segunda-feira, 31 de julho de 2023

Erros e omissões da imprensa no caso Marielle

Ilustração: Nando Motta/Instituto Marielle Franco
Por Bepe Damasco, em seu blog:


Alguém já leu alguma reportagem investigativa (não vale citações de rodapé), nos veículos da mídia corporativa, explorando a estranheza do fato de um assassino profissional, como o PM reformado Ronnie Lessa, ser vizinho do ex-presidente da República, Jair Bolsonaro, em um condomínio de alto padrão, na Barra da Tijuca?

Claro que não.

Tampouco mereceram a atenção devida as relações próximas entre Lessa e Bolsonaro. Além das fotos risonhas da dupla que circulam nas redes, sabe-se que o filho mais novo do capitão chegou a namorar a filha do matador.

Mas nada disso tem grande importância para a imprensa comercial.

Também nunca estiveram no radar da mídia questionamentos sobre a discrepância entre os rendimentos de Lessa como policial e o preço de um imóvel no condomínio Vivendas da Barra.

Aliás, soa também esquisito Bolsonaro ser proprietário de uma casa neste condomínio de luxo, com seus proventos de ex-militar e o salário de deputado, mesmo que tenha exercido tantos mandatos.

E tem mais.

Quando Moro, então ministro da Justiça do governo fascista, se comportando com a canalhice e a covardia habituais, perseguiu o porteiro do Vivendas, a mídia não se manifestou de forma crítica, oscilando entre a omissão e uma cobertura favorável ao seu “herói” na época.

Cabe lembrar que o porteiro havia dito que “seu Jair autorizou”, se referindo à permissão para a entrada no condomínio de Élcio de Carvalho, réu confesso de ter participado dos assassinatos de Marielle e Anderson.

A mudança no depoimento do porteiro, depois de ser ameaçado e coagido, bem como o confisco do sistema de som do condomínio por parte de Bolsonaro, foram tratados por Globo e companhia como a coisa mais natural do mundo.

São notórias as relações do clã Bolsonaro com as milícias do Rio. Bolsonaro e seus filhos deram várias declarações públicas de apoio a esses grupos criminosos.

Flávio Bolsonaro condecorou o chefe do escritório do crime, Adriano da Nóbrega, com a medalha Tiradentes e empregou em seu gabinete na Alerj a mulher e a mãe do miliciano.

Era, portanto, de uma clareza estelar que enquanto durasse o governo Bolsonaro as investigações ficariam emperradas. Mas os focos principais de abordagem da mídia sobre o assunto sempre foram as falhas técnicas das investigações e as disputas por protagonismo entre os setores das forças de segurança do estado do Rio de Janeiro, especialmente da Polícia Civil.

Não que isso não tenha ocorrido, mas são consequências e não causas da ineficiência da investigação. O inquérito não andava porque não interessava ao governo anterior.

Esse é o ponto.

Agora, ao que tudo indica, é apenas uma questão de tempo a descoberta de quem mandou matar Marielle e por que. As investigações avançaram mais em seis meses do que nos cinco anos anteriores. Bastou afastar a policia civil do Rio e colocar a Polícia Federal no caso, junto com o Ministério Público do estado.

E, principalmente, tratar a elucidação do crime como prioridade.

Isso só foi possível depois que o véu de proteção e cumplicidade do governo Bolsonaro foi removido. As investigações caminham a passos largos para corroborar com provas o que sempre se soube: a milícia do Rio planejou e executou o crime bárbaro.

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