segunda-feira, 29 de junho de 2020

A ‘autocrítica’ do ‘Jair Paz e Amor’

Por Fernando Brito, em seu blog:

Não há como deixar de lembrar da velha série do “Acredite se Quiser” que a televisão exibia.

Pois o Painel da Folha traz hoje que “Bolsonaro foi convencido de autocrítica e autorizou diálogo de auxiliares com STF em busca da paz“.

Será que alguém acredita que Bolsonaro – que não fez “autocrítica” da ditadura militar, dos assassinatos políticos, da tortura ou mesmo de um plano de explodir bombas em quartéis para obter aumento de soldo – vá arrepender-se de suas atitudes autoritárias no governo?

No entanto, diz o jornal que o presidente foi “convencido de que era momento de uma autocrítica e de agir de maneira diferente, sem esperar que os outros Poderes fizessem algo antes ou o cobrassem de novo por isso. O presidente autorizou três de seus ministros a abrir o diálogo neste tom e assumir o compromisso de uma nova postura, de paz, que até agora tem sido seguida”.

Felizmente, o espírito da “velhinha de Taubaté”, aquela personagem que Luiz Fernando Veríssimo criou para simbolizar a última pessoa no Brasil que ainda acreditava no governo Figueiredo, não se disseminou em todo o jornal.

Celso Rocha de Barros, na mesma edição, é mais realista ao dizer que tivemos apenas “uma semana de folga” da brutalidade de Jair Bolsonaro.

“(…) ganhamos uma semana de silêncio presidencial. A rodada de golpismo fracassou, resta o acobertamento, e isso não é feito diante das massas. Nessa semana de silêncio(…) só foi possível controlar Bolsonaro impondo-lhe silêncio total. Ninguém conseguiu fazer com que ele ao menos recitasse coisas razoáveis”.

Barros recomenda extrema cautela:

(…) faz pouco tempo, suspirávamos aliviados porque os generais haviam conseguido segurar Mandetta na saúde. Durou só uma semana. Os generais fracassaram, Mandetta caiu, a mortandade explodiu, e estava perpetrado o maior crime que a Presidência da República brasileira já cometeu.

E não sabemos o quanto o arranjo da semana passada é estável. Bolsonaro vai ficar em silêncio até o final de seu mandato? Não vai tentar novas manobras para interferir nas investigações? Se escapar das investigações, não vai tentar novos atentados contra a democracia? Se não escapar, vai cair e voltar para o Recreio dos Bandeirantes pacificamente? Vai ter acordão?

E nós, brasileiros, vamos também ficar em silêncio? Vamos normalizar o fato de não termos Poder Executivo funcional durante a pandemia, por culpa única e exclusiva do presidente da República? Vamos todos fingir que não vimos o presidente da República tentando um golpe de Estado?"


Parece que há gente disposta a isso e tratei disto ontem ao dizer que não há “frente ampla” possível com este governo em troca de composições que lhe garantam funcionar em troca da manutenção de uma semidemocracia formal.

Porque não há democracia possível com a indiferença com as dezenas milhares de mortes que tivemos, temos e teremos sendo ampliadas pela desídia governamental e com a continuidade de uma política – que muitos dos “oposicionistas” consideram intocável – que aliena e arruína o Brasil.

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