Por Juliana Sada, no blog Escrevinhador:
Instalada em março de 2012, a Comissão da Verdade de São Paulo realizou uma audiência pública nesta segunda-feira, 18. Sob o tema “Relação entre FIESP e Consulado dos EUA com ditadura militar”, a audiência mostrou o resultado de pesquisas realizadas em documentos do Arquivo do Estado de São Paulo e ouviu sindicalistas e operários que foram perseguidos durante o regime militar.
A Comissão da Verdade, batizada de Rubens Paiva, analisou seis livros de registro de visitantesdo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) de São Paulo, um dos principais órgãos de repressão da ditadura. Os livros listam a entrada de funcionários graduados, como delegados, e de visitantes, entre os anos 71 e 79, sempre registrando a ocupação e os horários de entrada e saída. Apesar de haver lacunas em relação a alguns meses, os livros trouxeram novos dados aos membros da Comissão por evidenciar a frequência e as circunstâncias em que determinadas pessoas visitavam o DOPS.
Com base nessa pesquisa, a Comissão anunciou que irá pedir explicações ao Consulado dos Estados Unidos em São Paulo e à Fiesp (Federação das indústrias do estado de São Paulo) sobre suas relações com o DOPS. Ivan Seixas, membro da Comissão, afirmou que “será um questionamento para saber quem são essas pessoas e o que faziam lá”.
Mr. Halliwell
Outro frequentador assíduo do DOPS era Geraldo Resende de Matos (ou Mattos, a grafia varia nos registros), identificado como “Fiesp”. Há muitos registros sem horário de saída de Matos ou com horário de saída no dia seguinte, indicando permanências de mais de 12 horas no DOPS. Somente no ano de 71, há cerca de 50 visitas de Matos ao Departamento, sendo que há apenas o registro de dez meses desse ano. Estima-se que ele tenha frequentado o Departamento até o ano de 78 ou 79. Ao jornal Estadão, a Fiesp afirmou que Geraldo Resende de Matos nunca fez parte do seu quadro de funcionários.
Durante a audiência, a relação entre o empresariado e a ditadura foi abordada também por ex-operários que foram perseguidos pelo regime militar. Os trabalhadores apresentaram relatos da existência de uma lista negra, que indicava quem não deveria ser contratado, e mostraram documentos que indicam que os empresários entregavam aos órgãos de repressão informações sobre seus funcionários envolvidos em greves e há, incluso, pedidos de empresas para que se investiguem seus trabalhadores.
O ex-metalúrgico e deputado estadual José Zico Prado, do PT, relatou que após sua prisão não conseguiu permanecer mais que alguns meses em nenhum emprego, sempre sendo demitido. “Só consegui emprego quando fui para outro setor [que não a metalurgia]”, afirma Prado, que relata ainda que diversos líderes sindicais que faziam parte das negociações coletivas com a Fiesp também encontravam dificuldade de conseguir emprego. O sindicalista e ex-metalúrgico Waldemar Rossi apresentou a pesquisa realizada pelo grupo Oposição Metalúrgica sobre a perseguição aos operários, em que se reuniu documentos como a lista negra das indústrias do ABC e as fichas dos funcionários enviadas ao DOPS. Rossi entregou o material aos membros da Comissão da Verdade com o pedido que se analise os casos apresentados.
Outra descoberta feita durante a análise dos livros de registro foi a relação entre o DOPS e a Operação Bandeirante (Oban), centro de investigação e repressão ilegal montado pelos militares em 69. Ivan Seixas explica que havia a percepção que existia uma separação entre os dois centros repressivos por um ser civil e outro militar. Entretanto, os livros de registro revelaram que era constante a presença de membros da Oban no DOPS, que “tinha um papel fundamental de articulador”, analisa. “Os dois [órgãos] se entendiam, se entendiam muito”, conclui.
Durante o mês de fevereiro, a Comissão da Verdade Estadual realizará uma série de audiências públicas para analisar casos específicos de mortos e desaparecidos durante a ditadura militar. Confira abaixo o cronograma de audiências, realizadas na Assembleia Legislativa de São Paulo.
