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A parceria entre o bicheiro Carlinhos Cachoeira, políticos de oposição e veículos de imprensa ruiu, depois que uma CPI Mista, instalada em 2012 pelo Congresso Nacional, desmascarou a que interesses ela servia. Carlinhos Cachoeira foi preso, o ex-senador pelo DEM Demóstenes Torres perdeu seu mandato, mas a imprensa continuou impune. E sem punição, transformou o mal feito em escola: a velha fórmula de obtenção ilegal de imagens permanece sustentando pretensas reportagens dos jornalões.
Em 2011, o ex-ministro José Dirceu teve sua intimidade violada, no hotel em que residia, em Brasília, por imagens publicadas pela revista Veja. A “justificativa” da revista era mostrar que, mesmo afastado do governo, ele continuava a receber autoridades da República para “conspirar” contra a presidenta Dilma Rousseff, acusação que a reportagem José Dirceu mostra que ainda manda em Brasília em nada contribui para comprovar, em um texto todo ele baseado em ilações.
O repórter Gustavo Ribeiro até que tentou conseguir algum fato concreto para sustentar a manchete, só que por meio de prática criminosa. Chegou a ser denunciado à Polícia pela direção do hotel, que o flagrou tentando invadir o quarto de Dirceu. Não deu em nada. Só mais tarde, com a explosão das denúncias contra a quadrilha de Cachoeira, ficou claro que a organização clandestina teve participação na obtenção das imagens veiculadas por Veja, assim como influiu no enfoque de várias outras reportagens.
Escutas obtidas com autorização judicial comprovaram que Policarpo Junior, diretor da sucursal da revista em Brasília, mantinha contato periódico com Cachoeira e outros membros da quadrilha para discutir pautas da revista. O assunto foi fartamente explorado pela CPI criada para investigar as relações escusas de Cachoeira com políticos. Os jornalistas envolvidos com a máfia chegaram a ser apontados no parecer do relator, deputado Odair Costa (PT-MG), conforme noticiou Carta Maior na reportagem “Quem são e o que fazem os jornalistas de Cachoeira”. No relatório final, porém eles foram isentos de responsabilidades.
Na semana passada, o mesmo José Dirceu, que agora cumpre pena no Complexo Penitenciário da Papuda, foi novamente vítima da publicação de imagens ilegais, obtidas durante uma visita da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, dessa feita publicadas pelo jornal Folha de São Paulo. E de forma ainda mais grave, já que a Lei de Execuções Penais é clara ao determinar que a intimidade do preso deva ser preservada. Além de que a juíza da Vara de Execuções Penais, Débora Valle de Brito, havia autorizado a visita com a condição de que não fossem feitos registros em fotos ou vídeos.
O Governo do Distrito Federal (GDF) abriu sindicância para apurar responsabilidades, mas é certo que o autor entrou na unidade penitenciária junto com os parlamentares que fizeram a visita. Em ofício encaminhado à juíza para esclarecer os fatos, a CDH descreve quem eram os membros da comitiva, entre deputados e assessores, e aponta quais dos últimos atenderam à determinação de aguardar na sala do diretor, enquanto apenas os parlamentares se deslocavam até a cela de Dirceu. O documento deixa claro que um deles descumpriu a ordem.
Trata-se do assessor técnico da Liderança do PPS, Wiliam Pereira dos Passos, que, na ocasião, acompanhava o deputado Arnaldo Jordy (PPS-PR). Dois dos cinco deputados presentes afirmaram à Carta Maior que viram um assessor de Jordy na cela de Dirceu. Houve uma confusão inicial em relação ao nome do suspeito, visto que o secretário parlamentar de Jordy, Vicente Bezerra, também participou da comitiva. Mas os outros assessores que aguardaram na sala da direção confirmaram que Bezerra estava com eles. William, não.
William, assessor do PPS, é casado com uma jornalista da Rádio CBN, que é amiga do repórter fotográfico da Folha de S. Paulo, Alan Marques, que assina a reportagem que apresentou o vídeo ao país. O episódio, certamente, não será pauta de nova CPI. Mas os resultados da investigação conduzida pelo GDF serão encaminhados à Corregedoria da Câmara, que poderá ou não determinar punição para o culpado. No máximo, a responsabilidade recairá sobre um dos elos da parceria que resultou na publicação do vídeo.
A imprensa, sem dúvida, seguirá com as mesmas práticas. No Brasil, como se sabe, não há nenhuma lei que regulamente o exercício profissional do jornalismo. Sequer o direito de resposta, princípio sagrado da profissão, está respaldado. Também não há nenhum controle dos veículos de comunicação, nem mesmo daqueles que são concessões públicas, os canais de rádio e TV. A imprensa brasileira é, cada vez mais, uma terra sem lei, onde certos agentes políticos e jornalistas assumem práticas ilícitas como coisa corriqueira. E se entendem entre si, sem sequer precisar terceirizá-las para bandos ou quadrilhas, como no passado. Em um cenário desses, quem precisa de um Carlinhos Cachoeira?
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