com essas teorias. Passou por cima dos meios, transmitiu diretamente suas mensagens e deixou nervosos os empresários da comunicação e os seus fiéis funcionários, abalados com a perda do monopólio da transmissão de mensagens", disse Rovai durante o curso anual do Núcleo Piratininga de Comunicação, realizado semana passada no Rio.

Para ele, "está dada, ao final deste governo, mais uma lição: governos populares não podem ficar sujeitos ao filtro ideológico da mídia para se relacionarem com a sociedade. Mas também não pode depender apenas de comunicadores excepcionais como é caso do presidente Lula. Se outros surgirem ótimo. Mas uma sociedade democrática não pode ficar contando com o acaso. Daí a importância dos blogueiros, dos jornais regionais, das emissoras comunitárias e de uma futura legislação da mídia que garanta espaços para vozes divergentes do pensamento único atual".

Preconceito

Durante a entrevista de Lula às rádios comunitárias, que durou pouco mais de uma hora, o presidente também falou sobre o preconceito que existe na política brasileira que o vitimou “a vida inteira” e que o assustou durante a campanha presidencial. Lula ressaltou, entretanto, que acredita que prevalecerá o bom senso e que está certo de que Dilma Rousseff fará mais e melhor, porque encontrou um País muito mais desenvolvido e com a economia em amplo crescimento.

"O que eu vi nessa campanha me assustou. Eu sempre fui vítima de preconceito, carreguei a vida inteira, e o preconceito deixa marcas profundas, quase que incuráveis. Eu não tinha noção de que eles seriam capazes de fazer uma campanha tao preconceituosa quanto fizeram com a Dilma… apenas porque era uma mulher candidata. Mas podem ficar certos de que a Dilma não veio de onde eu vim, mas ela vai para onde eu fui".

No final da entrevista, um dos radialistas perguntou a Lula se ele achava que as rádios comunitárias "derrubavam avião ou tubarão", em uma referência implícita aos grandes grupos de comunicação. Lula, então, respondeu: "Eu sinceramente não sou técnico especialista para dizer se rádio comunitária derruba avião. Obviamente que qualquer rádio que interferir no sistema do avião pode criar um problema. Mas eu acho que hoje ela preocupa muito mais o tubarão do que um avião".

Participaram da entrevista com o presidente Lula as rádios Maria Rosa, de Curitibanos (SC); Heliópolis, de São Paulo (SP); Líder Recanto, do Recanto das Emas (DF); Oito de Dezembro, de Vargem Grande Paulista (SP); Santa Luzia, de Santa Luzia (MG); Cidade, de Ouvidor (GO), Fercal, de Sobradinho (DF) e Comunitária Integração, de Santa Cruz do Sul (RS). A entrevista foi transmitida ao vivo pelo Blog do Planalto e também por diversos outros blogs do País.

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WikiLeaks, Honduras e a mídia golpista

Reproduzo artigo de Cynara Menezes, publicado na revista CartaCapital:

Há uma revelação, entre as tantas que estão vindo à tona com a divulgação dos telegramas confidenciais das embaixadas dos Estados Unidos no mundo pelo site WikiLeaks, que me deixou particularmente satisfeita. Trata-se da admissão oficial pela diplomacia americana de que o que viveu Honduras em junho do ano passado foi um golpe de Estado. G-O-L-P-E, em português claro, como escrevemos em CartaCapital. Em inglês usa-se a palavra francesa “coup”. Ninguém utilizou o eufemismo “deposição constitucional” a não ser os pseudodemocratas locupletados em setores da mídia no Brasil.

É a mesma gente que, quando o governo Lula fala da intenção de regular a mídia, vem com o papo furado de que está se querendo cercear a liberdade de expressão. É o mesmo pessoal que ataca cotidianamente um líder democraticamente eleito e reeleito com palavras vis, mas que, ao menor sinal de revide verbal, protesta com denúncias ao suposto “autoritarismo”do presidente. Jornalistas, vejam só, capazes de ir lamber as botas dos militares em seus clubes sob a escusa de que a democracia se encontra “ameaçada” em nosso país.

Pois estes baluartes da liberdade de imprensa e de expressão no Brasil foram capazes de apoiar um regime conquistado pela força a pouca distância de nós, na América Central. Quando Honduras sofreu o golpe, estes falsos democratas saíram em campo para saudar o auto-empossado novo presidente Roberto Micheletti, que mandou expulsar o eleito Manuel Zelaya do país, de pijamas. Dizem-se democratas, mas espinafraram Lula e seu ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, por se recusarem a reconhecer um governo golpista. Quem é e quem não é democrata nessa história toda?

Não se engane, leitor. Disfarçados de defensores da democracia, estes “formadores de opinião” são na verdade carpideiras do regime militar. Choram às escondidas de saudades dos generais. Quando se colocam nas trincheiras da “liberdade de expressão” contra o governo, na verdade estão a tentar salvaguardar o monopólio midiático de seus patrões, não por acaso beneficiados pela ditadura. Dizem-se paladinos da imprensa livre, desde que seja aquela cevada pelas graças do regime militar. Não à toa, elogiam quem morreu do lado dos generais e difamam quem foi torturado e desapareceu lutando contra a ditadura.

As carpideiras do golpe se disfarçam sob a máscara dos bons moços, cheios de senso de humor “mordaz” (alguns humoristas de profissão, inclusive) e pretensamente bem formados intelectualmente. Mas não é difícil identificá-las: fique de olho em gente que diz que “todo político é igual”, que despreza o brasileiro com declarações do tipo “somos todos Tiriricas” e que prega o voto nulo nas eleições. Repare bem: prescindir do voto é abrir mão de ser cidadão. Na ditadura, não se votava, lembra? As carpideiras do regime militar tentam se conter, mas volta e meia se traem.

É mais fácil reconhecer uma carpideira dos milicos em tempos de guerra do que de paz. Durante as eleições, foi só surgir a polêmica sobre a descriminalização do aborto que elas mostraram a verdadeira face, erguendo a bandeira da ala mais obscurantista da igreja católica. Com a invasão policial dos morros cariocas no fim de semana, a mais “tchutchuca” entre todas as carpideiras da ditadura teve a desfaçatez de postar no twitter: “E se o BOPE, a Polícia e as Forças Armadas, depois da operação no Rio, fossem limpar o Congresso Nacional?” Nenhum respeito às instituições: é dessa matéria que se fazem os golpistas.

Se foram capazes de colocar o presidente Lula, do alto de sua popularidade, em capa de revista com a marca de um pé no traseiro, é de se presumir que as carpideiras do regime militar não darão trégua a Dilma Rousseff. Já começaram por escarafunchar seu passado de guerrilheira. Que ninguém se engane, as carpideiras estão à espreita. Esperam um deslize qualquer de Dilma para tentar defenestrá-la. Estão louquinhas por uma “deposição constitucional” como a que houve em Honduras, porque jamais admitirão ser o que são: groupies de ditadores. Os papéis do Wikileaks deixam claro, porém, que nem os Estados Unidos se enganam mais com golpistas.

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A presença de Cuba no mundo digital

Reproduzo artigo de Bruno Peron Loureiro, publicado no sítio da Alai:

As tecnologias digitais permitem uma nova forma de interação cultural e a internet é o meio mais fértil de expressão deste fenômeno. A experiência cubana, por seu contraste político com outras nações latino-americanas, desperta a curiosidade de como sua cultura circula no mundo digital.

A Cubarte (Portal de divulgação da Cultura Cubana) organizou a "1ª Jornada da Cultura Cubana em Meios Digitais" em 10, 11 e 12 de novembro de 2010 na Casa da ALBA Cultural (ramo de cultura da Alternativa Bolivariana para os Povos de Nossa América).

O evento compôs as comemorações do 17º aniversário da Cubarte. Já se anunciou a 2ª Jornada para novembro de 2011.

Este tipo de encontro soma-se às oportunidades de discutir sobre os caminhos culturais de um país que seguiu uma experiência política guerrilheira, revolucionária e polêmica (desde a ótica capitalista dominante) sob o comando de Fidel Castro e logo seu irmão Raul, atual presidente.

Na seção acadêmica do encontro, especialistas, jornalistas e pesquisadores expuseram sobre as diversas facetas e dificuldades das novas tecnologias digitais em Cuba, o mal uso da informação, a baixa representatividade na internet de elementos essenciais da identidade cubana, a socialização de conteúdos digitais, o jornalismo cultural digital, e o uso das redes sociais. Na seção competitiva da Jornada, houve a premiação de produtos culturais digitais, como sítios virtuais.

O acesso à internet é limitado em comparação com a média latino-americana e sofre controle por parte do governo cubano. Predominam, desta forma, sítios governamentais oficiais na ilha, mas os blogs prosperam junto de outras participações em redes sociais.

