Por Maurício Caleiro, no blog Cinema & Outras Artes:
As reações do grosso da mídia à Operação Monte Carlo, às ligações Cachoeira-Demóstenes-imprensa, e à aprovação da respectiva CPI têm apresentado características que, embora não surpreendam, suscitam preocupação e desalento.
A esperança de que as evidências de associação com o crime organizado que paira sobre setores da imprensa fosse, por sua gravidade, promover um processo de revisão de seus métodos, condutas e deontologia se dissipa ante a constatação de que omissões, distorções e um perfil marcadamente partidário de atuação continuam ditando o perfil da cobertura do tema.
Operação-abafa
Em um primeiro momento, tratou-se de abafar o caso, já que este envolvia um dos ídolos do neoudenismo midiático – e, logo se soube, a mais raivosamente antipetista das revistas semanais. Tal fase durou pouco mais de uma semana, até que o burburinho gerado na internet, somado à gravidade das acusações contra Demóstenes, fez com que parte da mídia –talvez receosa de que seu silêncio fosse interpretado como cumplicidade criminosa – passou a acompanhar o caso.
É forçoso constatar, no entanto, que isso se deu de forma relutante – ainda que sem o estardalhaço moralista costumeiro (substituído por uma prudência acusatória inaudita) e se valendo de pesos e medidas desproporcionais aos habitualmente empregados na sucessão de denúncias contra a aliança governista, a mídia teve de se resignar a entregar a cabeça do senador catão à opinião pública.
Inversão de culpa
Teve início, então, um segundo movimento, que se perpetua até os dias atuais: tentar atribuir às forças demotucanas a autoria da CPI e o ímpeto investigativo contra “mais um episódio de corrupção”. Cabe destacar dois truques baratos acoplados a tal estratégia: o primeiro é que tal caracterização, ao tipificar o mais grave caso de envolvimento da imprensa com o crime organizado como mais uma falcatrua dentre tantas, o banaliza.
Esse segundo truque combina elementos de mistificação e de total desapego aos fatos, ao classificar o escândalo Cachoeira-Demóstenes como “mais um caso de corrupção no governo petista”. Desnecessário apontar o quanto a adoção de tal estratégia - à qual incorreu inclusive um ex-jornalista de prestígio, hoje convertido em hidrófobo blogueiro corporativo – é desrespeitosa para com o leitor/cidadão, concebido como um idiota desinformado incapaz de se aperceber do absurdo de se debitar as faltas da oposição conservadoras na conta das forças governistas que se lhe opõem.
O movimento de inverter responsabilidades e confundir a opinião pública contou, no início, com o auxílio luxuoso de Fernando Henrique Cardoso, que durante dois dias monopolizou a mídia que o adora e adula com declarações de apoio à CPI. Daí em diante passou-se a bola da embromação a focas menores, na imprensa e na política – inclusive lideranças do DEM (sic) bem próximas a Demóstenes -, que continuam a empiná-la à ponta do focinho, para deleite do público cada vez menor que lhes é cativo.
Bode expiatório
Um terceiro movimento midiático visa desviar o foco da atenção, de Demóstenes para alguma figura da aliança governista. A questão, para a mídia e para a oposição, não é de escala: ou seja, não importa que as acusações contra o ex-senador do DEM tenham centenas de provas a sustentá-las, enquanto as suspeitas contra, digamos, o governador Agnelo se baseiem em escassos indícios – eles apostam que, através do seu poder de ampliação, conseguirão convencer a opinião pública de que estas são mais graves do que aquelas. Para tais forças não importará, portanto, se, após o escrutínio milimétrico dos documentos da CPI, só lambaris e agulhinhas da aliança governista caírem na rede – o trabalho da mídia e dos setores conservadores será, então, transformá-los em pirarucus e em tubarões bem mais ameaçadores do que Demóstenes.
