Por Pedro Serrano, na revista CartaCapital:
A coleção de ofensas de Jair Bolsonaro para com a memória dos mortos e desaparecidos durante a ditadura ganhou nos últimos dias mais uma declaração indecorosa. Ao afirmar de forma zombeteira que poderia contar ao presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, como o pai dele havia morrido, Bolsonaro não apenas ofendeu seu interlocutor e familiares, mas também sugeriu saber mais do que os documentos oficiais registram.
Estudante de Direito e membro da Ação Popular, Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira estava no Rio de Janeiro no Carnaval de 1974, visitando um irmão em companhia da esposa, quando saiu para encontrar um amigo e nunca mais voltou. Foi preso por agentes do DOI-Codi, órgão de repressão. O atestado de óbito de Fernando, emitido somente no fim de julho pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, diz que ele morreu “de causa não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática e generalizada à população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985”.
Além disso, em uma sentença de 1983, a Justiça Federal decidiu que a União foi responsável pelo “sequestro, tortura, assassinato e ocultamento do corpo de Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira”. No processo constam ofícios de autoridades da Marinha e do Exército brasileiros confirmando o vínculo da morte de Fernando à ação do Estado. A versão oficial, portanto, é diferente da insinuada por Bolsonaro, que, depois da primeira declaração, voltou à carga para dizer que o estudante teria sido assassinado por um “justiçamento da esquerda” e também para deslegitimar o sério trabalho da Comissão Nacional da Verdade, elogiado até pela ONU.
Os ataques de Bolsonaro a seus adversários políticos não são novidade, mas a forma como os faz se mostra cada vez mais virulenta. Como se soube pela imprensa, o deboche presidencial com ferida tão dolorosa da família Santa Cruz deu-se em meio a discordâncias entre ele e o presidente da OAB em relação à quebra do sigilo telefônico do advogado de Adélio Bispo, autor da facada desferida contra o então candidato à Presidência. Por conta disso, Bolsonaro traz uma questão privada para o âmbito do debate político, o que, além de ofensivo, é absolutamente inadequado e evidencia que lhe falta não apenas tirocínio, mas também senso moral.
Importante apontar que Felipe Santa Cruz se tem destacado justamente por fazer valer dispositivos do estatuto da OAB que estavam esquecidos pela gestão anterior da entidade, que mais se alinhava ao MPF do que aos advogados. É tarefa primordial da OAB e de seu comandante atuar em defesa dos direitos humanos e fundamentais, zelar pela democracia e pela Constituição. Logo, essa defesa não significa uma atividade política extrafuncional do presidente da Ordem, mas sim um dever institucional estabelecido no seu estatuto.
Ao fazer valer esses dispositivos, Santa Cruz resgata a dignidade democrática e constitucional da OAB e merece elogios. Outro aspecto importante de sua gestão tem sido uma defesa mais rigorosa das prerrogativas dos advogados, que significa, sobretudo, assegurar o direito de defesa do cidadão. Portanto, ao defender o sigilo na comunicação entre advogado e cliente, uma das principais prerrogativas da advocacia, Santa Cruz apenas cumpriu seu papel como advogado, cidadão e presidente da OAB.
A resposta desmedida, grotesca e agressiva de Bolsonaro é que merece total repúdio. Revela, mais uma vez, traços psicopáticos e o completo despreparo do mandatário maior do País, incapaz de sustentar um debate e partir para uma agressão de natureza pessoal. Por outro lado, esse embate também reforça a coragem do presidente da OAB, evidentemente inspirada em seu pai, um homem que morreu jovem e ofereceu sua vida pela democracia e a liberdade do País. Felipe Santa Cruz, sem dúvida, honra a trajetória de Fernando, enfrentando o herdeiro da ditadura que ele combateu, e não deve esmorecer nessa caminhada.