21/2 – 10h – Caso Edgar Aquino Duarte – Auditório Teotônio Vilela (1º andar);
21/2 – 14h – Caso Dênis Casemiro – Auditório Teotônio Vilela (1º andar);
25/2 – 10h – Casos Ablilio Clemente Filho e Aluísio Palhano Pedreira Ferreira – Auditório Teotônio Vilela (1º andar);
26/2 – 10h – Casos Honestino Monteiro Guimarães, José Maria Ferreira Araújo e Paulo Stuart Wright – Auditório Teotônio Vilela (1º andar);
27/2 – 10h – Casos Luiz Almeida Araújo, Issami Nakamura Okano – Auditório Teotônio Vilela (1º andar);
28/2 – 10h – Casos Davi Capistrano, Elson Costa, Hiram de Lima Pereira, João Massena Melo, José Montenegro de Lima, José Roman, Luiz Ignácio Maranhão Filho, Nestor Vera e Walter de Souza Ribeiro – Auditório Teotônio Vilela (1º andar).
Instalada em março de 2012, a Comissão da Verdade de São Paulo realizou uma audiência pública nesta segunda-feira, 18. Sob o tema “Relação entre FIESP e Consulado dos EUA com ditadura militar”, a audiência mostrou o resultado de pesquisas realizadas em documentos do Arquivo do Estado de São Paulo e ouviu sindicalistas e operários que foram perseguidos durante o regime militar.
A Comissão da Verdade, batizada de Rubens Paiva, analisou seis livros de registro de visitantesdo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) de São Paulo, um dos principais órgãos de repressão da ditadura. Os livros listam a entrada de funcionários graduados, como delegados, e de visitantes, entre os anos 71 e 79, sempre registrando a ocupação e os horários de entrada e saída. Apesar de haver lacunas em relação a alguns meses, os livros trouxeram novos dados aos membros da Comissão por evidenciar a frequência e as circunstâncias em que determinadas pessoas visitavam o DOPS.
Com base nessa pesquisa, a Comissão anunciou que irá pedir explicações ao Consulado dos Estados Unidos em São Paulo e à Fiesp (Federação das indústrias do estado de São Paulo) sobre suas relações com o DOPS. Ivan Seixas, membro da Comissão, afirmou que “será um questionamento para saber quem são essas pessoas e o que faziam lá”.
Mr. Halliwell
No caso dos Estados Unidos, registrou-se a presença constante no DOPS de Claris Rowley Halliwell, que se apresentava como cônsul. Seixas explica que nos livros há registros de visitas de membros consulares de alguns países, entretanto “não tem outro consulado que tenha uma presença tão constante nos documentos”. Muitos dos registros de Halliwell não possuem horário de saída, indicando que teria permanecido até após às 22h, horário em que as anotações deixavam de ser efetuadas.
Entre os casos analisados, Seixas destaca a coincidência entre a visita de Halliwell e a prisão e tortura de Devanir José de Carvalho, dirigente do MRT (Movimento Revolucionário Tiradentes). Carvalho foi preso no dia cinco de abril de 71 e torturado por três dias, até ser morto. No dia cinco, registra-se a entrada de Halliwell ao meio dia mas não há horário de saída. Ivan Seixas, que ficou preso no DOPS durante a ditadura, explica que as torturas comumente ocorriam durante a noite e a madrugada e que os gritos dos torturados podiam ser escutados no prédio inteiro. Assim que Seixas considera essencial que “seja explicado para o Brasil o que um representante diplomático fazia num local em que ocorria tortura. Em um grau mínimo ele escutou e se omitiu e, em um grau máximo, imaginem o que quiser…”.
Empresários e repressão
Entre os casos analisados, Seixas destaca a coincidência entre a visita de Halliwell e a prisão e tortura de Devanir José de Carvalho, dirigente do MRT (Movimento Revolucionário Tiradentes). Carvalho foi preso no dia cinco de abril de 71 e torturado por três dias, até ser morto. No dia cinco, registra-se a entrada de Halliwell ao meio dia mas não há horário de saída. Ivan Seixas, que ficou preso no DOPS durante a ditadura, explica que as torturas comumente ocorriam durante a noite e a madrugada e que os gritos dos torturados podiam ser escutados no prédio inteiro. Assim que Seixas considera essencial que “seja explicado para o Brasil o que um representante diplomático fazia num local em que ocorria tortura. Em um grau mínimo ele escutou e se omitiu e, em um grau máximo, imaginem o que quiser…”.
