quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Trabalho escravo e a promessa de Dilma

Por Leonardo Sakamoto, em seu blog:

A Zara obteve uma decisão judicial provisória para não ser incluída na “lista suja” do trabalho escravo. A empresa foi responsabilizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego por conta de um resgate de trabalhadores em uma oficina que produzia roupas para ela no ano passado. A Advocacia Geral da União está recorrendo da decisão.


A MRV Engenharia foi incluída na “lista suja” do trabalho escravo por conta da libertação de 68 trabalhadores de duas de suas obras em Americana e Bauru, interior de São Paulo, e de mais 11 sob a responsabilidade da Prime Incorporações, em Aparecida de Goiânia (GO) – que pertence ao seu grupo. A empresa tentou uma liminar para sair da lista, mas a Justiça do Trabalho da 10a Região negou-a.

Ambas as empresas devem bater na porta do governo federal para pedir um acordo semelhante ao que beneficiou à gigante do açúcar e álcool Cosan, que não retornou para a “lista suja”, na qual havia sido inserida. O acordo foi concebido durante o governo Lula a pedido do próprio Palácio do Planalto. Na época, o então ministro-chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vannuchi, e o ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, foram contra o “perdão”. Mas Luís Inácio Adams, à frente da AGU, manteve o acerto. Pegava mal para o Planalto, que se empenhara em organizar o Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Cana-de-Açúcar, visando promover a imagem do etanol dentro e fora do país, ter a maior empresa nacional do setor em uma lista de escravagistas.

Contudo, a pressão da imprensa e da sociedade civil por conta desse acordão foi tão forte que levou Dilma Rousseff a ordenar que nenhum outro fosse costurado sob o seu governo. Em 2011, José Lopez Feijóo, assessor da secretaria geral da Presidência da República, hoje encabeçada pelo ministro Gilberto Carvalho, em reunião com a Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo e a ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos, trouxe a garantia disso da própria Dilma Rousseff.

Com exceção do caso Cosan, a Advocacia Geral da União tem sido célere e competente em defender a “lista suja” diante de ações judiciais que tentam minar um dos principais instrumentos de combate ao trabalho escravo, usada para cortar relações comerciais e financiamentos públicos e privados. E, até onde pude verificar, não há disposição da AGU em aceitar novos acordos.

Toda empresa tem o direito de entrar na Justiça caso se sinta prejudicada em uma fiscalização. Cabe ao Poder Judiciário decidir e ao governo federal defender suas ações. Quando o governo deixa de exercer o papel a que está incumbido, abrindo mão de seus instrumentos de controle, fica a dúvida: por que?

Nas próximas semanas, saberemos se Dilma manteve o seu compromisso de não permitir acordos, mesmo com pressões crescentes de setores, como a construção civil, o sucroalcooleiro e o têxtil. Que, vez ou outra, batem nas portas do Ministério do Trabalho e Emprego, através de refinados advogados que pedem a exclusão de nomes da lista – isso quando a solicitação não vem na forma de fogo-amigo. Ou se resolveu agradar as empresas.

Escravos foram encontrados em obras do Minha Casa, Minha Vida, do Luz para Todos e do Programa de Aceleração do Crescimento. Considerando que há dúvidas se o Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Indústria da Construção, lançado pelo governo neste ano, será capaz de melhorar a qualidade de vida do trabalhador, o caminho deveria ser fortalecer as ações de fiscalização e de transparência (como a “lista suja”) e não o contrário.

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