Por João Batista Moreira Pinto, no site Brasil Debate:
Alguns políticos têm dito que os deputados saberão ouvir a “voz das ruas”. Da mesma forma, o juiz Sergio Moro soltou nota, no 13 último, dizendo ser “importante que as autoridades eleitas e os partidos ouçam a voz das ruas”. Ora, essas afirmações que, em um primeiro momento, sem uma análise crítica, poderiam indicar uma posição democrática ou uma perspectiva pós-positivista no campo do direito, quando confrontadas a alguns elementos da realidade, expressam o caráter conservador e antidemocrático desses atores. Vejamos as bases dessa nossa inferência lógica, social e política.
Primeiro aspecto: as ruas não manifestam uma voz unívoca, elas expressam fundamentalmente duas posições políticas norteadoras e opostas diante da situação política atual: uma que defende a quebra do processo democrático reafirmado nas urnas em final de 2014 e outra que, pelo contrário, defende a manutenção do processo democrático.
Dito de outra forma: uma parte da população não quer a continuidade do governo Dilma, e isto desde o final do último processo eleitoral, e outra defende a permanência de um governo legitimamente eleito.
A primeira posição é marcadamente de direita, neoliberal e conservadora. Ela busca manter ou retomar as tradicionais relações econômicas e sociais que garantiam à classe, grupos ou setores com poderes estabelecidos, posições privilegiadas na sociedade e que foram colocadas em risco a partir dos governos Lula e Dilma por meio de programas que viabilizaram maior acesso a direitos sociais, econômicos e culturais; possibilitando maior efetividade ou materialidade aos direitos civis e políticos, antes claramente abstratos.
A outra posição política expressa por essas vozes nas ruas ou na cena política é a da esquerda, por princípios, contrária ao neoliberalismo e buscando a ampliação da emancipação em uma sociedade marcada por enorme desigualdade.
Um segundo aspecto fundamental na desconstrução dessa expressão vazia “voz das ruas” é considerar que as vozes têm um conteúdo e um contexto que precisam ser levados em conta. Para tratarmos disso, vale resgatar o que alguns operadores de Segurança Pública, com frequência, dizem em cursos de Segurança Pública e Direitos Humanos: “… mas é a população que pede os linchamentos!”
Ao que tenho respondido: “mas vocês, como agentes públicos, sabem que não podem concordar com isso, não estão ali para serem coniventes ou patrocinarem qualquer desrespeito à lei e aos Direitos Humanos, mesmo que parte da população ou sua maioria, não tendo a dimensão correta dos direitos humanos, possa desejar ações que violem esses direitos. Vocês não estão ali para dar ouvidos a essas vozes; pois nem sempre a voz do povo expressa a razão, a justiça e a legitimidade do Estado de Direito”.
Cabe destacar que a conivência desses agentes aos desejos populares levaria a situações institucionais ilegais e ilegítimas, portanto, em ruptura com o Estado Democrático de Direito. Assim, considerar as vozes do povo ou das ruas, sem uma análise do seu conteúdo legal e de legitimidade, poderia levar a um desvirtuamento da justiça institucional e do próprio processo democrático.
Chegamos a um terceiro elemento fundamental: a necessidade de observância do contexto e dos interesses dos atores que atuaram na formação de opinião de grande parte dos que estão na rua. Vamos partir do pressuposto de que a divulgação dos eventos e a apresentação ou criação dos motivos para a manifestação são fundamentais para o sucesso do que se pretende. A partir daí, analisemos criticamente a participação nas manifestações de rua recentes. Note-se que as manifestações contra o governo estão sendo precedidas de uma ampla cobertura da grande mídia, já anunciando a preparação das manifestações e as pautas políticas dessas manifestações. Assim, nas manhãs dos domingos, antes dos acontecimentos pró-impeachment, a grande maioria da mídia brasileira já tem antecipado em letras garrafais, como ocorreu no último dia 13, “O BRASIL NAS RUAS CONTRA O GOVERNO”.
Ora, isso não é notícia, é um chamamento do povo às ruas, favorecida por uma cobertura ampla e contínua da Rede Globo, em especial, durante todo o dia e noite. Outro aspecto a ser considerado nesse contexto é que essa cobertura midiática se deu após a apresentação e criação de fatos construídos a partir de ilegalidades, com a suspensão de sigilo e com a divulgação ilegal, e que se tornou político partidária ao ser encaminhada à Rede Globo, por parte do juiz Sergio Moro, no momento político que poderia permitir um outro desfecho para a crise: a posse de Lula como ministro da Casa Civil no governo Dilma.
Pode-se destacar que a avaliação de todos os políticos e dos poderes econômicos é que, com a posse de Lula como ministro, a hipótese do impeachment ficava remotíssima, e o juiz agiu com clara motivação político-partidária, alegando interesse público.
