Charge: Toni D'Agostinho |
Na avalanche de informações sobre os planos golpistas, quero destacar sete pontos.
1. O destino de Bolsonaro
A hora de Jair Bolsonaro chegou, embora não devamos esperar que ele seja preso em breve. Sua hora chegou porque já existem provas, e não apenas indícios, de sua participação central na tentativa de golpe.
Que prova pode ser mais eloquente que um vídeo em que ele discute o golpe com seus auxiliares?
O que dizer da descoberta, via delação de Mauro Cid, de que ele recebeu no dia 9 de julho de 2022 o general Theophilo de Oliveira, comandante do COTER (Comando de Operações Terrestres), que lhe garantiu o emprego de seu batalhão na quartelada?
Ou das mudanças que ele pediu no decreto do golpe, excluindo a prisão do ministro do STF Gilmar Mendes e a do senador Rodrigo Pacheco e deixando apenas a de Alexandre de Morais?
Bolsonaro teve o passaporte apreendido mas ninguém espere vê-lo sofrendo uma prisão preventiva ou temporária. Como ex-presidente, ele será em breve indiciado. Depois será denunciado, julgado e, esperamos todos, condenado.
Tudo será feito com absoluto rigor, para que não pairem dúvidas que alimentem o vitimismo. Só depois de condenado ele será preso. E paremos de falar em Papuda. Como ex-presidente ele irá para uma unidade militar. Isso tudo ouvi de uma fonte do Judiciário.
2. Por que o golpe de Bolsonaro falhou?
Já sabemos muito sobre o que foi planejado mas o documento do ministro Alexandre Morais, autorizando a Operação Tempus Veritates, pouco revela sobre seu fracasso. Estou falando do golpe que seria dado antes das eleições ou antes da posse de Lula. O 8 de janeiro foi um esperneio aloprado, uma tentativa de realizar, já com Bolsonaro nos EUA e Lula empossado, o golpe que não conseguiram dar antes.
Pode parecer secundaria mas essa minha curiosidade tem sua razão de ser. O golpe falhou por que Bolsonaro desistiu, porque os comandantes militares o impediram ou por qual razão? Já sabemos que Alexandre de Morais deveria ser preso no dia 18 de dezembro. Não foi.
No dia 22, a PF abortou o atentado a bomba planejado para ocorrer perto do aeroporto de Brasília. Seria ele a senha para a decretação do estado de sítio? O que houve entre os militares que pode ter impedido o golpe? Tudo isso ainda precisamos saber.
3. O crime dos que resistiram mas não denunciaram o golpe
Desde o ano passado o ministro da Defesa, José Múcio, repete o mantra de que a democracia foi salva pelos militares legalistas que resistiram ao golpe. Agora sabemos que, de fato, o então comandante do Exército, Freire Gomes, bem como o da Aeronáutica, Batista Júnior, não embarcaram na aventura, ao contrário do Almirante Garnier, que comandava a Marinha. Isso é um avanço em relação à tradição militara brasileira mas, inocente Freire Gomes não é: além de ter se calado, sabendo do golpe, tolerou o acampamento golpista à porta de seu QG em Brasília.
Vale recordar que Batista Júnior – aquele que Braga Neto xinga de traidor e manda que infernizem a vida dele e de sua família – teve conduta melhor. Foi ele que fez chegar a Alexandre o conselho para que antecipasse a diplomação de Lula, prevista para o dia 22 de dezembro de 2022, porque poderia haver ação golpista no final do mês. O ato foi antecipado para o dia 12, que foi um dia de terror em Brasília.
O que fará a Justiça em relação aos que se omitiram? E foram muitos. O golpe, pelo visto, era segredo de polichinelo na caserna.
4. A Abin Paralela e o FirstMile no golpe
A PF descobriu que o assessor de Bolsonaro Marcelo Câmara, membro do grupo de inteligência do golpe, monitorava os movimentos do ministro Alexandre de Morais. Afinal, quando o golpe estourasse, ele teria que ser preso.
O documento autorizando a operação Tempus Veritates afirma: “as circunstâncias identificadas evidenciam ações de vigilância e monitoramento em níveis avançados, o que pode significar a utilização de equipamentos tecnológicos fora do alcance legal das autoridades de controle. As ações identificadas de MARCELO CÂMARA revelam o uso de uma 'Inteligência paralela' para municiar os planos do grupo. Nesse sentido, considerando o atual estado de liberdade do investigado, não há garantias de que o monitoramento ao ministro ALEXANDRE DE MORAES tenha realmente cessado, não se descartando a possibilidade, inclusive, de outras autoridades do Poder Judiciário estarem sendo monitoradas...”.
Esta foi a justificativa para sua prisão. O trecho acima, entre aspas, parece sugerir que a Abin Paralela e o software israelense FirtsMile foram usados para monitorar o ministro.
5. A situação de Valdemar e do PL
Muita gente criticou ontem o senador Humberto Costa (PT-PE), considerando precipitado seu anúncio de que pedirá a cassação do registro do partido. Não acho. O documento autorizando a operação deixa muito claro que o PL foi utilizado para financiar algumas operações e que sua sede no Lago Sul funcionou como QG para alguns dos operadores.
Que o partido teve papel ativo na articulação, ao apresentar ao TSE o pedido de exclusão dos votos de um grande número de urnas, com base em estudo que contratou, com recursos do fundo eleitoral, a um certo Instituto Voto Livre. Partido que serve a plano golpista não pode funcionar no sistema democrático.
Quanto a Valdemar, está preso por conta da arma ilegal e da pepita de ouro. É possível que seja liberado em breve, mas não estará livre das consequências de sua atuação no plano golpista.
6. O documento encontrado no gabinete do PL
Pouco se sabe sobre a origem de um documento apócrifo, com a vaga forma de uma exposição de motivos, justificando a decretação do Estado de Sítio, seguido de uma GLO. Segundo a Globonews, que o revelou, o papel tinha o timbre do PL e estava na sala usada por Bolsonaro, na sede do partido, após deixar a Presidência.
Algo sugere que possa ter sido escrito pelo próprio, como o uso da expressão “dentro das quatro linhas” (da Constituição). Seu advogado negou a autoria, lembrando que o Estado de Sitio precisa ser aprovado pelo Congresso. Mas Bolsonaro não tinha o Centrão para isso? Seja quem for o autor, o documento é só mais um confeito neste bolo. Já sobram indícios e provas de que estivemos bem perto de uma quartelada, seguida de uma ditadura.
7. O conforto de dois golpistas
Muitos dos conspiradores foram para o degredo na planície dos sem-poder após a posse de Lula, tais como Heleno e Braga Neto, sem falar nos que foram presos, como Anderson Torres e Mauro Cid. Mas dois continuaram desfrutando de sombra e água fresca, como se nada tivessem feito.
Um foi o general Estevam Theóphilo de Oliveira, que continuou chefiando o Comando de Operações Terrestres até novembro do ano passado, e como tal, integrando o Alto Comando do Exército. Em 9 de dezembro de 2022 ele acertou com Bolsonaro o uso de suas tropas na quartelada.
Outro é o coronel Bernardo Romão, que por sua atuação relevante, inclusive no 8 de janeiro, teve a prisão preventiva decretada.
Em dezembro de 2022 ele conseguiu ser nomeado para um posto em Washington, onde passou os últimos meses ganhando em dólares. Quase escapou mas foi preso ontem à tarde.
Com ele, são três os militares presos: os outros dois são o coronel e ex-assessor de Bolsonaro, Marcelo Câmara, e o major Rafael Martins, preso em Niterói.
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