Ilustração: Igor Lukyanchenko/http://www.cartoonmovement.com/ |
As aceleradas mutações na área de comunicação têm provocado fortes abalos no modelo de negócios da mídia monopolista. Na semana passada, o jornalista Daniel Castro, do site especializado "Notícias da TV", confirmou que o mercado de tevê paga perdeu 500 mil assinantes em apenas quatro meses e "vive uma das piores crises da sua história". Diante desta retração, os barões da mídia tentam jogar a culpa exclusivamente na crise econômica do país - que eles inclusive ajudaram a alimentar com o seu pessimismo partidarizado. Mas esta não é a única resposta para a vertiginosa crise no setor.
Daniel Castro enfatiza que "o mercado de TV por assinatura atravessa uma das piores crises de seus quase 25 anos de história no Brasil. Segundo dados divulgados pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), o setor perdeu meio milhão de assinantes em apenas quatro meses, de julho a novembro do ano passado. As operadoras encerraram o penúltimo mês de 2015 com 19,167 milhões de assinantes, uma queda de 2,5% em relação aos 19,658 milhões de clientes que tinham em julho".
"Os dados revelam que o setor passa pela pior crise desde 2003, no início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Naquele ano, a TV por assinatura perdeu 300 mil assinantes. A base de assinantes, no entanto, não chegava a 4 milhões de domicílios. Hoje, a indústria de TV por assinatura é muito mais sólida do que há 13 anos e se confunde com a telefonia e o acesso à internet. A perda de 500 mil assinantes tem um impacto muito menor hoje do que de 300 mil em 2003". Mas ela é grave e tende a piorar no próximo período.
Todas as operadoras registram queda
"No final de julho do ano passado, a Associação Brasileira de TV por Assinatura previa fechar 2015 com um 'crescimento zero'. De fato, a oscilação na base de assinantes durante o primeiro semestre foi pequena. O setor perdeu assinantes em alguns meses e ganhou em outros. No segundo semestre, no entanto, as quedas foram sucessivas, mês a mês. Em novembro, os números pioraram. Em apenas 30 dias, as operadoras perderam 232.641 assinantes. Isso quer dizer que milhares de famílias, atingidas pela crise econômica do país, não estão conseguindo pagar as mensalidades da TV por assinatura".
Todas as operadoras registraram queda. Líderes do mercado, a Net e a Claro pela primeira vez no ano fecharam um mês com menos de 10 milhões de assinantes (9.989.447, ou 97.817 a menos do que em outubro). Segunda maior operadora, a Sky teve queda de 67.046 em sua base e fechou novembro com 5,413 milhões de pagantes. "Até a estável Nossa TV, sustentada pelos fiéis da Igreja Internacional da Graça, de R.R. Soares, sentiu os efeitos da crise. Perdeu 363 clientes dos pouco mais de 130 mil que possui". Daniel Castro insiste em apontar a crise econômica como a única responsável pela retração.
'Gatonet', Netflix e banda larga
Já o colunista Maurício Stycer, da Folha, apresenta uma visão mais multilateral sobre o problema. Para ele, "a situação econômica do país, evidentemente, é a vilã principal da crise que ameaça o setor. Qualquer família que se vê diante da necessidade de cortar custos provavelmente coloca o pacote de TV por assinatura no topo da sua lista de itens não essenciais. Não considero irrelevante, porém, a pressão de outros fatores. Um deles, tão antigo quanto a própria TV por assinatura, é a fartura de serviços clandestinos (o famoso 'gatonet'), cujo alcance real é impossível de mensurar".
"Também acho que não se deve ignorar o crescimento da Netflix no Brasil, oferecendo um vasto cardápio de filmes e séries a partir de R$ 19,90 mensais. A empresa, infelizmente, não divulga seus números, mas apenas dá pistas de que o país é um mercado muito relevante em sua estratégia, até o momento bem-sucedida, de expansão global. Também é preciso levar em conta que os jovens com acesso a banda larga, um número ainda limitado no país, não precisam mais da televisão para se informar ou entreter. Com uma boa internet hoje, vê-se tudo. E, se não houver constrangimento de apelar para a pirataria, de graça".