Dessa forma, foram construídas as bases para a que foi apresentada como a maior manifestação popular da história pela mídia; mas, ressalte-se, construída artificialmente e com base em ilegalidades, com participação de 2 a 3% do eleitorado brasileiro, pela média dos diferentes cálculos divulgados, em sua grande maioria, brancos, empresários ou de classe privilegiada economicamente, tirando evidentemente uma pequena parcela de desavisados políticos; isto é, os que sempre foram beneficiados pela estrutura de desigualdades na sociedade brasileira, com o apoio de organizações da sociedade conservadoras e capitaneadas, sobretudo, por movimentos que surgiram durante o último processo eleitoral e que se recusaram a aceitar o resultado das urnas.
Por outro lado, as manifestações pró-governo, favoráveis ao processo democrático e contra o impeachment, tiveram um tratamento completamente diferente na grande mídia. Praticamente não houve referência ao evento que já se organizava e as coberturas e análises foram majoritariamente no sentido de diminuir os méritos do que era evidente e que se buscava contornar: a presença e as vozes da rua por parte dos apoiadores do governo e/ou contrários ao impeachment, por considerá-lo um golpe, eram quantitativamente quase tão expressivas quanto as que se fizeram com toda uma produção e envolvimento da grande mídia.
Além disso, importa destacar a legitimidade dos atores políticos que têm manifestado sua posição contrária ao impeachment e favorável à manutenção do processo democrático: praticamente todas as entidades de direitos humanos ou vinculadas a pautas emancipatórias, com atuação de décadas, muitas ainda com histórico de atuação na luta contra a ditadura, e setores democráticos da sociedade, professores e outros perfilavam bandeiras e faixas em favor da manutenção do resultado eleitoral de 2014 e contra qualquer golpe contra a democracia.
Diante disso, e face à fala vazia por parte de parte dos políticos aliados a Eduardo Cunha e de parte do Judiciário, percebe-se claramente a maior legitimidade das vozes daqueles que defendem o governo, contra qualquer golpe que se tenta orquestrar pelos grupos de poder conservadores e que tentam falaciosamente se apresentar como as vozes da sociedade brasileira. NÃO, AS VOZES LEGÍTIMAS DO POVO, SUSTENTADAS NAS URNAS, DIZEM NÃO À RUPTURA DEMOCRÁTICA.
Alguns políticos têm dito que os deputados saberão ouvir a “voz das ruas”. Da mesma forma, o juiz Sergio Moro soltou nota, no 13 último, dizendo ser “importante que as autoridades eleitas e os partidos ouçam a voz das ruas”. Ora, essas afirmações que, em um primeiro momento, sem uma análise crítica, poderiam indicar uma posição democrática ou uma perspectiva pós-positivista no campo do direito, quando confrontadas a alguns elementos da realidade, expressam o caráter conservador e antidemocrático desses atores. Vejamos as bases dessa nossa inferência lógica, social e política.
Primeiro aspecto: as ruas não manifestam uma voz unívoca, elas expressam fundamentalmente duas posições políticas norteadoras e opostas diante da situação política atual: uma que defende a quebra do processo democrático reafirmado nas urnas em final de 2014 e outra que, pelo contrário, defende a manutenção do processo democrático.
Dito de outra forma: uma parte da população não quer a continuidade do governo Dilma, e isto desde o final do último processo eleitoral, e outra defende a permanência de um governo legitimamente eleito.
A primeira posição é marcadamente de direita, neoliberal e conservadora. Ela busca manter ou retomar as tradicionais relações econômicas e sociais que garantiam à classe, grupos ou setores com poderes estabelecidos, posições privilegiadas na sociedade e que foram colocadas em risco a partir dos governos Lula e Dilma por meio de programas que viabilizaram maior acesso a direitos sociais, econômicos e culturais; possibilitando maior efetividade ou materialidade aos direitos civis e políticos, antes claramente abstratos.
A outra posição política expressa por essas vozes nas ruas ou na cena política é a da esquerda, por princípios, contrária ao neoliberalismo e buscando a ampliação da emancipação em uma sociedade marcada por enorme desigualdade.
Um segundo aspecto fundamental na desconstrução dessa expressão vazia “voz das ruas” é considerar que as vozes têm um conteúdo e um contexto que precisam ser levados em conta. Para tratarmos disso, vale resgatar o que alguns operadores de Segurança Pública, com frequência, dizem em cursos de Segurança Pública e Direitos Humanos: “… mas é a população que pede os linchamentos!”
