Por João Brant, do Coletivo Intervozes, no blog Viomundo:
A Fundação Padre Anchieta vive um processo longo de carência de investimentos e de sucateamento. As últimas gestões foram marcadas por escassos recursos orçamentários e, consequentemente, por pouco investimento estrutural. Houve perda cumulativa do potencial criativo das Rádios e TV Cultura. E vale lembrar que a fundação tinha um papel diferenciado na comunicação brasileira, uma referência na TV aberta e gratuita para novos talentos, formatos e modelos.
Hoje, as emissoras possuem pouca dinâmica e estão estranguladas por demissões. São quase nulas em termos de audiência. As Rádios e TV Cultura estão passando por um processo de desmonte e privatização, com a degradação de seu caráter público. A criatividade e a produção de conteúdo – marcas fundamentais dos 43 anos de história da Fundação Padre Anchieta – estão ameaçadas pela transformação do canal de TV em um mero exibidor de material comprado de terceiros.
Histórico
As gestões anteriores da Fundação, com Marcos Mendonça e Paulo Markun, já demonstravam a carência de investimentos e recursos. Um contrato de gestão que o governo paulista obrigou a Fundação Padre Anchieta a assinar em 2009 já indicava o futuro das Rádios e TV Cultura com minguantes recursos. Este contrato previa a redução gradual de verbas orçamentárias para a TV e o conseqüente aumento da captação publicitária.
O documento, na época aprovado por unanimidade pelo conselho curador da Fundação, mas nunca tornado público, previa que tanto a TV Cultura quanto o governo deveriam cumprir metas e oferecer contrapartidas entre 2009 e 2013. Segundo o documento, o governo diminuiria as verbas que envia para o custeio da fundação (da ordem de R$ 75 milhões para R$ 55 milhões) e o contrato estabelecia metas maiores de captação externa (em publicidade e prestação de serviços). Isso já era um sinal claro que o comando do governo paulista queria gradualmente retirar seu papel da comunicação pública.
Com a eleição de João Sayad, o mesmo contrato de gestão assinado e com plano de metas claras foi deixado de lado. O conteúdo deste contrato não foi publicado, tampouco o documento que o substituiu. A assessoria de imprensa da FPA divulgou várias vezes que houve economia nos últimos meses. Mas vale lembrar que tal redução de gastos foi feita ao custo social de centenas de demissões. O Conselho Curador apenas endossou laconicamente a brutal mudança na programação e nos quadros funcionais.
Sayad e a privatização
A gestão do presidente João Sayad, do vice-presidente de conteúdo Fernando Vieira de Melo e do vice-presidente administrativo Ronaldo Bianchi caminhou às escuras para dilapidar o patrimônio público. Sayad optou por transformar a TV Cultura em uma mera exibidora. Cancelou e/ou deixou de renovar contratos de prestação de serviço (TV Justiça, Assembléia de São Paulo, etc), acabou com diversos programas e implantou um programa de demissões em massa.
Em conversas com seu staff, João Sayad já comentou que a TV Cultura deveria caber apenas de um andar de um prédio comercial diante do planejamento que ele implantou. O que se vê é um processo de “privatização” das funções da FPA na comunicação pública. E não se pode descartar também a “estatização” e a “partidarização” destas mesmas funções públicas. A atual gestão retrocedeu a TV Cultura em pelo menos 15 anos com a demissão de profissionais qualificados e a sobrecarga do restante das equipes.
Mais de mil demitidos
Desde o início da gestão João Sayad, a TV Cultura encolheu drasticamente. Foram mais de mil demitidos, entre celetistas e PJs. Um processo de seleção “pública” foi desenvolvido para a regularização de poucos funcionários. A maioria foi desligada com o fim de programas e dos contratos de prestação de serviços. Os Sindicatos dos Jornalistas e dos Radialistas não têm conseguido reagir às demissões. Seria importante que ao menos divulgassem o saldo consolidado de quantas demissões foram homologadas por eles durante a gestão João Sayad.