O expositor Víctor Ángel Fernández recordou que Cuba cumpriu quinze anos de uso de internet em setembro de 2010 e a ilha, agregou este participante do evento, tem o desafio de inserir-se na rede de modo a defender o "projeto social" que começou em janeiro de 1959 com a derrubada do ditador Fulgencio Batista, alinhado então aos interesses dos Estados Unidos.

A restrição do acesso à internet à maioria da população cubana não procede somente da política de Cuba de monitorar o tráfego de informações e punir os dissidentes políticos senão da pressão dos Estados Unidos de restringir investimentos em telecomunicações na ilha, negar a concessão de endereços IP (Protocolo de Internet, da sigla em inglês) a provedores locais, e sugerir o bloqueio do acesso de endereços cubanos a sítios virtuais estadunidenses e noutros países alinhados.

EUA segrega Cuba. Está claro

A Cubarte definiu como objetivo do evento: "propiciar o debate e intercâmbio de experiências entre os meios digitais cubanos na esfera da cultura". A pauta da Jornada é outro precedente para reforçar o internacionalismo da cultura cubana.

Cuba não alcançou o sonhado comunismo, que nunca existiu em país nenhum deste planeta exíguo do universo senão como experiências tortuosas de socializar a riqueza entre seres indispostos a este fim, os humanos. O sonho persiste a despeito da defesa do dinheiro, o luxo e o excesso, que ainda persegue os anseios de muitos Homo sapiens inebriados pelo pior dos vícios.

Enquanto houver uma vela acesa, Cuba continuará expondo sua vasta produção cultural apesar do embargo econômico dos Estados Unidos e o desmerecimento da imprensa servil, que digere a cultura estadunidense como a legítima e universal.

Não se deve ignorar, porém, que uma pequena ilha a cento e cinquenta quilômetros da Flórida resiste e não deixa que feneça sua dança, culinária, música e literatura. É uma brisa que sopra sobre a animosidade do vizinho intolerante.

A intrepidez cubana, apesar dos desajustes de um desafio tão difícil de conquistar quanto mal compreendido, aumenta com o acesso crescente de seus cidadãos ao cenário digital da internet. A crítica é inclusive bem-vinda neste meio de comunicação integrador.

A 1ª Jornada da Cultura Cubana em Meios Digitais, portanto, enriquece o diálogo sobre rumos que Estado nenhum pode controlar ou censurar devido à porosidade da informação e o direito universal de se comunicar livremente.

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quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Blogueiros gaúchos organizam seu encontro

Reproduzo artigo de Sônia Corrêa, publicado no blog Coisas da Soninha:

Desde o meu primeiro post neste blog, fiz questão de deixar claro que este não seria um espaço destinado a este ou aquele tema especificamente. O tema central do meu blog seriam os temas centrais da minha vida.

Logo, aqui eu falo de futebol, de música, de minhas alegrias e angústias, dos valores que possuo e, também, com muita ênfase, falo de política. Não de política partidária, apesar de eu ser filiada a um Partido há mais de 26 anos. Defendo minhas convicções políticas, sou socialista e, posso dizer hoje que sou uma militante da democratização da comunicação. Por isso, este tema também passeia por aqui.

Entendo que a verdadeira revolução da informação democrática promovida pela internet tem produzido um debate extremamente contundente, com resultados favoráveis às forças progressistas. A batalha de ideias ganhou um poderoso espaço que nos permite falar a milhares. É a comunicação e o debate de ideias caminhando juntos, através de um instrumento (ainda) acessível a uma imensa gama de formadores de opinião.

É neste espectro que a blogosfera vai ganhando corpo e jogando papel de destaque. Gostaria de sublinhar este protagonismo que os blog’s vão assumindo em nosso país, marcado pela gigantesca influência da chamada grande mídia, que, até então, falava sozinha e sem contraponto para toda nossa sociedade.

Estes novos canais comunicacionais, designados de blog’s, passam a integrar o espaço de informação, apresentando fatos em versões multilaterais, integrando e agregando à notícia, o olhar das forças populares, antes tão escondidos que chegavam a inexistir.

As recentes eleições ocorridas no Brasil constituem um divisor de águas. Aliás, foi isso mesmo que a blogosfera promoveu. Fez água nos planos daqueles que antes eram os únicos a falar ao povo brasileiro. Tuiteiros e blogueiros formaram um verdadeiro exército virtual que militou com muita firmeza no desmonte da boataria, baixarias e mentiras surgidas durante a campanha.

Quem, como eu, militou em 1989 e presenciou – como caxiense – a farsa montada num comício naquele município, ou ainda no seqüestro de Abílio Diniz, entre outros “fact’s”, é capaz de compreender a importância da existência dos blog’s e twitter’s no combate a boataria. Durante a campanha, José Serra, apoiado na grande mídia, atacou com ferocidade a blogosfera e, em um de seus discursos acusou os "blogs sujos" que fizeram, via rede, o contraponto da sua campanha. E, como todos sabem, ninguém chuta cachorro morto.

Na semana que passou (24/11) o Brasil assistiu, ao vivo, um momento histórico, onde o Presidente Lula, que tantas vezes serviu de alvo impetuoso e tortuoso da mídia oligárquica no país e, consciente do papel desempenhado pela blogosfera, concedeu uma entrevista inédita aos blogueiros progressistas. Lula, que aliás, durante a campanha, chegou a produzir um vídeo conclamando a blogosfera a se somar na luta de ideias através de seus instrumentos da internet.

Participaram da entrevista com o Presidente Lula, os blogueiros Altamiro Borges, do Blog do Miro, Renato Rovai, do Blog do Rovai, Leandro Fortes, do Blog Brasília, eu vi, José Augusto Duarte, do Blog Os Amigos do Presidente Lula, Túlio Viana, do Blog do Túlio Viana, Pierre Lucena, do Blog Acerto de Contas, William Barros, do Blog Cloaca News, Altino Machado, do Blog Altino Machado, Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania, Rodrigo Vianna, do Blog Escrevinhador e Conceição Oliveira, do Blog Maria Frô.

Com base neste entendimento, entre 20 e 22 de agosto passado tive a honra de participar do 1º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas.

Agora, com muito orgulho, componho a comissão que está organizando o 1º Encontro de Blogueiros do Rio Grande do Sul, que acontecerá nos dias 01, 02 e 03 de abril de 2011- e a mesa de abertura já está confirmada: será com Altamiro Borges, do Blog do Miro, que é o presidente do Centro de Mídia Barão do Itararé com o tema “Panorama da blosgosfera brasileira: histórico e desafios”.

Todos estão chamados a participar e contribuir. A blogosfera não tem dono, não tem chefe, não tem patrão. Nossa organização visa constituir um espaço de troca, de compartilhamento, de ideias e de tecnologias.

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BBB-11 e o fracasso da ética

Reproduzo artigo de Washington Araújo, publicado no Observatório da Imprensa:

Mais algumas semanas e a TV Globo estará colocando no ar seu programa de maior audiência no verão brasileiro: Big Brother Brasil 11. Sucesso de público, sucesso de marketing, sucesso financeiro, sempre na casa dos milhões de reais. Fracasso ético, fracasso de cidadania, fracasso de respeito aos direitos humanos fundamentais.

A data já foi confirmada: 11 de janeiro, uma terça-feira. O prêmio será de R$ 1,5 milhão para o vencedor. O segundo e terceiro lugares levam, respectivamente, R$ 150 mil e R$ 50 mil. As inscrições para a próxima edição do BBB já estão encerradas. Ao todo, nas dez edições, foram 140 participantes. E já foram entregues mais de R$ 8,5 milhões em prêmios. Balanço raquítico, tanto numérico quanto financeiro para seus participantes, para um programa que se especializou em degradar a condição humana.

Aos 11 anos de existência, roubando sempre 25% do ano (janeiro a março) e agora entrando na puberdade como se humano fosse, o BBB começa anunciando que passará por mudanças na edição 2011. Se você pensou que as mudanças seriam para melhorar o que não tem como ser melhorado se enganou redondamente. O formato será sempre o mesmo, consagrado pelo público e pelos anunciantes: invasão de privacidade com a venda de corpos quase sempre sarados, bronzeados e bem torneados e com a exposição de mentes vazias a abrigar ideias que trafegam entre a futilidade e a galeria de preconceitos contra negros, pobres, analfabetos funcionais.

Após dez anos seguidos, sabemos que a receita do reality show inclui em sua base de sustentação as antivirtudes da mentira, da deslealdade, dos conluios e... da cafajestagem. Aos poucos, todos irão se despir de sua condição humana tão logo um deles diga que "isto aqui é um jogo". Outros ensaiarão frases pretensamente fincadas na moral: "Mas nem tudo vou fazer para ganhar esse jogo."