É dentro desse diversionismo descalibrado que se inserem as tentativas recentes de associar, a priori, o governo federal (ou qualquer governo estadual da aliança capitaneada pelo PT) e a Delta, empresa envolvida em uma série de denúncias envolvendo Cachoeira na Operação Monte Carlo. E tome a enxurrada de manchetes no estilo “DEM quer investigação da Delta em todos Estados (sic)”, ontem disponibilizada no site yahoo!, ou o destaque a falas no mesmo sentido vindas de ninguém menos do que Agripino Maia.
Mais alto o coqueiro...
Soma-se a essas estratégias da mídia a tradicional técnica diversionista do assobiar para o lado e fingir que não é com ela, como exemplifica a inigualável capa da última Veja,que assegura que “Do alto tudo é melhor”. Não é preciso ser um expert em Análise do Discurso para se aperceber que se trata, naturalmente, de uma afirmação a ser entendida como uma metáfora socioeconômica e geopolítica, uma confissão de que a publicação dos Civita vê tudo pela ótica da elite predadora que ocupa o cume de nossa pirâmide social, e, por outro lado, o faz como convém aos colonizados, sob o tacão ideológico e material aos interesses da nação imperialista situada nas altas latitudes do Atlântico Norte.
O que fica claro desde já é que a mídia corporativa brasileira, seja em sua porção predominante, ideologicamente tendenciosa e useira e vezeira em verdadeiras campanhas políticas que mal se assemelham a jornalismo, seja na banda podre propriamente dita, flagrada pela Operação Monte Carlo, não está disposta em promover um mea culpa efetivo e, muito menos, em cortar na carne seu tecido necrosado, à la News of the World.
A impressão que fica é que, para além da CPI, faz-se necessária uma grande mobilização popular de pressão pela regeneração da mídia brasileira em bases republicanas e pela instauração de instrumentos efetivos de monitoração e controle - como os existentes nas principais democracias europeias -, os quais preservassem a liberdade de expressão mas coibissem a difamação e a violação da lei.
As reações do grosso da mídia à Operação Monte Carlo, às ligações Cachoeira-Demóstenes-imprensa, e à aprovação da respectiva CPI têm apresentado características que, embora não surpreendam, suscitam preocupação e desalento.
A esperança de que as evidências de associação com o crime organizado que paira sobre setores da imprensa fosse, por sua gravidade, promover um processo de revisão de seus métodos, condutas e deontologia se dissipa ante a constatação de que omissões, distorções e um perfil marcadamente partidário de atuação continuam ditando o perfil da cobertura do tema.
Operação-abafa
Em um primeiro momento, tratou-se de abafar o caso, já que este envolvia um dos ídolos do neoudenismo midiático – e, logo se soube, a mais raivosamente antipetista das revistas semanais. Tal fase durou pouco mais de uma semana, até que o burburinho gerado na internet, somado à gravidade das acusações contra Demóstenes, fez com que parte da mídia –talvez receosa de que seu silêncio fosse interpretado como cumplicidade criminosa – passou a acompanhar o caso.
É forçoso constatar, no entanto, que isso se deu de forma relutante – ainda que sem o estardalhaço moralista costumeiro (substituído por uma prudência acusatória inaudita) e se valendo de pesos e medidas desproporcionais aos habitualmente empregados na sucessão de denúncias contra a aliança governista, a mídia teve de se resignar a entregar a cabeça do senador catão à opinião pública.
Inversão de culpa
Teve início, então, um segundo movimento, que se perpetua até os dias atuais: tentar atribuir às forças demotucanas a autoria da CPI e o ímpeto investigativo contra “mais um episódio de corrupção”. Cabe destacar dois truques baratos acoplados a tal estratégia: o primeiro é que tal caracterização, ao tipificar o mais grave caso de envolvimento da imprensa com o crime organizado como mais uma falcatrua dentre tantas, o banaliza.
Esse segundo truque combina elementos de mistificação e de total desapego aos fatos, ao classificar o escândalo Cachoeira-Demóstenes como “mais um caso de corrupção no governo petista”. Desnecessário apontar o quanto a adoção de tal estratégia - à qual incorreu inclusive um ex-jornalista de prestígio, hoje convertido em hidrófobo blogueiro corporativo – é desrespeitosa para com o leitor/cidadão, concebido como um idiota desinformado incapaz de se aperceber do absurdo de se debitar as faltas da oposição conservadoras na conta das forças governistas que se lhe opõem.