Extinção de programas
O trio Sayad-Bianchi-Vieira de Melo extinguiu programas no atacado desde o início da sua gestão. Tentou-se acabar com outros, como o Manos e Minas, mas houve resistência de um público organizado e disposto a cobrar a programação de uma emissora pública. A lista de programas hoje é recheada de produções externas ou de reprises. Pouquíssimo material é feito com produção própria e inédita. A seguir, um resumo dos programas próprios que sucumbiram:
Cultura Retrô – Lançado pela gestão João Sayad em abril de 2011, o programa conduzido pela ex-MTV Marina Person não teve fôlego nem para comemorar um ano de vida. Seu fim foi anunciado em março. A atração revisitava reportagens e entrevistas do arquivo da emissora.
Entrelinhas – Dedicado exclusivamente à literatura, era o único do gênero na TV aberta e foi extinto em março de 2012. Existia desde 2005. A equipe de produção foi desmontada e redirecionada para outros programas. A promessa é integrá-lo à nova reformulação do Metropolis.
Grandes Momentos do Esporte – Também extinto em março de 2012, o programa já estava na mira da gestão Sayad há tempos. A atração perdera tempo na grade e o antigo apresentador, o jornalista Helio Alcântara, foi demitido em 2011. Seu lugar foi ocupado pelos jornalistas Vladir Lemos e Michel Laurence, além do capitão do tri Carlos Alberto Torres.
Letra Livre – Conduzido pelo jornalista e crítico literário Manuel da Costa Pinto, o programa foi criado em 2008 e promovia a cada edição o debate entre dois escritores consagrados. Foi extinto em junho de 2010.
Login – Inicialmente chamado de Programa Novo, foi criado na gestão de Paulo Markun e era exibido no início da noite. Dedicado ao público jovem, apresentava reportagens, entrevistas, bandas de música e contava com a participação de internautas. Extinto em dezembro de 2010.
Nossa Língua – Criado no início dos anos 2000 sob o comando do Professor Pasquale, o programa virou uma referência sobre o ensino da língua portuguesa na televisão. Extinto na gestão de Marcos Mendonça, retornou em 2008. Depois, reformulado, passou a ser produzido por temporadas. A última, de 26 capítulos, foi exibida em 2011. Não há previsão de retorno.
Vitrine – Com mais de 20 anos de história, foi símbolo de inovação ao tratar de cultura e mídia. Ultimamente era apresentado por Cunha Jr e Carla Fiorito. Foi extinto em março de 2012. A promessa é incorporá-lo à reformulação do programa Metrópolis.
Zoom – Programa semanal dedicado ao cinema, sobretudo à produção brasileira de médias e curtas metragens. Extinto em fevereiro de 2011, teve Flávia Scherner como última apresentadora. À época de sua extinção, a assessoria da FPA anunciou que ele viraria um quadro do Metropolis. Foram palavras ao vento.
A’uwe – Único programa da TV no mundo dedicado exclusivamente à cultura indígena. Apresentado pelo ator Marcos Palmeira, o programa foi extinto em 2010 após críticas da cúpula da gestão Sayad que o via como uma espécie de TV institucional da Funai.
Autor por autor – Série coproduzida com o canal SescTV e que apresentava a biografia e a obra de autores consagrados da literatura brasileira. Também extinto em 2010 sob o argumento de que era desinteressante.
Teatro Rá-Tim-Bum – Série de programas dedicados às crianças, com histórias de diversos autores e épocas. Extinto em 2010.
Lá e Cá – Parceria da TV Cultura e da Rádio e Televisão de Portugal (RTP) com o objetivo de compartilham visões, semelhanças e diferenças de brasileiros e portugueses. Primeira temporada tinha 13 episódios de 30 minutos. Foi abandonado com a saída do ex-presidente Paulo Markun.
Erros de gestão na TV
Roda Viva – Na reformulação do programa de debates e entrevistas, Marília Gabriela assumiu o posto de condutora da atração. A transformação, no entanto, foi mais profunda, resultando na completa desfiguração do programa. Um ano após a mudança, a direção da emissora recuou e restabeleceu o formato original.
Jornal da Cultura – Com o excesso de demissões e o sucateamento da estrutura técnica, o jornalístico perdeu a força das reportagens, que praticamente deixaram de ser exibidas. No ar, a âncora Maria Cristina Poli, divide a bancada com um time de comentaristas que se reveza para colher os louros do traço no Ibope.
