Por João Paulo Cunha, no jornal Brasil de Fato:
Bolsonaro faz muito mal ao Brasil e aos brasileiros. Não conduz uma liderança responsável na área da saúde, levando o país a quase 100 mil mortos pela Covid-19, na que é considerada a pior política pública sanitária no enfrentamento da pandemia em todo o mundo. Está quebrando a economia e exterminando direitos e empregos, desagradando tanto trabalhadores como empresários que choram suas pitangas depois que Guedes mostrou que não passa de um frentista de posto, incapaz de comandar a economia.
O presidente ainda se notabiliza internacionalmente pela destruição do meio ambiente, isolando ainda mais um país que tem à frente da diplomacia um ser extraviado de razão e dotado de um anacrônico pendor para a conspiração anticomunista. O governo conviveu ainda com o pior ministro da educação do planeta até poucos meses atrás e tem como lastro “intelectual” um misto de negacionismo científico, anti-iluminismo, moralismo tacanho e maus modos. A cultura, como política pública, é tratada como pum de palhaço.
Isso, todo mundo sabe. E os exemplos podem ser multiplicados para diversas áreas, sempre com o mesmo método de atacar o Estado social, dividir a população, incentivar o ódio, menosprezar a reflexão e o conhecimento, evidenciar desprezo à vida e romper com laços de solidariedade. O método da extrema direita sempre foi esse: não se trata apenas de um conteúdo regressivo, mas de uma forma antipopular e autoritária. Na chave populista de direita, a identificação do inimigo é o primeiro passo para o estabelecimento de uma estratégia do confronto.
Se não age de forma propositiva, o governo tem mostrado uma inexcedível capacidade de vetar todas as propostas minimamente humanistas surgidas nas últimas semanas referentes ao combate ao coronavírus. Como as medidas emergenciais voltadas as populações indígenas, inclusive referentes ao fornecimento de insumos e até água potável às aldeias ameaçadas. Ou a indenização de profissionais de linha de frente do combate à pandemia incapacitados, ou às suas famílias em caso de morte. Não se trata de ideias lançadas ao vento, mas de projetos de lei que tramitaram sem diálogo até receber o gesto genocida da negação pelo Planalto.
O que Bolsonaro inaugura – e nisso se destaca contra suas próprias convicções – é um tempo de descrédito à competência dos militares em cumprir funções para as quais não foram treinados. Missão dada tem sido missão descumprida. As Forças Armadas estão mostrando que não são tudo aquilo que certo imaginário autoritário do brasileiro médio sempre defendeu. E que ajudou o presidente a alimentar a alma reacionária que veste verde-e-amarelo. Se tudo der errado, é só chamar os conscritos e veteranos de todas as patentes que o problema está resolvido.
Da construção de estradas à organização de filas; do atendimento em agências do INSS ao patrulhamento das ruas; do meio ambiente à saúde. Em todas as áreas, nada melhor que um profissional feito para cumprir ordens e treinado nos protocolos da obediência inquestionável. Longe de sua função constitucional – de defesa da Pátria –, os militares se tornaram uma espécie de reserva moral (e profissional) para os impasses da conjuntura. No entanto, uma coisa é a promessa de competência, outra, bem diferente, é o teste de realidade. Bolsonaro mostrou, como na história infantil, que a farda nova do militar é transparente. Eles estão nus.
O primeiro teste, ainda sob Temer, foi entregar a área da segurança pública, talvez imantado por certa confusão que impedia enxergar que defesa de fronteiras e combate ao crime são coisas muito distintas, que têm como intercessão o uso de armas e uniformes. As ações de garantia de lei e da ordem foram um fracasso, não diminuíram a criminalidade e intensificaram os abusos. Mesmo em contextos mais restritos e aparentemente mais indicados para uso da força, como o dos presídios, as forças militares despontaram para o fracasso.