Ao que tenho respondido: “mas vocês, como agentes públicos, sabem que não podem concordar com isso, não estão ali para serem coniventes ou patrocinarem qualquer desrespeito à lei e aos Direitos Humanos, mesmo que parte da população ou sua maioria, não tendo a dimensão correta dos direitos humanos, possa desejar ações que violem esses direitos. Vocês não estão ali para dar ouvidos a essas vozes; pois nem sempre a voz do povo expressa a razão, a justiça e a legitimidade do Estado de Direito”.
Cabe destacar que a conivência desses agentes aos desejos populares levaria a situações institucionais ilegais e ilegítimas, portanto, em ruptura com o Estado Democrático de Direito. Assim, considerar as vozes do povo ou das ruas, sem uma análise do seu conteúdo legal e de legitimidade, poderia levar a um desvirtuamento da justiça institucional e do próprio processo democrático.
Chegamos a um terceiro elemento fundamental: a necessidade de observância do contexto e dos interesses dos atores que atuaram na formação de opinião de grande parte dos que estão na rua. Vamos partir do pressuposto de que a divulgação dos eventos e a apresentação ou criação dos motivos para a manifestação são fundamentais para o sucesso do que se pretende. A partir daí, analisemos criticamente a participação nas manifestações de rua recentes. Note-se que as manifestações contra o governo estão sendo precedidas de uma ampla cobertura da grande mídia, já anunciando a preparação das manifestações e as pautas políticas dessas manifestações. Assim, nas manhãs dos domingos, antes dos acontecimentos pró-impeachment, a grande maioria da mídia brasileira já tem antecipado em letras garrafais, como ocorreu no último dia 13, “O BRASIL NAS RUAS CONTRA O GOVERNO”.
Ora, isso não é notícia, é um chamamento do povo às ruas, favorecida por uma cobertura ampla e contínua da Rede Globo, em especial, durante todo o dia e noite. Outro aspecto a ser considerado nesse contexto é que essa cobertura midiática se deu após a apresentação e criação de fatos construídos a partir de ilegalidades, com a suspensão de sigilo e com a divulgação ilegal, e que se tornou político partidária ao ser encaminhada à Rede Globo, por parte do juiz Sergio Moro, no momento político que poderia permitir um outro desfecho para a crise: a posse de Lula como ministro da Casa Civil no governo Dilma.
Pode-se destacar que a avaliação de todos os políticos e dos poderes econômicos é que, com a posse de Lula como ministro, a hipótese do impeachment ficava remotíssima, e o juiz agiu com clara motivação político-partidária, alegando interesse público.
Dessa forma, foram construídas as bases para a que foi apresentada como a maior manifestação popular da história pela mídia; mas, ressalte-se, construída artificialmente e com base em ilegalidades, com participação de 2 a 3% do eleitorado brasileiro, pela média dos diferentes cálculos divulgados, em sua grande maioria, brancos, empresários ou de classe privilegiada economicamente, tirando evidentemente uma pequena parcela de desavisados políticos; isto é, os que sempre foram beneficiados pela estrutura de desigualdades na sociedade brasileira, com o apoio de organizações da sociedade conservadoras e capitaneadas, sobretudo, por movimentos que surgiram durante o último processo eleitoral e que se recusaram a aceitar o resultado das urnas.
Por outro lado, as manifestações pró-governo, favoráveis ao processo democrático e contra o impeachment, tiveram um tratamento completamente diferente na grande mídia. Praticamente não houve referência ao evento que já se organizava e as coberturas e análises foram majoritariamente no sentido de diminuir os méritos do que era evidente e que se buscava contornar: a presença e as vozes da rua por parte dos apoiadores do governo e/ou contrários ao impeachment, por considerá-lo um golpe, eram quantitativamente quase tão expressivas quanto as que se fizeram com toda uma produção e envolvimento da grande mídia.
Além disso, importa destacar a legitimidade dos atores políticos que têm manifestado sua posição contrária ao impeachment e favorável à manutenção do processo democrático: praticamente todas as entidades de direitos humanos ou vinculadas a pautas emancipatórias, com atuação de décadas, muitas ainda com histórico de atuação na luta contra a ditadura, e setores democráticos da sociedade, professores e outros perfilavam bandeiras e faixas em favor da manutenção do resultado eleitoral de 2014 e contra qualquer golpe contra a democracia.
Diante disso, e face à fala vazia por parte de parte dos políticos aliados a Eduardo Cunha e de parte do Judiciário, percebe-se claramente a maior legitimidade das vozes daqueles que defendem o governo, contra qualquer golpe que se tenta orquestrar pelos grupos de poder conservadores e que tentam falaciosamente se apresentar como as vozes da sociedade brasileira. NÃO, AS VOZES LEGÍTIMAS DO POVO, SUSTENTADAS NAS URNAS, DIZEM NÃO À RUPTURA DEMOCRÁTICA.
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