Bolsonaro tem o dever de informar à sociedade o que sabe sobre o caso, uma vez que afirmou ter tais informações. Mais que isso, precisa esclarecer em que circunstâncias lhe foi informado. Seria um registro histórico muito importante para o País. Alguém que ostenta valentia como traço de virilidade não deve se furtar a enfrentar as responsabilidades pelas covardias que diz, quase sempre, sem qualquer pudor.
Estudante de Direito e membro da Ação Popular, Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira estava no Rio de Janeiro no Carnaval de 1974, visitando um irmão em companhia da esposa, quando saiu para encontrar um amigo e nunca mais voltou. Foi preso por agentes do DOI-Codi, órgão de repressão. O atestado de óbito de Fernando, emitido somente no fim de julho pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, diz que ele morreu “de causa não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática e generalizada à população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985”.
Além disso, em uma sentença de 1983, a Justiça Federal decidiu que a União foi responsável pelo “sequestro, tortura, assassinato e ocultamento do corpo de Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira”. No processo constam ofícios de autoridades da Marinha e do Exército brasileiros confirmando o vínculo da morte de Fernando à ação do Estado. A versão oficial, portanto, é diferente da insinuada por Bolsonaro, que, depois da primeira declaração, voltou à carga para dizer que o estudante teria sido assassinado por um “justiçamento da esquerda” e também para deslegitimar o sério trabalho da Comissão Nacional da Verdade, elogiado até pela ONU.
Os ataques de Bolsonaro a seus adversários políticos não são novidade, mas a forma como os faz se mostra cada vez mais virulenta. Como se soube pela imprensa, o deboche presidencial com ferida tão dolorosa da família Santa Cruz deu-se em meio a discordâncias entre ele e o presidente da OAB em relação à quebra do sigilo telefônico do advogado de Adélio Bispo, autor da facada desferida contra o então candidato à Presidência. Por conta disso, Bolsonaro traz uma questão privada para o âmbito do debate político, o que, além de ofensivo, é absolutamente inadequado e evidencia que lhe falta não apenas tirocínio, mas também senso moral.
Importante apontar que Felipe Santa Cruz se tem destacado justamente por fazer valer dispositivos do estatuto da OAB que estavam esquecidos pela gestão anterior da entidade, que mais se alinhava ao MPF do que aos advogados. É tarefa primordial da OAB e de seu comandante atuar em defesa dos direitos humanos e fundamentais, zelar pela democracia e pela Constituição. Logo, essa defesa não significa uma atividade política extrafuncional do presidente da Ordem, mas sim um dever institucional estabelecido no seu estatuto.
Ao fazer valer esses dispositivos, Santa Cruz resgata a dignidade democrática e constitucional da OAB e merece elogios. Outro aspecto importante de sua gestão tem sido uma defesa mais rigorosa das prerrogativas dos advogados, que significa, sobretudo, assegurar o direito de defesa do cidadão. Portanto, ao defender o sigilo na comunicação entre advogado e cliente, uma das principais prerrogativas da advocacia, Santa Cruz apenas cumpriu seu papel como advogado, cidadão e presidente da OAB.
A resposta desmedida, grotesca e agressiva de Bolsonaro é que merece total repúdio. Revela, mais uma vez, traços psicopáticos e o completo despreparo do mandatário maior do País, incapaz de sustentar um debate e partir para uma agressão de natureza pessoal. Por outro lado, esse embate também reforça a coragem do presidente da OAB, evidentemente inspirada em seu pai, um homem que morreu jovem e ofereceu sua vida pela democracia e a liberdade do País. Felipe Santa Cruz, sem dúvida, honra a trajetória de Fernando, enfrentando o herdeiro da ditadura que ele combateu, e não deve esmorecer nessa caminhada.
Bolsonaro tem o dever de informar à sociedade o que sabe sobre o caso, uma vez que afirmou ter tais informações. Mais que isso, precisa esclarecer em que circunstâncias lhe foi informado. Seria um registro histórico muito importante para o País. Alguém que ostenta valentia como traço de virilidade não deve se furtar a enfrentar as responsabilidades pelas covardias que diz, quase sempre, sem qualquer pudor.
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