Por Haroldo Lima, no Blog do Renato:
As reiteradas posições inamistosas de Bolsonaro face à China fizeram com que este país, dois dias após a eleição no Brasil, tenha lavrado um protesto a suas posições e expressado um alerta vigoroso.
Jair Bolsonaro conseguiu ser eleito presidente da República sem apresentar suas ideias sobre o Brasil. Vituperava frases, em geral insolentes, agredindo setores sociais vulneráveis. Sobre a economia, repetia bordões genéricos e voluntaristas. Suas afirmações causavam sobressalto, mas seus apoiadores acreditavam que ele não as cumpriria. Nunca se desejou tanto que um presidente eleito desconsidere tudo o que prometeu. É a torcida de muitos dos que votaram nele, com elevada dose de ingenuidade.
Um bordão usado intensamente pelo presidente eleito é que o Brasil, sob seu governo, iria fazer negócios comerciais e ter relações internacionais “sem viés ideológico”. No breve discurso que fez ao tomar conhecimento da vitória, disse que iria libertar o “Brasil e o Itamaraty das relações internacionais com viés ideológico a que foram submetidos nos últimos anos”.
E na linha dessas “relações sem viés ideológico”, Bolsonaro disse que tiraria o Brasil da ONU, desejo do qual disse que já abriu mão; que tiraria o Brasil do Pacto de Paris, assinado com 195 países, em defesa do meio ambiente, e do qual o Trump já retirou os Estados Unido; que o Mercosul não era prioridade; que a Organização dos Estados Americanos tem “zero credibilidade”; que não queria nada com os “bolivarianos”; que suas prioridades seriam Estados Unidos, Chile e Israel; que em Israel mudaria a embaixada do Brasil para Jerusalém. Constante em seu raciocínio são críticas à China. Não fez em sua campanha qualquer referência aos BRICS, a articulação do Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Gosta de se considerar um “Trump tropical”, como se isso fosse um elogio.
A tal “política internacional sem viés ideológico” do Bolsonaro, pelo que se vê, não é senão uma política internacional com forte viés ideológico de direita, pro-americanista.
Sua atitude face à China chegou às raias da provocação. Sim. Em março deste ano, já como candidato a presidente do Brasil, resolveu visitar Taiwan, a ilha chinesa que continua rebelada desde a proclamação da República Popular em 1949, onde está, desde então, o grupo originariamente comandado por Chiang Kai-shek, o general-presidente derrotado na revolução socialista chinesa então vitoriosa.
É sabido que desde a fundação da República Popular, a China tem mantido a posição de princípio de “uma só China”, só estabelecendo relações diplomáticas com quem aceita este princípio e rejeita explicitamente a ideia de “duas Chinas”, ou “uma China e um Taiwan”. Todos os países que estabeleceram relação com a China o fizeram nessa base, a exemplo dos Estados Unidos, em 1979, e do Brasil, em 1974, na época da ditadura militar, quando era presidente o general Geisel.
A ida de Bolsonaro, quando candidato a presidente do Brasil, a Taiwan, era uma atitude claramente inamistosa, uma sinalização clara da tentativa de alguma aproximação com essa ilha rebelde, passando por cima dos compromissos diplomáticos firmados pelo Brasil desde a época do presidente Geisel e respeitados por todos os presidentes desde então.
Na época da provocativa visita, o Governo da China firmou um protesto, expressando sua “profunda preocupação e indignação” com a inusitada visita e alertando que a mesma era uma “afronta a soberania e integridade territorial da China”.
Já eleito presidente do Brasil, Bolsonaro reiterou um ponto de vista crítico à China, apresentando-a como predadora da economia brasileira e suscitando dúvidas quanto à continuidade da relação mutuamente proveitosa entre o Brasil e a China.