O movimento de inverter responsabilidades e confundir a opinião pública contou, no início, com o auxílio luxuoso de Fernando Henrique Cardoso, que durante dois dias monopolizou a mídia que o adora e adula com declarações de apoio à CPI. Daí em diante passou-se a bola da embromação a focas menores, na imprensa e na política – inclusive lideranças do DEM (sic) bem próximas a Demóstenes -, que continuam a empiná-la à ponta do focinho, para deleite do público cada vez menor que lhes é cativo.
Bode expiatório
Um terceiro movimento midiático visa desviar o foco da atenção, de Demóstenes para alguma figura da aliança governista. A questão, para a mídia e para a oposição, não é de escala: ou seja, não importa que as acusações contra o ex-senador do DEM tenham centenas de provas a sustentá-las, enquanto as suspeitas contra, digamos, o governador Agnelo se baseiem em escassos indícios – eles apostam que, através do seu poder de ampliação, conseguirão convencer a opinião pública de que estas são mais graves do que aquelas. Para tais forças não importará, portanto, se, após o escrutínio milimétrico dos documentos da CPI, só lambaris e agulhinhas da aliança governista caírem na rede – o trabalho da mídia e dos setores conservadores será, então, transformá-los em pirarucus e em tubarões bem mais ameaçadores do que Demóstenes.
É dentro desse diversionismo descalibrado que se inserem as tentativas recentes de associar, a priori, o governo federal (ou qualquer governo estadual da aliança capitaneada pelo PT) e a Delta, empresa envolvida em uma série de denúncias envolvendo Cachoeira na Operação Monte Carlo. E tome a enxurrada de manchetes no estilo “DEM quer investigação da Delta em todos Estados (sic)”, ontem disponibilizada no site yahoo!, ou o destaque a falas no mesmo sentido vindas de ninguém menos do que Agripino Maia.
Mais alto o coqueiro...
Soma-se a essas estratégias da mídia a tradicional técnica diversionista do assobiar para o lado e fingir que não é com ela, como exemplifica a inigualável capa da última Veja,que assegura que “Do alto tudo é melhor”. Não é preciso ser um expert em Análise do Discurso para se aperceber que se trata, naturalmente, de uma afirmação a ser entendida como uma metáfora socioeconômica e geopolítica, uma confissão de que a publicação dos Civita vê tudo pela ótica da elite predadora que ocupa o cume de nossa pirâmide social, e, por outro lado, o faz como convém aos colonizados, sob o tacão ideológico e material aos interesses da nação imperialista situada nas altas latitudes do Atlântico Norte.
O que fica claro desde já é que a mídia corporativa brasileira, seja em sua porção predominante, ideologicamente tendenciosa e useira e vezeira em verdadeiras campanhas políticas que mal se assemelham a jornalismo, seja na banda podre propriamente dita, flagrada pela Operação Monte Carlo, não está disposta em promover um mea culpa efetivo e, muito menos, em cortar na carne seu tecido necrosado, à la News of the World.
A impressão que fica é que, para além da CPI, faz-se necessária uma grande mobilização popular de pressão pela regeneração da mídia brasileira em bases republicanas e pela instauração de instrumentos efetivos de monitoração e controle - como os existentes nas principais democracias europeias -, os quais preservassem a liberdade de expressão mas coibissem a difamação e a violação da lei.
1 comentários:
Gostaria de observar, a respeito do rápido aceite da oposição para criar a CPI do Cachoeira, que existe um número limite de CPIs que podem ser instaladas por ano, e que este ano só mais uma CPI poderia ser instalada, então existia uma escolha: ou a CPI do Serra (Privataria Tucana) ou a CPI do Cachoeira (com o Demóstenes).
Logo se vê o porque da escolha da própria mídia-empresa de falar sobre a criação da CPI do Cachoeira... assim a oposiçao e a mídia-empresa podem ficar calados sobre a CPI do Serra, que no mínimo foi adiada para o próximo ano.
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