Por Venício A. de Lima, no Observatório da Imprensa:
Ao fazer um balanço crítico do ano que chegava ao fim, na perspectiva da atuação da mídia brasileira, escrevi neste Observatório, em dezembro de 2013:
“O que de mais importante aconteceu no nosso país de 2005 para cá – vale dizer, ao longo dos últimos oito anos – e se consolidou em 2013 com as várias semanas de julgamento televisionado, ao vivo, no Supremo Tribunal Federal – foi a formação de uma linguagem nova, seletiva e específica, com a participação determinante da grande mídia, dentro da qual parcela dos brasileiros passou a ‘ver’ os réus da Ação Penal nº 470, em particular aqueles ligados ao Partido dos Trabalhadores. (...) Nos últimos anos ‘mensalão’ passou a ser ‘um esquema de corrupção’ e tornou-se ‘mensalão do PT’, enquanto situações idênticas e anteriores, raramente mencionadas, foram identificadas pela geografia e não pelo partido político (‘mensalão mineiro’). Como resultado foi se construindo sistematicamente uma associação generalizada, seletiva e deliberada entre corrupção e os governos Lula e o PT, ou melhor, seus filiados e/ou simpatizantes. (...) A generalização seletiva tornou-se a prática deliberada e rotineira da grande mídia e, aos poucos, as palavras ‘petista’ – designação de filiado ao Partido dos Trabalhadores – e ‘mensaleiro’ se transformaram em palavrões equivalentes a ‘comunista’, ‘subversivo’ ou ‘terrorista’ na época da ditadura militar (1964-1985). ‘Petista’ e ‘mensaleiro’ tornaram-se, implicitamente, inimigos públicos e sinônimos de corruptos e desonestos” (ver “A linguagem seletiva do ‘mensalão’“).
Em abril de 2014, depois de visitar várias regiões do país lançando seu premiado romanceK, o escritor e jornalista Bernardo Kucinski recuperou a palavra “politicídio” para descrever o que antecipou como “uma mobilização em marcha para exterminar o PT da sociedade brasileira, a começar pela sua presença no imaginário da população”.
Saul Leblon comentou na Carta Maior:
“A aspiração não é nova nas fileiras conservadoras. Em 2005, já se preconizava livrar o país ‘dessa raça pelos próximos trinta anos’. Jorge Bornhausen, autor da frase, reúne credenciais e determinação para levar adiante seu intento. (...) A verdadeira novidade é a forma passiva como um pedaço da própria intelectualidade progressista passou a reagir diante dessa renovada determinação de exterminar o PT da vida política nacional” (íntegra aqui).
Nos meses que antecederam à realização da Copa do Mundo de Futebol presenciamos a uma intensa e uniforme campanha de descrédito que celebrava o fracasso antecipado em expressões do tipo “Não vai ter Copa”. Fracasso antecipado pela incapacidade brasileira – mas, sobretudo, do governo brasileiro – de realizar um evento dessa magnitude.
Superada a Copa do Mundo, iniciou-se o ciclo eleitoral propriamente dito e recrudesceu a indisfarçável partidarização da grande mídia em níveis desconhecidos até aqui. Hegemoniza-se rapidamente, não só na grande mídia, mas também nas redes sociais, uma assustadora “linguagem do ódio” – incluindo a edição deliberada de imagens – contra os governos liderados pelo PT nos diferentes níveis da administração pública e contra petistas que os apoiam.
Talvez a característica mais forte dessa “linguagem do ódio” seja a utilização dos verbos “acabar”, “varrer”, “eliminar”, “exterminar”, “expulsar”, “aniquilar” que contamina e, em muitos, casos transita de um para outro lado da disputa, como se estivéssemos numa guerra civil em que o lado derrotado devesse ser “banido” da face da terra.
E o pós-eleições?
Há alguns anos tenho escrito sobre processos de intolerância que vêm sendo construídos e estimulados por uma grande mídia cada vez mais partidarizada e, de fato, sem compromisso verdadeiro com o processo democrático. A menos de uma semana do segundo turno da eleição para Presidência da República e para governadores de 14 estados da Federação, não é possível ignorar o nível de irracionalidade e polarização a que se chegou à disputa eleitoral.
A questão incontornável é o que será feito do ódio e de sua linguagem que vêm sendo construídos e estimulados com a participação ativa da grande mídia ao longo dos últimos muitos meses, independentemente dos resultados das urnas. Como se comportarão os oligopólios da mídia partidarizada, derrotados ou vitoriosos, depois das omissões e distorções evidentes em favor de uma das posições políticas em disputa?
Infelizmente – inclusive, levando-se em conta o comportamento da grande mídia nos estados onde haverá segundo turno também para governador – não há indícios de que a linguagem do ódio desaparecerá com a realização do segundo turno. Ao contrário.