Metropolis – Além de ter sido jogado para o final de noite, o programa também sofreu uma completa desestruturação. E esta é a segunda reformulação do programa dentro da gestão Sayad. Cadão Volpato foi contratado e demitido na mesma gestão. Hoje, o programa exibe pouquíssimas reportagens, há anos não possui capacidade técnica para links ao vivo e acabou se limitando a um talk-show de temas culturais.
Música Clássica – Perdeu espaço na grade de programação. A gravação de concertos de orquestras brasileira passou a ser feito com menor regularidade. Em vez de exibir material novo, atualmente aposta em muitas reprises e na veiculação de produções estrangeiras.
TV Justiça e TV Assembleia – Terminar com os contratos de prestação de serviços não só cortou receitas para a FPA como acelerou o processo de transformação da emissora em mera exibidora. Demissões foram feitas as centenas com o fim deste contrato. Os valores e o conteúdo dos acordos nunca foram apresentados publicamente.
Teatro Franco Zampari – A gestão Sayad pretende doar o Teatro Franco Zampari, onde são gravados vários programas da TV Cultura. O objetivo é desfazer do patrimônio sob o argumento de que a estrutura é onerosa. As negociações estão em estado avançado com a Associação Paulista de Amigos da Arte (APAA).
Carnaval 2012 – A transmissão de 9 horas do Carnaval 2012 de São Paulo é um case importante desta fase da FPA. A negociação dos direitos de transmissão com o SBT e Globo foram suspeitas. A TV Cultura disponibilizou equipamentos e equipes para a transmissão do Grupo de Acesso e do Desfile das Campeãs, mas só transmitiu o primeiro. O Desfile das Campeãs ficou de presente para o SBT, incluindo a operação e o uso de equipamentos da FPA. Os valores da negociação não foram divulgados.
Portal Cmais – Lançado com alarde pela atual gestão, o portal tem uma produção ínfima e extremamente dependente das equipes já sobrecarregadas dos programas. A carente infra-estrutura de TI o deixa fora do ar frequentemente. E a equipe reduzida de funcionários propicia erros crassos, como a transmissão por horas do streamming de vídeo do SBT no lugar da programação ao vivo da própria TV Cultura (dia 29 de fevereiro).
Jornalismo fraco na TV
O acordo para a exibição de um programa da TV Folha e a possível exibição de um televisivo da Revista Veja estão inseridas no fraco papel que o jornalismo da emissora pública possui hoje. A fragilidade do jornalismo da TV é evidente diante da agenda política do PSDB. Não há crítica, não há profundidade, não há debates importantes no cotidiano. Por ter um dos principais títulos jornalísticos da história recente – o programa de entrevistas Roda Viva – e ser o local de trabalho do jornalista Vladimir Herzog quando foi preso e assassinado pela ditadura, a redação da TV Cultura deveria, sim, aparecer no foco do debates das comunicações.
O acordo com a Folha de S.Paulo expôs a “privatização” da TV e a simpatia política do governo com este veículo. Se, de acordo com Artigo 22º, Inciso 6º, do Estatuto da Fundação Padre Anchieta, o Conselho Curador “deve aprovar a celebração de convênios ou acordos com órgãos ou instituições públicas ou privadas, concernentes à programação”, a dúvida que fica é: esse acordo, redigido e formalizado, foi aprovado pelo Conselho? Por que não foi divulgado? Quais os valores envolvidos na negociação? Os conselheiros precisam publicizar essas informações.
A proposta de lotear a programação jornalística da TV Cultura é um desrespeito com a noção de como o Estado deve promover e incentivar o pensamento crítico e a liberdade de expressão. Abrir espaços para enlatados produzidos por terceiros de acordo com critérios editoriais de particulares é jogar uma pá de cal na agonizante história do jornalismo da emissora pública. O Brasil que tanto precisa de exemplos fortes e maduros no jornalismo público – porque ainda engatinha em todos – vai desprezar mais uma alternativa.