Como miquinhos amestrados, os participantes estarão ali para serem desrespeitados, não poucas vezes humilhados e muitas vezes objeto de escárnio e lições filosóficas extraídas de diferentes placas de caminhões e compartilhadas quase diariamente pelo jornalista Pedro Bial, ao que parece, senhor absoluto do reality show. Não faltarão "provas" grotescas, como colocar uma participante para botar ovo a cada trinta minutos; outra para latir ou miar a cada hora cheia; algum outro para passar 24 horas de sua vida fantasiado de bailarina ou para pular e coaxar como sapo sempre que for ativado determinado sinal acústico. O domador, que terá como chicote sua lábia de ocasião ou nalgumas vezes sua língua afiada, continuará sendo Pedro Bial que, a meu ver, representa um claro sinal de como as engrenagens que movem a televisão guardam estreita semelhança com aqueles velhos moedores de carne.

O último a sair da jaula

É inegável que Bial é talentoso. É inegável que passou parte de sua vida tendo páginas de livros ao alcance das mãos e dos olhos. É inegável também que parece inconsciente dos prejuízos éticos e morais que haverá de carregar vida afora. Isto porque a cada nova edição do reality mais se plasmam os nomes BBB e Pedro Bial. E será difícil ao ouvir um não lembrar imediatamente o outro. Porque lançamos aqui nosso nome, que poderá ter vida fugaz de cigarra ou ecoará pela eternidade. Imagino, daqui a uns 25 anos, em 2035, quando um descendente deste Pedro for reconhecido como bisneto daquele homem engraçado que fazia o Big Brother no Brasil. E os milhares de vídeos armazenados virtualmente no YouTube darão conta de ilustrar as gerações do porvir.

E, no entanto, essas quase duas dezenas de jovens estarão ali para ganhar fama instantânea, como se estivessem acondicionados naqueles pacotinhos de sopa da marca Miojo. Imagino cada um deles a envergar letreiro imaginário a nos dizer com a tristeza possível que "Coloco à venda meu corpo sem alma, meu coração quebrado e minha inteligência esgotada; vendo tudo isso muito barato porque vejo que há muita oferta no mercado". E teremos aquele interminável desfile de senso comum. Afinal, serão 90 dias de vida desperdiçada, ou melhor, de vida em que a principal atividade humana será jogar conversa fora. O que dá no mesmo. E não será o senso comum exatamente aquele conjunto de preconceitos adquiridos antes de completarmos 15 anos de vida?

Friederich Nietzsche (1844-1900) parecia ter o dom da premonição. É que o filósofo alemão se antecipava muito quando se tratava de projetar ideias sobre a condição humana. É dele esta percepção: "O macaco é um animal demasiado simpático para que o homem descenda dele". Isto porque Nietzsche foi poupado de atrações quase sérias e semi-circenses, como o BBB. No picadeiro, o macaco é aplaudido por sua imitação do humano: se equilibra e passeia de triciclo e de bicicleta, se veste de gente, com casaca e gravata, sabe usar vaso sanitário, descasca alimentos. No picadeiro do BBB, os seres humanos são aplaudidos por se mostrarem intolerantes uns com os outros, se vestem de papagaios, ladram, miam, coaxam, zumbem – e tudo como se animais fossem. Chegam a botar ovo em momento predeterminado. Se vestem de esponja e se encharcam de detergente a limpar pratos descomunais noite afora.

Em sua imitação de animal, o humano que se sobressai no BBB é aquele que consegue ficar engaiolado – digo, literalmente engaiolado – junto com outros bípedes não emplumados – por grande quantidade de horas. E sem poder satisfazer as necessidades humanas básicas, muitas vezes tendo que ficar em uma mesma posição, como seriemas destreinadas. E são os únicos animais que demonstram imensa felicidade em permanecer por mais tempo na gaiola. Não lhes jogam bananas nem pipocas, mas quem for o último a sair da jaula semi-humana ganha uma prenda. Pode ser um passeio de helicóptero, pode ser um carro, pode ser uma noite na Marquês de Sapucaí.

Heidegger reconheceria

O leitor atento deve ter percebido que em algum momento deste texto mencionei que o BBB 11 terá mudanças. Nem vou me dar ao trabalho de editar. Eis o que copiei do site G1:

"Boninho, diretor do BBB, falou em seu Twitter nesta quarta-feira, 24/11, sobre a nova edição do programa, a 11ª, que estreará em janeiro de 2011. E ele adianta que, desta vez, as coisas vão mudar. ‘Esse ano tudo vai ser diferente... Nada é proibido no BBB, pode fazer o que quiser’, postou Boninho em seu microblog. Questionado sobre o que estaria liberado no confinamento que não estava em edições anteriores, ele respondeu: ‘Esse ano... liberado! Vai valer tudo, até porrada’. Boninho também comentou sobre as bebidas no reality show: ‘Acabou o ice no BBB... Vai ser power... chega de bebida de criança’, escreveu."

Não terá chegado a hora de o portentoso império Globo de comunicação negociar com o governo italiano a cessão do Coliseu romano para parte das locações, ao menos aquelas em que murros e safanões, sob efeito de álcool ou não, certamente ocorrerão? E como nada compreendo de Heidegger, só me resta dizer que ao longo de toda sua vida madura Heidegger esteve obcecado pela possibilidade de haver um sentido básico do verbo "ser" que estaria por trás de sua variedade de usos. E são recorrentes suas concepções quanto ao que existe, o estudo do que é, do que existe: a questão do Ser (i.e. uma Ontologia) dependente dos filósofos antes de Sócrates, da filosofia de Platão e de Aristóteles e dos Gnósticos.

Quem sabe tivesse assistido uma única noite do BBB – caso o formato da Endemol estivesse em cena antes de 1976 –, o filósofo, por muitos cultuado, não apenas teria uma confirmação segura de que não valia mesmo a pena publicar o segundo volume de sua obra principal, O Ser e o Tempo, como também haveria de reconhecer a inexistência de algo anterior ao ser. Mas, com certeza, se fartaria com a miríade de usos dados ao verbo "ser".

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A premiação do MST e as vaias da Folha

Reproduzo matéria publicada no Blog da Reforma Agrária:

“João Stédile, fundador do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), recebe homenagem na Câmara dos Deputados; ao ser anunciado, ouviu vaias”, afirma nota na Folha de S. Paulo.

Não poderia ser diferente.

No Brasil, existe um número grande de parlamentares que são donos de grandes propriedades que não cumprem a sua função social.

Ou seja, proprietários de áreas que são improdutivas, desmatam o meio ambiente ou desrespeitam a legislação trabalhista.

E lá na Câmara dos Deputados está parada desde 2004 a PEC do Trabalho Escravo, que obriga a expropriação de terras de quem explora trabalho escravo.

Essa máfia de deputados ruralistas tem nome e sobrenome: bancada ruralista.

De acordo com o Instituto de Estudos Socioeconômicos ( Inesc), há 117 deputados na atual legislatura.

Esses parlamentares vaiaram João Pedro Stedile, assim como vaiaram aquele que indicou o militante do MST, Brizola Neto, assim como vão vaiar qualquer lutador do povo que questione as bases da desigualdade social do Brasil.

Ou seja, a nota da Folha poderia constatar também a existência da gravidade.

Essa foi a conclusão, mais do que óbvia, que chegou o jornal Estado de Minas, em nota da coluna de Baptista Chagas de Almeida: “Líder e fundador do Movimento dos Trabalhadores Sem terra (MST), João Pedro Stedile foi homenageado na Câmara dos Deputados. Ficou entre vaias e aplausos. Nenhuma surpresa numa casa que tem a bancada ruralista”.

A Folha esqueceu de registrar que as vaias dos parlamentares latifundiários foram sufocadas pelos aplausos à premiação do coordenador do MST.

A Folha conhece menos o Brasil que o Estado de Minas, e só ouviu vaias ao João Pedro Stedile.

Isso não é novidade também.

Já conhecida como “Falha de S. Paulo”, está caminhando para se tornar um “Diário Veja”, na mesma linha de um panfleto semanal vendido no nosso país.

* No mesmo mundo em que vive a Folha, vivem pessoas valorosas como o escritor Eduardo Galeano, que mandou a seguinte mensagem ao MST e ao João Pedro Stedile: “que boa notícia, essa. medalha! boa e rara. nao é frequente encontrar evidencias de que a justiça existe. te abraça, teu irmao”.

