Por Laurindo Lalo Leal Filho, na Rede Brasil Atual:
Até a semana passada programas de rádio e TV, jornalísticos ou não, e manchetes de jornais e revistas abriam grandes espaços para o caso Neymar-Najila. Espaços até então ocupados por malabarismos para justificar as ações de um governo tresloucado cederam lugar a um tema de folhetim. Nada melhor para segurar uma audiência do que juntar num só enredo fama, dinheiro, violência, sexo e traição. Tudo isso, é claro, travestido de jornalismo.
A linha editorial era clara. Salvar a galinha de ouro oferecida pela publicidade em torno do jogador, importante fonte de receita das empresas de comunicação, especialmente da Globo. Para isso o noticiário foi alimentado por vazamentos vindos de um inquérito sigiloso. Nada incomum nas relações público-privadas existentes no pais. A mídia corporativa, com esse caso, seguia ditando a pauta dos assuntos nacionais. De repente, depois de muito tempo, o jogo mudou.
O furo do The Intercept da tarde do domingo, 9 de junho, criou uma nova pauta para o país, livre das ingerências da mídia corporativa deixando os “senhores da verdade” midiáticos desconcertados. Na política, até então, o conluio mídia-lavajato seguia de vento em popa. Para não escapar da metáfora futebolística antiga, realizavam tabelinhas dignas da dupla Pelé-Coutinho.
O lançamento era feito em Curitiba e o gol no Rio de Janeiro, espalhando-se por todo o Brasil. Com as revelações daquele domingo as jogadas foram interrompidas. Seus autores perderam o poder da iniciativa e foram obrigados a reagir, o fazendo de forma atabalhoada inicialmente.
Aos poucos afinaram o discurso e sem poder criticar a mensagem, autenticada por seus autores, passaram a atacar os mensageiros e suas atitudes. Falaram até em “hackers” que teriam invadido o serviço de mensagens Telegram, controlado por cidadãos russos, sediado em Dubai. O jornalista Pepe Escobar, especializado em geopolítica, obteve uma declaração formal dos responsáveis pelo serviço de que não houve qualquer “raqueamento” no Telegram.
A tentativa seguinte foi de desacreditar a revista eletrônica, tratando-a como site ou blogue, forma ridícula de reduzir a sua credibilidade. No fundo, revelou apenas a profundidade do golpe sofrido. Trincou a verdade auto-proclamada da supremacia do que chamam de “jornalismo profissional”, uma atividade pretensamente praticada por seres de virtuosos, postados acima das paixões humanas, incluídas aí as preferências político-partidárias.
Vícios que, para eles, são privilégios das redes digitais, particularmente dos “blogues sujos”, como os definiu um político agora no ostracismo.
Além da tentativa de desqualificar o veículo buscou-se a desqualificação do seu principal responsável, Glenn Greenwald. Até a sua condição de jornalista foi contestada por um comentarista de rádio, numa clamorosa distorção de informações. Dos jornalistas brasileiros, porta-vozes dos seus patrões, talvez nenhum possa apresentar um currículo comparável com o do editor do The Intercept.
Para ser breve, Greenwald é advogado especializado em questões de direito constitucional e civil nos Estados Unidos, trabalhou para o jornal The Guardian, de Londres; ganhou, entre outros, o Prêmio Esso de Reportagem por artigos publicados no jornal O Globo sobre a espionagem estadounidense no Brasil e o Pulitzer por reportagens, também sobre espionagem, publicados no Guardian.
Apesar da fragilidade dos argumentos não é possível desconsiderar os impactos deles sobre a sociedade. A mídia corporativa continua poderosa, seus veículos atingem a maioria da população e seus discursos são, quase sempre, repetidos pelos receptores de forma acrítica. Sou testemunha disso ao ouvir, logo na manhã da segunda-feira posterior à publicação do The Intercept, a fala de um motorista de taxi reproduzindo quase literalmente o que havia ouvido no rádio sobre o assunto. Para ele nada do que foi revelado tinha valor porque era resultado de uma invasão criminosa, realizada no telefone do Moro na semana anterior. De nada adiantava informá-lo de que as conversas haviam sido obtidas muito antes. Valia o que o rádio havia dito.
O caminho do esclarecimento é longo mas o passo dado pelas revelações da tarde de domingo contribuiu para encurtá-lo. Só de pensar no assunto, as pessoas ainda que não convencidas de sua veracidade, já diminuíram um pouco a distância entre o fato e a sua versão. Agora fica a expectativa de novas revelações. Diante do que já foi exposto é quase impossível admitir que a mídia corporativa sairá ilesa desse processo.
Ou as negociações dos vazamentos da lava-jato, destinadas ao Jornal Nacional, não foram cuidadosamente articuladas para chegarem no horário preciso e com exclusividade? Diante do que já se sabe é possível admitir a existência de uma promiscuidade intensa entre operadores da lava-jato e jornalistas, cuja revelação, se acontecer, provocará sérios estragos na idoneidade dos envolvidos, para não falar na seriedade das instituições e das empresas.