Rádio Cultura Brasil
É a rádio de música brasileira da FPA, transmitida em AM. É de conhecimento de todos a importância cultural e educativa do trabalho realizado na emissora. Da seriedade da produção com a pesquisa à informação jornalística transmitida aos ouvintes. A equipe de produção foi achatada na atual gestão com fechamento de vagas e com demissões. Em abril de 2012, a equipe foi reduzida a cinco apresentadores, um diretor de programas, um assistente, três jornalistas e cinco estagiários. A equipe técnica também sofreu cortes e acumula as operações da rádio AM e da Rádio Cultura FM (música erudita).
Todos os funcionários trabalham mais horas do que as contratadas. Alguns programas gravados da Rádio Cultura Brasil (AM) são produzidos por funcionários da Cultura FM e vice-versa. Não existem mais programas gravados na Rádio Cultura Brasil, com exceção aos retransmitidos – o do produtor e pesquisador Solano Ribeiro (A Nova Música do Brasil) e o Reggae de Bamba (Jai Mahal). A programação musical é reprisada à exaustão e os programas ao vivo não têm mais entrevistas no estúdio com a presença do convidado. São usadas apenas entrevistas por telefone (com exceção ao programa Cultura Livre, que tem interesse da TV, mas cuja produção em vídeo também está paralisada).
A Rádio Cultura Brasil tem problemas técnicos de irradiação do sinal há pelo menos 20 anos. A única tentativa de solucionar esta questão foi na gestão de Marcos Mendonça. Contudo, a escolha de uma aparelhagem inadequada tirou o sinal das regiões nas quais a emissora era tradicionalmente ouvida e ampliou-se em duas regiões onde a rádio não chegava. Sem qualquer divulgação ou campanha, houve perda de audiência.
Nem a iniciativa do lançamento do Portal Cultura Brasil (muito pertinente em tempos de convergência digital) vingou. A proposta inicial de reunir todo o conteúdo musical da Rádio Cultura Brasil, da Cultura FM e dos programas musicais da TV Cultura não mais funciona regularmente. Hoje, o abastecimento de conteúdo do site é quase nulo.
* Dossiê Cultura/Fundação Padre Anchieta foi elaborado coletivamente por ex-funcionários, ex-colaboradores e observadores atentos à situação por lá, entre os quais João Brant, do Intervozes.
A Fundação Padre Anchieta vive um processo longo de carência de investimentos e de sucateamento. As últimas gestões foram marcadas por escassos recursos orçamentários e, consequentemente, por pouco investimento estrutural. Houve perda cumulativa do potencial criativo das Rádios e TV Cultura. E vale lembrar que a fundação tinha um papel diferenciado na comunicação brasileira, uma referência na TV aberta e gratuita para novos talentos, formatos e modelos.
Hoje, as emissoras possuem pouca dinâmica e estão estranguladas por demissões. São quase nulas em termos de audiência. As Rádios e TV Cultura estão passando por um processo de desmonte e privatização, com a degradação de seu caráter público. A criatividade e a produção de conteúdo – marcas fundamentais dos 43 anos de história da Fundação Padre Anchieta – estão ameaçadas pela transformação do canal de TV em um mero exibidor de material comprado de terceiros.
Histórico
As gestões anteriores da Fundação, com Marcos Mendonça e Paulo Markun, já demonstravam a carência de investimentos e recursos. Um contrato de gestão que o governo paulista obrigou a Fundação Padre Anchieta a assinar em 2009 já indicava o futuro das Rádios e TV Cultura com minguantes recursos. Este contrato previa a redução gradual de verbas orçamentárias para a TV e o conseqüente aumento da captação publicitária.
O documento, na época aprovado por unanimidade pelo conselho curador da Fundação, mas nunca tornado público, previa que tanto a TV Cultura quanto o governo deveriam cumprir metas e oferecer contrapartidas entre 2009 e 2013. Segundo o documento, o governo diminuiria as verbas que envia para o custeio da fundação (da ordem de R$ 75 milhões para R$ 55 milhões) e o contrato estabelecia metas maiores de captação externa (em publicidade e prestação de serviços). Isso já era um sinal claro que o comando do governo paulista queria gradualmente retirar seu papel da comunicação pública.