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Lula avisa: vem aí o debate sobre mídia

Reproduzo matéria publicada no Blog do Planalto:

Os ativistas da comunicação no Brasil devem se preparar para um importante debate que vai ganhar corpo a partir do ano que vem: a mudança na regulação dos meios de comunicação do País. O alerta foi dado pelo presidente Lula nesta quinta-feira (2/12) no Palácio do Planalto, em Brasília (DF) em entrevista coletiva a oito rádios comunitárias. Segundo informou, o Ministério das Comunicações do governo Dilma Rousseff vai priorizar esse debate, com ampla participação da sociedade, porque a legislação brasileira é ultrapassada e não reflete o mundo altamente tecnológico e conectado à internet que temos hoje. A discussão está na mesa:

"O novo Ministério está diante de um novo paradigma de comunicação. Quero alertar vocês porque esse debate vai ser envolvente, tem muita gente contra e muita gente a favor. Certamente, o governo não vai ganhar 100% e quem é contra não vai ganhar 100%. Eu peço que vocês se preparem para esse debate. Se a gente fizer um bom debate conseguiremos encontrar um caminho do meio. Esse será o papel do novo Ministério de Comunicações".

Lula expressou a vontade de se dedicar às discussões a respeito do marco regulatório das comunicações após o fim do mandato, já que, segundo disse, poderá ter um discurso que não podia ter na função de presidente da República. Ele disse que como militante político exercerá um papel centralizador dos debates da sociedade brasileira para politizar a questão do marco regulatório e “resolver a história das telecomunicações de uma vez”. Para isso, "é preciso ter força política” e embasamento, para vencer “o monopólio” que existe atualmente nas comunicações.

Na opinião do presidente, é preciso mudar urgentemente o padrão da comunicação brasileira, que não reflete a pluralidade do País e não contribui para a difusão da diversidade cultural. Lula disse que não é mais possível que uma pessoa que mora na região Norte, por exemplo, só tenha acesso à programação de São Paulo e do Rio de Janeiro. Na opinião dele, “sem querer tirar nada de ningúem”, é preciso que se dê a oportunidade para que moradores do Sudeste tenham acesso às informações de todo o País e para que todas as regiões estejam em contato com sua própria cultura.

"A democracia tem uma mão para ir e uma para voltar. Por isso é que nós trabalhamos a necessidade que você tenha uma programação regional para uma interação mais forte. Acho que poderemos avancar".

Durante a entrevista, que durou pouco mais de uma hora, o presidente falou sobre o preconceito que existe na política brasileira que o vitimou “a vida inteira” e que o assustou durante a campanha presidencial. Lula ressaltou, entretanto, que acredita que prevalecerá o bom senso e que está certo de que Dilma Rousseff fará mais e melhor, porque encontrou um País muito mais desenvolvido e com a economia em amplo crescimento.

"O que eu vi nessa campanha me assustou. Eu sempre fui vítima de preconceito, carreguei a vida inteira, e o preconceito deixa marcas profundas, quase que incuráveis. Eu não tinha noção de que eles seriam capazes de fazer uma campanha tao preconceituosa quanto fizeram com a Dilma… apenas porque era uma mulher candidata. Mas podem ficar certos de que a Dilma não veio de onde eu vim, mas ela vai para onde eu fui".

Participaram da entrevista com o presidente Lula as rádios Maria Rosa, de Curitibanos (SC); Heliópolis, de São Paulo (SP); Líder Recanto, do Recanto das Emas (DF); Oito de Dezembro, de Vargem Grande Paulista (SP); Santa Luzia, de Santa Luzia (MG); Cidade, de Ouvidor (GO), Fercal, de Sobradinho (DF) e Comunitária Integração, de Santa Cruz do Sul (RS). A entrevista foi transmitida ao vivo pelo Blog do Planalto e também por diversos outros blogs do País.

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A impagável entrevista do Sr. Cloaca

Reproduzo a versão irônica, "85% verdadeira", da entrevista concedida pelo Senhor Cloaca ao jovem repórter da Folha, logo após a coletiva de Lula aos blogueiros. Hilário, o texto foi publicado no blog Cloaca News:

- Olá, você é o senhor Cloaca, não é?

- Você, não. Senhor.

- Hãã...o senhor é o senhor Cloaca, não é?

- Até prova em contrário. E enquanto as pragas não pegarem...

- Será que voc...o senhor poderia me dar uma palavrinha?

- Uma só? Pode ser um adjetivo?

Algumas perguntas...

- Então, por que pediu uma palavrinha em vez de perguntar se podia fazer algumas perguntas?

- É que...,como voc...o senhor vê, sou novo nisso.

- Não vi nada. Mas vejo que você tem um crachá da Folha.

- É, pois é.

- É seu mesmo? Deixe-me ver a foto...

(Cara, crachá, cara, crachá, cara, crachá)

- Não repare muito, senhor Cloaca.

- Vem cá, você é sobrinho da Tia Lenita?- Quem?

- Deixa para lá...- Mas, senhor Cloaca...as perguntas...

- Ah, sim, claro!

- Voc...o senhor não acha que o Presidente Lula está querendo censurar a imprensa?

- Não, não acho. De onde você tirou essa ideia estapafúrdia?

- É que me mandaram perguntar...

- Você acha isso?

- Sabe, eu sou apenas um operário da mídia...

- Estou vendo. E vamos deixar claro que não tenho nada pessoal contra você, meu caroooo... qual é mesmo seu nome?

- (mostra o crachá) Breno. Breno Costa. E o seu?

- Senhor. Senhor Cloaca.

- Sei. Mas o seu nome verdadeiro...

- Isso não é importante. Sequer sou famoso.

- Mas agora está famoso, não é?

- Quem está famoso é o Senhor Cloaca.

- Mas, essa história de o Presidente Lula querer calar a imprensa...

- Que história, rapaz?

- O Lula atacou a imprensa, oras!

- O que o Presidente Lula fez foi manifestar suas ideias a respeito de como certa imprensa o tem tratado. Isso não é atacar a instituição Imprensa. Aliás, se você viu a entrevista que ele acabou de dar para os blogueiros...

- Uma entrevista chapa-branca, não é?

- Chapa-branca? Pode me citar algum exemplo?

- Bem...veja bem...ãããnnn...

- Escuta, não está na hora do seu Toddynho?

- Que horas são?

- Exatamente, meio-dia e quarenta.

- Então, a censura à imprensa...

- Olha, meu filho, a mesma liberdade que certa imprensa tem de publicar o que quiser contra o Lula tem o Lula de dizer o que pensa daquilo que publicaram contra ele. Ou a Imprensa não pode ser criticada?

- Não é isso...é que...

- Seu jornal, por exemplo, teve toda a liberdade de publicar que o Lula é assassino e estuprador.

- Veja bem...quer dizer...

- Seu jornal chamou a ditadura de ditabranda.

- É, isso é verdade.

- O que é verdade?

- Meu jornal chamou a ditadura de ditabranda.

- E você trabalha lá.

- Como eu disse, sou apenas um operário...

- Objetivamente, o que você quer saber de mim, que já não saiba?

- Voc...o senhor trabalha onde?

- Você vai publicar exatamente o que eu disser, não é?

- Sim.

- Assessoro políticos do PT-RS, mas vou evitar o assunto.

- É verdade que, na hora da foto, o Lula disse: vem cá, ô Cloaquinha"?

- Sim, é verdade, ele disse.

- E o senhor fez o quê?

- Nada. Apenas fui.

- Não vai se gabar disso?

- Vou, sim. Estou até pensando em botar uma placa no pescoço com os dizeres: O Lula me chamou depois: 'Vem cá, ô Cloaquinha!'

(Toca o celular. "Alô, mamãe! Como? Acabou??? Tudo bem, pode ser Ovomaltine!" Desliga o celular)

- Bem, obrigado pela entrevista, senhor Cloaca, mas estão me esperando para o almoço.

- Também vou indo. Até a próxima, Breno! E, olha, não aceite doces de estranhos na rua, tá?

O diálogo acima é 85% verdadeiro. E está gravado.

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Blogs brasileiros repercutem o Wikileaks

Reproduzo artigo de Raphael Tsavkko Garcia, publicado no sítio Global Voices: ·

O vazamento de mais de 250 mil documentos denunciando a prática de espionagem por parte do governo dos EUA causou furor também no Brasil, onde dezenas de documentos acabaram por colocar o Ministro da Defesa, Nelson Jobim, em situação delicada. Natália Viana, do Opera Mundi, detalha o número de documentos vazados sobre o Brasil e diz que ainda há muito mais por vir:

"No caso brasileiro, os documentos são riquíssimos. São 2.855 no total, sendo 1.947 da embaixada em Brasília, 12 do Consulado em Recife, 119 no Rio de Janeiro e 777 em São Paulo. Nas próximas semanas, eles vão mostrar ao público brasileiro histórias pouco conhecidas de negociações do governo por debaixo do pano, informantes que costumam visitar a embaixada norte-americana, propostas de acordo contra vizinhos, o trabalho de lobby na venda dos caças para a Força Aérea Brasileira e de empresas de segurança e petróleo".