A expansão agressiva da Netflix
No que se refere à Netflix, o cenário é ainda mais desafiador para os barões da mídia. No início deste ano, a empresa - que já está presente em cerca de 60 países - anunciou que passará a oferecer o seu serviço de streaming em mais 130 nações. Diante dos jornalistas que cobriam a feira de tecnologia de Las Vegas (EUA), o chefão da corporação, Reed Hastings, fez uma declaração bombástica: "Vocês estão testemunhando o nascimento de uma rede de TV global". O anúncio teve o efeito imediato de elevar as ações da Netflix em 8% na bolsa de valores. O executivo ainda citou a experiência brasileira como o motivo que inspirou a adoção desta agressiva política de expansão mundial.
"O Brasil é o melhor exemplo. Começamos há quatro anos. No início, o crescimento foi muito lento, mas porque estávamos em um mercado, falando com clientes que tinham problemas com o serviço. Conseguimos consertar as coisas e aprendemos mais rápido". Especula-se que a Netflix deve investir neste ano US$ 5 bilhões (cerca de R$ 20 bilhões) em conteúdo, com a compra de direitos e produção dos próprios programas. Ela também não se limitará mais às séries de tevê, diversificando sua grade de programação. O confronto com as emissoras brasileiras parece ser inevitável. A TV Globo, maior produtora local de conteúdo, até hoje se nega a licenciar seus programas para o serviço de streaming.
A expansão da Netflix - assim como da banda larga - deve abalar ainda mais o mercado publicitário. Nos EUA, por exemplo, este serviço já afastou anunciantes milionários das emissoras tradicionais. Segundo o escritor Alan Wolk, a Netflix está forjando uma nova geração de telespectadores de uma tevê sem comerciais. "O que é irônico, uma vez que a maior parte do seu conteúdo consiste em séries de TV cuja existência só foi possível por causa da receita com publicidade", argumenta. As maiores vítimas destas mutações são os canais abertos e as operadoras de TV por assinatura. Qual será o futuro? Ninguém sabe... nem os filhos de Roberto Marinho!
*****
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Daniel Castro enfatiza que "o mercado de TV por assinatura atravessa uma das piores crises de seus quase 25 anos de história no Brasil. Segundo dados divulgados pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), o setor perdeu meio milhão de assinantes em apenas quatro meses, de julho a novembro do ano passado. As operadoras encerraram o penúltimo mês de 2015 com 19,167 milhões de assinantes, uma queda de 2,5% em relação aos 19,658 milhões de clientes que tinham em julho".
"Os dados revelam que o setor passa pela pior crise desde 2003, no início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Naquele ano, a TV por assinatura perdeu 300 mil assinantes. A base de assinantes, no entanto, não chegava a 4 milhões de domicílios. Hoje, a indústria de TV por assinatura é muito mais sólida do que há 13 anos e se confunde com a telefonia e o acesso à internet. A perda de 500 mil assinantes tem um impacto muito menor hoje do que de 300 mil em 2003". Mas ela é grave e tende a piorar no próximo período.
Todas as operadoras registram queda
"No final de julho do ano passado, a Associação Brasileira de TV por Assinatura previa fechar 2015 com um 'crescimento zero'. De fato, a oscilação na base de assinantes durante o primeiro semestre foi pequena. O setor perdeu assinantes em alguns meses e ganhou em outros. No segundo semestre, no entanto, as quedas foram sucessivas, mês a mês. Em novembro, os números pioraram. Em apenas 30 dias, as operadoras perderam 232.641 assinantes. Isso quer dizer que milhares de famílias, atingidas pela crise econômica do país, não estão conseguindo pagar as mensalidades da TV por assinatura".
