Por Ricardo Kotscho, em seu blog:
Há duas corridas eleitorais paralelas hoje em disputa no Brasil.
Uma se dá no plano político-partidário em que a base aliada do governo Michel Temer ainda busca encontrar um candidato de centro viável capaz de enfrentar Lula e Bolsonaro nas urnas em outubro.
Outra corre no Judiciário, no mercado e na grande mídia para impedir Lula de ser candidato, e já tem data e local marcado para a grande decisão: 24 de janeiro, no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre.
À medida em que se aproxima o dia do julgamento do recurso do ex-presidente contra a sua condenação a 9 anos e seis meses de prisão em primeira instância, novos atores entram em cena, tornando o desfecho absolutamente imprevisível.
Primeiro, o prefeito tucano de Porto Alegre, Nelson Marchesan Jr. solicitou ao presidente Temer o envio de tropas do Exército e da Força Nacional para impedir manifestações em defesa do ex-presidente no dia do julgamento.
O pedido foi sumariamente recusado pelo governo federal, mas neste sábado o portal do Estadão informa que um vídeo divulgado esta semana por João Pedro Stédile, líder do Movimento dos Sem Terra, convocando os militantes para atos de protesto antes, durante e após o julgamento, “acendeu a luz de alerta” dos serviços de inteligência das Forças Armadas.
Em reportagem de Roberto Godoy e Ricardo Galhardo, ficamos sabendo que os militares estão acompanhando as movimentações de João Pedro Stédile e temem que possam evoluir para um confronto direto e violento com a polícia, e “pior, para a pressão além do limite sobre o Judiciário, sobre os magistrados, principalmente”.
No vídeo, Stédile afirmou que os 87 grupos reunidos na Frente Brasil Popular estão organizando manifestações diante de fóruns, não apenas em Porto Alegre, mas em outras capitais, “sobretudo da Justiça Federal para mostrar nossa indignação”.
A partir de março, a Frente Brasil Popular planeja mobilizações permanentes em defesa da candidatura de Lula para culminar num grande ato em julho, para 100 mil pessoas, no Maracanã.
“Teremos um 2018 cheio de mobilizações, de muita disputa política em que a própria campanha eleitoral se transformará numa verdadeira luta de classes”, anunciou Stédile.
Embora os líderes do MST tenham afirmado que “sempre procuramos minimizar qualquer tipo de conflito, até porque quem paga é o trabalhador”, a preocupação dos militares ouvidos pelo Estadão é a possibilidade de choques entre militantes dos sem terra e do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) com organizações como o Movimento Brasil Livre (MBL), apoiadores de Bolsonaro e do prefeito paulistano João Doria, que já se mobiliza também para fazer protestos contra Lula e em defesa do juiz Sergio Moro no dia do julgamento.
Com o silêncio das ruas nos últimos meses, fica ainda mais difícil avaliar neste momento que dimensões podem ganhar as reações populares, de um lado e de outro, ao julgamento de Porto Alegre.
O certo é que esse clima de beligerância só tende a aumentar daqui até o dia da eleição, nos tribunais e nas ruas, tornando irrelevantes os acordos partidários que estão sendo costurados pelos pré-candidatos e os partidos.
A pouco mais de nove meses da abertura das urnas, a disputa eleitoral fugiu do controle dos velhos caciques políticos, que tentam manter seu poder a qualquer preço, nem que seja necessário mudar as regras do jogo em andamento, como estão planejando em Brasília.
Por isso, já tem cada vez mais gente até duvidando que as eleições aconteçam mesmo na data marcada pelo calendário.
Ainda estão muito vivas na memória da minha geração as trágicas lembranças do que acontece quando os militares entram em cena para resolver impasses e conflitos políticos.
E pensar que mal acabamos de completar três décadas de redemocratização do país após 21 anos de ditadura.
Vida que segue.
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