Os documentos, ainda, demonstram o desconforto dos EUA com os máximos representantes da diplomacia brasileira, explica Altamiro Borges em seu blog:

"No caso brasileiro, conversas confirmam o desconforto dos EUA com a política externa soberana praticada pelo Itamaraty. O ministro Celso Amorim e o ex-secretário-geral Samuel Pinheiro Guimarães são encarados como inimigos do império. Já o ministro da Defesa, Nelson Jobim – que infelizmente a presidente Dilma Rousseff pretende manter no posto – é tratado como um “aliado” dos EUA".

Leandro Fortes, do blog Brasília, eu vi, vai ainda mais longe, acusando o Ministro Nelson Jobim de ser um informante dos EUA (usando a gíria popular X-9, que significa “informante”)

"Nelson Jobim, ministro da Defesa do Brasil, foi pego servindo de informante da Embaixada dos Estados Unidos. Isso depois de Lula ter consolidado, à custa de enorme esforço do Itamaraty e da diplomacia brasileira, uma imagem internacional independente e corajosa, justamente em contraponto à política anterior, formalizada no governo FHC, de absoluta subserviência aos interesses dos EUA.

[…]

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, costumava almoçar com o ex-embaixador dos Estados Unidos no Brasil Clifford Sobel para falar mal da diplomacia brasileira e passar informes variados. Para agradar o interlocutor e se mostrar como aliado preferencial dentro do governo Lula, Jobim, ministro de Estado, menosprezava o Itamaraty, apresentado como cidadela antiamericana, e denunciava um colega de governo, o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, como militante antiyankee. Segundo o relato produzido por Clifford Sobel, divulgado pelo Wikileaks, Jobim disse que Guimarães “odeia os EUA” e trabalha para “criar problemas” na relação entre os dois países".

Ao site oficial do Ministério da Defesa, Jobim negou ter criticado o então vice-chanceler brasileiro, Guimarães, informação também repassada pelo Twitter oficial do Ministério da Defesa.

Por outro lado, André Raboni, do blog Acerto de Contas, considera ridículas as desculpas dadas por Jobim e que suas declarações apenas comprovam sua função de informante da embaixada dos EUA:

"É absurdo (pra não dizer outra coisa) um ministro de Estado manter esse tipo de atitude colaborativa com um país que está tentando enfiar uma lei anti-terrorismo goela abaixo dos brasileiros. Uma lei que só interessa aos EUA, diga-se de passagem. Aliás, seria absurdo um ministro agir dessa forma com qualquer outro país, independentemente de serem os Estados Unidos e sua rede internacional de espionagem diplomática".

Danilo Marques, do blog O Inferno de Dandi, é irônico ao considerar que os EUA sentem ciúmes dos sucessos brasileiros em suas relações exteriores:

"Nos relatórios percebesse uma crise de ciúmes dos americanos, insatisfeitos com o sucesso brasileiro em suas relações exteriores. Achando que o Brasil está criando asas, a questão do Irã foi uma grande decepção aos que não gostam de dividir os brinquedos. Pois o Ministro Amorim, que defende as cores nacionais, afirmou em Washington que os americanos vão ter que largar de xilique, agora o panorama mundial pede outras relações diplomáticas".

Cristina Rodrigues, do Somos Andando, relembra outros episódios polêmicos me que se envolveu Nelson Jobim:

"Ele se posicionou contrário ao Programa de Direitos Humanos defendido pela sociedade civil e a criação de uma Comissão da Verdade. Parecia mais um aliado daqueles militares que comandaram o Brasil nos 21 anos entre 1964 e 1985. Foi peça-chave para derrubar Paulo Lacerda da Abin, Foram vários, enfim, os constrangimentos".

Luiz Carlos Azenha, do Vi o Mundo, acrescenta ainda que, segundo o WikiLeaks, Jobim teria também repassado ao embaixador americano a informação (falsa) de que Evo Morales, presidente da bolívia, teria “um tumor enfiado no nariz”.

Através dos documentos vazados, veio também à público [en] a informação de que os EUA estariam insatisfeitos com o fato do Brasil se recusar a implementar uma lei anti-terrorista em seu território, que não passou, segundo Hugo Albuquerque, do Descurvo:

"A ideia não vingou por pressão, inclusive, de Dilma Rousseff, atual chefe de estado e de governo. O argumento usado por ela é bem simples, como isso poderia ser usado para criminalizar movimentos sociais e, quem sabe, políticos".

Uma lei Anti-Terrorista teria como resultado, no Brasil, a criminalização de movimentos sociais, como o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), diz João Pedro Stédile em entrevista concedida ao Opera Mundi:

“É evidente que as pressões do governo dos EUA, tentando influenciar governos democráticos e progressistas a aderirem à sua sanha paranóica de terrorismo, visa criminalizar e controlar qualquer movimento de massas que lute por seus direitos e que ocasionalmente representem manifestações contra os interesses das empresas estadunidenses”

Hugo Albuquerque continua, ainda, criticando a forma pela qual os EUA e alguns analistas brasileiros tratam o terrorismo, traçando paralelos com o ideal fracassado de livre-mercado dos anos 90:

"A maneira como é narrada o aparente descaso do governo brasileiro com o “terrorismo” é uma peça antropológica, sem dúvida. Os americanos e os analistas nacionais - mais gringos que os próprios -, na verdade, não entendem como o Governo brasileiro ainda não descobriu o potencial de como controlar os seus, por meio do potencial de subjetivação dos seus cidadãos como “terroristas”, mas a maneira como isso é narrado é deliciosamente cínica, os tecnocratas apontam o governo como “imaturo” do mesmo modo como se fazia com os países que não queriam aderir ao livre-mercadismo nos anos 90: A nossa vontade é tamanha que quem não se dobra a ela, só pode ser um idiota. Uma forma de idealismo perversa, na qual os próprios ideólogos começam a acreditar nas mentiras que repetem - e aí, caríssimos, só o inferno é o limite".

Idelber Avelar, do Biscoito Fino, acrescenta:

"De novidades nesse front, há a participação de um especialista brasileiro, André Luis Woloszyn, como uma espécie de “consultor” para os estadunidenses interessados em adequar a legislação alheia a seus interesses: “é impossível”, disse ele, “fazer uma lei antiterrorismo que não inclua o MST”. O caso me parece gravíssimo".

Finalmente, Altamiro Borges finaliza, dando sua visão da importância dos dados vazados e do WikiLeaks:

"A vasta documentação tornada pública, num serviço inestimável da ONG Wikileaks, confirma que a luta contra a agressão imperialista é a principal batalha dos povos na atualidade para superar a opressão e a exploração".

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Nelson Jobim e o cadável insepulto

Reproduzo artigo de Maria Inês Nassif, intitulado "Divã para livrar o país da síndrome do quepe", publicado no jornal Valor:

O período militar é um cadáver insepulto. A jovem democracia brasileira tem uma enorme dificuldade de lidar com seu passado. Nos momentos em que os conflitos políticos são de baixa intensidade, a tendência da sociedade é simplesmente jogar esse período negro da vida do país para debaixo do tapete. Quando são de média intensidade, o passado põe a cabeça de fora e lembra que continua no ar, como uma nuvem, e a chuva pode desabar a qualquer momento sobre nossas cabeças. Em situações de grandes conflitos, como no recente período eleitoral, grupos sociais mais conservadores retiram do embornal um discurso que parece ter saído da boca de um general-presidente, com grande espaço para teorias conspiratórias dando conta de perigosas "ameaças comunistas".

Como o uso do cachimbo normalmente entorta a boca, os movimentos políticos, desde o pré-64, voltam sempre para a lógica segundo a qual um lado sempre deve estar na ofensiva e o outro, na defensiva. A contaminação da oposição pelo velho udenismo trouxe junto o hábito de pedir a tutela dos quartéis, quando seu projeto político não consegue se viabilizar pelo voto. Mas uma das coisas que alimenta a recaída permanente da elite brasileira ao conservadorismo - e ao militarismo - é o outro lado. O velho PSD, de Tancredo Neves, também permanece como padrão de comportamento político: a recusa a qualquer tipo de confronto, em especial quando pode resvalar na área militar. Os dois lados se alimentam de um consenso forjado sabe-se lá onde, de que a direita tem legitimidade para levar o confronto ao limite, enquanto, do centro à esquerda, os atores políticos tornam-se irresponsáveis se não estiverem sempre conciliando.

As Forças Armadas são peça central nas situações de confronto: não só assimilam apelos de tutela da democracia, como são a instituição que avaliza as pressões de um grupo minoritário - de direita - sobre o resto da sociedade. A lembrança do passado só vem à cena política quando serve a esse jogo de pressão.

