Por Luiz Gonzaga Belluzzo, na revista CartaCapital:
Nas últimas semanas, em meio ao burburinho sobre a desvalorização do real, desatei algumas opiniões sobre a necessidade de uma ação vigorosa do Banco Central destinada a impedir que o “não sistema” monetário internacional prosseguisse em sua habitual produção de turbulências nas economias de moeda não conversível.
No Brasil, diante do aguçamento da instabilidade cambial, as vozes de sempre descarregaram as culpas pela desvalorização do real sobre os ombros das “condições internas”. Proclamaram suas “verdades incontestáveis” ao som dos ruídos emitidos pelo tropel dos emergentes que lhes esfrega na cara o movimento generalizado de desvalorizações cambiais mundo afora.
Autoridades econômicas brasileiras cuidaram de explicar à opinião pública que eu não falava pelo governo. Amigo de longa data de muitos deles, imaginei que soubessem de minha figadal e irreconciliável hostilidade aos papéis de ventríloquo de governos ou de soprador de conselhos ao Príncipe. Se, porventura indagado, falo o que ditam minhas convicções, sempre desconfiado da fragilidade de minhas projeções e avaliações, para não dizer da precariedade de meus saberes.
Num ritual farsesco, renova-se em sua caducidade tediosa a discussão sobre a efetividade (ou inefetividade) do controle de capitais em um mundo moldado pela integração financeira e, sobretudo, pela ominosa presença dos mercados de derivativos. Em princípio destinados a promover a diversificação dos riscos, ou seja, oferecer proteção aos agentes do mundo real contra as imprevisibilidades da precificação de ativos e commodities executadas pelos mercados, os derivativos ganharam vida própria e se transformaram em formas monetárias “privadas” que abrem espaço para manobras especulativas de ordem superior. As taxas de câmbio e as apostas nos mercados futuros com índices de commodities são, hoje, exemplos escandalosos e aberrantes dessa “inversão” que submete as políticas econômicas a constrangimentos e a conflitos nada triviais.
Os países de moeda não conversível se dilaceram entre o objetivo de manter a inflação sob controle e o propósito de não danar o crescimento ou colocar em risco a estrutura industrial e, consequentemente, o “arcabouço” de geração de renda e emprego. No Brasil, a derrocada exportadora da indústria faz parceria com a invasão das importações de produtos manufaturados, prenhes de incentivos e subsídios oferecidos generosamente pelos competidores espertos.
Keynes repetiu seguidamente nos trabalhos preparatórios da Conferência de Bretton Woods: “O controle de capitais deveria ser uma característica permanente da nova ordem econômica mundial”. O Plano Keynes postulava a criação de uma moeda internacional. Perdeu a parada para os interesses do establisment americano, mas o controle de capitais e do câmbio foi incorporado ao artigo VI dos estatutos do fundo como faculdade concedida aos países que estivessem atravessando problemas agudos de balanço de pagamentos. Os controles cambiais estavam vedados para as transações correntes, salvo no caso de o Fundo declarar uma “moeda escassa”, conforme o artigo VII, o que permitiria aos demais membros impor controles às transações com essa divisa.
Keynes esclareceu que “a defesa do controle dos movimentos de capitais não deve ser compreendida como uma indicação de que a era do investimento internacional deve ser encerrada. Pelo contrário, o sistema aqui considerado deverá facilitar enormemente a restauração do crédito internacional para fins de empréstimos, tal como será discutido abaixo. O objetivo – e trata-se de um objetivo vital – é ter um instrumento que permita distinguir:
a) Entre movimentos de fundos variáveis e novos investimentos genuínos destinados ao desenvolvimento da riqueza mundial.
b) Entre movimentos especulativos ou fugas de capital dos países deficitários – ou de um país superavitário para outro – e movimentos que ajudarão a manter o equilíbrio dos países superavitários em relação aos países deficitários.
A controvérsia sobre a efetividade dos controles de capitais, tão acerba quanto monótona, termina indefectivelmente com a vitória da turma da bufunfa, aqueles que se refestelam na arbitragem com o diferencial de juros entre os países e engordam seus cabedais sob o patrocínio capitais voláteis. Neste momento, os mercados financeiros globalizados antecipam as manobras de Ben Bernanke e abandonam os “queridinhos” da periferia.