O furo do The Intercept rompendo o cerco informativo da mídia pode servir de exemplo para o desenvolvimento de novas pautas jornalísticas, ignoradas pela mídia hegemônica. A própria publicação liderada por Glenn Greenwald, ou outra com semelhante coragem, poderia investir na elucidação dos mistérios que cercam a “facada de Juiz de Fora” e os assassinatos da Marielle e do Anderson.
Quem se habilita?
A linha editorial era clara. Salvar a galinha de ouro oferecida pela publicidade em torno do jogador, importante fonte de receita das empresas de comunicação, especialmente da Globo. Para isso o noticiário foi alimentado por vazamentos vindos de um inquérito sigiloso. Nada incomum nas relações público-privadas existentes no pais. A mídia corporativa, com esse caso, seguia ditando a pauta dos assuntos nacionais. De repente, depois de muito tempo, o jogo mudou.
O furo do The Intercept da tarde do domingo, 9 de junho, criou uma nova pauta para o país, livre das ingerências da mídia corporativa deixando os “senhores da verdade” midiáticos desconcertados. Na política, até então, o conluio mídia-lavajato seguia de vento em popa. Para não escapar da metáfora futebolística antiga, realizavam tabelinhas dignas da dupla Pelé-Coutinho.
O lançamento era feito em Curitiba e o gol no Rio de Janeiro, espalhando-se por todo o Brasil. Com as revelações daquele domingo as jogadas foram interrompidas. Seus autores perderam o poder da iniciativa e foram obrigados a reagir, o fazendo de forma atabalhoada inicialmente.
Aos poucos afinaram o discurso e sem poder criticar a mensagem, autenticada por seus autores, passaram a atacar os mensageiros e suas atitudes. Falaram até em “hackers” que teriam invadido o serviço de mensagens Telegram, controlado por cidadãos russos, sediado em Dubai. O jornalista Pepe Escobar, especializado em geopolítica, obteve uma declaração formal dos responsáveis pelo serviço de que não houve qualquer “raqueamento” no Telegram.
A tentativa seguinte foi de desacreditar a revista eletrônica, tratando-a como site ou blogue, forma ridícula de reduzir a sua credibilidade. No fundo, revelou apenas a profundidade do golpe sofrido. Trincou a verdade auto-proclamada da supremacia do que chamam de “jornalismo profissional”, uma atividade pretensamente praticada por seres de virtuosos, postados acima das paixões humanas, incluídas aí as preferências político-partidárias.
Vícios que, para eles, são privilégios das redes digitais, particularmente dos “blogues sujos”, como os definiu um político agora no ostracismo.
Além da tentativa de desqualificar o veículo buscou-se a desqualificação do seu principal responsável, Glenn Greenwald. Até a sua condição de jornalista foi contestada por um comentarista de rádio, numa clamorosa distorção de informações. Dos jornalistas brasileiros, porta-vozes dos seus patrões, talvez nenhum possa apresentar um currículo comparável com o do editor do The Intercept.
Para ser breve, Greenwald é advogado especializado em questões de direito constitucional e civil nos Estados Unidos, trabalhou para o jornal The Guardian, de Londres; ganhou, entre outros, o Prêmio Esso de Reportagem por artigos publicados no jornal O Globo sobre a espionagem estadounidense no Brasil e o Pulitzer por reportagens, também sobre espionagem, publicados no Guardian.
Apesar da fragilidade dos argumentos não é possível desconsiderar os impactos deles sobre a sociedade. A mídia corporativa continua poderosa, seus veículos atingem a maioria da população e seus discursos são, quase sempre, repetidos pelos receptores de forma acrítica. Sou testemunha disso ao ouvir, logo na manhã da segunda-feira posterior à publicação do The Intercept, a fala de um motorista de taxi reproduzindo quase literalmente o que havia ouvido no rádio sobre o assunto. Para ele nada do que foi revelado tinha valor porque era resultado de uma invasão criminosa, realizada no telefone do Moro na semana anterior. De nada adiantava informá-lo de que as conversas haviam sido obtidas muito antes. Valia o que o rádio havia dito.
O caminho do esclarecimento é longo mas o passo dado pelas revelações da tarde de domingo contribuiu para encurtá-lo. Só de pensar no assunto, as pessoas ainda que não convencidas de sua veracidade, já diminuíram um pouco a distância entre o fato e a sua versão. Agora fica a expectativa de novas revelações. Diante do que já foi exposto é quase impossível admitir que a mídia corporativa sairá ilesa desse processo.
Ou as negociações dos vazamentos da lava-jato, destinadas ao Jornal Nacional, não foram cuidadosamente articuladas para chegarem no horário preciso e com exclusividade? Diante do que já se sabe é possível admitir a existência de uma promiscuidade intensa entre operadores da lava-jato e jornalistas, cuja revelação, se acontecer, provocará sérios estragos na idoneidade dos envolvidos, para não falar na seriedade das instituições e das empresas.
O furo do The Intercept rompendo o cerco informativo da mídia pode servir de exemplo para o desenvolvimento de novas pautas jornalísticas, ignoradas pela mídia hegemônica. A própria publicação liderada por Glenn Greenwald, ou outra com semelhante coragem, poderia investir na elucidação dos mistérios que cercam a “facada de Juiz de Fora” e os assassinatos da Marielle e do Anderson.
Quem se habilita?
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