O Ministério da Defesa, concebido teoricamente para submeter o poder militar às instituições democráticas, nem bem nasceu e parece estar contaminado pela visão udenista das Forças Armadas, que requer sempre uma ação pessedista, de conciliação, para evitar o pior. O ministro Nelson Jobim, que o governo Lula considera ter desempenhado um papel importante na consolidação do Ministério da Defesa, é tido como um ponto de equilíbrio não por ter assumido o comando das armas, mas por ter exercido um papel de mediador das pressões militares junto a um governo civil de esquerda.

O vazamento de documentos relativos ao ministro, pelo Wikileaks, trouxe à luz provas de que as forças militares continuam um capítulo à parte na história da democracia brasileira - e isso, mesmo quando o seu chefe é civil. Um ministro da Defesa que foi mantido e se fortaleceu nas brigas que comprou dentro do governo, com colegas mais comprometidos com visões não-conservadoras sobre os Direitos Humanos e sobre a forma de lidar com o passado autoritário do país, expôs as suas divergências com o Ministério das Relações Exteriores a ninguém menos que o embaixador dos Estados Unidos no Brasil. Gentilmente, cedeu ao embaixador a informação, dada confidencialmente pelo seu chefe, o presidente da República, sobre o estado de saúde do presidente da Bolívia, Evo Morales. As inconfidências ganham os jornais dias depois de Jobim ter sido confirmado, na mesma pasta, para o próximo governo. Continua ministro de Lula e será o ministro de Dilma Rousseff.

O governo Dilma acena para a manutenção de uma situação em que o Ministério da Defesa - e portanto as Forças Armadas - não se integra a um governo legitimamente eleito, mas se mantém no governo com altíssimo grau de autonomia, graças a ondas de pânico criadas por grupos de direita. Paga o mico das inconfidências de "um ministro da Defesa invulgarmente ativo", segundo definição do próprio Sobel em um de seus telegramas.

A falta de reação a ofensivas da direita tem seu preço. As Forças Armadas são um terreno fértil à pregação conservadora e a absorve com rapidez e clareza. Não deve ser à-toa que, depois de um processo eleitoral particularmente radicalizado - onde prevaleceu a lógica do udenismo que confronta e apela aos quartéis e do pessedismo que concilia - que a turma que se forma este ano na Academia Militar de Agulhas Negras (Aman) tenha se batizado com o nome do general Emílio Garrastazu Médici, presidente militar do período mais sangrento da ditadura.

Os militares se retiraram para os quartéis, mas é evidente que continuaram reproduzindo internamente uma ideologia altamente conservadora, que não afasta o papel de tutela sobre a sociedade civil. Isso aconteceu porque não houve uma contra-ofensiva capaz de colocar outra visão sobre o papel dos militares na sociedade e fazê-la dominante. A discussão do aprimoramento da democracia deve passar por uma profunda revisão do papel das Forças Armadas e por uma integração, de fato, da instituição nos esforços democráticos da sociedade.

A propósito: as consultas sobre os processos contra os adversários políticos da ditadura instruídos pela Justiça Militar podem ser consultados na Unicamp, que recebeu todos os arquivos reunidos pelo grupo Tortura Nunca Mais, abrigado na Arquidiocese de São Paulo, durante a ditadura. O grupo copiou os processos na Justiça Militar e, com base neles, fez um importante trabalho de denúncia de torturas e assassinatos de opositores políticos do regime. O trabalho final do grupo assume como legítima a ideia de que as denúncias de tortura por parte dos presos políticos, feitas no período à Justiça Militar, tornam sem valor as informações obtidas por esses meios. Para saber o que fizeram os presos políticos para se tornarem presos políticos, é mais garantido que se pergunte isso a eles hoje. Na democracia e em liberdade.

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Washington ameaça o sítio Wikileaks

Reproduzo artigo de David Brooks, publicado no jornal mexicano La Jornada e traduzido pela Adital:

O governo dos Estados Unidos ameaça fiscalizar judicialmente a Wikileaks enquanto tenta superar a crise diplomática provocada pela divulgação de mais de 250 mil mensagens de suas 274 embaixadas e consulados e se intensifica o debate sobre as implicações da filtração. Noam Chomsky considerou que isso revela "o profundo ódio" dos governantes à democracia.

Enquanto a secretária de Estado, Hillary Clinton, reuniu-se com contrapartes na Ásia Central -muitos deles mencionados nas mensagens eletrônicas- para tentar minorar o golpe e resgatar seu prestígio, o Procurador Geral, Eric Holder e o Pentágono reiteraram que estão sendo realizadas investigações "criminais" acerca das filtrações de Wikileaks.

Algumas versões jornalísticas assinalaram que as autoridades consideram aplicar a Lei de Espionagem contra Julián Assange, o fundador e diretor de Wikileaks. O porta voz da Casa Branca, Robert Gibbs, declarou que "obviamente, existe uma investigação criminal sobre o roubo e difusão de informação sensível e classificada". Explicou que estão sendo avaliadas uma gama de opções para castigar os responsáveis.

Minimizam a filtração

Outros funcionários do governo de Barack Obama continuaram minimizando o assunto. O secretário de Defesa, Robert Gates, declarou a repórteres no Pentágono que a divulgação foi um assunto "embaraçoso"; porém, que as consequências para a política exterior estadunidense são limitadas. "O fato é que os governos estabelecem relações com os Estados Unidos porque é de seu interesse, não porque gostam de nós, não porque confiam em nós e não porque acreditam que podemos manter segredos".

Hillary Clinton reiterou no Cazaquistão que "foi um ato muito irresponsável" que "colocou em risco as vidas de pessoas inocentes em todo o mundo, sem ter consideração para com os mais vulneráveis, incluindo jornalistas".

Insistiu em defender a liberdade de expressão e criticou aos governos que reprimem os jornalistas. Na era da Internet, é difícil balancear a liberdade e a responsabilidade. "Temos que apoiar e proteger a liberdade de expressão, seja de um indivíduo ou de um jornalista. Porém, também tem que haver algumas regras ou algum sentido de responsabilidade que deve ser inculcado".

O Departamento de Estado desconectou o acesso aos arquivos da rede cibernética classificada do governo e reduziu o número de empregados que podem ver mensagens diplomáticas. A medida é temporária, indicou o porta voz P. J. Crowley, enquanto são reparadas "debilidades no sistema, que ficaram evidentes nessa filtração".

Ao mesmo tempo, o Departamento de Estado tentou desmentir que os diplomatas estadunidenses são espiões. A mensagem divulgada por Wikileaks assinada por Clinton, que inclui instruções a funcionários estadunidenses para buscar informações até de DNA, escaneamento oculares e biométricos de representantes de outros governos e dos mais altos funcionários da Organização das Nações Unidas, provocou críticas em várias partes sobre se os diplomatas estavam espionando.

Um alto funcionário do Departamento de Estado -não identificado- que declarou que as solicitações para obter essa informação pessoal foram enviadas por "administradores da comunidade de inteligência", e que os diplomatas estadunidenses não tinham obrigação de atender a esses pedidos, informou a agência AP. O porta voz Crowley sublinhou que "nossos diplomatas são diplomatas, não bens de inteligência".

O caso detonou um crescente debate aqui sobre o impacto e o significado da filtração massiva de documentos classificados -a maior na história, "Talvez a revelação mais dramática (...) é o ódio amargo à democracia que é revelado pelo governo dos Estados Unidos -Hillary Clinton e outros- e também pelo serviço diplomático", considerou Noam Chomsky, em entrevista com Amy Goodman, em Democracy Now. "Devemos entender (...) que uma das principais razões dos segredos governamentais é para proteger ao governo de sua própria população".

Tomou como exemplo o dito ontem por Clinton acerca de que as mensagens "confirmam o fato de que o Irã representa uma ameaça muito séria ante os olhos de muitos de seus vizinhos", já que os documentos revelam que líderes árabes instaram a Washington a atacar o Irã. Chomsky assinalou que "as pesquisas mais recentes (realizadas por Brookings Institution) reportam que 80% da opinião pública árabe vê a Israel como a principal ameaça na região; a segunda são os Estados Unidos, com 77%; e o Irã, com 10%. Isso não se informa nos jornais; porém, é muito familiar para os governos de Israel e dos Estados Unidos e seus embaixadores" e. portanto, o que as mensagens revelam não é a posição dos povos da região, mas a dos ditadores árabes e dos governos ocidentais.

Assim, "o significado principal das mensagens divulgadas até agora é o que nos dizem da liderança ocidental", assinalou Chomsky. Ao omitir-se a opinião pública do mundo árabe, como em outros aspectos que abordam essas mensagens, isso "revela o ódio profundo à democracia pro parte de nossas lideranças políticas e (nesse caso) da liderança política israelita".

Isso apenas está começando

Os quatro diários e a revista que difundiram o vasto acervo de mensagens eletrônicas diplomáticas informam que continuarão publicando mais durante pelo menos uma semana. Alguns editores afirmaram que isso apenas está começando.