Equívoco na segurança das ruas, erro ainda maior em áreas distantes da vocação das armas. Bolsonaro, como foi identificado por vários analistas, tem mais militares em postos de primeiro e segundo escalões que até mesmo os governos da ditadura militar. Essa sanha militarista, que parecia ser sua carta na manga, chegou alimentada de um ressentimento do capitão afastado, que ganhou em razão da eleição o título de chefe das Forças Armadas. Sua chance de mandar nos generais era o trunfo que oferecia à parcela mais conservadora da sociedade, que puxou a onda que o elegeu.
No entanto, ao ser posto em prática, o plano deu chabu. Os militares à frente do Ministério da Saúde agigantaram a crise sanitária a proporções assustadoras. Não entendem de ciências da vida, não têm experiência como a organização de serviços, não dominam conceitos epidemiológicos, não têm a vivência do maior sistema público de saúde do mundo. São politicamente incapazes de ouvir e debater ideias. Além disso, se submetem – decorrência da obediência cega – aos desejos mágicos do presidente, dando sequência a protocolos ineptos de uso de medicamentos desaconselhados pelas autoridades sanitárias.
Com uma constelação de militares nos postos de comando do ministério, a necessidade de um comando unificado se esvaiu, deixando aberta a porta para a fragmentação das ações. Na realidade, não há ministro titular, mas um militar interino que se eterniza numa função para a qual não tem preparo, como tem demonstrado em vários momentos. Apenas na área de medicamentos e terapias desprezadas pela ciência e pelo bom senso, gerou-se na sociedade amedrontada uma onda de consumo de remédios e práticas que fazem mal ao coração, ao aparelho digestivo e, mais recentemente, com indicação de aplicação retal de ozônio.
O presidente tem o poder, como Midas ao contrário, de matar tudo que toca com seu dedo podre. Com os militares esse método destrutivo ameaça sua própria sobrevivência no poder, que se alimenta numa pretensa capacidade tirânica de pôr ordem na casa e tramar contra as instituições. Depois de arrasar com a política, com a economia e com a confiança da sociedade, Bolsonaro despe os militares de sua competência até então não testada. Se os generais se mostram tão incapazes, que dirá um capitão decaído. A população, hoje, já sabe que os militares não estão com essa bola toda. Bolsonaro pode ter ajudado a derrubar um mito. Pelo menos fez alguma coisa que presta.
O presidente ainda se notabiliza internacionalmente pela destruição do meio ambiente, isolando ainda mais um país que tem à frente da diplomacia um ser extraviado de razão e dotado de um anacrônico pendor para a conspiração anticomunista. O governo conviveu ainda com o pior ministro da educação do planeta até poucos meses atrás e tem como lastro “intelectual” um misto de negacionismo científico, anti-iluminismo, moralismo tacanho e maus modos. A cultura, como política pública, é tratada como pum de palhaço.
Isso, todo mundo sabe. E os exemplos podem ser multiplicados para diversas áreas, sempre com o mesmo método de atacar o Estado social, dividir a população, incentivar o ódio, menosprezar a reflexão e o conhecimento, evidenciar desprezo à vida e romper com laços de solidariedade. O método da extrema direita sempre foi esse: não se trata apenas de um conteúdo regressivo, mas de uma forma antipopular e autoritária. Na chave populista de direita, a identificação do inimigo é o primeiro passo para o estabelecimento de uma estratégia do confronto.
Se não age de forma propositiva, o governo tem mostrado uma inexcedível capacidade de vetar todas as propostas minimamente humanistas surgidas nas últimas semanas referentes ao combate ao coronavírus. Como as medidas emergenciais voltadas as populações indígenas, inclusive referentes ao fornecimento de insumos e até água potável às aldeias ameaçadas. Ou a indenização de profissionais de linha de frente do combate à pandemia incapacitados, ou às suas famílias em caso de morte. Não se trata de ideias lançadas ao vento, mas de projetos de lei que tramitaram sem diálogo até receber o gesto genocida da negação pelo Planalto.
