Por João Brant, em seu Facebook:
Eu teria muitos motivos para não votar em Dilma: seu governo é mais conservador do que eu gostaria, houve poucas tentativas articuladas para mudar a cultura política do país e sua interlocução com a sociedade é muito limitada. No meu tema histórico de atuação, a comunicação, permaneceu tudo como dantes, sem nenhum esforço real para incidir sobre um sistema de mídia concentrado e conservador. Na cultura, houve retrocessos notáveis em relação ao governo Lula.
Mas a realidade é mais complexa. É preciso lembrar onde estávamos em 2002 e o que significou o ciclo inaugurado em 2003. O Brasil abandonou a rota neoliberal e reorganizou seu rumo na economia e no campo social para buscar diminuir a miséria e a pobreza no país. Fez isso, é verdade, sem romper com o capital financeiro e sem aprofundar processos de mudanças estruturais necessários para avançar mais. Mas não há dúvidas de que PT e PSDB fizeram opções muito distintas, que colocaram o Brasil em rumos opostos nos governos Lula e FHC.
O governo Dilma manteve as bases do governo Lula. No essencial, naquilo que tem capacidade de influir em escala na vida dos trabalhadores, houve poucas mudanças significativas. A conjuntura internacional mudou, e o governo teve méritos e deméritos no processo de adaptação. Conseguiu retardar e mitigar os efeitos da crise de 2008, mas seguiu apostando numa política de exportação de commodities que, aliada à falta de uma política industrial, tem efeitos negativos para o país em médio e longo prazo. De toda forma, diminuímos a desigualdade, mantivemos o desemprego em níveis bem baixos e 36 milhões de pessoas saíram da pobreza extrema.
Explico porque, pra mim, Marina Silva e Luciana Genro não são opções. Em relação à Marina, vejo três problemas centrais. O primeiro é que ela opta por um programa econômico claramente liberal, vinculado à agenda do setor financeiro, que aponta na direção contrária do caminho de enfrentamento às desigualdades que tortuosamente estamos seguindo. Essa opção é estrutural, e com ela vêm todo um pacote cujos efeitos são sentidos diretamente pelos trabalhadores. Não que o programa de Dilma não assuma parte da agenda liberal, mas é só ver a resistência do setor financeiro à sua candidatura para ver que ela contraria interesses poderosos. Além disso, essa opção de Marina tende a neutralizar a oportunidade real de avanços que dependem de outra estrutura econômica. Seu programa tem vários pontos progressistas, alguns mais do que os do programa de Dilma, mas o papel aceita qualquer combinação. No mundo real, não vejo condições de a maior parte da agenda progressista ser mantida com essas bases.
O segundo problema é que a maneira como ela monta o discurso de mudanças na política é ilusória e, a meu ver, despolitizante. Ao dizer que vai governar com os melhores do PSDB e os melhores do PT, ela propõe ao Brasil ignorar que estes são dois projetos opostos para o Brasil, inconciliáveis se mantidas suas características essenciais. Ao mesmo tempo, ao se fixar no bordão da ‘nova política’, Marina transforma as necessárias mudanças na cultura política em um ato de vontade, que pula toda a parte de dar respostas concretas a problemas duros e reais. Não gosto da lógica de governabilidade assumida pelo PT e não acho que ela seja a única maneira de se governar, mas acho que sua superação só pode acontecer em um processo complexo de enfrentamento a essa lógica, que depende de uma articulação social potente. Que nova política é essa a que só teremos acesso depois das eleições? Por que ela depende de se estar no governo para ser praticada? Como acreditar em uma nova política que é mais personalista (baseia-se em quadros) e individualista e menos coletiva? No que Heraclito Fortes, Bornhausen e Roberto Freire se diferenciam de Renan, Maluf e Crivella?
O terceiro problema é o mais explorado nas redes, e tem a ver com um conservadorismo comportamental da candidata. Confesso que esse ponto nem é pra mim o principal, não porque não o considere importante, mas porque não me parece que Dilma e seu governo tenham feito (ou farão) avançar essa agenda de qualquer forma. São necessários casos emblemáticos e comoções gerais com muita luta social para que haja qualquer chance de mudança.
Mas frente a esse cenário por que não votar no PSOL? A opção feita pelo PSOL nos seus 10 anos de existência foi se fixar como um partido que não busca dialogar com um número significativo de brasileiros. Faz um discurso voltado para o eleitorado de extrema esquerda, que não alcança 2% da população, e não se propõe a construir um discurso e um programa que o aproxime das massas. Enquanto parte do petismo exagera na interpretação sobre a correlação de forças, o PSOL parece ignorar esta avaliação.
É preciso compreender como pensa o país. Mesmo sendo considerado um moderado por alguns amigos, eu estou provavelmente nos 2% mais à esquerda do Brasil. Não por ser extremamente radical, mas porque o povo, mesmo com valores de esquerda, é moderado. Essa opção de enclausuramento do partido é aceitável na atuação parlamentar, onde em geral o partido vai bem e cumpre um papel fundamental (vide Ivan Valente e Jean Wyllis), mas é insustentável no âmbito da disputa pelo Poder Executivo.
Ajuda a explicar a situação o fato de parte significativa do PSOL entender que o principal adversário a ser combatido é o PT. Psicanaliticamente dá pra aceitar, politicamente não.
Frente a esse quadro, acho que a opção por Dilma significa uma opção viável pelos mais pobres. Significa também ir por um caminho em que algumas mudanças estruturais podem vir a ser disputadas (embora o governo tenha se fixado em bases nas quais há pouco espaço para elas). E significa deixar longe do governo o PSDB, que representa a agenda orgânica do setor financeiro. Parecem-me motivos suficientes.