Parece que tudo começou quando um analista de inteligência militar estadunidense de 22 anos de idade, que, aparentando estar escutando a Lady Gaga -cantando e movendo-se- estava "baixando" mais de um quarto de milhão de documentos diplomáticos que, após entregá-los em uma minimemória portátil a Wikileaks, sacudiram a vários governos do mundo.

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quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

WikiLeaks: 2.855 documentos sobre o Brasil

Reproduzo artigo de Natália Viana, publicado no sítio Opera Mundi:

Fui convidada por Julian Assange e sua equipe para trazer ao público brasileiro os documentos que interessam ao nosso país. Para esse fim, o Wikileaks decidiu elaborar conteúdo próprio também em português. Todos os dias haverá no site matérias fresquinhas sobre os documentos da embaixada e consulados norte-americanos no Brasil.

Por trás dessa nova experiência está a vontade de democratizar ainda mais o acesso à informação. O Wikileaks quer ter um canal direto de comunicação com os internautas brasileiros, um dos maiores grupos do mundo, e com os ativistas no Brasil que lutam pela liberdade de imprensa e de informação. Nada mais apropriado para um ano em que a liberdade de informação dominou boa parte da pauta da campanha eleitoral.

Buscando jornalistas independentes, Assange busca furar o cerco de imprensa internacional e da maneira como ela acabada dominando a interpretação que o público vai dar aos documentos. Por isso, além dos cinco grandes jornais estrangeiros, somou-se ao projeto um grupo de jornalistas independentes. Numa próxima etapa, o Wikileaks vai começar a distribuir os documentos para veículos de imprensa e mídia nas mais diversas partes do mundo.

Assange e seu grupo perceberam que a maneira concentrada como as notícias são geradas – no nosso caso, a maior parte das vezes, apenas traduzindo o que as grandes agências escrevem – leva um determinado ângulo a ser reproduzido ao infinito. Não é assim que esses documentos merecem ser tratados: “São a coisa mais importante que eu já vi”, disse ele.

Não foi fácil. O Wikileaks já é conhecido por misturar técnicas de hackers para manter o anonimato das fontes, preservar a segurança das informações e se defender dos inevitáveis ataques virtuais de agências de segurança do mundo todo.

Assange e sua equipe precisam usar mensagens criptografadas e fazer ligações redirecionados para diferentes países que evitam o rastreamento. Os documentos são tão preciosos que qualquer um que tem acesso a eles tem de passar por um rígido controle de segurança. Além disso, Assange está sendo investigado por dois governos e tem um mandado de segurança internacional contra si por crimes sexuais na Suécia. Isso significou que Assange e sua equipe precisam ficar isolados enquanto lidam com o material. Uma verdadeira operação secreta.

Documentos sobre Brasil

No caso brasileiro, os documentos são riquíssimos. São 2.855 no total, sendo 1.947 da embaixada em Brasília, 12 do Consulado em Recife, 119 no Rio de Janeiro e 777 em São Paulo.

Nas próximas semanas, eles vão mostrar ao público brasileiro histórias pouco conhecidas de negociações do governo por debaixo do pano, informantes que costumam visitar a embaixada norte-americana, propostas de acordo contra vizinhos, o trabalho de lobby na venda dos caças para a Força Aérea Brasileira e de empresas de segurança e petróleo.

O Wikileaks vai publicar muitas dessas histórias a partir do seu próprio julgamento editorial. Também vai se aliar a veículos nacionais para conseguir seu objetivo – espalhar ao máximo essa informação. Assim, o público brasileiro vai ter uma oportunidade única: vai poder ver ao mesmo tempo como a mesma história exclusiva é relatada por um grande jornal e pelo Wikileaks. Além disso, todos os dias os documentos serão liberados no site do Wikileaks. Isso significa que todos os outros veículos e os próprios internautas, bloggers, jornalistas independentes vão poder fazer suas próprias reportagens. Democracia radical – também no jornalismo.

Impressões

A reação desesperada da Casa Branca ao vazamento mostra que os Estados Unidos erraram na sua política mundial – e sabem disso. Hillary Clinton ligou pessoalmente para diversos governos, inclusive o chinês, para pedir desculpas antecipadamente pelo que viria. Para muitos, não explicou direto do que se tratava, para outros narrou as histórias mais cabeludas que podiam constar nos 251 mil telegramas de embaixadas.

Ainda assim, não conseguiu frear o impacto do vazamento. O conteúdo dos telegramas é tão importante que nem o gerenciamento de crise de Washington nem a condenação do lançamento por regimes em todo o mundo – da Austrália ao Irã – vai conseguir reduzir o choque.

Como disse um internauta, Wikileaks é o que acontece quando a superpotência mundial é obrigada a passar por uma revista completa dessas de aeroporto. O que mais surpreende é que se trata de material de rotina, corriqueiro, do leva-e-traz da diplomacia dos EUA. Como diz Assange, eles mostram “como o mundo funciona”.

O Wikileaks tem causado tanto furor porque defende uma ideia simples: toda informação relevante deve ser distribuída. Talvez por isso os governos e poderes atuais não saibam direito como lidar com ele. Assange já foi taxado de espião, terrorista, criminoso. Outro dia, foi chamado até de pedófilo.

Wikileaks e o grupo e colaboradores que se reuniu para essa empreitada acreditam que injustiça em qualquer lugar é injustiça em todo lugar. E que, com a ajuda da internet, é possível levar a democracia a um patamar nunca imaginado, em que todo e qualquer poder tem de estar preparado para prestar contas sobre seus atos.

O que Assange traz de novo é a defesa radical da transparência. O raciocínio do grupo de jornalistas investigativos que se reúne em torno do projeto é que, se algum governo ou poder fez algo de que deveria se envergonhar, então o público deve saber. Não cabe aos governos, às assessorias de imprensa ou aos jornalistas esconder essa ou aquela informação por considerar que ela “pode gerar insegurança” ou “atrapalhar o andamento das coisas”. A imprensa simplesmente não tem esse direito.

É por isso que, enquanto o Wikileaks é chamado de “irresponsável”, “ativista”, “antiamericano” e Assange é perseguido, os cinco principais jornais do mundo que se associaram ao lançamento do Cablegate continuam sendo vistos como exemplos de bom jornalismo – objetivo, equilibrado, responsável e imparcial.

Uma ironia e tanto.

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Rádios comunitárias entrevistam Lula

Por Altamiro Borges

Depois da histórica entrevista dada aos blogueiros progressistas, o presidente Lula quebra novamente o monopólio midiático e concede a sua primeira entrevista às rádios comunitárias. Ela ocorrerá nesta quinta-feira, 2 de dezembro, a partir das 9 horas, no Palácio do Planalto, e será transmitida ao vivo pelo Blog do Planalto. Estarão presentes comunicadores sociais de 10 rádios comunitárias de várias partes do país.

A coletiva é promovida pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço). Ela representa uma importante vitória deste movimento, que sempre foi duramente criminalizado. Pode sinalizar para uma nova política de estímulo às rádios comunitárias no país, num novo passo para a democratização da comunicação. Ela ainda ajuda a fortalecer o congresso nacional da Abraço, que ocorrerá em dezembro.

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WikiLeaks e agressão imperialista dos EUA

Por Altamiro Borges

Para os que acham que não existe mais imperialismo, a revelação do sítio Wikileaks de mais de 250 mil novos documentos sobre as atividades de espionagem dos EUA em todo o planeta representa o fim das ilusões de classe. Os textos “confidenciais” mostram a face verdadeira da diplomacia ianque, que trabalha diuturnamente com o objetivo de prolongar seu domínio imperial sobre mundo.

Para manter a sua hegemonia econômica, política, militar e ideológica, os EUA não vacilam em espionar dezenas de nações, orquestram planos para desestabilizar e derrubar governos eleitos democraticamente, financiam organizações e operações “terroristas” e vigiam até mesmo o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU). O império não tem qualquer escrúpulo para manter o seu domínio.

Confissão do golpe em Honduras

Os documentos revelados pelo Wikileaks contêm informações levantadas por centenas de diplomatas sobre as prioridades da política externa dos EUA, como as ocupações do Afeganistão e Iraque, o Irã e o Paquistão. Além disso, estão incluídas avaliações sobre negociações bilaterais, conversas privadas e avaliações sobre líderes de vários países. Fica evidente a investida contra o Irã para “cortar a cabeça da cobra”, numa das referências ao presidente Mahmud Ahmadinejad. O esforço para derrubar o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, também aparece em vários textos.