O que Bolsonaro inaugura – e nisso se destaca contra suas próprias convicções – é um tempo de descrédito à competência dos militares em cumprir funções para as quais não foram treinados. Missão dada tem sido missão descumprida. As Forças Armadas estão mostrando que não são tudo aquilo que certo imaginário autoritário do brasileiro médio sempre defendeu. E que ajudou o presidente a alimentar a alma reacionária que veste verde-e-amarelo. Se tudo der errado, é só chamar os conscritos e veteranos de todas as patentes que o problema está resolvido.
Da construção de estradas à organização de filas; do atendimento em agências do INSS ao patrulhamento das ruas; do meio ambiente à saúde. Em todas as áreas, nada melhor que um profissional feito para cumprir ordens e treinado nos protocolos da obediência inquestionável. Longe de sua função constitucional – de defesa da Pátria –, os militares se tornaram uma espécie de reserva moral (e profissional) para os impasses da conjuntura. No entanto, uma coisa é a promessa de competência, outra, bem diferente, é o teste de realidade. Bolsonaro mostrou, como na história infantil, que a farda nova do militar é transparente. Eles estão nus.
O primeiro teste, ainda sob Temer, foi entregar a área da segurança pública, talvez imantado por certa confusão que impedia enxergar que defesa de fronteiras e combate ao crime são coisas muito distintas, que têm como intercessão o uso de armas e uniformes. As ações de garantia de lei e da ordem foram um fracasso, não diminuíram a criminalidade e intensificaram os abusos. Mesmo em contextos mais restritos e aparentemente mais indicados para uso da força, como o dos presídios, as forças militares despontaram para o fracasso.
Equívoco na segurança das ruas, erro ainda maior em áreas distantes da vocação das armas. Bolsonaro, como foi identificado por vários analistas, tem mais militares em postos de primeiro e segundo escalões que até mesmo os governos da ditadura militar. Essa sanha militarista, que parecia ser sua carta na manga, chegou alimentada de um ressentimento do capitão afastado, que ganhou em razão da eleição o título de chefe das Forças Armadas. Sua chance de mandar nos generais era o trunfo que oferecia à parcela mais conservadora da sociedade, que puxou a onda que o elegeu.
No entanto, ao ser posto em prática, o plano deu chabu. Os militares à frente do Ministério da Saúde agigantaram a crise sanitária a proporções assustadoras. Não entendem de ciências da vida, não têm experiência como a organização de serviços, não dominam conceitos epidemiológicos, não têm a vivência do maior sistema público de saúde do mundo. São politicamente incapazes de ouvir e debater ideias. Além disso, se submetem – decorrência da obediência cega – aos desejos mágicos do presidente, dando sequência a protocolos ineptos de uso de medicamentos desaconselhados pelas autoridades sanitárias.
Com uma constelação de militares nos postos de comando do ministério, a necessidade de um comando unificado se esvaiu, deixando aberta a porta para a fragmentação das ações. Na realidade, não há ministro titular, mas um militar interino que se eterniza numa função para a qual não tem preparo, como tem demonstrado em vários momentos. Apenas na área de medicamentos e terapias desprezadas pela ciência e pelo bom senso, gerou-se na sociedade amedrontada uma onda de consumo de remédios e práticas que fazem mal ao coração, ao aparelho digestivo e, mais recentemente, com indicação de aplicação retal de ozônio.
O presidente tem o poder, como Midas ao contrário, de matar tudo que toca com seu dedo podre. Com os militares esse método destrutivo ameaça sua própria sobrevivência no poder, que se alimenta numa pretensa capacidade tirânica de pôr ordem na casa e tramar contra as instituições. Depois de arrasar com a política, com a economia e com a confiança da sociedade, Bolsonaro despe os militares de sua competência até então não testada. Se os generais se mostram tão incapazes, que dirá um capitão decaído. A população, hoje, já sabe que os militares não estão com essa bola toda. Bolsonaro pode ter ajudado a derrubar um mito. Pelo menos fez alguma coisa que presta.
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