Miriam e Moro: na mídia brasileira, esta cena é normal |
Depois do depoimento de Lula a Sérgio Moro, a Rede Globo subiu um patamar na escalada do massacre midiático.
Agregou à estratégia da meia verdade a divulgação de mentiras completas.
A meia verdade pode ser também uma meia mentira, mas, em geral, ela tem um formato que faz parecer coisa séria.
E dá uma porta de saída ao jornalista mentiroso: ele pode dizer que o que disse ou escreve é fato.
Só não disse tudo, mas o que relatou é um fato.
Por exemplo: o caso do tríplex, o centro da acusação que levou o ex-presidente da República a depor em Curitiba.
É fato que a OAS tentou entregar o imóvel para Marisa Letícia Lula da Silva e Lula.
Este é o fato que se vê todos os dias na televisão.
Faz sentido à tese de que o tríplex era propina.
Mas há outros fatos, e estes não são divulgados, porque enfraquecem a tese da propina.
Marisa tinha iniciado o processo de aquisição do imóvel em abril de 2005, com o pagamento de entrada e parcelas, referentes à cota-parte.
Ela pagou à Bancoop um valor que, corrigido, ultrapassa os 300 mil reais.
Isso está declarado no imposto de renda do casal Lula e Marisa.
O imóvel só passou a pertencer à OAS quando a Bancoop quebrou, em 2009.
Também é fato que a OAS, quando entrou em dificuldade e abriu um processo de recuperação judicial, relacionou o tríplex do Guarujá como propriedade dela, para a garantia dos credores.
Como a empresa relacionaria o tríplex se ele não lhe pertencesse?
Isso não se divulga, porque enfraquece a tese do tríplex como propina.
A notícia que é martelada todos os dias é: Lula recebeu como propina um imóvel da OAS.
É uma mentira, mas há um fato que a esconde: o empenho da OAS para vender o imóvel a Lula e Marisa.
Por isso, no conjunto, o que se divulga é meia verdade.
Hoje, o Bom Dia Brasil passou para a mentira integral.
Ao chamar Miriam Leitão para comentar o depoimento de Lula – ela não fala mais apenas sobre economia, mas também sobre assuntos jurídicos –, a apresentadora Ana Paula deu o tom, ao dizer que o ex-presidente, “com um discurso político, tentou ESCAPAR das acusações”.
Escapar é verbo que já condena Lula. Mas o que disse Miriam é pior:
- A negativa de Lula no caso central, a compra do tríplex, não responde a vários pontos que ficaram nebulosos e permanecem nebulosos. O mais importante é: por que ele não desistiu ou a família não desistiu quando a OAS abriu essa possibilidade, para todos os compradores em 2011? E se desistiu, por que é que não pediu de volta os 209 mil reais que a família pagou?
Se Miriam Leitão, que fez fama como comentarista de economia tivesse se prendido à sua área, ela mesma daria a resposta: Marisa comprou uma cota-parte – não o imóvel – e, portanto, era um investimento, que, como tal, se valoriza.
Qualquer pessoa pode deixar sua cota parte lá e, quando lhe for conveniente, resgatar.
Miriam errou ao dizer que a OAS ofereceu a possibilidade de desistência em 2011.
Não foi em 2011, foi em 2009, erros assim acontecem.
Mas mentiu ao dizer que a família não pediu o dinheiro de volta.
Existe uma ação em São Paulo na qual Marisa cobra da Bancoop e da OAS o valor investido.
Era 209 mil reais em 2009. Hoje é R$ 300,8 mil. O processo está na 34ª Vara Cível.
Para revelar a farsa da acusação do tríplex como propina, Miriam Leitão também poderia se valer de seus conhecimentos sobre economia.
O tríplex, além de ser oferecido como garantia no processo de recuperação judicial da OAS, também foi relacionado pela empresa para garantir uma operação de emissão de debêntures – através dessa operação, a construtora captou recursos no mercado.
A OAS ofereceria o tríplex como garantia da dívida se ele pertencesse a Lula e Marisa?
Que tipo de propina é essa?
Se Miriam dissesse isso na Globo, explicando o que é debênture e o processo de recuperação judicial, ela desmontaria o teatro do Lula ladrão, mas, nesse caso, já não seria chamada nem para comentar sobre culinária no programa de Ana Maria Braga.
Na GloboNews, o Festival de Besteiras que Assola o País nunca desliga.
Gerson Camarotti, para sustentar o comentário de que Lula orientou o ex-diretor da Petrobras a destruir provas, diz que, depois da conversa de Lula com Duque, este transferiu o dinheiro da Suíça para Mônaco.
Ora, Duque disse no depoimento a Moro que transferiu o dinheiro porque foi obrigado, não por Lula, mas pelo banco na Suíça - possivelmente em razão do fato de que seu nome já estava relacionado ao escândalo de corrupção.
Camarotti pode ter errado porque não viu na íntegra o depoimento de Renato Duque a Moro, mas não corre risco de perder o emprego por essa mentira.
Afinal, o erro foi contra o Lula. Se fosse a favor, pobre Camarotti.
O que a Globo faz hoje é jornalismo de guerra e isso pode ser tudo, menos jornalismo.
Mas ele segue adiante e, para que atinja seus fins, precisa de assassinos de reputação.
É nítido que o prestígio de Camarotti na GloboNews tem aumentado, mas, nesse papel, ninguém supera a mãe de um dos biógrafos de Sérgio Moro.
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