A base de dados a que o jornal britânico The Guardian teve acesso revela a atividade de espionagem das embaixadas dos EUA em busca de informação que possa ser usada em chantagem contra dezenas de países, alguns deles aliados. Índia, Afeganistão, Paquistão, países árabes e africanos, assim como Honduras, Colômbia, Paraguai, Brasil e Venezuela, na América Latina, foram objeto de espionagem. No caso de Honduras, telegramas de diplomatas confirmam que houve um golpe militar no país – que os EUA e a mídia colonizada tentaram esconder.

Nelson Jobim, o "aliado"

No caso brasileiro, conversas confirmam o desconforto dos EUA com a política externa soberana praticada pelo Itamaraty. O ministro Celso Amorim e o ex-secretário-geral Samuel Pinheiro Guimarães são encarados como inimigos do império. Já o ministro da Defesa, Nelson Jobim – que infelizmente a presidente Dilma Rousseff pretende manter no posto – é tratado como um “aliado” dos EUA.

A vasta documentação tornada pública, num serviço inestimável da ONG Wikileaks, confirma que a luta contra a agressão imperialista é a principal batalha dos povos na atualidade para superar a opressão e a exploração.

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O diploma e os desafios contemporâneos

Reproduzo artigo de Venício Lima, publicado no Observatório da Imprensa:

São raras as atividades das quais participei nos últimos dois ou três anos nas quais, independente do tema sendo discutido, não aparecesse alguém e cobrasse minha posição sobre a obrigatoriedade do diploma de curso superior em jornalismo para o exercício da profissão de jornalista profissional.

Tenho constatado que a resposta a essa pergunta provoca inesperadas paixões e, em geral, serve como critério para colocar quem a responde no céu ou no inferno. Se a audiência for, majoritariamente, composta de estudantes de jornalismo e/ou militantes de sindicatos de jornalistas, relativizar a importância do diploma e chamar a atenção para as transformações radicais pelas quais passa o campo das comunicações – e as incontornáveis conseqüências desse fato para o jornalismo e a profissão de jornalista – pode ser o caminho seguro para hostilidades e intolerância.

Assumo, mais uma vez, o risco e boto a minha mão no vespeiro.

Transformações radicais

Nos Estados Unidos, como se sabe, não há exigência de diploma para o exercício profissional de jornalista. Aliás, a exigência não é encontrada em nenhum país de tradição democrática.

Em artigo publicado neste Observatório há cerca de três anos, comentei que o College of Communications, na minha alma mater, a Universidade de Illinois, em Urbana-Champaign, estava mudando seu nome para College of Media (ver "Ensino & Pesquisa: Mídia versus comunicação").

Reproduzi a justificativa oferecida pelo então dean do College, Ronald Yates, para a troca de communications por media. Disse ele:

"O que nos realmente fazemos é estudar e ensinar ‘comunicação midiatizada’ [mediated communications] (...). Nós estudamos e ensinamos mídia – mídia velha, mídia nova, mídia emergente, mídia futura. Em resumo, o College of Communications é sobre mídia. O mais importante de tudo isso (…) não é encontrar uma nomenclatura precisa, mas dar conta das mudanças que estão ocorrendo (...). A enorme mudança que produz informação e entretenimento a qualquer hora, em qualquer lugar, tem forçado as pessoas a se adaptarem constantemente. O resultado é que elas estão ficando mais sábias e discernindo melhor como gastar o dinheiro e o tempo delas, como buscar as notícias e como responder à mídia. Essas mudanças nas formas de distribuição [de informação e entretenimento] e na maneira como as pessoas pensam a respeito da mídia provocaram mudanças no escopo das comunicações como disciplina."

Na ocasião comentei também que, guardadas as diferenças, o "mercado" brasileiro demanda hoje um profissional que lembra os velhos pioneiros, isto é, um profissional que compreende a mídia em suas variadas dimensões, sua importância no mundo contemporâneo, e é capaz de produzir "comunicação" que possa ser distribuída em diferentes tecnologias. Em resumo: o profissional de hoje é multimídia, não é um especialista.

Apesar disso, afirmava, entre nós continuam a predominar cursos de graduação em unidades acadêmicas ainda vinculadas às divisões das velhas tecnologias, enquanto na pós-graduação prevalece uma tendência de forte fragmentação do campo de estudos (ver, neste OI, "Fragmentação versus convergência na comunicação").

Posição explicitada

Em pequeno livro concluído antes da decisão do STF, de junho de 2009, que considerou "não recepcionado" pela Constituição de 1988 o decreto que requer a obrigatoriedade do diploma de curso superior em jornalismo para o registro profissional, afirmei:

"Essa é uma questão sobre a qual tenho pensado há muito tempo. Mais recentemente, o surgimento da internet e o aparecimento dos blogs fizeram com que eu consolidasse uma posição amadurecida. Acredito que a melhor solução, aliás, já adotada em muitos países, inclusive no país que sempre é tido como referência na discussão sobre o jornalismo – os EUA – é a seguinte: existem os cursos de jornalismo nas escolas, nas universidades. As entidades profissionais fazem o ranking de qualidade desses cursos, que é amplamente divulgado. Os alunos que passam pelos melhores cursos acabam sendo valorizados no mercado profissional. Apesar disso, não há Lei impedindo alguém que não tenha feito o curso oferecido nessas escolas de exercer a profissão. Isso significa que ter freqüentado cursos de jornalismo, ter diploma, não é critério para o exercício da profissão. Mas também significa, evidentemente, que as escolas de jornalismo não devem deixar de existir. Ao contrário, elas devem existir. As melhores formarão os melhores profissionais" (cf. Bernardo Kucinski e Venício A. de Lima; Diálogos da Perplexidade – reflexões sobre a mídia; Editora Fundação Perseu Abramo, 2009; p. 27).

Formação profissional

Ao longo dos últimos três anos, os fatos parecem confirmar as tendências apontadas e a posição explicitada.

Noticiou-se recentemente que "a Universidade do Colorado estuda fechar seu curso de graduação em Jornalismo para criar um programa que combine preceitos jornalísticos e de ciência da computação". O novo curso seria algo próximo de uma "graduação em mídias". Além disso, informa-se que não é só a Universidade do Colorado "que estuda mudanças drásticas na grade de Jornalismo ou até mesmo a extinção do curso. Ao menos outras trinta escolas no país, entre elas Wisconsin, Cornell, Rutgers e Berkeley, consideram modificar os cursos para que se adequem às novas tendências do mercado de trabalho".

No Brasil, aos poucos, vai desaparecendo a tradição de formação crítica e humanista das universidades públicas. Ela vem sendo substituída pelo comprometimento exclusivo com o "mercado", predominante nos cursos oferecidos nas escolas privadas. Mais recentemente identifica-se uma clara movimentação por parte de setores do empresariado tradicional de mídia no sentido de atuar diretamente na formação profissional de jornalistas.

Além do conhecido e controvertido "Master em Jornalismo" (sic), que há mais de dez anos é oferecido no Brasil em associação com a Universidade de Navarra, recentemente a Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) anunciou que iniciará, no próximo ano, cursos de graduação e pós-graduação em jornalismo. Os cursos terão a parceria do Instituto de Altos Estudos em Jornalismo (IAEJ), criado em 2010 por Roberto Civita, principal executivo do grupo Abril. A pós-graduação terá ênfase em "Direção Editorial", será coordenada pelo jornalista e professor Eugênio Bucci e, nas palavras do diretor-presidente da ESPM, deverá "aliar os valores e práticas do jornalismo independente a noções avançadas de gestão. Vamos desenvolver nos alunos a capacidade de coordenar a produção de conteúdos multimídia de qualidade" (cf. "Um impulso extra para a carreira de jornalistas" in Imprensa, nº 262, pp. 22-25).

Desafios imediatos

Não seria o caso de outros setores da sociedade – além de empresários e grupos ligados a doutrinas religiosas – também se preocuparem com a formação do profissional em "jornalismo independente"? Por exemplo, os sindicatos de trabalhadores?

A questão da obrigatoriedade ou não do diploma, inevitavelmente passará para segundo plano se considerarmos a indiscutível centralidade da mídia nas sociedades contemporâneas e a necessidade que a sociedade civil organizada tem de utilizar plenamente os enormes potenciais democratizantes que a internet oferece para tornar públicas suas posições e travar a cotidiana "batalha das idéias".

Esse é um desafio concreto e imediato que torna mais importante – e não menos – a profissão de jornalista, mas que, ao mesmo tempo, torna inevitável a rediscussão (a) das profundas transformações que ocorrem no campo das comunicações; (b) de suas implicações na redefinição do jornalismo e do jornalista profissional; e, também, (c) do que significa a conquista do pleno exercício do direito à comunicação.

Apesar de todas as paixões que o tema desperta, não podemos esquecer que mais importante do que a obrigatoriedade do diploma de jornalismo para o registro profissional é a universalização da liberdade de expressão e o aprimoramento da democracia.

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