Por Higor Faria, no sítio Outras Palavras:
No sábado, 11 de janeiro, Kaíque (16 anos) foi encontrado morto, sem os dentes, com uma barra de ferro na perna e outros sinais de tortura. A polícia registrou o caso como suicídio. Não é preciso ser nenhum especialista para perceber que foi assassinato, provavelmente motivado por puro ódio.
Kaíque era negro, gay e provavelmente não pertencia às classes com maior poder aquisitivo. Na nossa sociedade branca heteronormativa, Kaíque fazia parte de três minorias e acumulava três tipos de preconceito: o de raça, o de sexualidade e o de classe social. Talvez essa situação fosse “amenizada” nos ambientes homossexuais e ele “só” sofresse racismo. E nos ambientes negros, “só” de homofobia.
Mesmo assim, não deve ter sido nada fácil encontrar um lugar que fosse acolhido plenamente e se sentisse protegido — se é que encontrou. Como tantos outros em nosso país, ele fazia parte de um grupo que é triplamente estigmatizado, invisibilizado e colocado em posição vulnerável. Não é a primeira vez que contam a história de Kaíque, mas a gente nunca deu a mínima. O Estado também não. Afinal, a vida de quem é preto vale menos — negros são 70% das vítimas de homicídio. A vida de quem é gay vale tão pouco quanto — os casos de assassinatos contra homossexuais triplicaram de 2007 a 2012. E a vida de quem é pobre segue na mesma cotação. Se a pessoa é preta, gay e pobre, o que não valia quase nada é dividido por três. Nem lágrima cai dos nossos olhos, que dirá uma comoção nacional.
E a regra é clara: se não tem valor, é deixado de lado. Invisibilizado. Não se considera nem nas estatísticas: não há recorte racial nos assassinatos registrados como motivados por homofobia, bem como não há recortes de sexualidade nos assassinatos registrados como de crime racial. E isso é uma coisa séria! Não tendo esses números, não se sabe e não se olha pra onde negros homossexuais estão sendo mais assassinados, não se reconhece os preconceitos da nossa sociedade, não se enxerga a dimensão do problema social e não há movimentação para resolvê-lo.
O resultado é esse aí registrado como suicídio. Como disse uma amiga minha “dizer que foi suicídio é como dizer que ele pediu por isso”. Muita gente acredita que por ser preto e gay ele pediu. Mas ele não pediu. Kaíque e tantos outros não pediram pra nascer numa sociedade que estigmatiza o preto, o gay e o pobre. E isso tudo é culpa do descaso do Estado e do meu, do seu e do preconceito dessa pessoa que tá aí ao seu lado. O Estado não criminalizou a homofobia, não aplica efetivamente as leis anti racismo, não educa contra o preconceito. Eu, você e a pessoa aí do lado não pressionamos o governo, os legisladores e as instituições, não denunciamos e ainda negamos quando algum oprimido acusa uma opressão. (In)Diretamente, todos somos torturadores dos jovens negros gay assassinados nesse país.
No sábado, 11 de janeiro, Kaíque (16 anos) foi encontrado morto, sem os dentes, com uma barra de ferro na perna e outros sinais de tortura. A polícia registrou o caso como suicídio. Não é preciso ser nenhum especialista para perceber que foi assassinato, provavelmente motivado por puro ódio.
Kaíque era negro, gay e provavelmente não pertencia às classes com maior poder aquisitivo. Na nossa sociedade branca heteronormativa, Kaíque fazia parte de três minorias e acumulava três tipos de preconceito: o de raça, o de sexualidade e o de classe social. Talvez essa situação fosse “amenizada” nos ambientes homossexuais e ele “só” sofresse racismo. E nos ambientes negros, “só” de homofobia.
Mesmo assim, não deve ter sido nada fácil encontrar um lugar que fosse acolhido plenamente e se sentisse protegido — se é que encontrou. Como tantos outros em nosso país, ele fazia parte de um grupo que é triplamente estigmatizado, invisibilizado e colocado em posição vulnerável. Não é a primeira vez que contam a história de Kaíque, mas a gente nunca deu a mínima. O Estado também não. Afinal, a vida de quem é preto vale menos — negros são 70% das vítimas de homicídio. A vida de quem é gay vale tão pouco quanto — os casos de assassinatos contra homossexuais triplicaram de 2007 a 2012. E a vida de quem é pobre segue na mesma cotação. Se a pessoa é preta, gay e pobre, o que não valia quase nada é dividido por três. Nem lágrima cai dos nossos olhos, que dirá uma comoção nacional.
E a regra é clara: se não tem valor, é deixado de lado. Invisibilizado. Não se considera nem nas estatísticas: não há recorte racial nos assassinatos registrados como motivados por homofobia, bem como não há recortes de sexualidade nos assassinatos registrados como de crime racial. E isso é uma coisa séria! Não tendo esses números, não se sabe e não se olha pra onde negros homossexuais estão sendo mais assassinados, não se reconhece os preconceitos da nossa sociedade, não se enxerga a dimensão do problema social e não há movimentação para resolvê-lo.
O resultado é esse aí registrado como suicídio. Como disse uma amiga minha “dizer que foi suicídio é como dizer que ele pediu por isso”. Muita gente acredita que por ser preto e gay ele pediu. Mas ele não pediu. Kaíque e tantos outros não pediram pra nascer numa sociedade que estigmatiza o preto, o gay e o pobre. E isso tudo é culpa do descaso do Estado e do meu, do seu e do preconceito dessa pessoa que tá aí ao seu lado. O Estado não criminalizou a homofobia, não aplica efetivamente as leis anti racismo, não educa contra o preconceito. Eu, você e a pessoa aí do lado não pressionamos o governo, os legisladores e as instituições, não denunciamos e ainda negamos quando algum oprimido acusa uma opressão. (In)Diretamente, todos somos torturadores dos jovens negros gay assassinados nesse país.
1 comentários:
Gostei do texto, a pesar de discordar em uma coisa: realmente o Estado deveria investir mais em políticas anti preconceituosas, mas isso nunca será erradicado se não partir de cada um, da educação civil, da orientação e formação de crianças em famılias qur reconhecem o Brasil como um país racista, homofóbico e opressor. Mas infelizmente a família e a sociedade em geral se prendem a padrões estipulados por mídia, que finge que todos nós vivemos sem esses problemas tão importantes, e encobre todos os crimes, fazendo de conta que o preconceito é apenas um fantasma que serve para piadas oportunistas.
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