Por João Paulo Cunha, no jornal Brasil de Fato:
O recente afastamento de José Serra do governo não eleito por motivos de saúde foi interpretado por alguns analistas como um episódio que carregava também motivações políticas e emocionais. No que diz respeito à saúde pessoal, os votos são de melhoras e de um acompanhamento médico ético e respeitoso. Fora do governo, Serra tem condições de melhorar a saúde, o que é bom. Sem Serra nas relações exteriores, a saúde diplomática do país só tem a ganhar, o que é promissor.
O que passa a ganhar interesse público a partir de agora é a consequência do ato. Ao deixar o Ministério das Relações Exteriores, no qual se esforçou para reduzir a altivez alcançada pelo Brasil nos últimos anos, Serra parece sinalizar para uma fratura no bloco do poder. Mas é sempre bom lembrar que em sua gestão ele imprimiu uma ação menor, sempre submissa aos países ditos centrais e aos interesses do capital internacional em matéria de comércio e exploração das riquezas nacionais. Essa direção não deve se alterar, o que indica motivações pessoais no gesto.
No campo político, a atitude significa uma torção do interesse público às ambições pessoais. Todos sabem que Serra tem anseios maiores e que sua opção desde o início da aventura golpista se dirigia para pastas mais influentes. Não foi um acaso que sua atuação como incentivador do entreguismo das riquezas brasileiras tenha reforçado a dimensão econômica do ministério. Ao mesmo tempo, virava as costas para o caminho trilhado com êxito em direção a um novo concerto multilateral.
A substituição de Serra por outra plumagem do mesmo partido – como também deve ocorrer na pasta da Justiça –, vai consagrando uma divisão de tarefas sórdida. De um lado a ideologia neoliberal extrema dos tucanos dá as cartas, de outro o pragmatismo sem ética do peemedebismo viabiliza o jogo. Todas as ações voltadas para a desmontagem do estado social, para a entrega do patrimônio nacional e para o extermínio das conquistas da Constituição de 1988 não são tiros dados a esmo, mas componentes de um programa antipopular orgânico, jamais bancado pelas urnas.
O sucesso da arquitetura do golpe foi substituir a legitimidade da democracia direta e de seus instrumentos pela composição de uma base parlamentar venal. O que os tucanos tecem em seus ninhos ideológicos, os peemedebistas e acólitos bancam em votações dirigidas. Neste sentido, Temer mantém a postura dúbia de fiador e síndico de um poder que não emana de seus projetos, mas que só se concretiza por meio de sua ação e de sua base de apoio. O parlamento deixa de ser uma casa do diálogo para se configurar como um cartório. Sai a palavra, entra o carimbo.
Mas a renúncia de Serra tem ainda um componente simbólico forte. O ex-chanceler, pelo que noticiaram comentaristas próximos ao poder, estava, além de desgastado fisicamente, padecendo de depressão. Parte vinha da ausência de protagonismo, parte de um real déficit de vitalidade em razão das críticas que se avolumavam em torno de sua atuação. Serra tem motivo para se deprimir. Fez um péssimo trabalho, rebaixou o Brasil no contexto internacional e retirou da diplomacia brasileira a elegância. É bom ficar atento a esse sinal. Os tristes decaem.
O momento por que passa o país, com o risco de naturalização do atraso, tem servido para ampliar a perda de vitalidade dos que se contrapõem ao poder do arbítrio. Pior que a ditadura é a ditadura sem oposição enérgica. Além de restabelecer a força dos argumentos, a defesa de valores e a mobilização popular, cabe aos cidadãos que se identificam na luta contra o poder sem legitimidade, preservar a cota necessária de esperança e, por que não, de alegria. Este não é um desafio menor.
Deixemos a depressão para os inimigos do povo. O futuro precisa ser desenhado na luta ferrenha e destemida. Deve ainda ser provida de força política, mobilização popular e disposição para conhecer melhor a realidade e propor alternativas consequentes de transformação. Interpretar para mudar o mundo. Mas os novos dias devem ser alimentados em doses poderosas pela felicidade do encontro e pela esperança de justiça social. A revolução, como a alegria, é a prova dos nove.