O protesto da China publicado a 30 passado pelo prestigiado jornal China Daily é duro e toca na questão de fundo. Diz que a crítica a Pequim feita por Bolsonaro “pode servir a algum objetivo político específico”, mas que poderá ter um custo elevado para o Brasil. De fato, os manejos do Bolsonaro servem à geopolítica americana.
Para os negócios do Brasil, essa postura do Bolsonaro chega às raias da irresponsabilidade, pois vai na linha de tumultuar, para agradar aos Estados Unidos, a relação do Brasil com o país que é hoje o seu maior parceiro comercial, à frente dos Estados Unidos.
O comércio Brasil-China tem-se ampliado consideravelmente. Especialmente desde 2001, quando terminava o governo de Fernando Henrique, até 2015, incluindo os dois governos de Lula e o primeiro de Dilma, esse comércio saiu de US3,2 bilhões para US$66,3 bilhões, sendo que a China passou a ser, desde 2009, o principal parceiro comercial do Brasil.
Aspecto que não deve ser esquecido é que nessa relação comercial agudamente aquecida, o superávit está sempre com o Brasil. Em 2015, o Brasil exportou para a China US$35,6 bilhões de mercadorias e comprou US$30,7 bilhões, do que resultou um superávit de US$4,9 bilhões. Se computarmos todo o superávit favorável ao Brasil que vem desde 2009, veremos que o saldo chega a US$46 bilhões, quantia extremamente significativa.
No mundo de hoje há um deslocamento do eixo econômico principal no rumo oriental, polarizado pela Ásia, na sequência do declínio dos Estados Unidos e da Europa. É da Ásia, e especialmente da China, que virão e já estão vindo os maiores investimentos e onde estão os maiores mercados consumidores.
O que o futuro governo de Bolsonaro já sinaliza é que, também no nível das relações internacionais entrará na contramão da história. E a resistência popular terá que se opor também a uma política internacional regressiva do novo governo.
* Haroldo Lima é engenheiro, ex-deputado federal e ex-Presidente do Grupo Parlamentar Brasil-China, é da Comissão Política Nacional do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil.
As reiteradas posições inamistosas de Bolsonaro face à China fizeram com que este país, dois dias após a eleição no Brasil, tenha lavrado um protesto a suas posições e expressado um alerta vigoroso.
Jair Bolsonaro conseguiu ser eleito presidente da República sem apresentar suas ideias sobre o Brasil. Vituperava frases, em geral insolentes, agredindo setores sociais vulneráveis. Sobre a economia, repetia bordões genéricos e voluntaristas. Suas afirmações causavam sobressalto, mas seus apoiadores acreditavam que ele não as cumpriria. Nunca se desejou tanto que um presidente eleito desconsidere tudo o que prometeu. É a torcida de muitos dos que votaram nele, com elevada dose de ingenuidade.
Um bordão usado intensamente pelo presidente eleito é que o Brasil, sob seu governo, iria fazer negócios comerciais e ter relações internacionais “sem viés ideológico”. No breve discurso que fez ao tomar conhecimento da vitória, disse que iria libertar o “Brasil e o Itamaraty das relações internacionais com viés ideológico a que foram submetidos nos últimos anos”.
E na linha dessas “relações sem viés ideológico”, Bolsonaro disse que tiraria o Brasil da ONU, desejo do qual disse que já abriu mão; que tiraria o Brasil do Pacto de Paris, assinado com 195 países, em defesa do meio ambiente, e do qual o Trump já retirou os Estados Unido; que o Mercosul não era prioridade; que a Organização dos Estados Americanos tem “zero credibilidade”; que não queria nada com os “bolivarianos”; que suas prioridades seriam Estados Unidos, Chile e Israel; que em Israel mudaria a embaixada do Brasil para Jerusalém. Constante em seu raciocínio são críticas à China. Não fez em sua campanha qualquer referência aos BRICS, a articulação do Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Gosta de se considerar um “Trump tropical”, como se isso fosse um elogio.
