Que o governo Temer representa uma forte guinada à direita, está claro pelo retrato do ministério: branco, masculino, rico e essencialmente conservador. Nesta sexta-feira, a solução para o primeiro problema político grave, a substituição de Eduardo Cunha na presidência da Câmara, gerou um golpe dentro do golpe. Na próxima semana o presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Osmar Serraglio, aliado de Cunha, posto no cargo para defender seus interesses, tentará aprovar um parecer técnico pelo qual será necessária a eleição de um novo presidente da Câmara. O cargo vem sendo ocupado, desde o afastamento de Cunha pelo STF, pelo primeiro-vice-presidente Waldir Maranhão.
A nova eleição seria golpista, um golpe em cima do fraco Maranhão, porque o regimento só admite a eleição de um novo membro da Mesa diretoria em casos de morte, renúncia ou cassação. No caso de Cunha, ele não quer renunciar e a cassação, se vier, vai demorar. E como nesta sexta-feira Maranhão declarou que não vai renunciar, encontraram esta saída autoritária e legalmente discutível no STF. Ele caiu em desgraça com o bloco vitorioso desde que votou contra o impeachment. Depois resolveu anular a votação do impeachment na Câmara e, pressionado ao limite, recuou.
A outra saída para resolver o problema do comando da Câmara seria Temer pedir a renúncia de Eduardo Cunha. Aí sim, estaria criada a situação legal para a eleição de novo ocupante do cargo. Por que Temer não faz isso?
Ele precisa de um homem (mulher nem pensar) de suas confiança no comando da Câmara. Ao lotear o governo – da mesma forma como fizeram TODOS os presidentes desde que se instalou entre nós, por força da pulverização partidária e da Constituição de 1988, o tal presidencialismo de coalizão – Temer atendeu a 11 partidos com ministérios e atenderá aos pequenos com estatais e autarquias. Inclusive o aguerrido SD de Paulo Pereira da Silva, que tanto fez pelo impeachment mas ficou fora do primeiro escalão. Com o corte de ministérios, não coube todo mundo. E atendendo a todos os partidos da coalizão golpista, Temer garante-se uma maioria de 355 votos na Câmara, onde será fundamental ter uma base fiel e orgânica para aprovar as medidas que vêm por ai. Mas não basta ter maioria e não dispor de um e fiel comandante da Câmara. Dilma começou a cair no dia em que Eduardo Cunha se elegeu presidente, derrotando Arlindo Chinaglia, do PT. A disputa foi tida, inclusive por Lula, como um grave erro cometido por Dilma e pelos petistas. Agora é a vez de Temer ter um presidente da Câmara para chamar de seu.
Negociar a renúncia de Cunha seria mais fácil mas seus aliados optaram por arrebentar a corda do lado mais fraco, mesmo que seja atropelando o regimento. Depois de forçar o recuo de Maranhão na anulação do impeachment, tentaram arrancar-lhe a renúncia ao posto de vice-presidente que lhe garante o exercício interino da presidência. Ele pensou 48 horas e acabou dizendo não. Foi então que entrou em cena o presidente da CCJ encomendando o parecer técnico que admite a eleição de um novo presidente, embora Cunha esteja apenas afastado do mandato, e por decorrência, do cargo de presidente. A votação na comissão está marcada para semana que vem.
Temer fará tudo para não trombar com Cunha. A citação mais grave ao presidente em exercício, nos anais da Lava Jato, aparece na transcrição de troca de mensagens entre Cunha e Léo Pinheiro, executivo da OAS. Nela Cunha reclama por ter a construtora realizado um pagamento de R$ 5 milhões a Temer, deixando de fora a parcela devida ao resto da turma do PMDB. Isso já é de conhecimento de Sergio Moro e do Supremo. Temer, quando da divulgação da conversa eletrônica, apresentou comprovante de uma doação legal de R$ 5,2 milhões pela OAS ao PMDB. Mas a transcrição sugere que Cunha não falava de doação legal mas de um outro dinheiro. Teria ele algo mais a dizer sobre este assunto?
Maranhão teve o filho demitido do tribunal de contas do estado e sofreu todo tipo de ameaças para recuar da decisão de anular o impeachment. Capitulou mas dizem amigos seus que ele está disposto a resistir se tentarem lhe tirar a vice-presidência no tapetão. Seja com a eleição de um novo presidente, seja acelerando sua expulsão do PP, partido que o indicou ao posto de vice-presidente.
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