Todas as operadoras registraram queda. Líderes do mercado, a Net e a Claro pela primeira vez no ano fecharam um mês com menos de 10 milhões de assinantes (9.989.447, ou 97.817 a menos do que em outubro). Segunda maior operadora, a Sky teve queda de 67.046 em sua base e fechou novembro com 5,413 milhões de pagantes. "Até a estável Nossa TV, sustentada pelos fiéis da Igreja Internacional da Graça, de R.R. Soares, sentiu os efeitos da crise. Perdeu 363 clientes dos pouco mais de 130 mil que possui". Daniel Castro insiste em apontar a crise econômica como a única responsável pela retração.
'Gatonet', Netflix e banda larga
Já o colunista Maurício Stycer, da Folha, apresenta uma visão mais multilateral sobre o problema. Para ele, "a situação econômica do país, evidentemente, é a vilã principal da crise que ameaça o setor. Qualquer família que se vê diante da necessidade de cortar custos provavelmente coloca o pacote de TV por assinatura no topo da sua lista de itens não essenciais. Não considero irrelevante, porém, a pressão de outros fatores. Um deles, tão antigo quanto a própria TV por assinatura, é a fartura de serviços clandestinos (o famoso 'gatonet'), cujo alcance real é impossível de mensurar".
"Também acho que não se deve ignorar o crescimento da Netflix no Brasil, oferecendo um vasto cardápio de filmes e séries a partir de R$ 19,90 mensais. A empresa, infelizmente, não divulga seus números, mas apenas dá pistas de que o país é um mercado muito relevante em sua estratégia, até o momento bem-sucedida, de expansão global. Também é preciso levar em conta que os jovens com acesso a banda larga, um número ainda limitado no país, não precisam mais da televisão para se informar ou entreter. Com uma boa internet hoje, vê-se tudo. E, se não houver constrangimento de apelar para a pirataria, de graça".
A expansão agressiva da Netflix
No que se refere à Netflix, o cenário é ainda mais desafiador para os barões da mídia. No início deste ano, a empresa - que já está presente em cerca de 60 países - anunciou que passará a oferecer o seu serviço de streaming em mais 130 nações. Diante dos jornalistas que cobriam a feira de tecnologia de Las Vegas (EUA), o chefão da corporação, Reed Hastings, fez uma declaração bombástica: "Vocês estão testemunhando o nascimento de uma rede de TV global". O anúncio teve o efeito imediato de elevar as ações da Netflix em 8% na bolsa de valores. O executivo ainda citou a experiência brasileira como o motivo que inspirou a adoção desta agressiva política de expansão mundial.
"O Brasil é o melhor exemplo. Começamos há quatro anos. No início, o crescimento foi muito lento, mas porque estávamos em um mercado, falando com clientes que tinham problemas com o serviço. Conseguimos consertar as coisas e aprendemos mais rápido". Especula-se que a Netflix deve investir neste ano US$ 5 bilhões (cerca de R$ 20 bilhões) em conteúdo, com a compra de direitos e produção dos próprios programas. Ela também não se limitará mais às séries de tevê, diversificando sua grade de programação. O confronto com as emissoras brasileiras parece ser inevitável. A TV Globo, maior produtora local de conteúdo, até hoje se nega a licenciar seus programas para o serviço de streaming.
A expansão da Netflix - assim como da banda larga - deve abalar ainda mais o mercado publicitário. Nos EUA, por exemplo, este serviço já afastou anunciantes milionários das emissoras tradicionais. Segundo o escritor Alan Wolk, a Netflix está forjando uma nova geração de telespectadores de uma tevê sem comerciais. "O que é irônico, uma vez que a maior parte do seu conteúdo consiste em séries de TV cuja existência só foi possível por causa da receita com publicidade", argumenta. As maiores vítimas destas mutações são os canais abertos e as operadoras de TV por assinatura. Qual será o futuro? Ninguém sabe... nem os filhos de Roberto Marinho!
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