O recente afastamento de José Serra do governo não eleito por motivos de saúde foi interpretado por alguns analistas como um episódio que carregava também motivações políticas e emocionais. No que diz respeito à saúde pessoal, os votos são de melhoras e de um acompanhamento médico ético e respeitoso. Fora do governo, Serra tem condições de melhorar a saúde, o que é bom. Sem Serra nas relações exteriores, a saúde diplomática do país só tem a ganhar, o que é promissor.
O que passa a ganhar interesse público a partir de agora é a consequência do ato. Ao deixar o Ministério das Relações Exteriores, no qual se esforçou para reduzir a altivez alcançada pelo Brasil nos últimos anos, Serra parece sinalizar para uma fratura no bloco do poder. Mas é sempre bom lembrar que em sua gestão ele imprimiu uma ação menor, sempre submissa aos países ditos centrais e aos interesses do capital internacional em matéria de comércio e exploração das riquezas nacionais. Essa direção não deve se alterar, o que indica motivações pessoais no gesto.
No campo político, a atitude significa uma torção do interesse público às ambições pessoais. Todos sabem que Serra tem anseios maiores e que sua opção desde o início da aventura golpista se dirigia para pastas mais influentes. Não foi um acaso que sua atuação como incentivador do entreguismo das riquezas brasileiras tenha reforçado a dimensão econômica do ministério. Ao mesmo tempo, virava as costas para o caminho trilhado com êxito em direção a um novo concerto multilateral.
A substituição de Serra por outra plumagem do mesmo partido – como também deve ocorrer na pasta da Justiça –, vai consagrando uma divisão de tarefas sórdida. De um lado a ideologia neoliberal extrema dos tucanos dá as cartas, de outro o pragmatismo sem ética do peemedebismo viabiliza o jogo. Todas as ações voltadas para a desmontagem do estado social, para a entrega do patrimônio nacional e para o extermínio das conquistas da Constituição de 1988 não são tiros dados a esmo, mas componentes de um programa antipopular orgânico, jamais bancado pelas urnas.
O sucesso da arquitetura do golpe foi substituir a legitimidade da democracia direta e de seus instrumentos pela composição de uma base parlamentar venal. O que os tucanos tecem em seus ninhos ideológicos, os peemedebistas e acólitos bancam em votações dirigidas. Neste sentido, Temer mantém a postura dúbia de fiador e síndico de um poder que não emana de seus projetos, mas que só se concretiza por meio de sua ação e de sua base de apoio. O parlamento deixa de ser uma casa do diálogo para se configurar como um cartório. Sai a palavra, entra o carimbo.
Mas a renúncia de Serra tem ainda um componente simbólico forte. O ex-chanceler, pelo que noticiaram comentaristas próximos ao poder, estava, além de desgastado fisicamente, padecendo de depressão. Parte vinha da ausência de protagonismo, parte de um real déficit de vitalidade em razão das críticas que se avolumavam em torno de sua atuação. Serra tem motivo para se deprimir. Fez um péssimo trabalho, rebaixou o Brasil no contexto internacional e retirou da diplomacia brasileira a elegância. É bom ficar atento a esse sinal. Os tristes decaem.
O momento por que passa o país, com o risco de naturalização do atraso, tem servido para ampliar a perda de vitalidade dos que se contrapõem ao poder do arbítrio. Pior que a ditadura é a ditadura sem oposição enérgica. Além de restabelecer a força dos argumentos, a defesa de valores e a mobilização popular, cabe aos cidadãos que se identificam na luta contra o poder sem legitimidade, preservar a cota necessária de esperança e, por que não, de alegria. Este não é um desafio menor.
Deixemos a depressão para os inimigos do povo. O futuro precisa ser desenhado na luta ferrenha e destemida. Deve ainda ser provida de força política, mobilização popular e disposição para conhecer melhor a realidade e propor alternativas consequentes de transformação. Interpretar para mudar o mundo. Mas os novos dias devem ser alimentados em doses poderosas pela felicidade do encontro e pela esperança de justiça social. A revolução, como a alegria, é a prova dos nove.
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