Com a eleição de João Sayad, o mesmo contrato de gestão assinado e com plano de metas claras foi deixado de lado. O conteúdo deste contrato não foi publicado, tampouco o documento que o substituiu. A assessoria de imprensa da FPA divulgou várias vezes que houve economia nos últimos meses. Mas vale lembrar que tal redução de gastos foi feita ao custo social de centenas de demissões. O Conselho Curador apenas endossou laconicamente a brutal mudança na programação e nos quadros funcionais.
Sayad e a privatização
A gestão do presidente João Sayad, do vice-presidente de conteúdo Fernando Vieira de Melo e do vice-presidente administrativo Ronaldo Bianchi caminhou às escuras para dilapidar o patrimônio público. Sayad optou por transformar a TV Cultura em uma mera exibidora. Cancelou e/ou deixou de renovar contratos de prestação de serviço (TV Justiça, Assembléia de São Paulo, etc), acabou com diversos programas e implantou um programa de demissões em massa.
Em conversas com seu staff, João Sayad já comentou que a TV Cultura deveria caber apenas de um andar de um prédio comercial diante do planejamento que ele implantou. O que se vê é um processo de “privatização” das funções da FPA na comunicação pública. E não se pode descartar também a “estatização” e a “partidarização” destas mesmas funções públicas. A atual gestão retrocedeu a TV Cultura em pelo menos 15 anos com a demissão de profissionais qualificados e a sobrecarga do restante das equipes.
Mais de mil demitidos
Desde o início da gestão João Sayad, a TV Cultura encolheu drasticamente. Foram mais de mil demitidos, entre celetistas e PJs. Um processo de seleção “pública” foi desenvolvido para a regularização de poucos funcionários. A maioria foi desligada com o fim de programas e dos contratos de prestação de serviços. Os Sindicatos dos Jornalistas e dos Radialistas não têm conseguido reagir às demissões. Seria importante que ao menos divulgassem o saldo consolidado de quantas demissões foram homologadas por eles durante a gestão João Sayad.
Extinção de programas
O trio Sayad-Bianchi-Vieira de Melo extinguiu programas no atacado desde o início da sua gestão. Tentou-se acabar com outros, como o Manos e Minas, mas houve resistência de um público organizado e disposto a cobrar a programação de uma emissora pública. A lista de programas hoje é recheada de produções externas ou de reprises. Pouquíssimo material é feito com produção própria e inédita. A seguir, um resumo dos programas próprios que sucumbiram:
Cultura Retrô – Lançado pela gestão João Sayad em abril de 2011, o programa conduzido pela ex-MTV Marina Person não teve fôlego nem para comemorar um ano de vida. Seu fim foi anunciado em março. A atração revisitava reportagens e entrevistas do arquivo da emissora.
Entrelinhas – Dedicado exclusivamente à literatura, era o único do gênero na TV aberta e foi extinto em março de 2012. Existia desde 2005. A equipe de produção foi desmontada e redirecionada para outros programas. A promessa é integrá-lo à nova reformulação do Metropolis.
Grandes Momentos do Esporte – Também extinto em março de 2012, o programa já estava na mira da gestão Sayad há tempos. A atração perdera tempo na grade e o antigo apresentador, o jornalista Helio Alcântara, foi demitido em 2011. Seu lugar foi ocupado pelos jornalistas Vladir Lemos e Michel Laurence, além do capitão do tri Carlos Alberto Torres.
Letra Livre – Conduzido pelo jornalista e crítico literário Manuel da Costa Pinto, o programa foi criado em 2008 e promovia a cada edição o debate entre dois escritores consagrados. Foi extinto em junho de 2010.
Login – Inicialmente chamado de Programa Novo, foi criado na gestão de Paulo Markun e era exibido no início da noite. Dedicado ao público jovem, apresentava reportagens, entrevistas, bandas de música e contava com a participação de internautas. Extinto em dezembro de 2010.
Nossa Língua – Criado no início dos anos 2000 sob o comando do Professor Pasquale, o programa virou uma referência sobre o ensino da língua portuguesa na televisão. Extinto na gestão de Marcos Mendonça, retornou em 2008. Depois, reformulado, passou a ser produzido por temporadas. A última, de 26 capítulos, foi exibida em 2011. Não há previsão de retorno.
