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O debate sobre os embargos infringentes representa um dos maiores desafios da história da Justiça brasileira e é uma situação que se reflete, também, na experiência de outros países.
Estamos falando de fazer a revisão de uma condenação, pelo crime de formação de quadrilha.
É uma decisão difícil em qualquer lugar. Exemplo tradicional de erro judiciário, a condenação - perpétua - do capitão Alfredo Dreyfus por espionagem nunca foi corrigida pelo tribunal que o condenou. Foi reafirmada sempre que necessário.
A inocência de Dreyfus estava clara um ano depois de sua condenação, quando surgiram provas que incriminavam outro oficial. Mas a máquina para proteger uma decisão - mesmo errada - moveu-se muito mais depressa do que aquela que pretendia corrigir o erro. O militar que descobriu o erro e só pretendia que Dreyfus tivesse uma segunda chance foi mandado para fora do país. Seu lugar foi assumido por um oficial leal a ordem. Ele falsificou papéis para sustentar a condenação de Dreyfus. Emile Zolá escreveu o Eu Acuso mas o resultado não foi aquele que você imagina. Ele foi processado e condenando a pena máxima, chegando a fugir para a Inglaterra.Retornou a França depois que sua condenação foi revista por outro tribunal.
Dreyfuss foi julgado uma segunda vez, quase dez anos depois de cumprir sua pena na Guiana Francesa, onde chegou a ser submetido a tortura - ficou amarrado, a ferros, no sol escaldante do Equador. Mas o segundo julgamento não foi favorável. Embora não faltassem provas a seu favor, os debates foram tumultuados. A pressão do comando do Exército era grande, seus testemunhos - errados mas bem articulados - se mostraram convincentes.
O resultado é que Dreyfus foi considerado culpado - com atenuantes. Essa situação obrigou o presidente francês, que há anos se convencera de sua inocência, a lhe dar um indulto.
O país continuou dividido em torno do caso que, ao longo dos anos, colocou conservadores (e anti-sionistas) de um lado, democratas e socialistas de outro. O anti-sionismo seria uma das bases da direita francesa que, duas décadas depois, daria apoio a Hitler e formaria um governo submisso ao nazismo, encaminhando opositores aos campos de concentração.
Claro que você tem todo o direito de achar que a AP 470 foi o "maior julgamento da história" para punir o " maior escândalo da história." Não é obrigado a acreditar nas críticas ao julgamento, embora elas tenham sido feitas por vozes respeitadas do direito brasileiro. E pode achar, claro, que falar em Dreyfus é uma apelação.
Mas a experiencia - e aí não custa lembrar que Dreyfuss foi personagem de um país que fundou os Direitos Humanos e ajudou a edificar a democracia moderna - mostra que convém um pouco de humildade nos fatos e convicções, em especial quando envolvem tantas questões de natureza política que o relator do processo terminou o caso na condição de eventual candidato a presidente da República.
Acusar os réus de formarem uma " quadrilha " é um bom instrumento de retórica política mas se revela uma definição incompatível com o rigor de um tribunal. Falar em " quadrilha", na legislação brasileira, implica em dizer que o país esteve nas mãos de um grupo que se dedicava a praticar crimes - e não a cumprir um projeto político que, eventualmente, envolveu crimes e delitos que,sem que isso seja um atenuante, fazem parte do cotidiano das campanhas eleitorais do país. Insistir nessa condenação é um absurdo. E é fácil demonstrar que o agravamento artificial da pena por quadrilha viabilizou condenações em regime fechado, que não teriam sido possíveis a partir de uma dosimetria adequada, como demonstrou Ricardo Lewandovski.
O debate, hoje, envolve a humildade do tribunal para admitir que houve um erro e aceitar que será necessário fazer uma correção. Seria muito produtivo, do ponto de vista da história de um país. Demonstrada uma injustiça, que se faça justiça.
Seria até saudável, também. O STF estaria mostrando que é capaz de agir com equilíbrio numa situação particularmente difícil - que é examinar seu próprio desempenho.
Com essa decisão, o mito que se ergueu em torno do STF talvez não fique do mesmo tamanho. Os ministros talvez sejam obrigados a descer do pedestal em que muitos acreditam estar colocados. Estarão mais humanizados - condição que implica na possibilidade de cometer erros, argumento essencial para um julgamento de segunda instância que, como sabemos, foi negado aos réus da AP 470.
O país só terá a ganhar, assim, com tamanha prova de maturidade.
A manutenção de uma pena errada, nestas circunstâncias, irá mostrar uma opção preocupante, de preservar o próprio mito.
1 comentários:
[Brasileiros na Guiana Francesa] Manifesto dos imigrantes na Guiana Francesa
Guiana Francesa: Um coletivo de cidadãos estrangeiros faz um apelo à mídia nacional e internacional.
Em um texto publicado dia 11 de abril de 2014 e difundido na França, Brasil e Haiti, um colectivo de imigrantes que vive na Guiana Francesa denúncia as condições do tratamento dos estrangeiros nesse departamento francês ultramarino que faz fronteira ao Brasil. Uma semana depois da publicação do manifesto, disponível na internet em francês e português, o coletivo de estrangeiros pede "à mídia nacional e internacional que investigue, em câmera escondida de preferência, as condições do tratamento dos estrangeiros na Guiana Francesa" como indica a Comunidade Brasileira na França, jornal de referência para a comunidade brasileira na França. Este pedido de socorro será ouvido e será investigado pela grande mídia? A resposta está logo em frente aos nossos computadores e televisores.
(*) http://www.comunidadebrasileiranafranca.com
Guiana francesa – a França que a França não respeita : http://www.comunidadebrasileiranafranca.com/guiana-francesa-a-franca-que-a-franca-nao-respeita
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