A tal “política internacional sem viés ideológico” do Bolsonaro, pelo que se vê, não é senão uma política internacional com forte viés ideológico de direita, pro-americanista.
Sua atitude face à China chegou às raias da provocação. Sim. Em março deste ano, já como candidato a presidente do Brasil, resolveu visitar Taiwan, a ilha chinesa que continua rebelada desde a proclamação da República Popular em 1949, onde está, desde então, o grupo originariamente comandado por Chiang Kai-shek, o general-presidente derrotado na revolução socialista chinesa então vitoriosa.
É sabido que desde a fundação da República Popular, a China tem mantido a posição de princípio de “uma só China”, só estabelecendo relações diplomáticas com quem aceita este princípio e rejeita explicitamente a ideia de “duas Chinas”, ou “uma China e um Taiwan”. Todos os países que estabeleceram relação com a China o fizeram nessa base, a exemplo dos Estados Unidos, em 1979, e do Brasil, em 1974, na época da ditadura militar, quando era presidente o general Geisel.
A ida de Bolsonaro, quando candidato a presidente do Brasil, a Taiwan, era uma atitude claramente inamistosa, uma sinalização clara da tentativa de alguma aproximação com essa ilha rebelde, passando por cima dos compromissos diplomáticos firmados pelo Brasil desde a época do presidente Geisel e respeitados por todos os presidentes desde então.
Na época da provocativa visita, o Governo da China firmou um protesto, expressando sua “profunda preocupação e indignação” com a inusitada visita e alertando que a mesma era uma “afronta a soberania e integridade territorial da China”.
Já eleito presidente do Brasil, Bolsonaro reiterou um ponto de vista crítico à China, apresentando-a como predadora da economia brasileira e suscitando dúvidas quanto à continuidade da relação mutuamente proveitosa entre o Brasil e a China.
O protesto da China publicado a 30 passado pelo prestigiado jornal China Daily é duro e toca na questão de fundo. Diz que a crítica a Pequim feita por Bolsonaro “pode servir a algum objetivo político específico”, mas que poderá ter um custo elevado para o Brasil. De fato, os manejos do Bolsonaro servem à geopolítica americana.
Para os negócios do Brasil, essa postura do Bolsonaro chega às raias da irresponsabilidade, pois vai na linha de tumultuar, para agradar aos Estados Unidos, a relação do Brasil com o país que é hoje o seu maior parceiro comercial, à frente dos Estados Unidos.
O comércio Brasil-China tem-se ampliado consideravelmente. Especialmente desde 2001, quando terminava o governo de Fernando Henrique, até 2015, incluindo os dois governos de Lula e o primeiro de Dilma, esse comércio saiu de US3,2 bilhões para US$66,3 bilhões, sendo que a China passou a ser, desde 2009, o principal parceiro comercial do Brasil.
Aspecto que não deve ser esquecido é que nessa relação comercial agudamente aquecida, o superávit está sempre com o Brasil. Em 2015, o Brasil exportou para a China US$35,6 bilhões de mercadorias e comprou US$30,7 bilhões, do que resultou um superávit de US$4,9 bilhões. Se computarmos todo o superávit favorável ao Brasil que vem desde 2009, veremos que o saldo chega a US$46 bilhões, quantia extremamente significativa.
No mundo de hoje há um deslocamento do eixo econômico principal no rumo oriental, polarizado pela Ásia, na sequência do declínio dos Estados Unidos e da Europa. É da Ásia, e especialmente da China, que virão e já estão vindo os maiores investimentos e onde estão os maiores mercados consumidores.
O que o futuro governo de Bolsonaro já sinaliza é que, também no nível das relações internacionais entrará na contramão da história. E a resistência popular terá que se opor também a uma política internacional regressiva do novo governo.
* Haroldo Lima é engenheiro, ex-deputado federal e ex-Presidente do Grupo Parlamentar Brasil-China, é da Comissão Política Nacional do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil.
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