Empresários e repressão
Outro frequentador assíduo do DOPS era Geraldo Resende de Matos (ou Mattos, a grafia varia nos registros), identificado como “Fiesp”. Há muitos registros sem horário de saída de Matos ou com horário de saída no dia seguinte, indicando permanências de mais de 12 horas no DOPS. Somente no ano de 71, há cerca de 50 visitas de Matos ao Departamento, sendo que há apenas o registro de dez meses desse ano. Estima-se que ele tenha frequentado o Departamento até o ano de 78 ou 79. Ao jornal Estadão, a Fiesp afirmou que Geraldo Resende de Matos nunca fez parte do seu quadro de funcionários.
Durante a audiência, a relação entre o empresariado e a ditadura foi abordada também por ex-operários que foram perseguidos pelo regime militar. Os trabalhadores apresentaram relatos da existência de uma lista negra, que indicava quem não deveria ser contratado, e mostraram documentos que indicam que os empresários entregavam aos órgãos de repressão informações sobre seus funcionários envolvidos em greves e há, incluso, pedidos de empresas para que se investiguem seus trabalhadores.
O ex-metalúrgico e deputado estadual José Zico Prado, do PT, relatou que após sua prisão não conseguiu permanecer mais que alguns meses em nenhum emprego, sempre sendo demitido. “Só consegui emprego quando fui para outro setor [que não a metalurgia]”, afirma Prado, que relata ainda que diversos líderes sindicais que faziam parte das negociações coletivas com a Fiesp também encontravam dificuldade de conseguir emprego. O sindicalista e ex-metalúrgico Waldemar Rossi apresentou a pesquisa realizada pelo grupo Oposição Metalúrgica sobre a perseguição aos operários, em que se reuniu documentos como a lista negra das indústrias do ABC e as fichas dos funcionários enviadas ao DOPS. Rossi entregou o material aos membros da Comissão da Verdade com o pedido que se analise os casos apresentados.
Outra descoberta feita durante a análise dos livros de registro foi a relação entre o DOPS e a Operação Bandeirante (Oban), centro de investigação e repressão ilegal montado pelos militares em 69. Ivan Seixas explica que havia a percepção que existia uma separação entre os dois centros repressivos por um ser civil e outro militar. Entretanto, os livros de registro revelaram que era constante a presença de membros da Oban no DOPS, que “tinha um papel fundamental de articulador”, analisa. “Os dois [órgãos] se entendiam, se entendiam muito”, conclui.
Durante o mês de fevereiro, a Comissão da Verdade Estadual realizará uma série de audiências públicas para analisar casos específicos de mortos e desaparecidos durante a ditadura militar. Confira abaixo o cronograma de audiências, realizadas na Assembleia Legislativa de São Paulo.
21/2 – 10h – Caso Edgar Aquino Duarte – Auditório Teotônio Vilela (1º andar);
21/2 – 14h – Caso Dênis Casemiro – Auditório Teotônio Vilela (1º andar);
25/2 – 10h – Casos Ablilio Clemente Filho e Aluísio Palhano Pedreira Ferreira – Auditório Teotônio Vilela (1º andar);
26/2 – 10h – Casos Honestino Monteiro Guimarães, José Maria Ferreira Araújo e Paulo Stuart Wright – Auditório Teotônio Vilela (1º andar);
27/2 – 10h – Casos Luiz Almeida Araújo, Issami Nakamura Okano – Auditório Teotônio Vilela (1º andar);
28/2 – 10h – Casos Davi Capistrano, Elson Costa, Hiram de Lima Pereira, João Massena Melo, José Montenegro de Lima, José Roman, Luiz Ignácio Maranhão Filho, Nestor Vera e Walter de Souza Ribeiro – Auditório Teotônio Vilela (1º andar).
1 comentários:
Duvido muito que isso irá sair nas páginas do Globo ou nas notícias do Jornal Nacional. Lá só anda saindo matéria sobre traidores de revoluções financiados por agentes do neoliberalismo... Gostei de saber que a comissão da verdade já está atuando a mil por hora. Queremos esclarecimentos já!
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