Por Dayane Santos, no site Vermelho:
A revista Veja desta semana traz uma matéria em que garante que na tarde do dia 27 de abril teve acesso com “exclusividade” ao local onde o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está preso, e seguindo o seu roteiro de factoides, apresentou uma suposta rotina do primeiro mês na prisão, mas que na verdade é um panfleto que tenta desconstruir a imagem do ex-presidente.
“A Veja está descontente com o fato do Lula estar preso e mesmo assim ser notícia todos os dias”, avalia o jornalista e presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Altamiro Borges, se referindo às diversas manifestações de solidariedade e contra a arbitrária prisão de Lula, citando a vigília com acampamento, o ato de 1º de Maio – o maior já realizado em Curitiba – e os pronunciamentos de lideranças internacionais.
Já o professor aposentado da Faculdade de Comunicação da USP, Laurindo Lalo Leal, afirma que até os anos 1990, a Veja foi uma revista importante, mas após a vitória das forças progressistas o veículo entrou no que chama de “rota de sensacionalismo hostil”.
“A partir do governo Lula, a Veja entrou numa rota de panfletagem do sensacionalismo claramente hostil aos governos populares de Lula e Dilma, chegando a ser a maior reprodutora do que hoje chamamos de fake news”, analisou Lalo, citando como exemplo a capa publicada na véspera das eleições de 2014, com a foto de Lula e Dilma, que dizia “Eles sabiam de tudo”, tratando sobre as investigações da Petrobras.
“Na verdade, era muito mais do que a capa. Era a capa transformada em outdoors, numa clara demonstração de que aquilo não era jornalismo, mas propaganda política”, enfatizou. “Essa capa [desta semana] é a continuidade desse processo”, acrescentou
Altamiro não considera que a Veja seja uma revista, mas “um panfleto que estimula ódio no Brasil”. “Se dependesse da Veja, o Lula estava esquecido. O que incomoda é o fato de que mesmo preso, Lula é motivo de mobilização, solidariedade internacional e crítica aos abusos cometidos contra ele”, frisou. “Se dependesse da Veja, que já fez dezenas de capas em que Lula aparece sangrando ou vestido de presidiário, o ex-presidente não estaria preso, mas numa câmara de gás num campo de concentração nazista. Essa é a vontade da Veja”, completou o jornalista.
A avaliação de Altamiro é constatada na reportagem da revista que demonstra sua frustração ao insinuar que o ex-presidente, preso em regime de isolamento, teria privilégios com uma “rotina diferente da dos outros 22 presos na carceragem da PF em Curitiba”.
“O ex-presidente não tem hora para acordar ou dormir, não tem hora para o banho de sol, pode receber os advogados quando desejar”, afirma a revista, como se receber advogados não fosse um direito de Lula ou de qualquer outro preso.
A revista diz ainda que a cela é “confortável se comparada às demais, não fica trancada” e ainda tem “banheiro, onde há um boxe com chuveiro elétrico, uma pia e um vaso sanitário”.
“Normalmente, a porta permanece apenas fechada. Mesmo sem horários rígidos, o dia de Lula na prisão começa por volta das 7 horas — e segue uma rotina especial”, diz.
Até mesmo o fato do encarregado de servir a refeição bater na porta antes de abri-la é considerado inadmissível para a revista. “Entra, coloca a marmita sobre a mesa redonda e aplica uma dose de insulina no ex-presidente, necessária para o tratamento do diabetes”, descreve.
Para Altamiro, se a versão da Veja de que estiveram na Superintendência da Polícia Federal, onde Lula está preso, for verdade, é uma demonstração de que Polícia Federal e a Lava Jato “perderam qualquer estribeira”.
“Proibiram a entrada do Prêmio Nobel. Proibiram a entrada de governadores e de sindicalistas. Proibiram a entrada de Leonardo Boff, um dos mais importantes teólogos do mundo e conselheiro do papa Francisco, mas permite a entrada de jagunços da imprensa. É uma coisa inexplicável”, afirmou o jornalista.
Ele não duvida de que a reportagem foi feita a partir da autorização da entrada do jornalista e não por um informante. “Existe uma relação entre o aparato coercitivo do Estado – Ministério Público e Polícia Federal – e o aparado de hegemônico da sociedade civil que é a mídia. Essa relação o próprio Moro descreveu em sua tese apontando que era fundamental para garantir o êxito de uma operação eivada de abusos”, lembrou.
Lalo reforça que se confirmado o fato, a Polícia Federal deve explicações por essa irregularidade ou “responder quem foi o espião da Veja dentro da carceragem”.
Para o professor, por mais que seus leitores se identifiquem com a linha política “eles percebem que o limite entre a propaganda e a informação vai sendo rompido”.
O líder do PT na Câmara dos Deputados, Paulo Pimenta (RS), afirmou que se trata de “um fato de gravidade ímpar” que revela o “conluio, a cumplicidade da mídia com a Lava Jato, para destruir reputações”.
“Se esta matéria for verdadeira, significa a falência do Sistema Judiciário brasileiro e que a cada dia revela a sua capacidade de ser pior. Estamos assistindo há dias um tratamento desumano jamais visto a um líder político que é um chefe de Estado reconhecido internacionalmente”, disse o parlamentar.
Segundo Pimenta, se a matéria for real é mais um sinal da instalação do Estado policial no Brasil. “Eu custo a acreditar que esta matéria seja verdadeira. Quero crer que não seja verdadeira”, acrescentou.
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