Eu teria muitos motivos para não votar em Dilma: seu governo é mais conservador do que eu gostaria, houve poucas tentativas articuladas para mudar a cultura política do país e sua interlocução com a sociedade é muito limitada. No meu tema histórico de atuação, a comunicação, permaneceu tudo como dantes, sem nenhum esforço real para incidir sobre um sistema de mídia concentrado e conservador. Na cultura, houve retrocessos notáveis em relação ao governo Lula.
Mas a realidade é mais complexa. É preciso lembrar onde estávamos em 2002 e o que significou o ciclo inaugurado em 2003. O Brasil abandonou a rota neoliberal e reorganizou seu rumo na economia e no campo social para buscar diminuir a miséria e a pobreza no país. Fez isso, é verdade, sem romper com o capital financeiro e sem aprofundar processos de mudanças estruturais necessários para avançar mais. Mas não há dúvidas de que PT e PSDB fizeram opções muito distintas, que colocaram o Brasil em rumos opostos nos governos Lula e FHC.
O governo Dilma manteve as bases do governo Lula. No essencial, naquilo que tem capacidade de influir em escala na vida dos trabalhadores, houve poucas mudanças significativas. A conjuntura internacional mudou, e o governo teve méritos e deméritos no processo de adaptação. Conseguiu retardar e mitigar os efeitos da crise de 2008, mas seguiu apostando numa política de exportação de commodities que, aliada à falta de uma política industrial, tem efeitos negativos para o país em médio e longo prazo. De toda forma, diminuímos a desigualdade, mantivemos o desemprego em níveis bem baixos e 36 milhões de pessoas saíram da pobreza extrema.
Explico porque, pra mim, Marina Silva e Luciana Genro não são opções. Em relação à Marina, vejo três problemas centrais. O primeiro é que ela opta por um programa econômico claramente liberal, vinculado à agenda do setor financeiro, que aponta na direção contrária do caminho de enfrentamento às desigualdades que tortuosamente estamos seguindo. Essa opção é estrutural, e com ela vêm todo um pacote cujos efeitos são sentidos diretamente pelos trabalhadores. Não que o programa de Dilma não assuma parte da agenda liberal, mas é só ver a resistência do setor financeiro à sua candidatura para ver que ela contraria interesses poderosos. Além disso, essa opção de Marina tende a neutralizar a oportunidade real de avanços que dependem de outra estrutura econômica. Seu programa tem vários pontos progressistas, alguns mais do que os do programa de Dilma, mas o papel aceita qualquer combinação. No mundo real, não vejo condições de a maior parte da agenda progressista ser mantida com essas bases.
O segundo problema é que a maneira como ela monta o discurso de mudanças na política é ilusória e, a meu ver, despolitizante. Ao dizer que vai governar com os melhores do PSDB e os melhores do PT, ela propõe ao Brasil ignorar que estes são dois projetos opostos para o Brasil, inconciliáveis se mantidas suas características essenciais. Ao mesmo tempo, ao se fixar no bordão da ‘nova política’, Marina transforma as necessárias mudanças na cultura política em um ato de vontade, que pula toda a parte de dar respostas concretas a problemas duros e reais. Não gosto da lógica de governabilidade assumida pelo PT e não acho que ela seja a única maneira de se governar, mas acho que sua superação só pode acontecer em um processo complexo de enfrentamento a essa lógica, que depende de uma articulação social potente. Que nova política é essa a que só teremos acesso depois das eleições? Por que ela depende de se estar no governo para ser praticada? Como acreditar em uma nova política que é mais personalista (baseia-se em quadros) e individualista e menos coletiva? No que Heraclito Fortes, Bornhausen e Roberto Freire se diferenciam de Renan, Maluf e Crivella?
O terceiro problema é o mais explorado nas redes, e tem a ver com um conservadorismo comportamental da candidata. Confesso que esse ponto nem é pra mim o principal, não porque não o considere importante, mas porque não me parece que Dilma e seu governo tenham feito (ou farão) avançar essa agenda de qualquer forma. São necessários casos emblemáticos e comoções gerais com muita luta social para que haja qualquer chance de mudança.
Mas frente a esse cenário por que não votar no PSOL? A opção feita pelo PSOL nos seus 10 anos de existência foi se fixar como um partido que não busca dialogar com um número significativo de brasileiros. Faz um discurso voltado para o eleitorado de extrema esquerda, que não alcança 2% da população, e não se propõe a construir um discurso e um programa que o aproxime das massas. Enquanto parte do petismo exagera na interpretação sobre a correlação de forças, o PSOL parece ignorar esta avaliação.
É preciso compreender como pensa o país. Mesmo sendo considerado um moderado por alguns amigos, eu estou provavelmente nos 2% mais à esquerda do Brasil. Não por ser extremamente radical, mas porque o povo, mesmo com valores de esquerda, é moderado. Essa opção de enclausuramento do partido é aceitável na atuação parlamentar, onde em geral o partido vai bem e cumpre um papel fundamental (vide Ivan Valente e Jean Wyllis), mas é insustentável no âmbito da disputa pelo Poder Executivo.
Ajuda a explicar a situação o fato de parte significativa do PSOL entender que o principal adversário a ser combatido é o PT. Psicanaliticamente dá pra aceitar, politicamente não.
Frente a esse quadro, acho que a opção por Dilma significa uma opção viável pelos mais pobres. Significa também ir por um caminho em que algumas mudanças estruturais podem vir a ser disputadas (embora o governo tenha se fixado em bases nas quais há pouco espaço para elas). E significa deixar longe do governo o PSDB, que representa a agenda orgânica do setor financeiro. Parecem-me motivos suficientes.
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