Vitrine – Com mais de 20 anos de história, foi símbolo de inovação ao tratar de cultura e mídia. Ultimamente era apresentado por Cunha Jr e Carla Fiorito. Foi extinto em março de 2012. A promessa é incorporá-lo à reformulação do programa Metrópolis.
Zoom – Programa semanal dedicado ao cinema, sobretudo à produção brasileira de médias e curtas metragens. Extinto em fevereiro de 2011, teve Flávia Scherner como última apresentadora. À época de sua extinção, a assessoria da FPA anunciou que ele viraria um quadro do Metropolis. Foram palavras ao vento.
A’uwe – Único programa da TV no mundo dedicado exclusivamente à cultura indígena. Apresentado pelo ator Marcos Palmeira, o programa foi extinto em 2010 após críticas da cúpula da gestão Sayad que o via como uma espécie de TV institucional da Funai.
Autor por autor – Série coproduzida com o canal SescTV e que apresentava a biografia e a obra de autores consagrados da literatura brasileira. Também extinto em 2010 sob o argumento de que era desinteressante.
Teatro Rá-Tim-Bum – Série de programas dedicados às crianças, com histórias de diversos autores e épocas. Extinto em 2010.
Lá e Cá – Parceria da TV Cultura e da Rádio e Televisão de Portugal (RTP) com o objetivo de compartilham visões, semelhanças e diferenças de brasileiros e portugueses. Primeira temporada tinha 13 episódios de 30 minutos. Foi abandonado com a saída do ex-presidente Paulo Markun.
Erros de gestão na TV
Roda Viva – Na reformulação do programa de debates e entrevistas, Marília Gabriela assumiu o posto de condutora da atração. A transformação, no entanto, foi mais profunda, resultando na completa desfiguração do programa. Um ano após a mudança, a direção da emissora recuou e restabeleceu o formato original.
Jornal da Cultura – Com o excesso de demissões e o sucateamento da estrutura técnica, o jornalístico perdeu a força das reportagens, que praticamente deixaram de ser exibidas. No ar, a âncora Maria Cristina Poli, divide a bancada com um time de comentaristas que se reveza para colher os louros do traço no Ibope.
Metropolis – Além de ter sido jogado para o final de noite, o programa também sofreu uma completa desestruturação. E esta é a segunda reformulação do programa dentro da gestão Sayad. Cadão Volpato foi contratado e demitido na mesma gestão. Hoje, o programa exibe pouquíssimas reportagens, há anos não possui capacidade técnica para links ao vivo e acabou se limitando a um talk-show de temas culturais.
Música Clássica – Perdeu espaço na grade de programação. A gravação de concertos de orquestras brasileira passou a ser feito com menor regularidade. Em vez de exibir material novo, atualmente aposta em muitas reprises e na veiculação de produções estrangeiras.
TV Justiça e TV Assembleia – Terminar com os contratos de prestação de serviços não só cortou receitas para a FPA como acelerou o processo de transformação da emissora em mera exibidora. Demissões foram feitas as centenas com o fim deste contrato. Os valores e o conteúdo dos acordos nunca foram apresentados publicamente.
Teatro Franco Zampari – A gestão Sayad pretende doar o Teatro Franco Zampari, onde são gravados vários programas da TV Cultura. O objetivo é desfazer do patrimônio sob o argumento de que a estrutura é onerosa. As negociações estão em estado avançado com a Associação Paulista de Amigos da Arte (APAA).
Carnaval 2012 – A transmissão de 9 horas do Carnaval 2012 de São Paulo é um case importante desta fase da FPA. A negociação dos direitos de transmissão com o SBT e Globo foram suspeitas. A TV Cultura disponibilizou equipamentos e equipes para a transmissão do Grupo de Acesso e do Desfile das Campeãs, mas só transmitiu o primeiro. O Desfile das Campeãs ficou de presente para o SBT, incluindo a operação e o uso de equipamentos da FPA. Os valores da negociação não foram divulgados.
Portal Cmais – Lançado com alarde pela atual gestão, o portal tem uma produção ínfima e extremamente dependente das equipes já sobrecarregadas dos programas. A carente infra-estrutura de TI o deixa fora do ar frequentemente. E a equipe reduzida de funcionários propicia erros crassos, como a transmissão por horas do streamming de vídeo do SBT no lugar da programação ao vivo da própria TV Cultura (dia 29 de fevereiro).
