Foto: Ricardo Stuckert |
A teoria de que os Estados Unidos da América atuaram ativamente na implantação e sustentação das ditaduras que assombraram a América Latina no século XX deixou de ser uma teoria faz muito tempo, dadas as evidências disponíveis sobre o assunto.
Leia, a título de exemplo, esta matéria de 2007 – da insuspeita IstoÉ – sobre a participação dos EUA no golpe de 64. Os detalhes da participação do Tio Sam na organização das Marchas da Família com Deus Pela Liberdade – as micaretas coxinhas de antigamente – foram fornecidos pelo próprio governo americano, por meio de documentos secretos desclassificados.
O tempo passou e o custo político de bancar golpes militares – e seus costumeiros tanques nas ruas, perseguições, torturas e mortes de opositores – foi ficando cada vez maior. Isso se deve à globalização, à instantaneidade das comunicações proporcionada pela internet e à evolução de consciência da humanidade, traumatizada com as guerras e ditaduras sangrentas tão tristemente corriqueiras na história da nossa espécie.
Os EUA passaram, então, a adotar outro tipo de tática – mais limpinha, digamos assim – para interferir em governos ao redor do planeta, sempre visando manter a sua hegemonia política, econômica e ideológica. Trata-se da guerra híbrida.
O golpe de 2016 no Brasil é um belo exemplo deste novo tipo de guerra, caracterizado por métodos não convencionais de interferência política. A manipulação da opinião pública, expediente largamente utilizado em 64, sofisticou-se, apesar de manter o foco no mesmo anticomunismo tosco – e agora absolutamente anacrônico – do século passado. Já os militares foram substituídos pelo Judiciário, poder historicamente antidemocrático, conservador e subserviente ao capital, para que haja um certo verniz de legalidade sobre as ações autoritárias. A Justiça, sob a proteção dos oligopólios de mídia, tem carta branca para perseguir os líderes políticos que desagradam o império, distorcendo à vontade a Constituição e as leis do país.
A perseguição judicial a três ex-presidentes latino-americanos do campo da esquerda insere-se neste contexto de sofisticação das estratégias imperialistas dos EUA.
Lula está preso sem provas para que não possa participar da próxima eleição presidencial brasileira.
Cristina Kirchner e agora também Rafael Correa, que também pretendem candidatar-se novamente para a presidência, tiveram ordens de prisão expedidas contra si pelos sistemas de justiça da Argentina e do Equador, respectivamente.
Diante dos fatos históricos e da simples lógica – é evidente que não cessaria, de uma hora para a outra, a fome de poder dos EUA, o império dos nossos tempos -, fica claro que a perseguição a Lula, Correa e Kirchner é parte da nova ofensiva do imperialismo sobre a América do Sul.
Você pode, entretanto, acreditar que tudo não passa de uma grande coincidência, que são apenas políticos corruptos – todos de esquerda e não alinhados aos EUA, coincidentemente – sendo enquadrados pelo imaculado Judiciário de seus países. A cegueira ideológica e a desonestidade intelectual não são, felizmente, consideradas crimes.
Em tempo: a sofisticação dos métodos imperialistas às vezes não é suficiente para arrefecer o gostinho por dinheiro, poder e sangue do império do norte, como demonstram, por exemplo, a guerra do Iraque, empreendida contra toda a opinião pública mundial e sob uma desculpa que provou-se ser, de fato, apenas uma desculpa, e a recentíssima notícia de que Trump sugeriu diversas vezes – uma delas em púbico – que os EUA invadissem militarmente a Venezuela.
A Venezuela, aliás, é outro país rico em petróleo, assim como o Iraque, a Líbia e o Brasil. Se você quiser acreditar que é apenas mais uma coincidência, fique à vontade.
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