O que é possível fazer para que se restabeleçam as condições mínimas de tolerância necessárias à convivência democrática?
A ver.
“O que de mais importante aconteceu no nosso país de 2005 para cá – vale dizer, ao longo dos últimos oito anos – e se consolidou em 2013 com as várias semanas de julgamento televisionado, ao vivo, no Supremo Tribunal Federal – foi a formação de uma linguagem nova, seletiva e específica, com a participação determinante da grande mídia, dentro da qual parcela dos brasileiros passou a ‘ver’ os réus da Ação Penal nº 470, em particular aqueles ligados ao Partido dos Trabalhadores. (...) Nos últimos anos ‘mensalão’ passou a ser ‘um esquema de corrupção’ e tornou-se ‘mensalão do PT’, enquanto situações idênticas e anteriores, raramente mencionadas, foram identificadas pela geografia e não pelo partido político (‘mensalão mineiro’). Como resultado foi se construindo sistematicamente uma associação generalizada, seletiva e deliberada entre corrupção e os governos Lula e o PT, ou melhor, seus filiados e/ou simpatizantes. (...) A generalização seletiva tornou-se a prática deliberada e rotineira da grande mídia e, aos poucos, as palavras ‘petista’ – designação de filiado ao Partido dos Trabalhadores – e ‘mensaleiro’ se transformaram em palavrões equivalentes a ‘comunista’, ‘subversivo’ ou ‘terrorista’ na época da ditadura militar (1964-1985). ‘Petista’ e ‘mensaleiro’ tornaram-se, implicitamente, inimigos públicos e sinônimos de corruptos e desonestos” (ver “A linguagem seletiva do ‘mensalão’“).
Em abril de 2014, depois de visitar várias regiões do país lançando seu premiado romanceK, o escritor e jornalista Bernardo Kucinski recuperou a palavra “politicídio” para descrever o que antecipou como “uma mobilização em marcha para exterminar o PT da sociedade brasileira, a começar pela sua presença no imaginário da população”.
Saul Leblon comentou na Carta Maior:
“A aspiração não é nova nas fileiras conservadoras. Em 2005, já se preconizava livrar o país ‘dessa raça pelos próximos trinta anos’. Jorge Bornhausen, autor da frase, reúne credenciais e determinação para levar adiante seu intento. (...) A verdadeira novidade é a forma passiva como um pedaço da própria intelectualidade progressista passou a reagir diante dessa renovada determinação de exterminar o PT da vida política nacional” (íntegra aqui).
Nos meses que antecederam à realização da Copa do Mundo de Futebol presenciamos a uma intensa e uniforme campanha de descrédito que celebrava o fracasso antecipado em expressões do tipo “Não vai ter Copa”. Fracasso antecipado pela incapacidade brasileira – mas, sobretudo, do governo brasileiro – de realizar um evento dessa magnitude.
Superada a Copa do Mundo, iniciou-se o ciclo eleitoral propriamente dito e recrudesceu a indisfarçável partidarização da grande mídia em níveis desconhecidos até aqui. Hegemoniza-se rapidamente, não só na grande mídia, mas também nas redes sociais, uma assustadora “linguagem do ódio” – incluindo a edição deliberada de imagens – contra os governos liderados pelo PT nos diferentes níveis da administração pública e contra petistas que os apoiam.
Talvez a característica mais forte dessa “linguagem do ódio” seja a utilização dos verbos “acabar”, “varrer”, “eliminar”, “exterminar”, “expulsar”, “aniquilar” que contamina e, em muitos, casos transita de um para outro lado da disputa, como se estivéssemos numa guerra civil em que o lado derrotado devesse ser “banido” da face da terra.
E o pós-eleições?
Há alguns anos tenho escrito sobre processos de intolerância que vêm sendo construídos e estimulados por uma grande mídia cada vez mais partidarizada e, de fato, sem compromisso verdadeiro com o processo democrático. A menos de uma semana do segundo turno da eleição para Presidência da República e para governadores de 14 estados da Federação, não é possível ignorar o nível de irracionalidade e polarização a que se chegou à disputa eleitoral.
A questão incontornável é o que será feito do ódio e de sua linguagem que vêm sendo construídos e estimulados com a participação ativa da grande mídia ao longo dos últimos muitos meses, independentemente dos resultados das urnas. Como se comportarão os oligopólios da mídia partidarizada, derrotados ou vitoriosos, depois das omissões e distorções evidentes em favor de uma das posições políticas em disputa?
Infelizmente – inclusive, levando-se em conta o comportamento da grande mídia nos estados onde haverá segundo turno também para governador – não há indícios de que a linguagem do ódio desaparecerá com a realização do segundo turno. Ao contrário.
O que é possível fazer para que se restabeleçam as condições mínimas de tolerância necessárias à convivência democrática?
A ver.
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