Jornalismo fraco na TV
O acordo para a exibição de um programa da TV Folha e a possível exibição de um televisivo da Revista Veja estão inseridas no fraco papel que o jornalismo da emissora pública possui hoje. A fragilidade do jornalismo da TV é evidente diante da agenda política do PSDB. Não há crítica, não há profundidade, não há debates importantes no cotidiano. Por ter um dos principais títulos jornalísticos da história recente – o programa de entrevistas Roda Viva – e ser o local de trabalho do jornalista Vladimir Herzog quando foi preso e assassinado pela ditadura, a redação da TV Cultura deveria, sim, aparecer no foco do debates das comunicações.
O acordo com a Folha de S.Paulo expôs a “privatização” da TV e a simpatia política do governo com este veículo. Se, de acordo com Artigo 22º, Inciso 6º, do Estatuto da Fundação Padre Anchieta, o Conselho Curador “deve aprovar a celebração de convênios ou acordos com órgãos ou instituições públicas ou privadas, concernentes à programação”, a dúvida que fica é: esse acordo, redigido e formalizado, foi aprovado pelo Conselho? Por que não foi divulgado? Quais os valores envolvidos na negociação? Os conselheiros precisam publicizar essas informações.
A proposta de lotear a programação jornalística da TV Cultura é um desrespeito com a noção de como o Estado deve promover e incentivar o pensamento crítico e a liberdade de expressão. Abrir espaços para enlatados produzidos por terceiros de acordo com critérios editoriais de particulares é jogar uma pá de cal na agonizante história do jornalismo da emissora pública. O Brasil que tanto precisa de exemplos fortes e maduros no jornalismo público – porque ainda engatinha em todos – vai desprezar mais uma alternativa.
Rádio Cultura Brasil
É a rádio de música brasileira da FPA, transmitida em AM. É de conhecimento de todos a importância cultural e educativa do trabalho realizado na emissora. Da seriedade da produção com a pesquisa à informação jornalística transmitida aos ouvintes. A equipe de produção foi achatada na atual gestão com fechamento de vagas e com demissões. Em abril de 2012, a equipe foi reduzida a cinco apresentadores, um diretor de programas, um assistente, três jornalistas e cinco estagiários. A equipe técnica também sofreu cortes e acumula as operações da rádio AM e da Rádio Cultura FM (música erudita).
Todos os funcionários trabalham mais horas do que as contratadas. Alguns programas gravados da Rádio Cultura Brasil (AM) são produzidos por funcionários da Cultura FM e vice-versa. Não existem mais programas gravados na Rádio Cultura Brasil, com exceção aos retransmitidos – o do produtor e pesquisador Solano Ribeiro (A Nova Música do Brasil) e o Reggae de Bamba (Jai Mahal). A programação musical é reprisada à exaustão e os programas ao vivo não têm mais entrevistas no estúdio com a presença do convidado. São usadas apenas entrevistas por telefone (com exceção ao programa Cultura Livre, que tem interesse da TV, mas cuja produção em vídeo também está paralisada).
A Rádio Cultura Brasil tem problemas técnicos de irradiação do sinal há pelo menos 20 anos. A única tentativa de solucionar esta questão foi na gestão de Marcos Mendonça. Contudo, a escolha de uma aparelhagem inadequada tirou o sinal das regiões nas quais a emissora era tradicionalmente ouvida e ampliou-se em duas regiões onde a rádio não chegava. Sem qualquer divulgação ou campanha, houve perda de audiência.
Nem a iniciativa do lançamento do Portal Cultura Brasil (muito pertinente em tempos de convergência digital) vingou. A proposta inicial de reunir todo o conteúdo musical da Rádio Cultura Brasil, da Cultura FM e dos programas musicais da TV Cultura não mais funciona regularmente. Hoje, o abastecimento de conteúdo do site é quase nulo.
* Dossiê Cultura/Fundação Padre Anchieta foi elaborado coletivamente por ex-funcionários, ex-colaboradores e observadores atentos à situação por lá, entre os quais João Brant, do Intervozes.
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