Nas últimas semanas, em meio ao burburinho sobre a desvalorização do real, desatei algumas opiniões sobre a necessidade de uma ação vigorosa do Banco Central destinada a impedir que o “não sistema” monetário internacional prosseguisse em sua habitual produção de turbulências nas economias de moeda não conversível.
No Brasil, diante do aguçamento da instabilidade cambial, as vozes de sempre descarregaram as culpas pela desvalorização do real sobre os ombros das “condições internas”. Proclamaram suas “verdades incontestáveis” ao som dos ruídos emitidos pelo tropel dos emergentes que lhes esfrega na cara o movimento generalizado de desvalorizações cambiais mundo afora.
Autoridades econômicas brasileiras cuidaram de explicar à opinião pública que eu não falava pelo governo. Amigo de longa data de muitos deles, imaginei que soubessem de minha figadal e irreconciliável hostilidade aos papéis de ventríloquo de governos ou de soprador de conselhos ao Príncipe. Se, porventura indagado, falo o que ditam minhas convicções, sempre desconfiado da fragilidade de minhas projeções e avaliações, para não dizer da precariedade de meus saberes.
Num ritual farsesco, renova-se em sua caducidade tediosa a discussão sobre a efetividade (ou inefetividade) do controle de capitais em um mundo moldado pela integração financeira e, sobretudo, pela ominosa presença dos mercados de derivativos. Em princípio destinados a promover a diversificação dos riscos, ou seja, oferecer proteção aos agentes do mundo real contra as imprevisibilidades da precificação de ativos e commodities executadas pelos mercados, os derivativos ganharam vida própria e se transformaram em formas monetárias “privadas” que abrem espaço para manobras especulativas de ordem superior. As taxas de câmbio e as apostas nos mercados futuros com índices de commodities são, hoje, exemplos escandalosos e aberrantes dessa “inversão” que submete as políticas econômicas a constrangimentos e a conflitos nada triviais.
Os países de moeda não conversível se dilaceram entre o objetivo de manter a inflação sob controle e o propósito de não danar o crescimento ou colocar em risco a estrutura industrial e, consequentemente, o “arcabouço” de geração de renda e emprego. No Brasil, a derrocada exportadora da indústria faz parceria com a invasão das importações de produtos manufaturados, prenhes de incentivos e subsídios oferecidos generosamente pelos competidores espertos.
Keynes repetiu seguidamente nos trabalhos preparatórios da Conferência de Bretton Woods: “O controle de capitais deveria ser uma característica permanente da nova ordem econômica mundial”. O Plano Keynes postulava a criação de uma moeda internacional. Perdeu a parada para os interesses do establisment americano, mas o controle de capitais e do câmbio foi incorporado ao artigo VI dos estatutos do fundo como faculdade concedida aos países que estivessem atravessando problemas agudos de balanço de pagamentos. Os controles cambiais estavam vedados para as transações correntes, salvo no caso de o Fundo declarar uma “moeda escassa”, conforme o artigo VII, o que permitiria aos demais membros impor controles às transações com essa divisa.
Keynes esclareceu que “a defesa do controle dos movimentos de capitais não deve ser compreendida como uma indicação de que a era do investimento internacional deve ser encerrada. Pelo contrário, o sistema aqui considerado deverá facilitar enormemente a restauração do crédito internacional para fins de empréstimos, tal como será discutido abaixo. O objetivo – e trata-se de um objetivo vital – é ter um instrumento que permita distinguir:
a) Entre movimentos de fundos variáveis e novos investimentos genuínos destinados ao desenvolvimento da riqueza mundial.
b) Entre movimentos especulativos ou fugas de capital dos países deficitários – ou de um país superavitário para outro – e movimentos que ajudarão a manter o equilíbrio dos países superavitários em relação aos países deficitários.
A controvérsia sobre a efetividade dos controles de capitais, tão acerba quanto monótona, termina indefectivelmente com a vitória da turma da bufunfa, aqueles que se refestelam na arbitragem com o diferencial de juros entre os países e engordam seus cabedais sob o patrocínio capitais voláteis. Neste momento, os mercados financeiros globalizados antecipam as manobras de Ben Bernanke e abandonam os “queridinhos” da periferia.
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